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Impacto Psíquico e Social da Pandemia.

Atualizado: 14 de jan.

Ansiedade como Sintoma Coletivo.

A ansiedade sempre fez parte da nossa experiência.
Impacto Psíquico e Social da Pandemia.

A ansiedade sempre fez parte da nossa experiência, mas a pandemia de COVID-19 marcou um ponto de inflexão, transformando esse sentimento em um fenômeno de proporções inéditas. Nosso mundo, caracterizado por incertezas e rápidas mudanças, foi acometido por um estado coletivo de vulnerabilidade e medo. Inspirado neste artigo pelas reflexões de Freud sobre a pulsão de morte e as manifestações do inconsciente, é possível perceber como eventos traumáticos geram ondas ansiolíticas que afetam tanto o indivíduo quanto a coletividade como um todo. O choque comunitário da pandemia se instalou no inconsciente social, e moldou nossos comportamentos, desafiando as defesas psíquicas tradicionais.

Olhando sob a perspectiva filosófica, também acrescento as ideias de Sartre sobre a angústia existencial e de Heidegger sobre a Geworfenheit” – o sentimento de "ser lançado no mundo" – que nos ajudam a entender como esse flagelo intensificou a nossa percepção de finitude e a falta de controle. Logo se subentende que a ansiedade contemporânea não é apenas um reflexo de ameaças externas; é também uma resposta factual do ser à percepção global de mundo, em que as bases da vida cotidiana, antes tidas como garantidas foram repentinamente abaladas.

Como já refleti anteriormente no meu livro Ansiedade Revelada “Em tempos de crise, a sociedade não só se denota, mas também se reinventa; a ansiedade é o sintoma dessa adaptação dolorosa.” — Dan Mena. Além disso, falei; “O medo que emerge de uma ameaça global não só atravessa nossos corpos, mas penetra em toda a estrutura social, provocando um redesenho do contexto de prioridades e valores.” — Dan Mena.

Esse estado de angústia, vivido por bilhões de pessoas em diferentes graus, se manifestou de diversas formas: do medo de perder a saúde, à segurança financeira à solidão, o isolamento e a ameaça da morte possível a qualquer momento. A ansiedade, agora mais do que nunca, se tornou um claro espelho das crises internas e externas que atravessamos na era pós-pandemia. Boa leitura.

Da perspectiva psicanalítica, a ansiedade pode ser entendida como um reflexo de um trauma coletivo, amplificado pelo isolamento e pela incerteza. Freud, ao abordar a relação entre o inconsciente e o medo, nos ofereceu uma base sólida para entender como a consciência grupal foi moldada pelo pavor do perecimento e pela sensação de impotência diante do desconhecido:  “O medo do fim da vida é o medo dos castigos esperados depois dela." — Freud.  “O trauma coletivo aciona uma forma de ansiedade que transcende o indivíduo, e se transforma em uma marca cultural que transparece a vulnerabilidade de uma sociedade que encara verticalmente sua própria fragilidade." — Dan Mena. Essa forma de ansiedade pode ser vista como uma sombra da angústia existencial de cada um de nós. O isolamento social, essencial para mitigar a disseminação do vírus, trouxe consigo um distanciamento físico que afetou todas as redes de apoio, nos tornando mais suscetíveis à solidão e ao sofrimento psíquico. Um mundo novo de imprecisões, onde as relações se tornaram frágeis e temporárias.  “Na era da liquidez, a pandemia agiu como um catalisador e transformou a leveza e a adaptabilidade em um fardo insustentável, deixando a ansiedade como um legado de instabilidade." — Dan Mena. A pandemia exacerbou essa fragilidade, levando a um aumento significativo da ansiedade.

A filosofia existencial também nos oferece importantes dicas sobre essa ansiedade gerada pela pandemia. Jean-Paul Sartre e Martin Heidegger analisaram a angústia desse ponto de vista como uma resposta à nossa consciência da limitação temporal de vida e à nossa liberdade inescapável de fazer escolhas em um mundo inconstante. Heidegger a descreveu como uma sensação de "ser lançado" no mundo, sem um propósito claro, o que nos correlaciona diretamente quanto à nosso existir.

Além disso, mudanças nas dinâmicas familiares e no ambiente de trabalho durante a pandemia intensificaram o sentimento de insegurança. A ansiedade, que já era uma característica essencial da nossa época, foi exacerbada pela crise social. Conforme destacou o psicanalista René Kaës, o isolamento forçado se assemelha a uma "vivência de confinamento", que agravou os traumas pré-existentes, gerando novas formas sintomáticas de expressão.

Essa conjunção de fatores psíquicos, sociais e existenciais não apenas escancararam nossas fragilidades individuais, mas também, desafiaram as colunas estruturais sociais que sustentam o coletivo. O filósofo francês Emmanuel Levinas destacou a importância da alteridade e do cuidado com o outro como elementos importantes para superar a crise.

O medo que emerge de uma ameaça global não só atravessa nossos corpos, mas penetra em toda a estrutura social.
O trauma coletivo aciona uma forma de ansiedade que transcende o indivíduo.

“A responsabilidade pelo outro é a essência da ética.” — Levinas.

A Transformação do Trabalho na Era Pós-Pandemia.

O impacto percebido no trabalho mudou sensivelmente a vida social e pessoal gerando um cenário de ansiedade relacionado à sua prática remota, à sobrecarga de produtividade e à pressão constante para que essa adaptação acontecesse. Sob o prisma da psicanálise, percebo que existe uma relação estreita entre a ansiedade e o aumento da busca por reconhecimento e sucesso. A teoria freudiana da repressão e o conceito de "superego" nos ajudam a entender como as exigências internas de excelência e conquista se tornaram exacerbadas durante o distanciamento imposto.

A pandemia acelerou a desvalorização das relações de trabalho tradicionais, como vemos na proposta de Bauman sobre a fragilidade dos vínculos e a liquidez dos laços. As fronteiras entre o trabalho e a vida pessoal ficaram ofuscadas, criando uma coação constante para que sejamos produtivos e disponíveis, contribuindo diretamente para essa intensificação.

Essa imposição de um imperativo produtivo se tornou ainda mais insuportável no pós-pandemia. A necessidade de ser "sempre melhor" e "sempre conectado" ampliou a sensação de cansaço e a sobrecarga emocional natural, o que fez com que esse fator estressante no emprego ficasse muito evidente. Aqui vemos que é essencial compreender a fina relação entre o desejo e a ansiedade no contexto laboral pós-pandemia. Se o desejo é sempre o desejo do Outro, que por sua vez está estruturada pela linguagem e por interações sociais, que são particularmente relevantes na era atual. Assim, o trabalho remoto e a virtualização das relações profissionais se ampliaram na busca por reconhecimento. Isolados de contatos físicos e presenciais, passamos a buscar aprovação em um "Outro" distante, e muitas vezes inacessível. A falta de interações tangíveis agravou a sensação de falta e de desejo não realizado, aumentando a angústia e a sensação de inadequação.  “Entre a ansiedade e a incongruência, perdemos a capacidade de simplesmente ser, fomos consumidos pela necessidade de parecer, em vez de viver autenticamente." – Dan Mena.

Por esse angulo Lacan introduziu a ideia de "falta-a-ser" (manque-à-être), que define a nossa condição como marcada por uma carência essencial primitiva. No ambiente de trabalho moderno, essa insuficiência se manifesta como um vazio que tentamos preencher com eficácia incessante e conquistas ocupacionais. No entanto, essa busca é interminável e insatisfatória, pois o objeto do nosso desejo permanecerá sempre fantasioso, elusivo e inalcançável.  “O reconhecimento se tornou uma necessidade vital, enquanto a paz se mostra uma utopia, essa, que apenas conseguimos enxergar através da névoa das nossas próprias expectativas." – Dan Mena.

A pandemia não apenas desestruturou as formas tradicionais de trabalho, mas também desafiou a maneira como nos relacionamos com o desejo e com o Outro. A virtualização das interações ocupacionais trouxe à tona uma sensação de despersonalização e alienação, onde o desejo por validação se confronta com a impossibilidade de ser plenamente satisfeito. Lacan observou que; "Não há Outro do Outro," indicando essa impossibilidade de encontrar um ponto final de aprovação externa.

Concluo, que a solução para essa ansiedade não reside apenas em ajustes estruturais no ambiente laboral, mas também, em um entendimento das nossas motivações e quereres inconscientes. Ao reconhecer a natureza inacabada do desejo, podemos encontrar formas mais saudáveis de nos conectarmos com a profissão e conosco propriamente.  “A pandemia articulou a ilusão da perfeição profissional, destacando a necessidade de equilibrar desejo e realidade em um mundo onde o Outro se tornou digital." – Dan Mena. Hiperconectividade e a Ansiedade Digital.

Outro campo em que a pandemia acelerou foi à digitalização das relações sociais, criando uma dependência das plataformas midiáticas que, por um lado, facilitaram a conexão, mas, por outro, alargaram a ansiedade. Na psicanálise, a relação entre o indivíduo e a tecnologia pode ser interpretada a partir da ideia de "vazio" que se manifesta nas interações computacionais, onde buscamos constantemente preencher nossas lacunas emocionais, mas, evidentemente sem sucesso.

Sociologicamente, a tecnologia criou uma cultura de "hiperconectividade" que, embora ofereça uma sensação de proximidade, resulta em uma solidão estendida. O conceito de "sociedade de risco" de Ulrich Beck me parece muito assertivo nessa direção, lugar em que nos sentimos constantemente ameaçados pela quantidade de informações disponíveis, isso reflete muito bem esse contrapeso de estímulos de telas que alimentam a ansiedade. Essa sociedade emerge com a modernidade, na qual o progresso técnico e científico, embora tenha trazido enormes benefícios, também gerou uma gama de perigos que ultrapassaram as fronteiras. Exemplos disso incluem a poluição ambiental, as mudanças climáticas, crises financeiras globais e as ameaças nucleares. O risco assim, se torna uma constante cotidiana, se transformando em um fator elementar da organização social.  “A conectividade promete proximidade, mas nos entrega solidão, criando um paradoxo onde estamos constantemente conectados, mas emocionalmente isolados.” – Dan Mena.

Se na nossa era as ameaças eram mais concretas e conhecidas, na sociedade de risco, o perigo é muitas vezes abstrato e difuso, como um vírus invisível ou a implicação ecológica iminente. Esse panorama cria uma sensação generalizada de insegurança, que desafia a confiança nas instituições e nas estruturas de poder. À medida que as vulnerabilidades se tornam mais globais, as respostas sociais também passam a evoluir. Não é mais suficiente enfrentar os esboços de maneira isolada; é necessária uma abordagem coletiva e global, onde a responsabilidade deve ser compartilhada entre indivíduos, governos e corporações.

Além disso, existe uma desigualdade na distribuição desses riscos. As classes sociais mais baixas e as nações mais vulneráveis ​​são frequentemente as mais afetadas, apesar de não serem as principais responsáveis pela criação deles. Nesse sentido, não apenas se aponta para a presença de hesitação, mas também para a justiça social na maneira como eles são distribuídos. Isso nos convida a repensar a forma como vivemos, organizamos nossa sociedade e nos relacionamos com o ambiente.  “Na sociedade de risco, as ameaças são invisíveis como um vírus, criam uma insegurança difusa que desafia nossa confiança nas instituições." – Dan Mena.

Outra abordagem interessante faz Baudrillard, com sua teoria da hiper-realidade, ele oferece uma crítica sobre como a vida digital, mediada por imagens e redes, distorce a percepção de si e do mundo, gerando uma ansiedade existencial diante da efemeridade das relações e da superficialidade das experiências online. A filosofia pós-moderna sugere que essa busca incessante por identificação nas redes sociais não só aumenta a ansiedade, mas também cria um ciclo de autossabotagem que desintegra o "eu" real em um "eu" virtual “Fiquemos alerta para o perigo de uma existência mediada por imagens, onde o 'eu' virtual não só desintegra o real, mas também intensifica a solidão e a insegurança." – Dan Mena.

Estratégias de Enfrentamento e Transformação Social.

Com a ampliação da ansiedade surgem também formas de resistência e enfrentamento. A psicanálise oferece abordagens terapêuticas que buscam a reconstrução da identidade e o entendimento das defesas mentais que utilizamos. A análise das barricadas do ego e a busca por formas de lidar com o sofrimento de maneira mais saudável são básicas para ajudar os pacientes a enfrentarem os reptos.

Nossa capacidade de enfrentar a ansiedade é essencial para o desenvolvimento emocional saudável.  “As defesas do ego não apenas nos protegem, mas também moldam nossa habilidade de afrontar e transformar a aflição em crescimento." – Dan Mena. Essa visão reforça a necessidade de abordagens terapêuticas que ajudam pessoas a identificar e trabalhar suas guardas psíquicas de forma construtiva.

Do ponto de vista sociológico, me deparo com a análise de Anthony Giddens sobre a modernidade reflexiva. Ele aduz que a globalização e a rápida reforma das instituições sociais têm aumentado à sensação de insegurança.  “A modernidade reflexiva cria um cenário onde as tradições são continuamente questionadas, gerando um ambiente de incerteza constante." – Giddens. Para superar a crise de ansiedade, é essencial fortalecer a confiança nos sistemas sociais e promover práticas que aumentem a salvaguarda emocional.

Além disso, o sociólogo Richard Sennett, em sua obra "O Respeito: A Formação do Caráter em um Mundo Desigual," discute como a falta de deferência e valorização nas relações de trabalho agrava a sensação de alienação.  “O respeito é um dos alicerces da vida social saudável; sua ausência pode levar a um sentimento de desvalorização e insegurança." Fortalecer a gentileza e a dignidade nas interações sociais e profissionais.  “Ao identificar nossas defesas psíquicas, desbloqueamos o potencial para crescer emocionalmente e defrontar a ansiedade com mais adaptabilidade." – Dan Mena. Outra visão interessante é a reflexão sobre o propósito e o sentido da vida de Viktor Frankl, em sua obra "Em Busca de Sentido", onde pondera que a busca por um norte maior pode ser uma ferramenta poderosa contra a ansiedade existencial.

 

O pós-pandemia exige que repensemos nossa relação com o trabalho, o consumo e os vínculos sociais, focando na busca por um lugar renovado que transcenda a lógica da produtividade incessante e do isolamento emocional.  O Propósito e o Sentido da Vida Segundo Frankl.

Ele argumenta que o propósito de viver pode ser encontrado em três dimensões principais:

Trabalho: Realizar tarefas que nos preenchem e contribuam para algo maior.

Amor e Relacionamentos: Construir e manter vínculos significativos com outras pessoas.

Atitude perante o sofrimento: Adotar uma postura elástica e encontrar desígnio mesmo nas adversidades inevitáveis.

Mesmo em situações de extremo penar, é possível descobrir um cometimento que nos permita perseverar. A vida tem sentido em todas as condições, e que é responsabilidade de cada um encontrar essa direção. Como ele próprio disse:  "Quando não podemos mais mudar uma situação, somos desafiados a mudar a nós mesmos.” – Frankl.

O sentido da vida é único e exclusivo para cada pessoa, dependendo de suas próprias experiências e valores. Essa busca contínua por significado pode transformar a existência e proporcionar uma sensação de plenitude e realização.

Na pós-pandemia, essa ponderação se torna ainda mais importante, inúmeras mudanças e desafios, que muitas vezes nos levam a sentimentos de desorientação.

A transformação social passa também por um maior reconhecimento da importância da saúde mental e do suporte psicológico. Ao se promoverem políticas públicas que incentivem o acesso a terapias e cuidados psicológicos, a sociedade pode se tornar mais preparada para enfrentar crises futuras. Iniciativas comunitárias, programas de educação emocional e campanhas de conscientização são imprescindíveis para criar uma cultura de cuidado e solidariedade.

A identificação e o trabalho com as defesas psíquicas, a reconstrução dos laços sociais e a reflexão sobre o propósito de vida são pilares essenciais para enfrentar a pós-pandemia.

"O propósito da vida pode ser encontrado nas pequenas tarefas diárias que nos preenchem e contribuem para um bem maior, nos conectando a algo além de nós mesmos." – Dan Mena.

Impacto Psicoemocional nas Gerações Emergentes.

A pandemia afetou particularmente as gerações mais jovens, desde crianças até adolescentes e adultos, certamente deixou marcas psíquicas que podem reverberar por toda a vida. O desenvolvimento emocional pode ser afetado por eventos traumáticos coletivos. A privação de socialização e o aumento da dubiedade geram ansiedades relacionadas à identidade, laços, autoestima e vínculos afetivos, dificultando o processo de individuação. 

A responsabilidade pelo outro é a essência da ética.
Entre a ansiedade e a incongruência, perdemos a capacidade de simplesmente ser.

"A privação de socialização e o aumento da incerteza durante a pandemia geraram ansiedades relacionadas à identidade, autoestima e vínculos afetivos entre os jovens.” – Dan Mena.

A sociologia Pierre Bourdieu, com sua teoria sobre o capital cultural, pode ser aplicada aqui para compreender como as desigualdades educacionais e sociais acentuadas pela pandemia exacerbaram as dificuldades enfrentadas por jovens de classes mais vulneráveis, aumentando sua ansiedade frente ao futuro. De acordo com ela, esse capital se refere aos conhecimentos, habilidades, educação e outras formas de competência que uma pessoa possui, as quais conferem status e vantagem social.

Identifica três tipos de capital cultural:

  1. Incorporado: Inclui hábitos, habilidades e disposições que são internalizados e se tornam parte da identidade de um indivíduo. Este tipo de recurso é adquirido ao longo do tempo, através da socialização e da educação.

  2. Objetivado: Se refere a bens materiais e culturais, como livros, obras de arte e instrumentos, que possuem valor cultural. Estes itens podem ser adquiridos e possuídos, mas seu uso eficaz depende do capital incorporado.

  3. Institucionalizado: Compreende qualificações e credenciais acadêmicas, como diplomas e certificações, que oficializam o reconhecimento cultural e educacional de um indivíduo.

Dito recurso é uma forma de poder que contribui para a reprodução das desigualdades sociais. Aqueles que possuem mais têm maiores vantagens em diversas esferas da vida, incluindo educação, emprego e prestígio social. A transmissão se dá através das gerações e contribui para a manutenção da estrutura de classes e a perpetuação das desigualdades.

Entender as múltiplas formas de capital instrutivo além do econômico passa por enfatizar que o acesso e a posse dele são alicerces para o sucesso e a mobilidade social. Nesse contexto, as instituições educacionais desempenham um papel na legitimação e sua reprodução. Estruturas familiares e educacionais podem redefinir o conceito de infância e adolescência, se convertendo em períodos de maior angústia existencial e adaptação.

Caminhos para a Regeneração Psíquica.

A psicanálise, tradicionalmente centrada no diálogo face a face, agora é desafiada pela crescente popularidade da terapia online. No entanto, é importante discutir se essas novas formas de tratamento oferecem um alívio genuíno ou se são apenas um paliativo para um problema maior.

A sociologia analisa como a digitalização da saúde mental reflete a busca por soluções rápidas em uma sociedade que se tornou obcecada pela instantaneidade e conveniência. Este fenômeno pode ser observado em aplicativos de bem-estar e plataformas digitais que prometem acesso fácil e rápido ao apoio psicológico. No entanto, esta busca por celeridade pode ter consequências significativas.

Existe um alerta para o risco de a digitalização desumanizar as relações, transformando o processo terapêutico em algo excessivamente mecanizado. A tecnologia, quando não criticamente examinado, pode reduzir as interações a meras operações técnicas, as privando do seu valor essencial. No contexto da saúde mental, isso pode significar que a profundidade e a qualidade do laço entre terapeuta e paciente são sacrificadas em nome da conveniência.  “A terapia online, embora acessível, deve ser cuidadosamente avaliada para garantir que mantenha a profundidade necessária para um alívio genuíno e duradouro." – Dan Mena.

Convenhamos quanto o potencial de erosão das práticas tradicionais de terapia, que dependem fortemente da presença física e do contato para efetuar mudanças reais e expressivas. A terapia nestes moldes, enquanto oferece acessibilidade e alcance ampliado, pode não captar nuances importantes da comunicação não verbal e da conexão emocional que são fundamentais para a eficácia terapêutica.

Não deixo de destacar a mercantilização da saúde mental, onde a busca por soluções vertiginosas pode levar à superficialidade dos tratamentos oferecidos. Em um ambiente digital, há o perigo de os processos terapêuticos serem reduzidos a respostas padronizadas e fórmulas pré-definidas, em vez de abordagens personalizadas que considerem a individualidade do cliente.  “Em nossa busca por soluções rápidas, não devemos perder de vista a importância das interações genuínas." – Dan Mena.

Ao mesmo tempo, é importante reconhecer os benefícios que a tecnologia pode trazer como o aumento do acesso a recursos para pessoas que vivem em áreas remotas ou que têm dificuldade em acessar o atendimento tradicional. No entanto, devemos equilibrar essas benesses com uma reflexão crítica sobre a qualidade das interações e o impacto em longo prazo.  “Para combater as limitações da terapia digital, devemos desenvolver abordagens que integrem o digital com a importância do contato presencial." – Dan Mena.

Isso pode incluir a formação de terapeutas treinados em ferramentas digitais de maneira sensível e ética.

A Crise Psicológica Global.

Toda essa série de impactos psíquicos e sociais que, sob o olhar da psicanálise se compreendem como uma expressão das forças primordiais do inconsciente. Elas jogam dentro de um quadro estrutural psíquico e pulsional que destacam a existência de duas grandes forças que regem o nosso comportamento: a pulsão de vida (Eros) e a de morte (Thanatos).

A pulsão de morte atua como uma tendência inerente à autodestruição e ao retorno do nosso ser ao estado inorgânico, se manifestando de maneira dissimulada, operando de forma discreta e encoberta em nossa vida. Essa potência aumenta seu destaque em contextos de crise, como aconteceu durante a pandemia. Dita situação pandêmica pode ser vista como um evento que dilatou as manifestações de Thanatos, fazendo com que confrontemos o próprio medo de aniquilação e o desejo inconsciente de autodestruição, tanto individual quanto coletivo.   “O objetivo da vida é a morte.” – Freud. “Em tempos de crise, a pulsão de morte se destaca, provocando nossa capacidade de equilibrar as forças de vida e aniquilação." – Dan Mena.

Durante tempos de crise, o inconsciente coletivo busca formas de expressão para lidar com a nova realidade. Os sonhos, os lapsos de linguagem e até os comportamentos sociais (ou mesmo a falta deles) evidenciam essa tensão interna entre as pulsões mencionadas. Temos, portanto, grande dificuldade em lidar com a incerteza e o desconhecido, assim, catalisou em práticas regressivas, como a busca por explicações mágicas ou a negação da ciência — onde reconhecemos ditas defesas inconscientes contra a angústia da realidade que nos acometem.  “A emergência de conteúdos reprimidos durante o isolamento social mostrou as ansiedades e conflitos latentes em nossa sociedade." – Dan Mena.

O isolamento por sua vez, foi uma das principais armas adotadas para conter a propagação do vírus, trouxe à tona o retorno do reprimido, um conceito da psicanálise que se refere à emergência de conteúdos inconscientes recalcados. Essa ausência de contato social e a dubiedade constante criaram o ambiente ideal para o surgimento de ansiedades intensas e propagação de conflitos emocionais de toda índole.

Nossa reação como sociedade à pandemia também pode ser vista através das dinâmicas de grupo descritas por Freud em sua obra "Psicologia das Massas e Análise do Eu." A maneira como congregações sociais se mobilizam, seja através da solidariedade ou do conflito, refletem certamente a luta entre Eros e Thanatos.Dentro das massas, tendemos a perder a individualidade, sucumbimos a sentimentos de uniformidade e conformidade, tomemos como exemplo as torcidas de futebol. Isso ocorre porque o ego individual se dissolve, sendo substituída pela identificação com a figura de liderança, bandeira, ideologia do grupo, etc.

“Dentro das massas, a identidade individual se dissipa, sendo substituída pela identificação com bandeiras, líderes e ideologias, como visto nas torcidas de futebol.” – Dan Mena.

Enquanto Eros promove a união, a colaboração e a construção de laços sociais, Thanatos pode levar à desintegração, ao caos e à destruição. Durante a pandemia, essa luta interna se tornou visível nas diferentes respostas das sociedades ao redor do mundo, onde atitudes de solidariedade e destruição coexistiram e se contrapunham constantemente.

Na visão freudiana, o enfrentamento dessa crise depende da capacidade da sociedade e dos indivíduos de reintegrar as pulsões e restaurar um equilíbrio onde Eros possa novamente prevalecer sobre Thanatos, proporcionando uma proteção da identidade e da ordem social a partir das ruínas deixadas por uma experiência tão traumática. O papel da psicanálise, portanto, é trazer o sujeito a reencontrar sentido e resiliência em meio às forças conflitantes do inconsciente.  “A tarefa de tornar consciente o inconsciente nunca é fácil." – Freud. Enquanto seguimos remando pelas águas turbulentas do pós-pandemia, somos instados a nos perguntar: como podemos reintegrar as pulsões heterogêneas que plasmam nossa existência? Será possível reconstruir uma sociedade onde Eros prevaleça sobre Thanatos? Estamos preparados para enfrentar o próprio inconsciente coletivo, ou continuaremos a buscar refúgio em paliativos que pouco fazem para sanar as feridas deixadas? Que lições emergem dos destroços deixados pela pandemia?

São algumas perguntas que devemos enfrentar, com coragem e honestidade, na busca por uma regeneração psíquica e social verdadeira.

 “A luta entre Eros e Thanatos durante a pandemia revelou a dualidade que governa nosso comportamento." – Dan Mena.

A pandemia articulou a ilusão da perfeição profissional.
Sociologicamente, a tecnologia criou uma cultura de "hiperconectividade" .

Do Medo à Esperança.

A responsabilidade, neste contexto, assume uma dimensão que não trata apenas de um dever individual, mas de uma linha coletiva. Cada escolha que fazemos, cada ação que empreendemos, tem o potencial de influenciar o curso dos eventos futuros. Como disse Viktor Frankl:  "Entre o estímulo e a resposta, existe um espaço. Nesse espaço está o nosso poder de escolher a nossa resposta. Na nossa resposta está o nosso crescimento e a liberdade”.

Olhemos então para o futuro com olhos atentos e coração aberto, conscientes de que não estamos limitados ao presente imediato, mas que ele se estende às gerações que virão. O conceito de "futuro" não é apenas uma linha tênue no horizonte, mas uma construção contínua que começa agora, no presente. Sejamos corajosos (as) para suportar as perdas, muitas delas irreparáveis, como no meu caso que perdi minha mãe durante a crise. Apenas imaginemos novas possibilidades, permaneçamos estoicos para superar os incitamentos.

Sim, o caminho pode ser cheio de pedras, mas cada dificuldade enfrentada para transpô-las nos oferece uma oportunidade de aprendizado e transformação. O poeta alemão Rainer Maria Rilke escreveu:  “A vida, como a conhecemos, parece demasiado árida, estéril e oca; é por isso que nos lançamos como loucos na busca do milagre e da violência". É precisamente nessa demanda que encontramos nossa força e descobrimos novas formas de viver e nos conectar.

Aprendemos então, que apesar das adversidades, somos capazes de nos adaptar, de encontrar novas maneiras de nos relacionar e apoiar-nos mutuamente. A responsabilidade que agora compartilhamos é a de não permitir que as lições aprendidas sejam esquecidas, mas sim, que nos guiem. Sejam destarte nas atitudes e opções que encontremos o rumo ao amanhã, onde à empatia e a solidariedade sejam os pilares dessa reconstrução.  "O futuro, embora sempre cheio de incertezas, também está repleto de infinitas possibilidades." – Dan Mena. Somos absolutamente capazes de transformar a ansiedade em um motor de mudança positiva para construir algo novo e melhor. Vamos assumir a missão de criar um mundo onde todos tenham a chance de florescer, lugar de perspectivas infinitas, e o futuro, apesar de incerto, seja cheio de esperança. Até breve, Dan Mena.

Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130.

Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Departament of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. Palavras chaves: #ImpactoPsíquicoDaPandemia #AnsiedadeColetiva #AnsiedadePósPandemia #EstadoEmocionalNaPandemia #IsolamentoSocialESaúdeMental #TraumaColetivo #FilosofiaExistencialEAnsiedade #PercepçãoDeFinitude #EfeitosDaPandemiaNasRelaçõesSociais #TrabalhoRemotoEAnsiedade #HiperconectividadeESolidão #TransformaçãoDoTrabalhoPósPandemia deMentalDasGeraçõesMaisJovens #EquilíbrioVidaPessoalETrabalho #PapelDaPsicanáliseNaPandemia #EstratégiasDeEnfrentamentoDaAnsiedade #CulturaDeRiscoNaSociedadeModerna #DigitalizaçãoDasRelaçõesSociais #ProatividadeNaSaúdeMental #EmpatiaESolidariedadePósPandemia #ConstruçãoColetivaDoFuturo #ReconfiguraçãoDasPrioridadesSociais #ReconhecimentoEIdentidadeNoTrabalho #AlteridadeECuidadoComOOutro #VínculosSociaisESaúdeMental #ResponsabilidadeSocialNaEraDigital #ImportânciaDoPropósitoESentido #RegeneraçãoPsíquicaNaSociedade #MobilidadeSocialECapitalCultural #Crescimento. Todo o conteúdo deste site, incluindo textos, imagens, vídeos e outros materiais, é protegido pelas leis brasileiras de direitos autorais (Lei nº 9.610/1998) e por tratados internacionais. A reprodução total ou parcial, distribuição ou adaptação dos materiais aqui publicados é permitida somente mediante o cumprimento das seguintes condições:


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2 Comments

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paulatavares106
Nov 13, 2024

Muito lindo seu livro

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Rafaela Santos II
Rafaela Santos II
Nov 09, 2024
Rated 5 out of 5 stars.

Muito bom ler

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