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A Narrativa Perdida.

Atualizado: 22 de set. de 2024

A Morte de Deus e a Ascensão da Ciência.

“A ciência substituiu o sagrado, mas desumanizou a vida.” Dan Mena.

A Narrativa Perdida

Ao refletirmos sobre o tempo anterior à era atual, somos conduzidos a observar um período marcado por narrativas sólidas e estruturas sociais bem definidas. Uma extensão temporal, onde as certezas eram ancoradas em tradições, religiões e sistemas de pensamento que ofereciam uma sensação de continuidade e estabilidade. Vivíamos em um mundo, onde as fronteiras entre o público e o privado eram mais claramente delineadas e respeitadas, e a identidade pessoal encontrava suas bases em comunidades físicas e culturais mais restritas. Esse passado recente, sem evocar aqui nenhum saudosismo, onde narrações tradicionais foram perdendo sua força repressiva, logo, substituídas por outras fluidas, que deram lugar a fronteiras difusas entre o real e o virtual. Eis, que a tal da velocidade e a eficiência, passaram a ser mais valorizadas do que o diálogo, a contemplação e a reflexão.


“Vínhamos de uma era de continuidade estável, agora acelerada pela eficiência que sacrificou a reflexão.” Dan Mena


Nesse passado, o ritmo da vida era mais lento, permitia uma conexão mais íntima com o ambiente natural, físico e social. Pessoas viviam em um tempo marcado pelas estações, rituais e fases. A experiência do tempo era mais cíclica e menos linear, com um senso de continuidade transmitido de geração em geração. Tudo era compreendido como um período estático, era como observar uma tela de uma paisagem, em que tudo já estava presente, já estava tudo dado. Não havia a necessidade de alcançar algo, o propósito estava naturalmente estabelecido. O cristianismo oferecia uma explicação clara sobre de onde viemos e para onde vamos, propiciando um amparo. Havia um calendário de eventos cristãos, como a Páscoa e o Natal, que marcavam o tempo, e conferiam o significado necessário a cada dia.


Com o tempo advindo, essa estrutura narrativa foi se desintegrando. Deus, que antes ocupava o centro da vida das pessoas, perdeu seu papel central. Nietzsche captou bem isso, e se preocupou com essa mudança ao falar sobre a “Morte de Deus”. Ele, não se referia apenas ao declínio da fé religiosa, mas ao desaparecimento de um sistema que conferia propósito e direção a todos. A perda desse quadro estático da moral e costumes, levou ao que experimentamos hoje: uma vida mensurada pelo relógio, em que o tempo é visto como algo a ser otimizado, corremos atrás dele, e a produtividade se tornou a nova moral.


Tomemos, por exemplo, a relação com o trabalho. No período pré-industrial ele não era separado da vida; fazia parte de uma rotina natural. O artesão trabalhava no seu ofício, muitas vezes seguindo tradições familiares, e seu tempo de produção estava ligado aos ritmos da terra ou à necessidade local. Havia uma sensação de pertencimento e perpetuação, onde o sujeito se via como parte de algo maior, contribuindo para a comunidade e sendo valorizado dentro dela. A acomodação do lazer também seguia essa lógica, e as pausas para descanso, especialmente as rotinas religiosas eram respeitadas e até sacralizadas.


A tecnologia e a globalização conectaram o mundo de maneiras nunca imaginadas, transformando a experiência do tempo em algo instantâneo e pulverizado. Redes sociais e meios de comunicação ampliaram nossas possibilidades de interação, mas também fragmentaram nossa atenção. Hoje, vivemos em uma sociedade dominada pela pressa e a eficiência. A noção de tempo e sua cronologia foi despojada de qualquer caráter sagrado, se tornando uma simples mercadoria. Somos constantemente bombardeados por demandas de produtividade, criamos a ilusão de que devemos estar sempre ligados, produzindo ou consumindo. Nesse cenário, a vida parece se diluir, com as pessoas buscando obstinadamente reconhecimento e validação por meio de curtidas, seguidores e interações diversas, o que acaba minando a construção de relações autênticas.


Essa variante que não é apenas tecnológica, mas também filosófica e cultural, produziu a perda das narrativas tradicionais e a ascensão da pretensa visibilidade, desconstruindo a compreensão do eu e do outro. Estamos sob intensa pressão, obrigados a se auto gerenciar e se apresentar de maneira otimizada em busca de ratificação.


Como psicanalista percebo essa mudança, que observo carregar consequências psíquicas consideráveis. Na era pré-moderna, o indivíduo encontrava segurança e sentido nas narrativas externas que o cercavam — Deus, a família, costumes e a tradição. Porém, com a ascensão da nova era e a queda desses relatos importantes, fomos deixados à deriva. Destarte, agora forçados a criar nosso próprio sentido de permanência, subsistência, realidade e senso de identidade, resultou em ansiedade, depressão, sensação de vazio e desorientação, sintomas que derivam na sua maioria da tensão entre as demandas sociais e os desejos individuais. Essa apreensão só fez aumentar, e agora, somos os únicos responsáveis por se moldar e se vender no mercado das aparências.


Essa aceleração também se reflete na forma como lidamos com o tempo. Perdemos a capacidade de contemplação e imersão em atividades que não tenham um valor imediatamente quantificável. O tempo vazio, tão necessário para a criatividade e a meditação, foi trocado pelo tempo útil, aquele que deve ser sempre preenchido com algo essencialmente produtivo ou divertido. Esquecemos nossa capacidade tridimensional de olhar para o céu, do fazer nada, de brincar. Comprometemos uma herança importante da qualidade de vida que redunda dessa desconexão, do ócio criativo e da capacidade de simplesmente estar, em vez de fazer algo o tempo todo.


Atento aqui para um paradoxo introduzido por Nietzsche. Quando ele anuncia que “Deus está morto”, o qual não se refere simplesmente ao declínio das religiões tradicionais, mas à perda de uma centralidade que dava sentido e direção à nossa experiência. É isso, nada tem a ver se você é cristão, protestante, espiritualista, etc., ou acredita ou não em Deus, se é ateu ou religioso. No mundo pré-moderno, o tempo e o senso comum estavam estruturados em torno de algo transcendente ou de uma ordem espiritual. Após a dita filosófica, o homem é forçado a encontrar significado em um contexto que, segundo Nietzsche, se torna essencialmente caótica e sem propósito.


''Nietzsche nos alertou sobre a “morte de Deus” como sendo a perda de uma ordem transcendente, e agora, a nossa busca por sentido é um labirinto sem saída no caos moderno.'' Dan Mena


Esse diagnóstico, reflete claramente as mudanças, sem uma narrativa articulada num eixo para dar sentido ao tempo, somos jogados e lançados em uma existência desagregada, onde o tempo se tornou algo a ser consumido, e o ''eu'', um projeto a ser vendido. Dita ruptura, também resulta em uma dificuldade crescente em estabelecer laços, pois os afetos passaram a ser permeados pela lógica de mercado, onde o valor do outro é medido pela sua utilidade ou atuação. Portanto, essa metafórica morte de Deus, é também a falência de uma estrutura que nos permitia saborear o tempo de forma mais rica. Agora, sem uma narrativa primordial e mediana, ele se tornou uma série de momentos frágeis e desconectados, onde a imposição para estar sempre em movimento, sempre “fazendo”, nos impedem de acessar o simples prazer de ser, estar e existir.


Tomei para dar um exemplo um trecho do livro 'A Gaia Ciência', que se refere a essa abordagem por vezes lúdica e perturbadora, espelhando o tema da superação de antigos valores e a criação de novas conceituações.


Em uma das passagens centrais do livro, não se afirma literalmente a morte de Deus, mas sim, se faz uma simbiose do colapso dos valores religiosos e metafísicos que sustentavam a moral e o sentido da vida na cultura ocidental. Surge então o desafio de como viver em um mundo sem essas bases. Veja o trecho abaixo, e ao fim, uma análise;


Vocês nunca ouviram falar daquele louco que, em plena manhã, acendeu uma lanterna e correu para a praça, gritando: “Procuro Deus! Eu procuro Deus!”? Havia muitos por ali que não acreditavam nele, e eles riam, provocando: “Mas o que aconteceu, ele está perdido? Será que é como uma criança que se escondeu? Está com medo de nós? Viajou para longe?”


O louco, então, olhou fixamente para eles e, com um grito de desespero, respondeu: “Para onde foi Deus? Eu lhes direi: nós o matamos — vocês e eu! Somos todos seus assassinos! Mas como fizemos isso? Como conseguimos esvaziar o mar? Quem nos deu a esponja para apagar o horizonte? O que fizemos quando desencadeamos a Terra de seu sol? Para onde estamos indo agora? Não estamos continuamente caindo para frente, para trás, para o lado, em todas as direções? Há ainda um 'acima' ou um 'abaixo'? Não estaremos vagando por um nada infinito? Não sentimos o vazio se expandindo sobre nós?”


Nesse trecho poético e dramático, Nietzsche não apenas expressa essa tal “morte de Deus”, mas desenha fielmente um retrato sombrio das consequências para a nossa civilização.


Como podemos interpretar essa metáfora literária?


A imagem do louco, correndo pela praça em plena luz do dia com uma lanterna, sinaliza a busca desesperada por algo que foi perdido — não apenas Deus como entidade, mas a estrutura de valores, moral, costumes e sentido que ele representava para o mundo.


Quando o louco grita “nós o matamos”, não está apenas falando de um ato individual ou literal, mas de uma transformação cultural e espiritual, essa que estamos assistindo. O “assassinato de Deus”, simboliza o colapso da moralidade tradicional e das certezas que, por séculos, deram sentido à nossa existência. Ao perguntar num trecho, “como conseguimos esvaziar o mar” ou “apagar o horizonte”, convoca a ponderação sobre como, ao destruir esse centro, perdemos as referências que organizavam o mundo e o tornavam compreensível.


A alegoria da Terra sendo “desvinculada de seu sol”, conclama a ideia de que, sem Deus, o mundo foi despojado de seu ponto fixo — tudo o que antes parecia estável, agora está em queda livre. Então, o louco pergunta; “para onde estamos indo agora?”, e a resposta é desoladora: sem um ponto essencial que nos oriente, estamos condenados a vagar por um “nada infinito”, sem direção ou propósito. O “vazio que se expande”, expõe a ausência de sentido que permeia e invade a vida atual, após a perda das antigas verdades.


Em essência são esses elementos que assistimos diariamente, como partícipes de uma era onde Deus foi tirado do trono, e obviamente, nada pode substituir sua ausência. Somos absolutamente incapazes de construir um novo conjunto de valores que sustentem a sociedade. Podemos então enfrentar esse abismo existencial que se abre diante de nós? Sem ele, resta a suposta liberdade — mas também, a responsabilidade assustadora de criar novos horizontes.


O grande paradoxo é que nossa busca por uma enganosa liberdade e inovação, nos aprisionou em um ciclo interminável de produção e consumo, alienados de nós mesmos e dos outros. E essa tal de liberdade? Será que é como a pensamos?


Por isso, farei um aparte sobre liberdade;


No ângulo da psicanálise, esse conceito vai além da simples ausência de restrições externas. Ela está relacionada ao inconsciente, às forças internas que moldam a personalidade e à nossa capacidade de lidar com os anseios, conflitos e responsabilidades. Freud a descrevia como algo paradoxal. Afirmava, que a mente é governada por impulsos inconscientes que estão muitas vezes fora do nosso controle. Esses incitamentos, relacionados aos quereres, ao medo e à culpa, exercem grande poder e influência sobre nossas escolhas e ações. Assim, a ideia de liberdade é totalmente rejeitada como pensada horizontalmente, uma vez que o inconsciente nos limita, e de certa forma, interage na nossa capacidade de atuar de maneira completamente autônoma. Constituídos que somos por uma falta estrutural, desde o nosso nascimento, carregamos uma parcialidade inerente que nos separa de qualquer forma de totalidade. O conceito de “separação-individuação”, é um momento mágico e irrepetível, quando no ventre materno somos ''UM'', bebê e mãe, interligados de maneira indissociável. Ao nascer, ocorre a separação física e psicológica, que marca o início da nossa individualidade e a percepção de si(s) como um ser separado dela.


Essa traumática divisão inicial, gerará sentimentos de ausência e falta, ao representar a perda do estado de plenitude e fusão emocional. A compreensão dessa quebra como um evento fundamental na formação psíquica instigará o desenvolvimento emocional, os relacionamentos e a busca por sentido ao longo da vida.


Assim surge o desejo, como nosso ato primordial, e ele, como a manifestação primeira dessa carência. Como sujeitos, desejaremos um retorno àquilo que nunca poderá se repetir, pois o ''objeto'' desse querer será sempre inatingível. Nunca estaremos saciados, pois e nessa busca por sermos completos novamente que a vida vai se impulsionar e acontecer.


''O paradoxo da liberdade, está em aceitar que nossos impulsos inconscientes limitam nossa autonomia plena, ainda que nos impulsionem a agir.'' Dan Mena


A liberdade nesse contexto, não reside na realização plena dos desejos, mas no reconhecimento dessa privação como parte constitutiva do ser. A verdadeira liberdade emerge quando tomamos clara consciência dessa dinâmica entre desejo e falta, nos posicionando de forma ativa e responsável frente a eles, em vez de sermos meramente conduzidos.


E agora? Será que dá para repensar essa concepção abstrata do que realmente é liberdade?


''Liberdade é aceitar que a vida se movimenta através do desejo, mas que a satisfação plena está sempre fora do nosso alcance.'' Dan Mena


Vamos prosseguir;


Qual seria então a principal consequência dessa transição?


''A “morte de Deus”, pode ser lida como o colapso do grande “outro” simbólico, que sustentava nossa identidade e ancorava nossas neuroses em um sistema de sentido coletivo.'' Dan Mena


Abrimos caminho para o surgimento da ciência como a nova narrativa central na construção da modernidade. Com sua ascensão, o foco se deslocou das explicações transcendentes e espirituais para uma revisão do mundo regido pela razão, empirismo e progresso. A ciência, passou a ocupar o espaço deixado pelo divino, por Deus propriamente, oferecendo respostas objetivas e práticas para o funcionamento do mundo e da natureza. Essa mudança de paradigma, trouxe muitos avanços inegáveis — desde a Revolução Industrial até os saltos científicos nas áreas da medicina, comunicação e transportes. No entanto, também contribuiu para uma desumanização gradual. A ciência, em sua busca pela eficiência e precisão, muitas vezes desconsidera a subjetividade, os aspectos emocionais e espirituais da nossa espécie. O mundo passou a ser visto de forma mecanicista, e nós, transfigurados apenas como mais uma engrenagem irrelevante para servir ao sistema.


''O paradoxo da modernidade é buscarmos a liberdade, mas nos encontrarmos aprisionados em uma incessante máquina de produção e consumo.'' Dan Mena


Leituras que faço do texto 'A Gaia Ciência' sob a interpretação da psicanálise;


''A lanterna do louco é uma metáfora da busca pelo ego perdido no vazio existencial, onde o sujeito moderno tenta resgatar uma identidade fragmentada em um mundo sem narrativa''.


''Quando fala da Terra desvinculada de seu sol, podemos ver o ser pós-moderno à deriva, sem um “centro” que organize seu desejo e angústia psíquica''.


''A ausência de Deus é também a ausência do superego cultural, que antes limitava e regulava o comportamento, e agora nos confronta com a liberdade de recriar nossos próprios valores''.


''O “vazio que se expande” simboliza, psicanaliticamente, o retorno do Real, o insuportável encontro com a falta de sentido que desestabiliza a psique na era pós-Deus''.


''Sem o horizonte da narrativa religiosa, o sujeito contemporâneo está condenado a viver o desamparo, um estado de angústia primal semelhante ao sentimento de abandono que ocorre no início da vida psíquica''.


''O grito do louco “nós o matamos” reflete a pulsão de morte freudiana, na qual o sujeito destrói suas referências simbólicas, mas se encontra no vazio, preso entre a destruição e a criação de novos sentidos''.


A “queda livre” representa o deslocamento da pulsão, que antes era direcionada pela religião e agora está desorganizada, buscando desesperadamente novas formas de sublimação''.


''A responsabilidade de criar novos valores após a morte de Deus, gera uma angústia existencial que, na psicanálise, pode ser vista como o peso do sujeito de assumir o lugar do grande “outro”, agora ausente''.


''O ciclo interminável de produção e consumo reflete, na psicanálise, a compulsão à repetição, onde o sujeito alienado tenta preencher o vazio simbólico com o gozo imediato, sem nunca alcançar satisfação''.


Os efeitos dessa transição são claros. A ciência, ao suprimir nossas narrativas ancestrais mais subjetivas e espirituais, nos trouxeram ao cenário da pós-modernidade, onde a busca pelo sentido é individualizada, encapsulada e desmembrada. O progresso científico, embora tenha melhorado muitos aspectos da vida, também intensificou a alienação e o sentimento de vazio. Assim, o tempo passou a ser medido em função da produtividade, nosso valor quantificado em termos de utilidade, como se fossemos parte de um grande experimento.


Fala a verdade, você não se sente assim?


O tempo agora parece evaporar diante de nossos olhos, a tecnologia dita o ritmo da vida e da informação, consumida como Nescafé. A narrativa, como uma das expressões mais antigas, se depara hoje com uma profunda crise. Aquela tradição de contar histórias e recebê-las de nossos avós se perderam, aquela sabedoria e experiência, passadas de geração em geração — está sendo corroída. O conteúdo se tornou efêmero, descartável, banal e desprovido, lançando um alerta sobre o colapso dessa capacidade fundamental do sapiens: a de contar histórias que nos conectam ao passado, presente e futuro.


Desde os primórdios, foram mais do que simples entretenimento ao redor de uma fogueira; elas moldaram civilizações, construíram identidades e forjaram os laços invisíveis que mantinham as comunidades unidas. Das pinturas rupestres e mitos primitivos, às epopeias heroicas, das alegorias religiosas ao Iluminismo e o Renascimento, cada era, teve suas histórias que davam sentido ao mundo. Eram o tecido forte que nos ligavam ao coletivo, a realidade, a fantasia, ao imaginário, tempo e espaço.


''A ciência pode ter avançado nossa compreensão, mas também nos isolou, transformando o 'eu' em um número e o tempo em uma mercadoria efêmera.'' Dan Mena


Questiono; como chegamos a esse ponto, e o que perdemos ao longo do caminho. Ao analisar ditas mudanças, e na forma como as histórias foram contadas — e deixaram de ser transmitidas — viso entender as consequências dessa ruptura. O que acontece então quando perdemos a capacidade de recontar vivências e ensinamentos que transcendem o momento presente? Estamos apenas perdendo nossas raízes ou estamos também desassistindo a própria essência?


Como foram afetadas às diversas dimensões da vida?


Crise de Sentido Existencial: Sem Deus como ponto de referência para o propósito da vida, mergulhamos em um estado de niilismo, caracterizado pela incerteza. Os valores tradicionais, antes sustentados por uma narrativa religiosa, perderam sua força, e nos deparamos com uma crise de significado. A vida, que antes tinha sua estrutura delineada pelo divino, agora parece desprovida de direção, gerando questionamentos sobre o sentido de existirmos e o nosso papel no mundo.


Liberdade Acompanhada de Angústia: A ausência de uma autoridade transcendente que defina regras morais e éticas nos colocou diante de uma liberdade extrema, mas também de uma responsabilidade esmagadora. Agora, cada um precisa criar seus próprios valores e determinar o que é certo ou errado, o que pode ser ao mesmo tempo, libertador e aterrorizante. O fardo de carregar essa responsabilidade moral em um mundo desprovido de garantias absolutas é uma das principais fontes de angústia. Essa liberdade, antes desejada, agora se revela uma carga insuportável, uma vez que nos exige a constante criação de próprio sentido.


Fragmentação e Polarização: Com a perda de uma narrativa unificadora proporcionada pela religião, a sociedade experimenta uma fragmentação crescente de valores e ideologias. Sem um consenso moral comum, indivíduos e grupos se guiam por diferentes crenças e prioridades, gerando polarização, conflitos e uma crescente sensação de desconexão. Essa pluralidade de valores, embora seja o reflexo da liberdade moderna, também, intensifica rachas, e cria uma crise de identidade, onde a coesão e o sentido de pertencimento coletivo são cada vez mais difíceis de alcançar.


Ascensão do Materialismo: Na ausência de apelos ao espiritual, a nova sociedade tende a buscar significado na aquisição de bens materiais, no consumo e no progresso tecnológico. Embora esses elementos tenham impulsionado avanços econômicos e científicos, eles alimentam um vazio emocional. O consumo incessante, apesar de oferecer gratificação imediata e provisória, não consegue suprir as necessidades de propósito. A busca por sentido no materialismo frequentemente resulta em alienação, em vez de preencher o vazio existencial deixado pela ausência de uma narrativa espiritual mais ampla.


Busca por Novos Sentidos: Com a morte de Deus, muitos de nós procuramos novas formas de significado em campos como a arte, a escrita, a filosofia, a ciência e novas práticas espirituais. Enquanto alguns conseguem reinventar suas crenças e valores, outros caem em estados de desesperança, cinismo ou até apatia. Essa busca por novas direções se torna uma jornada melindrosa, que reflete tanto a liberdade moderna quanto a dificuldade de encontrar algo que substitua o papel central que Deus outrora ocupou.


O Paradoxo da Nova Era: Ela trouxe avanços inegáveis, progresso científico e tecnológico, mas também gerou um contradição. Ao eliminar Deus, a sociedade criou um mundo onde todas as possibilidades parecem acessíveis, mas onde o sentido da existência se esvai. Liberdade sem diretrizes éticas nos lançam em um oceano de escolhas, mas a ausência de uma orientação clara provocam angústia e incerteza. Agora, navegamos em um universo de possibilidades infinitas, mas a falta de um limiar transcendente torna essa multiplicidade solta e corrosiva.


O Fardo dos Novos Valores: Esse ponto de virada, se, por um lado nos ofereceu uma suposta liberação das amarras da moralidade religiosa e das narrativas pré-estabelecidas, por outro, nós impôs o pesado estorvo de criar novos valores em um cenário de vazio existencial. Essa mudança, trouxe consigo consequências psicológicas, sociais e culturais. Enquanto o terreno fértil do moderno impulsiona a liberdade e o progresso, ele também nos confronta com a angústia de viver em um mundo onde as respostas foram dissolvidas, e o sentido último do ser, se tornou um enigma.


Estamos diante de um desafio monumental: como reconstruir as pontes entre passado e presente sem nos perder no vazio da aceleração contemporânea? Precisamos revisitar a narrativa, não com o olhar saudoso, mas com a intenção de recriar um espaço e lugar, onde as histórias voltem a florescer, nutrindo o que há de mais humano em nós.


Qual o seu papel nisso? Como você percebe a função das histórias em nossa incessante busca por sentido? Questões como essas nos convidam a descer às camadas mais profundas ,onde o tempo, a memória e a identidade se entrelaçam, nos desafiando a buscar, novamente, o fio condutor que nos conecta ao todo, principalmente a Deus, em meio à desordem e à incerteza que marcam o presente.


''A perda da capacidade de contar e ouvir histórias pode significar mais do que uma desconexão com o passado; pode ser um abandono da própria essência''. Dan Mena


Ao poema; Paradoxo do Tempo

Por Dan Mena.


No tempo passado, sólido e certo,

Vivíamos com histórias e o universo aberto.

Narrativas firmes, tradições a brilhar,

Em cada conto, um caminho a se traçar.


Com o avanço da ciência, a fé se esconde,

O sagrado se apaga, e a alma se encobre.

O tempo, antes cíclico, agora é linear,

E o ser, um novo projeto a desvendar.


No passado, o trabalho e o lazer se entrelaçavam,

No ritmo das estações, as vidas se formavam.

Agora, na pressa, a vida se desfaz,

Em busca de produtividade, o valor se refaz.


O tempo, outrora rico, virou mercadoria,

Conexões se fragmentam, perdem a harmonia.

A ciência avança, mas deixa um vazio,

Substituindo histórias por números frios.


Nietzsche falou da morte do divino,

E agora buscamos sentido em um labirinto fino.

Sem uma narrativa para nos guiar,

Vivemos momentos esquecendo o espiritual.


O paradoxo da modernidade é evidente,

Buscamos liberdade, mas somos prisioneiros, de repente.

Entre produção e consumo, nossa essência se esconde,

E a sabedoria ancestral na bruma se confunde.


As histórias que moldaram nossa identidade,

Hoje são efêmeras, perdidas na superficialidade.

De fogueiras e mitos a epopeias sem fim,

O passado nos liga, mas está se esvaindo assim.


Precisamos reconstruir a ponte do saber,

Onde anedotas antigas possam renascer.

Para não perder o que há de mais real,

E encontrar no caos um sentido vital.


Questione o que perdeu, busque a conexão,

Entre passado e presente, encontre a lição.

A narrativa é o fio que nos mantém no instante,

Ligando o ser ao todo, ao divino, ao constante.


Até breve, Dan Mena.


Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199.

Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130.

Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University - Florida Departament of Education - USA. Enrollment H715 - Register H0192.

 
 
 

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