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Alice in Borderland: Análise Psicanalítica do Jogo Final e do Trauma

Atualizado: há 5 horas

Alice in Borderland: Análise Psicanalítica do Jogo Final e do Trauma
Alice in Borderland: Análise Psicanalítica do Jogo Final e do Trauma

A Psicologia da Sobrevivência e as Escolhas Humanas em Alice in Borderland.

Caros leitores(as), depois de algum tempo sem poder publicar meus artigos, (site em reforma) é com grande entusiasmo que me dirijo a vocês hoje para adentrar em uma obra que, à primeira vista, pode parecer apenas um entretenimento, mas que, sob uma visão mais aguçada, traz um verdadeiro laboratório atual da psique: a série "Alice in Borderland". É fato que no meu trabalho, busco constantemente conectar pontes entre a cultura pop e os conceitos da psicanálise, da psicologia e da neurociência, para que possamos assim compreender melhor as confusas curvas da nossa existência e os desafios amparados na contemporaneidade.

A Tóquio vazia de Borderland: um espelho da solidão e do vazio existencial contemporâneo.

‘’Em Borderland, a única fronteira real é aquela que separa o homem de sua própria sombra.’’ - Dan Mena.

E por que "Alice in Borderland"? Porque esta série japonesa da Netflix não é apenas um jogo de sobrevivência; é um espelho absolutamente brutal e fascinante das tensões reais que vivemos em nossos próprios limites da vida. Ela nos força a confrontar o que chamo de "efeito borderline" – uma era onde as fronteiras entre o real e o virtual, a sanidade e a loucura, a conexão e o isolamento, se tornam cada vez mais fluidos e presentes. Os personagens, lançados em um Tóquio desolado e esvaziado dos seus cidadãos, onde alguns são forçados a participar de jogos perigosos e mortais. Um drama que personifica essa tela de experiências limítrofes, onde a identidade se conjuga, é constantemente renegociada e a própria noção de self é posta à prova em cada protagonista. A série, com sua atmosfera de incerteza e a constante ameaça de aniquilação, se enquadra de forma abrupta e visceral na fragilidade da nossa existência e a busca incessante por um sentido impossível em meio a contextos anárquicos. ‘’O jogo mais perigoso que participamos na vida não é contra o tempo ou adversários, mas contra a esperança que insiste em sobreviver dentro de nós.’’ - Dan Mena.

Em um mundo que exige performance constante, onde relações se liquefazem, a série nos oferece um palco descortinado para observar, em sua forma mais cruel, a luta pela manutenção da nossa humanidade. Surgem os dilemas éticos e morais, os traumas que ressurgem com uma intensidade avassaladora, a perseguição desesperada por um propósito que justifique o ser e a sua resiliência inabalável diante do absurdo – tudo isso, ressoando cavadamente com as questões que diariamente trago para o divã e para as discussões sobre a nossa condição. A trilha é um convite irrecusável para olhar as nuances do comportamento humano sob pressão extrema, e podermos refletir sobre o que significa, de fato, sobreviver e encontrar sentido em um mundo tão babélico quanto o próprio Borderland. ‘’A apatia é o sintoma de uma alma que desistiu de desejar; o trauma, por sua vez, é o violento despertar desse desejo.’’ - Dan Mena.

"Alice in Borderland" se destaca, não apenas pela sua trama envolvente, mas pela diversidade com que aborda a psique. Cada jogo é uma sessão de análise ao cubo, expondo medos, desejos e a ativação feroz dos mecanismos de defesa. A série nos permite analisar como a perda, a culpa e a necessidade de conexão moldam significativamente as escolhas e a evolução dos personagens, oferecendo um rico material para conceituar as dinâmicas do inconsciente coletivo e individual. É uma obra que nos desafia a olhar para dentro, a questionar nossas fronteiras e reconhecer tanto a força quanto a fragilidade que coexistem em cada um de nós. Se preparem, isso promete ir além da tela, tocando nas fibras mais sensíveis da própria condição psicológica.


Baseada no mangá de ‘’Haro Aso’’, transcende sem dúvidas o gênero de suspense e ação para se consolidar como um fenômeno cultural global. O universo distópico de "Alice in Borderland" nasceu da sua mente criativa, um mangaká conhecido por suas resenhas intensas e psicologicamente carregadas de tensão. A obra de Aso vai além da mera ação, sua habilidade em construir personagens labirínticos e jogos engenhosos criou um marco no gênero ''survival game'', culminando em sua aclamada adaptação para a série da Netflix. ‘’A verdadeira sobrevivência não está em vencer o jogo, mas em encontrar alguém por quem valha a pena ser jogado. - Dan Mena.

Entre a Vida e a Morte, um Jogo pela Alma.
Entre a Vida e a Morte, um Jogo pela Alma.

Contextualização Teórica

Para escavar na análise de "Alice in Borderland", é preciso estabelecer um arcabouço teórico robusto que nos permita decifrar dinâmicas psicológicas e sociais em jogo, presentes na história. A série, com sua premissa de jogos de vida ou morte, abre um campo fértil para a aplicação de conceitos sociais, psicanalíticos e filosóficos. ‘’A confiança é a moeda mais valiosa e volátil no purgatório das relações humanas.’’ - Dan Mena.

O Mal-Estar na Civilização e a Pulsão de Morte

A civilização atual impõe restrições significativas às pulsões, especialmente aquelas agressivas e à pulsão de morte (Thanatos). Em "Borderland", o colapso da ordem social e a instauração de um regime de jogos fatais, removem integralmente as barreiras civilizatórias, permitindo que essas emoções se manifestem sem freios. Os jogos, especialmente os de Copas, manipulam as emoções e forçam a traição, são manifestações claras dessas pulsões de morte em ação, onde a aniquilação do outro se torna um meio da própria subsistência. Do que somos capazes realmente quando nossa vida está em jogo? O clima e a temperatura da série podem ser lidos como uma experiência social extrema, expondo a fragilidade da nossa civilização e, sobretudo, a do homem, que, quando impelido ao confronto direto com sua natureza e essência primitiva, revelam a nua e crua verdade sobre a pulsão de sobrevivência, levando nossa moralidade a ruínas. E ae? você já imaginou como agiria numa situação de desordem social? ‘’O vazio de Tóquio como uma cidade fantasma apenas espelha o deserto que os personagens já carregavam dentro de si.’’ - Dan Mena.

Arquétipos e o Inconsciente Coletivo

Olhando para os personagens e os simbolismos agregados que a série utiliza, vemos os estalões de padrões universais de pensamento e comportamento que residem no inconsciente coletivo humano.

Em "Alice in Borderland" percebo diversos deles em ação:

O Herói (Arisu): Inicialmente apático e desmotivado, é forçado a embarcar em uma cruzada de autodescoberta, enfrentando provações e desafios, motivado a desenvolver novas habilidades para salvar a si e aos outros. Sua evolução evoca a jornada arquetípica do herói, que surge transformado após confrontar seus medos, dramas e limitações.

A Anima/Sombra (Usagi): Com sua força física e resiliência emocional, atua como um contraponto e ponto de equilíbrio, uma deficiência de Arisu. Ela representa a ligação com o corpo e a natureza, a força vital que impulsiona a permanência no caos, a sobrevivência. Pode ser vista como a manifestação da Anima para Arisu, que o guia, ancorando sua distância da realidade. Ao mesmo tempo, vários sujeitos sucumbem à crueldade dos jogos, que interpreto como manifestações da Sombra, o lado reprimido e destrutivo da nossa psique.

O Trapaceiro (Chishiya): Ele encarna o modo espertalhão, com sua inteligência astuta e sua moral ambígua. Em sua atuação, desafia as convenções e utiliza a manipulação como estratégia da sua sobrevivência, muitas vezes agindo de forma imprevisível e questionando a própria natureza da realidade dos jogos no campo ficcional e metafórico. ‘’A inteligência sem a âncora da empatia, se torna apenas uma ferramenta mais sofisticada para a autodestruição.’’ - Dan Mena.

Modernidade Líquida e Sociedade do Cansaço

Zygmunt Bauman descreveu magistralmente esta sociedade da que participamos, onde as estruturas sociais são banalizadas e efêmeras, lugar onde a incerteza é a norma, mandam. "Alice in Borderland" é uma metáfora extrema dessa liquidez, onde a vida se tornou realmente descartável e as relações instantâneas são constantemente testadas. A falta de solidez e a ameaça de aniquilação que enfrentamos, refletem a vulnerabilidade dos laços delicados que tecemos e a ausência de um futuro estável. Impulsionados pela lógica capitalista do desempenho e da autoexploração, vemos nesta obra nitidamente os fatores que nos empurram ao esgotamento, exaustão física e psicológica. Os jogos que assistimos na série, são a representação máxima dessa lógica utópica: os participantes são constantemente impelidos a performar para sobreviver, um ciclo interminável de lutas e desafios que drenam aos poucos sua energia mental. O cansaço que experimentam não é apenas físico, mas existencial, resultado da constante pressão para provar seu valor em um sistema tirânico que não oferece descanso ou propósito duradouro. Questionamento para você; Diante da aniquilação iminente e da dissolução de todas as estruturas sociais, qual seria o seu mecanismo de defesa primário? Você se agarraria desesperadamente a laços instantâneos para sentir uma falsa segurança, mesmo sabendo que eles podem ser sua ruína, ou adotaria um individualismo radical, sacrificando qualquer conexão em nome da sua autopreservação, e o que essa escolha mostraria sobre o seu medo fundamental: o medo do abandono ou o medo da aniquilação do eu? ‘’É preciso encarar o absurdo da morte para, enfim, dar um sentido deliberado à vida.’’ - Dan Mena.

Quando Sobreviver se Torna o Próprio Esgotamento.
Quando Sobreviver se Torna o Próprio Esgotamento.

O Real Lacaniano e o Trauma

Convocando Lacan, que postula a existência do "Real" como aquilo que nos escapa à simbolização e à imaginação, o trauma bruto que não pode ser plenamente integrado à linguagem ou à consciência. Recai então, neste "Borderland", que interpretado, é uma manifestação dessa suposta realidade: um evento contuso e inexplicável que irrompe na vida dos intérpretes, desorganizando sua realidade e os forçando a enfrentar o impensável. A experiência dos jogos é inevitavelmente um encontro com o Real, um embate com a morte e a aniquilação que deixa marcas indeléveis na psique dos sobreviventes. O impacto traumático generalizado, portanto, não é apenas um evento passado, mas uma presença constante que moldam suas ações e percepções de presente. Com esta base teórica estruturada, vou prosseguir para a análise detalhada dos personagens e dos jogos, buscando demonstrar como "Alice in Borderland" não é apenas mídia de entretenimento, mas, a clara reflexão sobre a nossa condição na contemporaneidade. ‘’A culpa não nasce do erro, mas da sobrevivência que nos lembra constantemente daqueles que não tiveram a mesma sorte.’’ - Dan Mena.

Análise Psicológica dos Personagens Principais

Os personagens de "Alice in Borderland" não são meros peões em um jogo mortal; eles são combos e individualizações de complicados estudos de caso sobre a psique em alta pressão. Cada um representa uma faceta diferente da resposta ao trauma, à perda, desaparecimento e à iminência da morte. ‘’Borderland não é um lugar para onde se vai, mas um estado da alma que se apresenta quando a realidade simbólica se desfaz.’’ - Dan Mena. Questionamento para você; Considerando que a experiência dos jogos é um encontro constante com o trauma, que deixam marcas indeléveis e moldam o presente, como você lidaria com a repetição desse trauma? Você desenvolveria uma compulsão à repetição, buscando reviver o evento traumático nos jogos na tentativa de dominá-lo, se tornando um(a) jogador(a) cada vez mais frio e eficiente? Ou o seu sintoma se manifestaria como uma evitação fóbica, uma paralisia diante da ação, onde o medo da aniquilação se tornaria maior do que o próprio instinto de sobrevivência? O que o seu padrão de resposta ao trauma diria sobre a sua relação com a própria morte?

Arisu: A Jornada do Herói e a Redescoberta do Propósito

Ryohei Arisu, um dos protagonistas, é inicialmente apresentado como um jovem apático, viciado em games e desiludido com a vida. Sua inteligência aguçada, embora evidente nos jogos, estava adormecida pela falta de propósito na vida. A entrada em Borderland atua para ele como um choque que o força a defrontar sua própria existência. Arisu personifica o indivíduo moderno que, imerso na sociedade do cansaço, perdeu o contato com seus desejos e com o sentido de direção. Seu vício em jogos é utilizado como uma fuga da realidade e de suas responsabilidades, um mecanismo de defesa contra a angústia existencial que muitos atravessam. ‘’A máscara da indiferença é o escudo mais pesado que uma alma pode carregar para se proteger da dor do outro.’’ - Dan Mena.

Em Borderland, Arisu é conduzido a interpretar a jornada do herói. Forçado, ele passa do mundo comum (em sua vida anterior) para o mundo especial (Borderland), situado em uma série de provações (os jogos), onde encontra aliados e mentores (Usagi, Chishiya, Kuina) e, eventualmente, retorna um ser transformado. Sua principal força reside em sua inteligência, capacidade de análise e dedução, mas sua fraqueza inicial é a dependência emocional e a culpa do sobrevivente. A perda de seus amigos, Chota e Karube, no jogo "Esconde-Esconde" chamado de (7 de Copas), é um trauma fundacional que o impulsiona a buscar um propósito: sobreviver não apenas por si mesmo, mas em memória daqueles que como grandes amigos perdeu. Uma busca por sentido em meio ao absurdo, onde o propósito é encontrado mesmo nas circunstâncias mais adversas. ‘’Cada jogo de Copas é uma sessão de análise bruta, onde o divã é a própria vida e o analista a morte.’’ - Dan Mena.

Onde a Linguagem Falha e o Trauma se Instala.
Onde a Linguagem Falha e o Trauma se Instala.

Usagi: Resiliência, Culpa e a Âncora da Realidade

Yuzuha Usagi é uma alpinista que, antes de entrar para Borderland, vivia isolada após a morte de seu pai e a desilusão com a sociedade. Sua força física e sua autossuficiência são notáveis, mas sua fraqueza e vulnerabilidade residem na culpa do sobrevivente e na dificuldade de formar laços firmes. Ela representa a resiliência em sua forma mais pura, a capacidade de se adaptar e persistir diante de adversidades impossíveis e extremas. Vemos aqui a representação viva da pulsão de vida (Eros), em contraste transparente com a pulsão de morte que permeia Borderland. Ela se apega à vida e à possibilidade de criar um futuro, mesmo quando tudo parece perdido. A formação da sua conexão com Arisu é crucial, permitindo a elaboração de uma âncora emocional, o que impede que  sucumba ao desespero e à loucura. A relação entre eles é um exemplo da importância dos laços que estabelecemos na preservação da sanidade em um ambiente complicado e traumático. A culpa que Usagi carrega pela morte de seu pai a torna relutante em se apegar a outros, mas a necessidade de sobrevivência e a empatia por Arisu a levam a superar essa barreira, formando um vínculo que se torna a espinha dorsal da narrativa da série. ‘’O retorno à realidade em qualquer circunstância de vida, nunca é uma volta ao que era, mas a dolorosa tarefa de integrar o trauma ao novo eu.’’ - Dan Mena.

Chishiya: O Intelecto Desapegado e a Busca pela Verdade

Shuntaro Chishiya é um estudante de medicina brilhante, destarte, seja cínico e manipulador. Sua inteligência estratégica e sua capacidade de manter a calma sob pressão o tornam um jogador único e formidável. No entanto, seu desapego emocional e sua aparente indiferença à vida o colocam em uma categoria à parte. Ele não é um psicopata no sentido clínico, mas um indivíduo que desenvolveu um mecanismo de defesa desviado contra a dor e a vulnerabilidade. Sua curiosidade sobre a natureza do humano e o funcionamento de Borderland é quase científica, ele busca desvendar a verdade por trás dos jogos, a qualquer custo.

Esse singular intelecto puro, desprovido de emoção, age, observa e analisa o caos com uma frieza calculada. Sua postura altamente crítica à sociedade que, antes de Borderland o via apenas como um meio para um fim (um médico de grande sucesso). Em Borderland, ele encontra um palco perfeito, onde sua inteligência pode ser plenamente exercida sem amarras sociais, mas sua caminhada também envolve a lenta redescoberta da empatia e do valor dos vínculos, especialmente quando interage com Kuina e, em menor grau, com Arisu. Seu largo arco narrativo sugere que, mesmo o mais racional e desapegado dos indivíduos, não pode escapar completamente da necessidade de interação e conexão, muito menos se isolar completamente das emoções terrenas. ‘’O Coringa não é o fim do jogo, mas a eterna promessa de que o caos é a única regra que nunca poderá ser vencida.’’ - Dan Mena.

A Nostalgia por um "Eu" que Não Existe Mais.
A Nostalgia por um "Eu" que Não Existe Mais.

Outros Personagens e suas Representações Importantes

Kuina: Uma ex-artista marcial e transsexual, representa a autenticidade e a aceitação de si mesmo. Seu papel é de interpretar a superação e a lealdade, onde oferece um contraponto de calor humano e exibição de força física.

Niragi: É o sádico e violento, encarna a manifestação mais sombria da pulsão de morte e da agressividade desinibida, mostrando o que acontece quando as restrições sociais são completamente removidas do meio. Ele é um espelho distorcido da ira, da raiva e do ressentimento que podem surgir em tempos de crise.

Aguni: Um líder militarista, busca por ordem e controle em meio a desordem, mas também a fragilidade da liderança e o peso da culpa. Sua figura é arquetípica do ideal do "pai" ou "líder". Ele tenta proteger seu grupo, que também pode sucumbir à violência e ao desespero da lide.

Através desse elenco e seus personagens singulares, "Alice in Borderland" constrói um mosaico intrínseco da psique, situado entre diferentes personalidades que reagem distintamente à pressão do roteiro, ao colapso do convencional, do trauma e à necessidade de redefinir o que significa viver e sobreviver. ‘’Em um mundo sem regras, o homem não se torna livre; nos tornamos escravos dos instintos mais primitivos.’’ - Dan Mena.

Análise dos Jogos e Simbolismos Psicanalíticos

Os jogos são o centro e coração da narrativa, principal catalisador da exaustiva exploração psicológica dos personagens. Cada naipe do baralho representa uma categoria de nível e desafio, onde a dificuldade é indicada pelo número da carta. Essa estrutura não é por acaso arbitrária; refletem diferentes aspectos sociais experimentais quando verificados pelo prisma psicanalítico. Questionamento para você; Se cada naipe do baralho representa um tipo diferente de desafio psicológico (por exemplo, Copas para jogos de traição e manipulação emocional, Paus para cooperação, Ouros para inteligência e Espadas para força física), em qual naipe você acredita que sua psique seria mais brutalmente exposta e por quê? Sua maior vulnerabilidade reside na necessidade de confiar nos outros, na sua capacidade de colaborar, na sua racionalidade sob pressão ou na sua resistência física? O que a sua "fraqueza" nesse sistema de jogos revelaria sobre o aspecto mais reprimido ou mal resolvido da sua própria personalidade?

O Simbolismo dos Naipes

Paus (♣️): Jogos de equipe e cooperação. Representam a necessidade de abertura de laços sociais e a dinâmica social de interação de grupos. Os jogos desta carta adentram a tensão entre o indivíduo e o coletivo, a capacidade de confiar nos outros e a formação de alianças fortes. Eles testam a habilidade de sublimar os desejos individuais em prol de um objetivo comum, um dos pilares da nossa civilização.

Ouros (♦️): Jogos de inteligência, lógica e raciocínio. Simbolizam a racionalidade e a capacidade de equacionar e resolver problemas. Estes jogos estão sob o domínio de Arisu e Chishiya, que utilizam o intelecto como principal ferramenta de sobrevivência. No entanto, os games que envolvem Ouros também podem mostrar a vulnerabilidade da lógica, quando confrontada com o inesperado ou com a intenção de usar a manipulação emocional.

Espadas (♠️): Jogos de força física, resistência, estratégia e combate. Coexistem na luta pela sobrevivência em seu estado mais grosseiro. Os jogos de Espadas são uma manifestação icônica e direta da pulsão de morte, onde o uso da violência e a agressão são as principais armas de insights. Eles forçam os personagens a afrontar seus limites físicos e a lidar com o eixo da crueldade.

Copas (♥️): Jogos de traição, aspereza, manipulação emocional e dilemas éticos e morais. São considerados os mais malvados, atacam diretamente o lado mental dos participantes. São o palco onde a confiança é canibalizada e destruída, os laços testados e a moralidade levadas ao limite. Eles são encenados como sessões de medos e desejos onde os personagens são expostos e chantageados. O jogo do "Esconde-Esconde" força Arisu a sacrificar seus amigos, um evento que o vai assombrar por toda a série. ‘’Na fronteira da existência, a única bússola que nos resta é a voz do inconsciente, sussurrando verdades que a própria civilização silenciou.’’ - Dan Mena.

A Tênue Linha Entre a Humanidade e a Barbárie.
A Tênue Linha Entre a Humanidade e a Barbárie.

O Borderland como Espaço Liminar e Purgatório Psíquico

O próprio "Borderland" é um poderoso símbolo, não é apenas um lugar físico, mas um espaço liminar, um estado límbico que dança entre o intermediário da vida e a morte, a realidade e a ilusão. Um verdadeiro purgatório psíquico, lugar onde as almas são testadas e purificadas através da angústia e do sofrimento. É um ringue onde as regras da sociedade são suspensas, permitindo que o inconsciente se manifeste de forma livre e intensa. Como mencionei anteriormente pode ser associado ao Real lacaniano, o domínio do trauma e do inominável. A chegada a Borderland é um evento que desestrutura a realidade dos personagens, sendo impelidos a reconstruir seu mundo simbólico e a encontrar um novo sentido. A busca ininterrupta por "voltar para casa" não é apenas um desejo de retornar ao mundo físico, mas também um anseio por restaurar a ordem e a estabilidade psíquica. Questionamento para você; Considerando que a busca por voltar para casa é um anseio por restaurar sua estabilidade psíquica, e não apenas um retorno físico, o que aconteceria se, ao final da provação, você descobrisse que o "lar" psíquico que você tanto almeja reconstruir foi irremediavelmente destruído? Se a experiência desse purgatório psíquico alterou você a ponto de não mais caber na sua antiga vida, você viveria como um exilado dentro da sua própria realidade, assombrado pela intensidade do Real que experimentou? Ou você abraçaria essa fratura interna como uma nova identidade, aceitando que a única casa possível é a própria consciência do trauma? ‘’Cada vida poupada em Borderland é um fragmento de si mesmo, resgatado do abismo da indiferença.’’ - Dan Mena

O Coringa: O Caos e o Inconsciente

A carta do Coringa aparece no final da segunda temporada, é um símbolo que representa o imprevisível, a anarquia, o pandemônio, aquilo que está fora do sistema de regras dos jogos. Posso interpretar assim:

O Inconsciente: O Coringa sinaliza o próprio inconsciente, com sua natureza caótica, imprevisível e, por vezes, perigosa. É a soma das forças que não podem ser controladas pela razão ou pela vontade consciente.

O Real: Assim como o Borderland, o Coringa pode ser uma manifestação do Real, o elemento que resiste à simbolização e que sempre retorna para desestabilizar aquela ordem pré-estabelecida.

O Mestre do Jogo: O Coringa pode ser o próprio mestre, uma entidade que controla e manipula o destino dos participantes, mas que permanece oculto e inatingível. Independentemente da interpretação, sua presença sugere que o jogo nunca termina de fato, que sempre haverá um elemento de incertidumbre e balbúrdia na existência. Ele é a promessa de que, mesmo após superar todos os jogos e desafios, o confronto com o desconhecido será algo inevitável para todos.

Através da análise dos games e seus aspectos icônicos, "Alice in Borderland" é uma obra rica em significados psicológicos, que utiliza essa estrutura perversa para sua construção. ‘’A verdadeira face do desejo se expõe não na abundância, mas na escassez imposta pelo jogo da vida e da morte.’’ - Dan Mena.

O Inconsciente como Campo de Batalha.
O Inconsciente como Campo de Batalha.

Conclusão Analítica da Série - "Alice in Borderland"

Ao desmantelarem as bases da civilização moderna e lançarem seus personagens em um purgatório de jogos, a série expõe essas camadas essenciais da nossa raiz primitiva, principalmente aquelas relacionadas à psique. Trabalha fortemente com as pulsões de vida e morte, a busca incessante por direção, sentido e a resiliência do espírito humano diante do trauma. Através do prisma freudiano, minha escola, vejo "Borderland" como um cenário onde o mal-estar na civilização é levado ao ápice, e as pulsões agressivas e de morte emergem libertas de grilhões. A série nos lembra que, sob coerção, a linha que nos separa entre a humanidade e a barbárie pode ser muito tênue. ‘’A resiliência não é a ausência de medo, mas a coragem de dançar com nossa própria sombra no palco da sobrevivência.’’ - Dan Mena. Questionamento para você; Visto que a civilização exige a repressão de nossos instintos mais primitivos em troca de segurança. Se você fosse lançado(a) em um cenário onde essa troca se desfaz e a barbárie é a norma para sobreviver, você sentiria uma secreta e aterrorizante sensação de alívio ou libertação? O que a ausência do "mal-estar" - a tensão constante entre desejo e repressão - lhe revelaria sobre o peso que a própria civilização impõe à sua psique? E, ao final, considerando o retorno à humanidade, seria para você um alívio bem-vindo ou uma nova e dolorosa forma de aprisionamento?

A perspectiva junguiana enriquece minha análise dos personagens, que encarnam certamente arquétipos universalizados. Arisu, o herói em sua jornada de autodescoberta; Usagi, a âncora da resiliência e da pulsão de vida; e Chishiya, o fraudador intelectual, todos arremetem em padrões para o inconsciente coletivo. Suas interações e evoluções demonstram como o confronto com a sombra e a integração de aspectos reprimidos da psique são essenciais para a individuação e a sobrevivência da raça.

Adicionalmente, a série dialoga fácil com as críticas contemporâneas à sociedade. A "Modernidade Líquida" de Bauman, encontra seu lugar na efemeridade da vida e das relações, enquanto a "Sociedade do Cansaço" de Byung-Chul Han, metaforizada pela incessante necessidade de "desempenho exímio" nos jogos, levam o elenco à exaustão de toda índole.

Em última análise, "Alice in Borderland" é uma poderosa alegoria sobre a nossa condição. Embora, não ofereça respostas fáceis, mas sim complexidades quanto a angústias e esperanças da nossa própria realidade, reafirmando que, mesmo no limbo entre a vida e a morte, a capacidade de desejarmos e de amar permanecem como ferramentas vigorosas. É nessa gangorra que reside a nossa mais bela essência. Que esta reflexão nos inspire a valorizar a humanidade em nós e nos outros, antes que o jogo final nos obrigue a fazê-lo. ‘’No tabuleiro de Alice in Borderland, cada movimento mostra que a vida é um jogo enigmático e complicado, onde a única vitória reside na coragem de enfrentar o abismo da própria alma.’’ - Dan Mena.

Referências Bibliográficas

Freud, Sigmund – O Mal-Estar na Civilização (1930, Companhia das Letras)

Jung, Carl Gustav – Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo (1934, Vozes)

Jung, Carl Gustav – O Homem e Seus Símbolos (1964, Nova Fronteira)

Lacan, Jacques – O Seminário, Livro 1: Os Escritos Técnicos de Freud (1953-54, Jorge Zahar Editor)

Bauman, Zygmunt – Modernidade Líquida (2000, Jorge Zahar Editor)

Han, Byung-Chul – Sociedade do Cansaço (2010, Vozes)

Han, Byung-Chul – Psicopolítica: O Neoliberalismo e as Novas Técnicas de Poder (2014, Âyiné)

Winnicott, Donald Woods – O Brincar e a Realidade (1971, Ubu Editora)

Bollas, Christopher – A Sombra do Objeto: Psicanálise do Conhecido Não Pensado (1987, Escuta)

Klein, Melanie – Inveja e Gratidão e Outros Trabalhos (1957, Imago)

Frankl, Viktor E. – Em Busca de Sentido: Um Psicólogo no Campo de Concentração (1946, Vozes)

Yalom, Irvin D. – Psicoterapia Existencial (1980, Artmed)

Beck, Aaron T. – Terapia Cognitiva da Depressão (1979, Artmed)

Campbell, Joseph – O Herói de Mil Faces (1949, Pensamento)


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FAQ (Perguntas Frequentes) sobre Alice in Borderland


1.  Qual o perfil psicológico de Arisu?

Arisu representa o intelecto paralisado pela apatia, que redescobre seu propósito através do trauma e da necessidade de proteger os outros.


2.  O que Usagi simboliza na série?

Usagi é a resiliência encarnada, movida pela culpa do sobrevivente e pelo instinto de vida (Eros), ancorando Arisu à realidade.


3.  Chishiya é um psicopata?

Não. Ele exibe traços de desapego emocional e curiosidade científica sobre a natureza humana, um mecanismo de defesa para sobreviver, não ausência de moral.


4.  O que "Borderland" representa psicanaliticamente?

É um espaço liminar, um purgatório psíquico. Representa o "Real" lacaniano — o trauma bruto que força os indivíduos a confrontarem seus desejos e medos mais primitivos.


5.  Qual o significado dos jogos de Copas?

 São os mais cruéis psicologicamente. Exploram a fragilidade dos laços afetivos, forçando traições e sacrifícios, testando o núcleo moral dos participantes.


6.  A série discute o trauma?

Sim, o trauma é o tema central. A série explora como diferentes indivíduos processam, reprimem ou ressignificam eventos traumáticos para continuar vivendo.


7.  Qual a relação com "Alice no País das Maravilhas"?

 Arisu (Alice) segue o "coelho" (Usagi) para um mundo ilógico (Borderland) onde as regras da realidade são suspensas, forçando uma jornada de autodescoberta.


8.  Como a série se conecta à "Sociedade do Cansaço"?

Borderland é a metáfora máxima da sociedade de desempenho: a obrigação de "performar" (jogar) para sobreviver, levando ao esgotamento físico e anímico.


9.  O que a carta Coringa simboliza?

O Coringa é o imprevisível, o mestre do caos. Psicanaliticamente, pode representar o próprio Inconsciente ou o "Real" que não pode ser simbolizado ou controlado.


10. Arisu tem uma jornada de herói?

Sim. Ele passa do "mundo comum" (apatia) para o "mundo especial" (Borderland), enfrenta provações, encontra mentores e retorna transformado.


11. Qual a função da violência na série?

 A violência serve como um catalisador que desnuda a psique, revelando o que resta do "humano" quando as convenções sociais são removidas.


12. O que significa "sobreviver" em Borderland?

Significa mais do que apenas não morrer. É sobre manter a própria humanidade, a capacidade de criar laços e encontrar um motivo para viver.


13. A amizade é importante na série?

É fundamental. Os laços de amizade e confiança são o principal contraponto à crueldade dos jogos, representando a pulsão de vida contra a de morte.


14. A série é otimista ou pessimista?

É dialética. Mostra o pior da natureza humana, mas afirma que, mesmo no extremo, a esperança, o amor e o sacrifício podem florescer.


15. Qual a principal mensagem psicológica da série?

A de que o sentido da vida não é algo dado, mas construído ativamente, especialmente quando confrontados com a iminência da morte e o absurdo da existência.


Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199.

Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130.

Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Department of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192.

 
 
 

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