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Repressão e Recalque.

Atualizado: 22 de set. de 2024

Desvende os mistérios da mente ansiosa e descubra como encontrar a paz interior.


''Como guardiões dos portais do consciente e inconsciente, a repressão e o recalque se erguem como sentinelas que vigiam os segredos mais sombrios da alma.'' Dan Mena. Por Dan Mena. Neste artigo, proponho adentrarmos no fascinante tema da repressão e o recalque. A repressão é um dos pilares sobre os quais repousa toda a elaboração teórica da psicanálise. Freud assegura que é uma conquista do seu trabalho, obtida de maneira legítima, como decantação teórica de inúmeras experiências clínicas. “O que pensamos ser uma conquista de nossa própria mente muitas vezes é apenas uma repressão da verdade inconveniente.” Quando falamos deste assunto, nós referimos ao mecanismo de defesa mais importante da dinâmica psíquica. Nada mais e nada menos, senão, aquele que nos mostrou o caminho para a descoberta da existência do inconsciente. Como ele cita: “A repressão é a mãe da neurose; ela é a origem de toda doença mental.” As explicações sobre o fenômeno se entrelaçam com a relevância da sexualidade, da moral e do desenvolvimento biológico do ser. “A repressão é a maneira pela qual a sociedade controla nossos instintos, nos forçando a ajustar-nos a padrões sociais, o que pode levar a conflitos internos e distúrbios psicológicos.” Outrossim, creio ser oportuno sinalizar que existem algumas diferenças entre os termos Repressão e Recalque, destarte muitas vezes são utilizados associados, um substituindo o outro, ou apenas subentendidos como sinônimos. Na sua definição final, são sim conceitos intimamente relacionados, mas com nuances distintas em seu funcionamento mental. Por isso é importante abrir o tema esclarecendo essa simbiose linguística, conforme concebidos pela nossa teoria. Boa leitura.

''A repressão vigia os desejos proibidos, enquanto o recalque obscurece a consciência, ecoando para o inconsciente.'' Dan Mena.

Repressão:

A repressão é um mecanismo de defesa capital, ele opera no inconsciente. Envolve o ato de suprimir ou eliminar da consciência pensamentos, desejos, impulsos ou memórias que são considerados ameaçadores ou socialmente inaceitáveis. O processo repressivo é frequentemente instintivo e ocorre de forma totalmente involuntária ao nosso querer e possível controle. Quando um conteúdo psíquico é reprimido, ele não é simplesmente esquecido, mas sim empurrado ladeira abaixo para o inconsciente, onde continua a influenciar o comportamento e os sentimentos que nos acometem. Pode ser visto como uma estratégia defensiva destinada a proteger o ego contra conflitos internos, ansiedades ou experiências traumáticas que poderiam perturbar o equilíbrio psíquico.

''Diante das exigências da sociedade, a repressão ergue seus muros, moldando a persona pública, enquanto relega ao esquecimento os desejos que não se encaixam nos moldes socialmente aceitos.'' Dan Mena.

Recalque:

Já o recalque é um aspecto específico da própria repressão, se refere a dinâmica pela qual conteúdos mentais singulares, intrínsecos, são deslocados do consciente para o inconsciente. O recalque age principalmente em relação aos desejos sexuais e agressivos, elaborados durante a infância. No desacolhimento desse mecanismo, não apenas esquecemos ou ignoramos um pensamento, ou desejo indesejado, mas ativamente negamos sua existência conscientemente. Assim o jogamos para o inconsciente, o mantendo fora do âmbito da consciência. Esse processo, muitas vezes, ocorre em resposta a determinadas normas sociais impostas, regras familiares ou culturais, que proíbem expressões abertas de certos assuntos e interesses sexuais ou mesmo dos impulsos naturais. O recalque é, portanto, uma chave na formação da estrutura psíquica do indivíduo, que se forma durante o desenvolvimento normal e psicossexual, influenciando a personalidade, a identidade e o comportamento ao longo da nossa experiência de vida.

''Diante do confronto com o intolerável, o recalque emerge como o mecanismo de defesa primordial da psique, relegando ao esquecimento aquilo que não pode ser enfrentado verticalmente de frente.'' Dan Mena.

Natureza do Processo — Diferenças concretas;

Repressão:

É como a mente se protege ao esconder pensamentos ou sentimentos ameaçadores.

Recalque:

É um tipo específico de repressão que esconde desejos, especialmente os sexuais e agressivos.

Foco e Abrangência:

Repressão:

Pode envolver uma variedade de pensamentos e emoções.

Recalque:

Se concentra especialmente em esconder desejos considerados socialmente inaceitáveis, como os sexuais ou agressivos.

Atividade dos Processos:

Repressão:

Pode acontecer sem a pessoa perceber, como um reflexo automático.

Recalque:

Geralmente é um processo ativo, onde estamos cientes de querer esconder determinados pensamentos e sentimentos que nos incomodam.

Momento em que Ocorrem:

Repressão:

Pode ocorrer em qualquer fase da vida.

Recalque:

Principalmente acontece na infância, durante o desenvolvimento da personalidade.

Conforme apuramos, descobrimos e desenredamos ditas complexidades de ambas, vamos nos aprofundar em suas influências nas dinâmicas da psicoterapia. Aqui, a repressão pode se manifestar como resistência, dificultando a sondagem profunda dos conflitos internos apresentados pelos pacientes. Além disso, verifiquemos como a repressão impacta a vida psíquica, onde conteúdos reprimidos podem gerar sintomas, distúrbios, estresse ou tensões emocionais, alterando significativamente a qualidade de vida e o bem-estar geral. Compreender como a repressão opera é essencial para abordar essas questões emocionais eficazmente.

A Energia Psíquica Permanece.

O processo de repressão é uma peça angular na compreensão da nossa psicodinâmica. Freud a descreve como um esquema automático e constante da mente, ela funciona para manter afastados da consciência conteúdos mentais percebidos como ameaçadores e alarmantes. Através desse recurso, o ego exerce uma censura sobre os impulsos, desejos e memórias considerados(as) intoleráveis e insuportáveis. Podemos usar o impulso como modelo para elucidar esse método. Quando um ímpeto, lance ou pulsão, é reprimido, ele não é simplesmente eliminado, mas sim privado do uso da sua energia e potência. No entanto, a intensidade e vigor delas permanecem ligadas e conectadas, fixada nas suas representações mentais associadas, exercendo uma atração sobre novas configurações que vão surgir inevitavelmente, posteriormente. Assim, a repressão não é um esquecimento, mas uma exclusão animada e deslocada do conteúdo da consciência, se tornando por consequência uma memória inconsciente, que influencia indiretamente o comportamento e os sentimentos que nos acompanham.

Os Três Processos da Repressão.

É importante destacar, que a repressão não empreende apenas sobre os impulsos ou desejos, mas também sobre os afetos coligados a eles. Afeições, apegos e estimas não são diretamente restritos e sufocados, mas podem ser transformados ou dirigidos para outros pontos. Isso pode levar a uma desconexão entre a expressão emocional e a consciência do indivíduo, resultando em sintomas psicológicos ou psicossomáticos. Nosso postulado, distingue três momentos peculiares e específicos no processo de repressão: a repressão originária, que estabelece a divisão entre os domínios consciente e inconsciente da mente; a repressão propriamente dita, que desloca os conteúdos intoleráveis para o inconsciente; e o retorno do reprimido, onde esses elementos buscam uma forma de expressão na consciência mediante sintomas, sonhos ou atos falhos.

1. Repressão Originária:

A repressão originária marca o início da divisão entre os domínios consciente e inconsciente da mente. Esse momento como aquele em que representações mentais intoleráveis são expulsas da consciência e relegadas ao inconsciente. Como destacado por Laplanche e Pontalis (1967), “A repressão originária é o processo primário pelo qual o indivíduo lida com a excitação psíquica” (p. 353). Neste estágio, a mente busca se proteger da sobrecarga emocional, relegando esses materiais e conteúdos inadmissíveis ao inconsciente.

2. Repressão Propriamente Dita:

A repressão propriamente dita é o segundo momento desse processo, onde os conteúdos reprimidos são mantidos no inconsciente. Como explicado por Freud (1915); “A repressão propriamente dita, desloca para o inconsciente os conteúdos intoleráveis para a consciência, onde permanecem ativos”. Esta fase, é caracterizada pela manutenção dos temas reprimidos no inconsciente, onde exercem uma influência contínua sobre a vida mental do indivíduo. Como observado por Jung (1964); “O inconsciente retém os conteúdos reprimidos, onde continuam a influenciar a vida psíquica”.

3. Retorno do Reprimido:

O retorno do reprimido é o terceiro momento da repressão, onde os manifestos recalcados buscam uma forma de expressão na consciência. “O retorno do reprimido pode ocorrer via sintomas, sonhos ou atos falhos”. Este estágio é crucial para o trabalho terapêutico, ao oferecer oportunidades para o paciente confrontar e elaborar os aspectos refreados de sua experiência. Como afirmado por Ferenczi (1919); “O retorno do reprimido é uma oportunidade para o paciente revisitar e integrar esses conteúdos na consciência”. O inconsciente é estruturado como uma linguagem, e os desejos limitados se expressam por meio de símbolos e metáforas, que por sua vez são interpretados como manifestações do inconsciente tentando se fazer ouvir. O inconsciente não é apenas uma região reprimida da mente, mas sim um campo de significação, onde os desejos e embates psíquicos são representados tropológica e emblematicamente. Portanto, fundamental para a compreensão da psicodinâmica, ao revelarem as lutas entre forças conscientes e inconscientes na mente.

''Os processos da repressão representam as diferentes faces da mesma moeda psíquica, onde a negação se comporta como uma incapacidade cognitiva a existência dos desejos indesejados, o recalcamento as empurra para o subterrâneo do inconsciente, e a formação reativa, os transformando em seu oposto, para torná-los socialmente aceitáveis.'' Dan Mena.

Implicações Clínicas:

“A análise visa trazer luz aos conteúdos tolhidos e auxiliam o paciente a integrá-los construtivamente”. O ''retorno do reprimido'' na sessão terapêutica oferece oportunidades para o processo analítico na totalidade, permitindo ao cliente confrontar e elaborar os aspectos censurados da sua singular vivência. Atinar, depreender e interpretar esses momentos é essencial para o nosso trabalho, ao abrir uma janela de imersão nos conflitos, contribuem para se alcançar uma maior integração e autoconsciência.

A Abordagem Lacaniana.

Não é possível agregar elementos contemporâneos a repressão e o recalque sem convocar o essencial aporte da visão lacaniana, que adiciona novas nuances e reflexões sobre esses conceitos. Para Lacan, a repressão não é simplesmente a exclusão de conteúdos da consciência, mas sim um processo labiríntico e hermético, que envolve a negação da falta fundamental do sujeito. Ele argumenta que a repressão implica em negar não apenas os desejos ou impulsos individuais, mas principalmente o desejo do Outro. Em suas palavras, “A repressão não é a eliminação de um desejo, mas a rejeição do desejo do Outro” (Lacan, 1957). Por esta via, ele introduz o conceito de “foraclusão”, (veja adiante a definição); sugerindo que o recalque não ocorre simplesmente por meio da repressão de conteúdos para o inconsciente, mas sim pela eliminação simbólica desses elementos, do registro metafórico e alegórico. Assim, isso se configura pela operação emblemática típica, que envolve a negação do desejo do sujeito em relação ao desejo do Outro.

A Incompletude do Ser.

A falta fundamental do ser, surge da percepção da incompletude primordial e da ausência de algo primigênio original, inerentemente ligado à nossa experiência humanística desde o nascimento. Ao percebermos a falta do objeto primevo, geralmente identificado com a nossa mãe ou com a fusão com o outro. Esse absentismo, que vai nos compor e acompanhar por toda a vida, será crucial para o nosso desenvolvimento, pois a partir dele nos tornamos seres desejantes, logo o ausentismo dessa completude impossível será o próprio motor do desejo, que vai consequentemente nos mover em direção à vida. Lacan argumenta, que o desejo é sempre marcado pela falta, uma vez que visamos preencher essa lacuna original, muitas vezes de maneira inconsciente e simbólica. Assim, a falta fundamental do sujeito é o que impulsiona a busca por satisfação e completude. Essa carência, não pode ser diretamente preenchida, faz parte da nossa condição. Geralmente se relaciona ao conceito de “castração simbólica”, que se refere à perda do objeto primordial e à entrada do sujeito na ordem simbólica da linguagem e da cultura. Portanto, a falta fundamental do sujeito não é uma deficiência a ser corrigida, mas sim, uma condição intrínseca à experiência decorrente da vida, que molda a maneira como os desejos são formados e vivenciados ao longo da vida.

Recalque em Lacan.

O recalque em Lacan está intimamente relacionado ao conceito do “retorno do recalcado”, que descreve como os conteúdos reprimidos retornam de maneira sintomática na vida do sujeito. O recalque não é simplesmente a supressão de desejos ou impulsos, mas sim uma negação simbólica que mascara a falta fundamental do sujeito. Como ele escreve; “O recalque é a negação simbólica da falta” (Lacan, 1957). Ele implica que no indeferimento e suposto desprezo da denegação do desejo do sujeito em relação ao desejo do Outro, ou seja, a negação da falta que constitui o sujeito. O recalque não elimina o desejo reprimido, mas o transforma em sintoma, que retorna de maneira codificada na nossa vida.

Conceito de Foraclusão.

A noção de foraclusão, introduzida na teoria psicanalítica, indica o isolamento e a marginalização de um significante elementar e precípuo do campo simbólico do indivíduo, resultando em uma lacuna ou falha na sua estruturação psíquica; “A rejeição de um significante elementar do campo simbólico” (Lacan, 1957). Este significante elementar, muitas vezes referido como o Nome-do-Pai, é substancial para a entrada do sujeito na ordem simbólica e para a constituição de sua identidade. Quando esse significante não é adequadamente inscrito no campo simbólico, ocorre uma ''foraclusão'', levando a consequências expressivas para o sujeito. Diferentemente do recalque, que enquanto implica a rejeição de um significante já simbolizado, a foraclusão envolve a supressão dele, que nunca foi plenamente integrado ao registro simbólico do indivíduo. Tal a sua importância, que podemos afirmar que; “A falta do Nome-do-Pai no inconsciente é a estrutura mesma da psicose” (Lacan, 1957). A apreensão desse conceito, que agrega Lacan, implica na profunda compreensão da psicopatologia e do desenvolvimento mental. Em casos de psicose, por exemplo, a foraclusão do Nome-do-Pai pode levar a uma fragmentação do self e a uma perda do senso de realidade. Além disso, pode ser a fonte de sintomas neuróticos, como ansiedade, depressão e dificuldades de identidade. “A análise visa a trazer à luz o que foi foracluído e o reintegra ao campo simbólico do sujeito” (Lacan, 1957). Ao reconhecermos as entrelinhas desse simbolismo, como analistas, podemos investigar questões laterais à foraclusão e facilitar o processo de simbolização e integração do paciente.

''A foraclusão, como o ato de rejeitar o significante primordial, impõe ao sujeito um destino marcado pela falta, onde a ausência de sentido se torna o fio condutor de sua existência.''

Dan Mena.

Simbólico, Imaginário e Real.

Assimilar repressão e recalque na psicanálise lacaniana envolve uma análise dos conceitos de simbólico, imaginário e real, os quais desempenham papéis básicos na estruturação da mente e na formação dos sintomas.

1. O Simbólico:

O simbólico, é o domínio da linguagem, da cultura e dos significantes. É o registro, no qual os significados são atribuídos e compartilhados mediante sistemas estruturados figuradamente como a dialética. Na repressão e no recalque, o simbolismo se estabelece mediante conteúdos mentais codificados e organizados conforme as normas sociais e culturais. “O simbólico é o domínio do Outro, da lei e das normas sociais que moldam a subjetividade” (Lacan, 1957).

2. O Imaginário:

O imaginário, por sua vez, é o registro das imagens que formamos e projetamos, das fantasias e das identificações narcísicas. São representações mentais que surgem a partir das relações especulares, especialmente, da relação com a imagem do outro e da própria imagem no espelho. Na repressão e no recalque, o imaginário e a fantasia, perpetram a formação dos sintomas, ao ser onde o lugar onde os conflitos psíquicos são simbolizados e representados de maneira imagética. “O imaginário é o domínio das identificações narcísicas e das fantasias que moldam a percepção de si e do outro” (Lacan, 1957).

3. O Real:

Por fim, o real é o registro do inassimilável, do não simbolizável e de tudo que nos é ou foi traumático. É aquilo que escapa à nossa representação icônica e imaginária, representando um ponto de ruptura dessa ordem figurada e metafórica. Na repressão e no recalque, o real surge como um lapso, uma ausência que persiste apesar das nossas tentativas de representar e dar significado. “O real é o que não pode ser representado, o que está além do simbólico e do imaginário” (Lacan, 1957).

Simbólico, imaginário e real possuem papéis interdependentes e complementares. Eles constituem os registros fundamentais da nossa experiência, moldam a maneira como encaixamos os conteúdos mentais codificados, representados e experimentados. Fazer uma análise criteriosa e cuidadosa desses registros é medular para uma cognição abrangente da dinâmica psíquica e dos processos defensivos que ocorrem na mente.

''Na tessitura dos significados simbólicos, das imagens fantasiosas e das realidades concretas, a repressão e o recalque atuam como os artífices que tecem os véus da ilusão, ocultando os segredos mais sombrios do eu.''

Importantes Contribuições.

Como apontei inicialmente, diversos autores contemporâneos têm contribuído positivamente com perspectivas integrativas e complementares sobre a repressão e o recalque na psicanálise. Citarei aquelas que de alguma forma considero às mais relevantes, numa breve síntese:

1. Melanie Klein — Teoria das Posições Depressiva e Esquizo-Paranoide:

Klein sugeriu que nossa mente passa por diferentes fases de desenvolvimento. Ela chamou essas fases de posições depressiva e esquizo-paranoide. Segundo ela, a repressão e o recalque ocorrem quando tentamos lidar com ansiedades primitivas, como a perda e a destruição. Então disse: “A repressão é nossa forma de lidar com essas ansiedades ao negar, remover ou transformar conteúdos mentais ameaçadores.”

2. Bion — Teoria dos Pensamentos Não Pensados:

Bion trouxe a ideia de pensamentos não pensados. Afirma que temos elucubrações e ponderações primitivas e perturbadoras que eclodem na mente. Para tal, são muito assustadoras para serem reconhecidas conscientemente. Explicou, que esses pensamentos originários que nos permeiam são reprimidos e recalcados, resultando no levantamento de uma série de defesas e sintomas.

3. Winnicott — Teoria do Falso Self:

Já Winnicott sugeriu o falso self, uma espécie de máscara que usamos para nos proteger. Ele enfatiza que a repressão e o recalque podem ocorrer como uma tentativa de manter esse falso self seguro. Isso acontece quando queremos evitar experiências que possam nos perturbar.

4. Kohut — Teoria do Narcisismo:

Kohut falou sobre o narcisismo, como nos vemos e valorizamos a nós mesmos. A repressão e o recalque podem ser usados para proteger nossa autoestima e nos manter seguros. “A repressão pode acontecer quando sentimos que nossa autoestima está ameaçada, então tentamos esconder essas partes de nós mesmos.”

5. Jessica Benjamin — Teoria da Intersubjetividade:

Jessica falou sobre a importância dos relacionamentos em nossa mente. Assevera que a repressão e o recalque podem acontecer devido às interações com outras pessoas. Explica que isso pode acontecer quando tentamos manter uma boa relação com alguém importante para nós, às vezes, reprimindo partes de quem somos para manter a paz.

Casos Clínicos — Repressão:

Paciente:

Nome: João

Idade: 35 anos

Sexo: Masculino

João buscou ajuda terapêutica devido a uma persistente sensação de ansiedade e dificuldade em manter relacionamentos interpessoais estáveis.

História:

João me relata que cresceu em um ambiente familiar onde seu pai era um homem autoritário, inflexível e crítico. Seu genitor alimentava expectativas altas e praticamente inalcançáveis, frequentemente expressava sua desaprovação quanto aos seus passos, o que levava João a se perceber constantemente inadequado, com baixa estima e desvalorizado. Desde criança, aprendeu a reprimir suas emoções e desejos autênticos para evitar conflitos com ele. Eventos traumáticos dessa infância, que foi marcada por castigos severos e rejeições emocionais, foram empurradas para o inconsciente durante seu desenvolvimento, como uma forma de autopreservação. No entanto, essas memórias reprimidas continuaram vivas, exercendo uma influência poderosa sobre sua vida adulta, se manifestando por fim como ansiedade generalizada e dificuldade em formar vínculos interpessoais saudáveis.

Leitura:

A repressão das experiências de embate e traumáticas de João com seu pai foram uma estratégia inconsciente, criadas para se proteger e isolar sua psique da dor emocional associada a essas memórias. No entanto, essa supressão resultou em sintomas psicológicos significativos que interferem atualmente em sua vida diária. Na terapia, visei ajudar João a acessar essas memórias reprimidas de forma segura e integrá-las em sua consciência, promovendo assim uma releitura emocional e o retorno do seu bem-estar psicológico.

Caso Clínico — Recalque:

Paciente:

Nome: Maria

Idade: 28 anos

Sexo: Feminino

Maria me procurou pela terapia devido a dificuldades persistentes em relacionamentos interpessoais e episódios recorrentes de tristeza e angústia inexplicáveis.

História:

Maria me conta que cresceu em um lar onde havia uma tensão constante entre seus genitores, especialmente em relação às provocadas por seu pai. Embora ela não tenha memórias claras de eventos específicos, sempre sentiu uma sensação de desconforto em relação à figura paterna. Sua infância foi marcada por um sentimento de confusão e ambivalência em relação ao pai, alternando entre momentos de proximidade emocional e distanciamentos prolongados. Essa ambiguidade, a levaram a desenvolver um mecanismo de enfrentamento inconsciente, onde memórias ou emoções relacionadas ao seu genitor foram reprimidas e varridas de sua consciência. Ditas memórias inacessíveis se tornaram uma fonte lateral de sua dificuldade em se conectar emocionalmente com seu parceiro atual, com amizades e no trabalho. Á partir de determinado momento do seu amadurecimento pessoal, passou a experimentar uma sensação duradoura de tristeza inexplicável.

Leitura:

Maria está experimentando recalque em relação às memórias e emoções associadas à figura paterna. Sua incapacidade de acessar conscientemente essas experiências sugere que elas foram empurradas para o inconsciente como uma forma de evitar o confronto com aqueles sentimentos desconfortáveis. Essa falta de acesso consciente contribuiu para sua dificuldade em estabelecer vínculos emocionais em todos os níveis sociais, o que pode estar exacerbando essa tristeza persistente que relata. O processo terapêutico com Maria visou ajudá-la a rememorar essas emoções reprimidas de maneira segura, incorporando esse elo em sua consciência de uma maneira integrada. Isso lhe permitiu enfrentar seus sentimentos escuros de frente, promovendo um novo olhar sobre seu crescimento emocional adulto.

Conclusão.

A Repressão e um dos pilares principais na formação da teoria psicanalítica, possue uma articulação mental enigmática, embaraçada e abstrusa, o que levou Freud a constantes questionamentos e pesquisas. Inicialmente, observou o fenômeno como uma resistência presente no tratamento de suas pacientes histéricas, que mostravam relutância em falar, lembrar, repetir e agir. Levou tempo para ser possível localizar a origem dessa obstinação tenaz em resistir, até atinar para o reconhecimento dos obstáculos. As barreiras que pesavam no tratamento foram gradualmente caindo, onde foi elucidando os sintomas e perseguindo o núcleo patogênico que causava o sofrimento psíquico e a causa dos sintomas que suas clientes apresentavam. Em primeira instância, a repressão está certamente ligada a uma defesa patológica, contra uma experiência sexual prematura, na qual o ego rejeita uma determinada representação que gera os desconfortos, aflição e desassossego. Esse estranhamento do ego, circundado em relação à representação, ocorre devido à força repressora da moral. Havia, pois, certa incompatibilidade entre o desejo sexual que buscava se fazer presente, se expressar, e uma proibição moral que o suspendia e sustava. Nesse processo clinico, envidou tornar conscientes as vivências sexuais infantis e remover os sintomas. Destarte, houve avanços, não foram eficazes o suficiente para cancelar o que estava reprimido, o que continuava a se manifestar ciclicamente no paciente. Foi nesta análise, que considera trabalhar na possibilidade da existência de uma espécie de repressão primordial, anterior à repressão secundária.

A repressão se instaura, devido à impossível defesa de um ego imaturo, à perturbação causada pela sexualidade na infância e às proibições éticas e morais associadas ao desenvolvimento cultural a que somos submetidos. Por esta razão, a sexualidade é um fator preponderante, pois não é possível evitar suas intercorrências prematuras e os traumas advindos da sua ação. A angústia provocada por esses elementos, se originam de respostas filogenéticas herdadas do DNA primitivo, introduzindo assim o protótipo dessa reação afetiva que todos abrigamos na experiência do nascimento.

A repressão não desempenha necessariamente um papel mestre na estruturação das instâncias psíquicas, ela se funda quando o aparelho psíquico já está consolidado e formado. No entanto, acreditamos que a pesar dele, esse processo é crucial para a constituição do ser como sujeito da cultura civilizatória. Sabemos que todos os caminhos estão repletos de obstáculos, e lidar com a repressão é um desafio difícil, muitas vezes extemporâneo e atrasado. Por experiência própria, sei o quão árduo, duro e cansativo é poder conter e dominar ao longo da vida nossos impulsos ancestrais, muitas vezes desajuizados, insensatos e impacientes, cujas consequências podem nos cobrar um preço alto e provocar diversos desconfortos em diferentes níveis sociais, pessoais e familiares. Por isso, precisamos conviver dentro do nosso melhor possível, trabalhar esses ajustes, cientes, que também somos decretados naturalmente pela espécie exordial, onde inquietações e manifestações nos atravessam no decorrer da experiência de vida.

Até breve, Dan Mena.

Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199.

Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130.

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