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O Pânico que nos Assola.

Atualizado: 22 de set. de 2024



Conforme o conceito psicanalítico, certos indivíduos são suscetíveis a episódios de ataques de pânico devido a uma predisposição à ansiedade, associada a um temperamento suscetível ao medo.

Conforme o conceito psicanalítico, certos indivíduos são suscetíveis a episódios de ataques de pânico devido a uma predisposição à ansiedade, associada a um temperamento suscetível ao medo. Devido à ansiedade, crianças com esta predisposição tendem a desenvolver uma dependência de outras, caracterizadas pelo medo, e sentem que seus pais devem estar presentes em todos os momentos para lhes proporcionar uma sensação de segurança. Além disso, esta dependência dos outros, é uma humilhação narcisista para eles, pois o sentimento de segurança depende da presença de um cuidador. Esta adição temerosa, pode ser devida a uma experiência inadequada e/ou traumática nas primeiras relações com outras pessoas significativas, geralmente pais, familiares ou tutores.


Em resposta a esta percepção de rejeição ou indisponibilidade, devido à ferida narcisista da dependência, a criança desenvolve uma certa raiva em relação a figuras de apego próximo. Esta ira, é perigosa, pois as fantasias associadas podem potencialmente prejudicar a relação com às pessoas das quais ela depende, aumentando assim a ameaça de perda e de dependência sob o medo. Desta forma, gera-se um círculo vicioso, desencadeado novamente na vida adulta, quando o mesmo indivíduo experimenta ou percebe uma ameaça à sua integridade, geralmente quando os mecanismos de ansiedade e defesa são ativados, numa tentativa de controlar essa suposta ameaça.


Devido ao grau de temor e desorganização gerada por essas fantasias, a pessoa se torna sobrecarregada, onde surgem níveis de ansiedade que afunilam no pânico. Estes, por sua vez, impedem que o individuo perceba a raiva. No tratamento psicanalítico, é importante que o paciente preste atenção aos gatilhos e ativação dos mecanismos de defesa, que impedem que tome consciência das emoções que dão origem aos sintomas psicológicos.


As causas:


O distúrbio do pânico pode ser causado por situações de extremo estresse, tais como crises financeiras, brigas, separações e mortes na família, experiências traumáticas na infância ou após agressões, roubos e sequestros. Pessoas cujos genitores têm distúrbios de ansiedade, são mais propensos a desenvolver sintomas com as seguintes características:


Sensação de asfixia.


Aperto ou desconforto no peito.


Náuseas ou dores abdominais.


Instabilidade, vertigem ou desmaios.


Sentimento de irrealidade ou despersonalização, estar separado de si mesmo.


Medo de perder o controle ou ficar louco.


Medo de morrer.


Sensação de entorpecimento.


Arrepios ou sufocamento.


Pavor de locais fechados.


Freud, em seu trabalho, anota: "Sobre a justificativa para separar uma certa síndrome da neurastenia, como uma neurose de ansiedade" (1894), descreve as seguintes manifestações clínicas:


Distúrbios cardíacos, palpitações, arritmia breve e taquicardia.


Perturbações respiratórias.


Ondas de transpiração.


Temores injustificados.


Fome insaciável, vômitos, náuseas.


Diarreia.


Vertigem locomotora.


Urgência para urinar.


Insônia.


Os sintomas são largamente baseados em fantasias inconscientes, conflitos e efeitos. No caso de distúrbios de pânico, as acometidas têm uma dificuldade especial com fantasias e sentimentos de raiva em relação a figuras próximas, como pai, mãe, tios, tais como desejos de vingança em relação a eles. Estes anseios, são experimentados como uma ameaça às figuras de apego, desencadeando grande ansiedade.


Os pacientes, geralmente, não estão cientes da intensidade desses efeitos, nem das fantasias de vingança que os acompanham. Tornar estes aspectos da vida mental conscientes, e menos ameaçadores é um passo importante no tratamento psicodinâmico dos distúrbios de pânico.


Por outro lado, assim como doenças orgânicas, a codificação dos riscos envolvidos e a consequente resposta emocional não é a mesma para todos os sujeitos, no caso de manifestações corporais de ansiedade, haverá aqueles que reagirão com a máxima sensação de perigo e outros, lhe darão um significado mais benigno. Portanto, ao examinar os distúrbios de pânico, devemos considerar:


a) O nível dos significados e significantes que suscitam angústia. Em outras palavras, o tipo de representações que conseguem acionar o circuito de perigo em cada assunto.


b) O nível neurobiológico, cerebral, hormonal e corporal que acompanham os eventos.


c) A reação à angústia, ou seja, como o sujeito se percebe quando se sente angustiado, o quanto a angústia é perigosa para ele, a antipatia criada quando percebe manifestações de angústia.


d) O feedback cíclico, entre os circuitos anteriores.


Freud, em "Psicologia das Massas", propõe que a origem da ansiedade neurótica está na "magnitude do perigo" e/ou "ruptura dos laços afetivos", estendendo estes conceitos à ansiedade coletiva, que assim "apresenta múltiplas analogias com a ansiedade neurótica". Os efeitos deste "medo coletivo" são caracterizados pelo fato de que: "… as pessoas não ouvem mais nenhuma ordem, e cada um cuida de si mesmo, sem se preocupar com os outros.


Os laços recíprocos cessaram, e uma enorme e insensata angústia é liberada". (Freud).


Gostaria também de salientar a importância de considerar a singularidade de cada caso, no sentido de manter uma atitude terapêutica comprometida com a observação dos pacientes, o que, quando o caso exige, me permito considerar uma abordagem interdisciplinar. É geralmente um trabalho cuidadoso, de "construção" de "pedaços de história" onde eventos traumáticos são muitas vezes escondidos. Por este motivo, se faz necessário, estabelecer objetivos a médio e longo prazo numa estratégia de tratamento aberta ao paciente, ou seja, explicada e trabalhada com ele, indicando as etapas e metas a serem alcançadas conjuntamente. Paciente e terapeuta, devem trabalhar para superar o "pânico do pânico", muitas vezes, colocado a serviço da pulsão de morte, especialmente, quando é experimentado como um ataque ao próprio tratamento analítico.


O tripé do trabalho em ataques de pânico, quando necessário:


Cada corrente terapêutica funciona, diríamos que o cognitivo age basicamente na reação consciente à ansiedade; os farmacologistas, com ansiolíticos e antidepressivos, abordam o nível neurobiológico; os psicanalistas, geralmente trabalhamos sobre as fontes inconscientes da ansiedade. Mas somente um modelo que considere a complexidade dos fatores em jogo nos permitirá, não somente esclarecer em cada caso, quais são as dimensões relevantes, mas também estabelecer princípios técnicos de tratamento, o momento do tratamento ou não, combinando formas de intervenção. Assim, por exemplo, em um paciente negativo, narcisista e racionalista, que chamamos de informativo, pode ser totalmente contra-indicado, exigindo, ao invés disso, uma análise, desde o início, de transferência negativa e desconfiança. Da mesma forma, em alguns pacientes limítrofes, com fortes componentes hipocondríacos, o tratamento psicofarmacológico é neutralizado pela reação aos efeitos colaterais e fantasias de envenenamento. Em outros pacientes, com desregulamentação psicobiológica significativa e com uma estrutura de tratamento de poucas sessões, a medicação psicotrópica como coadjuvante da psicoterapia me parece, não só justificada, mas indispensável em certos casos. Neste sentido, a experiência alerta para os riscos da onipotência mágica do terapeuta, que o faz rejeitar intervenções úteis de outras clínicas, das quais sou totalmente favorável neste caso específico.


Quanto ao tratamento da ansiedade, na psicanálise é possível oferecer e aplicar um redimensionamento do sujeito com seu desejo, numa tentativa de reduzir a captura deste, pelo ego, ou seja, pelas imagens narcisistas produzidas, para reduzir sua necessidade em atender às exigências da cultura, reduzindo a captura destes desejos. Bom domingo, vamos ao poema; É sempre no passado aquele orgasmo,

é sempre no presente aquele duplo,

é sempre no futuro aquele pânico.


É sempre no meu peito aquela garra.

É sempre no meu tédio aquele aceno.

É sempre no meu sono aquela guerra.


É sempre no meu trato o amplo distrato.

Sempre na minha firma a antiga fúria.

Sempre no mesmo engano outro retrato.


É sempre nos meus pulos o limite.

É sempre nos meus lábios a estampilha.

É sempre no meu não aquele trauma.


Sempre no meu amor a noite rompe.

Sempre dentro de mim meu inimigo.

E sempre no meu sempre a mesma ausência.


Carlos Drummond de Andrade

Por Dan Mena.

Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 - CNP 1199 Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 - CBP 2022130


 
 
 

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