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Bebe Reborn: A Descida Coletiva à Loucura.

Atualizado: 22 de mai.

O Desejo e a Falta - Bebês Reborn

O Desejo e a Falta - Bebês Reborn
O Desejo e a Falta - Bebês Reborn.

O fenômeno dos bebês reborn se instalou como uma histeria coletiva autorizada de surto psicótico. Um modismo bizarro, um colapso mental que escancara um retrato perturbador da falência racional, emocional, espiritual e psíquica de toda uma geração. Não se trata de simples bonecas(os) hiper-realistas, foi rapidamente transformado em indústria, capaz de drenar afetos, de quem, anestesiada(o) pela solidão, pretende substituir a carne e os ossos de um filho, seja de sangue ou de criação por pedaços de borracha. Essa febre, que hoje alimenta narrativas nas redes sociais e reúne multidões em fóruns e grupos de “mães reborn”, expõe uma geração inteira órfã de sentido e direção, narcotizada pelo insulamento e niilismo: (“Niilismo é contemplar um mundo sem alicerces, onde o vazio de sentidos se traduz na urgência – e no desafio – de forjar nossos próprios valores.”) que passou a substituir filhos por bonecos. Esse movimento, longe de ser um gesto poético, é antes de tudo um espetáculo de negação absurda da realidade: isso não é amor. O reborn é um simulacro extremo, ao mesmo tempo objeto de fetiche, anseio falido da maternidade sem sacrifício. Sujeitos que dão mamadeira a pedaços de látex, fazem chá de bebê, carteirinhas de vacinação, agendam consultas médicas, dão vacinas, sessão de fotos, criam creches, aniversários com bolos e convidados, certidões de nascimento falsas, pode com todas as letras ser chamado de — a ''falácia do século''. Simulam a maternidade de forma ritualizada, repetindo gestos que deveriam ser portadores de vida em corpos que nada mais são do que invólucros vazios.

Adoção de Bonecos e o Individualismo como Fuga das Relações
Adoção de Bonecos e o Individualismo como Fuga das Relações.

''A dor que não encontra abrigo no outro busca consolo no artifício.'' – Dan Mena. Não é incomum encontrarmos em blogs relatos emocionados sobre o conforto que as(os) bonecas(os) trazem, mas é preciso reconhecer a perversão que está por trás desse consolo: pagar psicólogo para validar o surto em nome da intropatia, transformar um comportamento psicopatológico em nome de um suposto bem-estar. Uma insanidade institucionalizada, que alguns psicólogos apoiam, a sociedade aplaude, influenciadores promovem — um verdadeiro rompimento socialmente autorizado, publicizado e vendido como normal e naturalizado. É o falso desalento em sua dimensão mais real, esse, que mata e vende filhos de verdade, que abandona crianças e aborta, que assiste meninos(as) passando fome, frio e necessidade e nada faz para ajudar, mas, embala bonecos frios em enxovais de luxo, quartos decorados e berços de plástico. Enquanto isso, crianças são violentadas, assassinadas, sequestradas, mortas e esquecidas. Em paralelo, adultos desequilibrados(as) buscam na frieza do silicone a utopia de uma maternidade sem dor, sem esforço, sem vida – filhos sem coração nem alma, um útero literalmente estéril. Isso é comprar a alienação como consolo, o que alimenta um ciclo infernal em que a fantasia se impõe à experiência, se valendo de catálogos e tutoriais online que ensinam a simular choro, a preparar mamadeira, trocar fralda e dar banho em um corpo inanimado.


''É mais fácil domesticar o afeto do que aceitar que o amor é sempre risco.'' – Dan Mena. Um sacrifício cruel da realidade em detrimento do delírio, porque é mais fácil amar o que nada demanda nem exige, do que enfrentar a oscilação, o desamparo e a seriedade necessária do exercício inerentes ao cuidado com um ser vivo. Eis a prova impiedosa de uma ''geração infantilizada'', que atinge os limites imponderáveis do absurdo, sintoma de um tempo doente em que a valoração do real cede lugar ao culto da paródia.


''A dor que não é elaborada vira teatro,  o boneco é apenas o cenário.'' – Dan Mena. Filhos sem alma, amor sem reciprocidade — o bebê reborn se ergue como um ícone emblemático de uma era que prefere o ensaio de um lamento à vivência autêntica de um luto; que troca o calor da amamentação pelo sopro de um script manual de movimentação de olhos de vidro, cabeça, pernas e braços de fantoche. Estamos normalizando o anormal, romantizando a demência, e quando a realidade se tornar realmente insuportável para todos, o reborn, será mais um dos altares do sacrilégio humano como portador da nossa decadência. Se reproduz, insistentemente, a mentira de que esses inorgânicos são companheiros, egressos de um amor impossível: uma humanidade que prefere viver no faz de conta do que viver e encarar o peso das suas derrotas, desilusões e perdas. ‘’Bebê reborn’’ é uma imagem perturbadora do século XXI, um espelho fosco em que se configura a insolência de um tempo que evita, (como se fosse possível) a finitude e a dor. É o ícone máximo desconcertado, que já não é meramente individual, mas a soma das vontades, modismos, discursos de consolo e pânico, catalisando angústias no molde frio de um boneco.


Ao privilegiar uma maternidade simulada, estamos abrindo mão da força transformadora do laço e do vínculo. Que possamos reencontrar a coragem de enfrentar a dor e celebrar a vida real, convertendo nosso cuidado em presença autêntica, não em fingimento. Não pode passar despercebido a instrumentalização estruturada da indústria, que capitaliza em cima da vulnerabilidade e os seus custos sociais, éticos e clínicos. Somente conscientizando essa avaliação, de forma crítica e fundamentada, que o verdadeiro alcance desse evento pode ser relegado aos anais da insânia, aquela, que nunca deveria ter saído do manicômio da imaginação desregrada. Agora, vou aliviar um pouco as críticas, e tentar estabelecer um diálogo mais filtrado. Boa leitura.


''A indiferença por crianças reais contrasta com o zelo por bonecos — isso diz tudo sobre a inversão dos valores contemporâneos.'' – Dan Mena.


O Luto Prolongado e o Desejo de Recriar o Presente Acredito que o reborn seja utilizado em alguns casos como uma armadura contra a dor de perdas irreparáveis. Quando o vazio deixado por um aborto espontâneo, uma morte neonatal ou uma infertilidade persistente, que pode se tornar insuportável. Logo, ele aparece como um amplificador do luto – um objeto que pode ser punido, culpado ou até mesmo idealizado. Se busca então, um reencontro com o que se perdeu, mas esse retorno nunca traz alívio definitivo; antes, estabelece uma repetição compulsiva do sofrimento. Ao invés de acolher o luto através da presença real, se cria uma ilha de afeto que, embora pareça proteger, impede o sujeito de atravessar o momento e reconstruir seus vínculos reais. ''O apego a objetos transicionais pode, em determinados quadros clínicos, prolongar o processo de luto em vez de aliviá-lo.'' Como afirma Winnicott em: ''O Brincar e a Realidade'', ''o uso saudável do objeto transicional deve ser progressivamente abandonado, permitindo ao indivíduo ingressar plenamente na realidade externa''. No reborn, porém, esse abandono é negado, resultando em uma fixação regressiva, que fixa o paciente numa saudade eterna.


''Toda tentativa de substituir o ausente é um pacto silencioso com a dor que se recusa a partir.'' - Dan Mena.

A Substituição do Conflito Emocional pela Estética da Tranquilidade
A Substituição do Conflito Emocional pela Estética da Tranquilidade.

Solidão e Controle: A Dependência Emocional como Refúgio Na era da hiperconexão, paradoxalmente, vivemos momentos de isolamento. Esse boneco idealizado, talhado com silicone e vidro para simular a doçura da vida, oferece uma ilusão de companhia absoluta, sem risco de rejeição. Quem o integra busca segurança afetiva num “outro” que nunca falará de retorno, de cobranças, não exige responsabilidade e se deixará manipular ao bel prazer. É uma promessa de controle: o cuidador define cada gesto, cada choro e troca de fralda—um manejo que a vida real jamais pode oferecer, sob nenhuma circunstância. Esse simulacro de afeto, antecipa o fracasso das estruturas sociais em ofertar relações seguras; onde o reborn se encaixa como luva, substituindo os vínculos por sinônimos de consumo e domínio. Neste caso, testemunhamos o ápice da liquidez contemporânea dos laços afetivos: um sentimento fabricado, pasteurizado, pronto para ser descartado no lixo quando a ilusão se desfaz. Em um mundo onde nada persiste, tudo é fluido, ele promete eternidade e obediência, mas isso, apenas perpetua a exclusão relacional.


''A tentativa de domesticar o sofrimento apenas prolonga o seu reinado.'' – Dan Mena. Benefícios Terapêuticos ou Armadilha Clínica? Autores como Martha Stark, em ''Trabalhando com a Resistência'', apontam que certas práticas ''terapêuticas'' podem cristalizar sintomas em vez de aliviá-las. É inegável que algumas pessoas relatam a diminuição momentânea de ansiedade ao cuidado com reborns, sobretudo em contextos de asilos geriátricos ou unidades de paliativos. Contudo, quando esses benefícios parecem justificar o afastamento de familiares ou a rejeição de intervenção profissional, água abaixo, cai em xeque sua validade. Jean Baudrillard em ''Simulacros e Simulação'' resume: ''quando o simulacro ultrapassa o real, a cura se converte em alienação''. Ao aplicar eles como possível  instrumento para o vazio, reafirmamos a hegemonia do ''objeto sobre o sujeito, negando a potência transformadora do vínculo humano.''


''O que chamam de consolo pode ser, na verdade, o cárcere do afeto.'' – Dan Mena. O Abismo Ante o Espelho de Silicone Estamos diante de um sintoma coletivo da nossa época: lutos não elaborados, vinculações desfeitas pela ansiedade de performance, busca de mando a qualquer custo. É um reverbero subversivo de como transformamos a dor em mercadoria, o afeto em espetáculo, e a cura em espectro. Mais um abismo psicológico — não do boneco, mas de nós mesmos: uma geração ansiosa para abraçar o gerenciamento ilusório, enquanto negligencia a coragem de viver o caos inerente ao amar de fato. A Fantasia Fetichista e o Vazio do Inconsciente Com seus traços que emulam realismo e sua promessa de presença sem resistência, são mais do que uma moda cultural ou uma prática excêntrica: são objetos que condensam desejos inconscientes e tentativas desesperadas de preencher o vazio existencial. Na prática, funcionam como ferramentas transicionais e fetichistas, ocupando o espaço de uma falta primordial que nos estrutura como sujeitos. Espelhos do inconsciente que expõem uma luta contra a alteridade e a aceitação da incompletude. O apego a eles é uma tentativa de domesticar o desejo, transformando a maternidade em uma fantasia estéril que nega o outro real.


''A fantasia de um amor incondicional sem reciprocidade é um desejo de poder disfarçado de cuidado.'' – Dan Mena. Uma Ilusão de Continuidade Crianças utilizam objetos — como chupetas, cobertores, chocalhos ou ursinhos — para mediar a transição entre a dependência materna e a sua autonomia. Esses itens, situados entre o "eu" e o "não-eu", oferecem conforto diante da ansiedade de separação. No caso dos bebês reborn, adultos parecem regredir a esse estado objetual infantilizado, os utilizando como substitutos para lidar com a ausência — seja de um filho perdido, de uma maternidade não realizada ou de conexões perdidas que foram significativas. No entanto, diferente do ''objeto transicional infantil'', que facilita a entrada no mundo simbólico, ele aprisiona o sujeito no imaginário, um conceito lacaniano que descreve a esfera das ilusões e identificações narcísicas. Nesse ângulo, é utilizado para simbolizar e lidar com a ausência da mãe, representando uma forma inicial do "objeto a", produto dos quereres que nos impulsionam ao apontar para uma falta essencial no sujeito.

Quando o Amor é Encenado para as Redes Sociais
Quando o Amor é Encenado para as Redes Sociais.

O imaginário é o domínio onde o indivíduo busca uma completude ilusória, rejeitando a alteridade que caracteriza o registro alegórico. O reborn, com sua aparência de vida, mas sem a capacidade de responder ou desafiar, se torna um produto idealizado que satisfaz o desejo sem confrontar o sujeito com sua própria falta. Cuidar de um boneco — com essa ritualização — é rejeitar a necessária vulnerabilidade mútua. Como fetiche, é uma tentativa de negar a castração, substituindo a falta por algo que possa encarnar o desejo reprimido e recalcado. Ao investir em um boneco, se tenta preencher o vazio estrutural, uma materialização do ''objet petit''— o objeto-causa do desejo.

''O reborn é o espelho fosco onde se projeta o medo contemporâneo de aceitar a incompletude.'' – Dan Mena. O Risco da Regressão Patológica Manequins podem servir como ferramentas terapêuticas para processar luto ou infertilidade, destarte, se alerta para os riscos de uma regressão. O objeto transicional para bebês e crianças, é eficaz, fato que de certa forma os prepara para a independência; nos adultos, no entanto, o apego prolongado a eles pode indicar uma fixação no imaginário, bloqueando o acesso simbólico. Esse apego pode se tornar uma defesa contra a ansiedade, mas também um obstáculo à resiliência emocional, pois evita o confronto com a realidade da perda. A validação acrítica desses comportamentos por profissionais da saúde mental, sob o pretexto de empatia, podem agravar esse quadro.


Como a Indústria Reborn Capitaliza a Falência Emocional Mais do que uma subcultura de colecionadores ou um nicho de artesanato; é uma indústria próspera que transforma a fragilidade emocional, a dor, o luto e a solidão em mercadorias de alto valor. Com preços que variam de centenas a dezenas de milhares de reais, são vendidos como obras de arte, ferramentas terapêuticas ou até substitutos de filhos.  A Cadeia Produtiva: Artesanato, Tecnologia e Comércio Esse mercado é impulsionado por uma rede complexa de artesãos, fabricantes e vendedores, que operam tanto em plataformas digitais quanto em feiras especializadas. O processo de "reborning" teve início nos anos 1990, quando colecionadores começaram a transformar bonecas de vinil em representações realistas de bebês, aplicando camadas de tinta, cabelo enraizado à mão e detalhes como unhas e veias visíveis. Hoje, a indústria se expandiu significativamente, com o mercado global de bonecas (incluindo reborns) avaliado em US$ 12,8 bilhões em 2025, projetado para atingir US$ 23,73 bilhões até 2033, com um CAGR de 7,1%. O segmento de colecionáveis, onde eles(as) se encaixam, cresce a um ritmo de 4,1% ao ano, um apelo crescente dessas criações. Os "reborners", são o coração da indústria. O processo é meticuloso: kits de vinil ou silicone, fornecidos por fabricantes como Ashton-Drake ou Bountiful Baby, são pintados com até 80 camadas de tinta, recebem olhos de vidro, cabelos de mohair e pesos internos para simular o corpo de um bebê. Esses kits custam entre US$ 50 e US$ 500 globalmente, enquanto bonecos(as) prontos variam de US$ 200 a US$ 20.000, dependendo da reputação do artista e da exclusividade do design. Pessoas renomadas, como Sara de Reborn Dolls, oferecem criações personalizadas que podem levar três meses para serem concluídas, muitas vezes vendidas em minutos devido à alta demanda.


"O consumo do afeto plastificado revela mais sobre nossa intolerância à frustração do que sobre nosso desejo de amar." - Dan Mena. As estratégias de venda são igualmente sofisticadas. Plataformas como eBay, Amazon, Etsy e sites especializados, como Paradise Galleries, funcionam como "berçários" virtuais, onde são apresentados com certificados de adoção e narrativas emocionais que simulam um processo de adoção real. Feiras como a Tiny Treasures Show e convenções como a IDEX, patrocinadas pela Doll Reader Magazine, atraem colecionadores, artistas e varejistas, oferecendo workshops e competições. Recentemente, a ascensão das redes sociais, especialmente Instagram e YouTube, transformaram o marketing: influenciadores exibem rotinas com seus reborns, enquanto artistas utilizam postagens para anunciar novos "bebês"disponíveis, gerando engajamento imediato. Postagens no X destacam que essas estratégias digitais, incluindo parcerias com influenciadores, visam maximizar lucros, muitas vezes explorando ''histórinhas emocionais'' sensibilizando para atrair compradores. O Desejo e a Falta Essa dinâmica, que transforma a dor em mercadoria, como apontado em postagens no X, é uma "bizarrice do capitalismo", onde até o afeto é mercantilizado. Empresas como a Mattel, focadas em bonecas tradicionais, inspiraram o mercado reborn ao investir em realismo e personalização. Detalhes como a escolha de tom de pele, expressão facial ou gênero, atendem ao desejo de individualidade, mas também se aproveitam da vulnerabilidade emocional, prometendo um "filho" feito sob medida. Intenções Genuínas versus Lucro Predominante A indústria transforma a empatia em uma ferramenta de marketing, usando narrativas de cura para justificar preços elevados. Postagens nas redes reforçam essa crítica, apontando que fabricantes pagam influenciadores para promover histórias emocionais, visando lucros "estratosféricos". A prática de simular adoções, é uma estratégia deliberada para intensificar o achego emocional, garantindo vendas repetidas e fidelidade à marca. Mesmo artesãos bem-intencionados operam dentro de um sistema que prioriza o lucro, onde a dor é transformada em um ciclo de consumo.


"O boneco reborn não chora porque não tem alma — e ainda assim é amado por aquilo que não nos desafia." - Dan Mena.

Quando a Dor se Esconde sob a Roupa de um Bebê Artificial
Quando a Dor se Esconde sob a Roupa de um Bebê Artificial.

Trocando Filhos por Silicone no Niilismo Em uma era marcada pela fragmentação de valores e pela busca incessante por sentido, ''reborn'' não mais são do que outra tentativa de fugir do vácuo emocional abraçando substitutos artificiais. Tratados como filhos por adultos que os alimentam, vestem e celebram, não são apenas uma extravagância cultural; são um sintoma de um niilismo moderno, onde a vida, desprovida de propósito intrínseco, é preenchida por simulacros que prometem conforto sem compromisso. Uma crise existencial coletiva, onde os princípios tradicionais como a família, cuidado e responsabilidade são abandonados em favor de uma maternidade estéril. O niilismo, popularizado por Nietzsche no final do século XIX, é a crença de que a vida não possui sentido ou valor inerente. Em ''Assim Falou Zaratustra'' proclama a "morte de Deus", simbolizando o colapso das estruturas morais e espirituais que outrora davam propósito à existência do ser. Esse absentismo de sentido se manifesta em uma civilização de gratificações instantâneas, onde prazeres efêmeros e substitutos fantasiosos são buscados para preencher o eclipse existencialista que atravessamos. Esses artefatos, com sua aparência de vida mas sem a sua essência, são a materialização desse niilismo. Uma forma de maternidade destilada, das noites sem dormir e das incertezas que acompanham a criação de uma criança. Assim, compromissos de longo prazo são evitados em favor de conexões fluidas e irrelevantes. São o símbolo perfeito: de um "filho" que não exige sacrifício, não cresce, não decepciona — uma solução rápida para o desejo de parentalidade sem o peso existencial de criar um ser autônomo.


"O drama da ausência só é suportável quando aceitamos que o outro é irrecuperável — tudo o mais é fetiche de quem teme se perder." - Dan Mena. Mas, o que levaria a adultos optarem por bebês reborn em vez de filhos reais? A resposta reside em uma combinação de escapismo e controle. Em uma sociedade que valoriza a autonomia e o sucesso individual, a maternidade real é vista como uma ameaça à liberdade pessoal. Filhos exigem tempo, energia e uma renúncia ao ''eu'' que muitos não estão dispostos a fazer. Por outro lado, oferecem uma ilusão de maternidade sem suas demandas: eles são passivos e previsíveis. Essa preferência também nos mostra uma tendência mais ampla de evitar o compromisso. A taxa de natalidade global está em declínio, com países como Japão e Itália registrando quedas acentuadas. No Brasil, a taxa de fecundidade caiu para 1,6 filhos por mulher em 2024, abaixo da taxa de reposição. Paralelamente, o mercado de bonecas colecionáveis, incluindo reborns, está em ascensão. Essa correlação não é acidental: à medida que a criação de filhos reais se torna menos atraente, os substitutos artificiais ou robóticos ganham espaço, oferecendo uma forma de parentalidade que se encaixa na lógica do consumo e da instantaneidade moderna.


"Desejar um filho que nunca cresça é desejar um amor que nunca nos confronte — puro narcisismo embalado em afeto." - Dan Mena. Creio que perdemos a fé nos valores tradicionais e na capacidade de encontrar sentido nas relações autênticas. Essa tendência de uma "dessublimação repressiva", onde o desejo é canalizado para objetos inanimados, procura evitar a complexidade do ''outro'' Em vez de enfrentar as tensões— que exigem amor, paciência e, muitas vezes, dor — os adeptos, optam por uma versão pasteurizada da maternidade, onde o "filho" é uma extensão do ego, não um ser independente. Sem dúvidas, uma crise do cuidado, onde o futuro é incerto e a vida parece desprovida de propósito, o zelo com o outro — especialmente com as gerações futuras — que perdem seu valor. Esses silicones que não exigem cuidado real, são uma resposta cínica a essa decadência: uma forma de performar o afeto sem se comprometer com suas implicações éticas, onde a circunspeção genuína exige reciprocidade e vulnerabilidade, elementos ausentes na relação com objetos inanimados.


"Contra a ditadura da transparência, erguemos um altar ao opaco, o inconsciente é nossa última trincheira contra a colonização do ser." - Dan Mena. Impacto nas Relações e na Sociedade A substituição de filhos reais por bebês de borracha tem implicações catastróficas para as relações sociais. Em primeiro lugar, contribui para o isolamento: adultos que dedicam seu tempo e afeto a objetos inanimados se afastam dessas conexões significativas, preferindo a segurança do artificial à imprevisibilidade. Essa tendência pode levar a uma sociedade mais atomizada, onde as interações são mediadas por acessórios em vez de pessoas. A glorificação dos reborns, distorce a percepção de família para as próximas gerações. Crianças que crescem vendo adultos tratarem bonecas(os) como filhos, irão certamente internalizar uma visão superficial do cuidado, onde o afeto é teatral, não substancial. Isso vai conduzir a uma diminuição na empatia e na capacidade de formar laços afetivos, logo, um ciclo de alienação.

Como a Mídia Glamouriza o Desvio e o Transforma em Tendência
Como a Mídia Glamouriza o Desvio e o Transforma em Tendência.

"Quando a boneca substitui o bebê, não é a infância que retorna, mas a desistência de amar que escapa ao nosso controle." - Dan Mena. Do ponto de vista demográfico, essa predileção por suplentes artificiais pode agravar a queda nas taxas de natalidade, com consequências econômicas e sociais a longo prazo. Uma sociedade que não se reproduz, envelhece, perde dinamismo e enfrenta desafios para sustentar sua estrutura social. Uma consequência lógica de uma cultura que valoriza o espetáculo acima da substância. Romantizando a Loucura no Século XXI A Mídia e a Cultura Pop Transformam os Bebês Reborn em uma Tendência Glamourosa Na sociedade atual, onde a realidade se dissolve em um mar de narrativas midiáticas, o fenômeno das bonecas(os) hiperrealistas vem alimentado por uma cultura pop obcecada por glamour e uma mídia que transforma excentricidades em espetáculo. Elevado de uma curiosidade psicológica a uma tendência aspiracional. Mas o que isso diz sobre nós? Uma romantização que disseca suas implicações psicológicas, sociais e culturais com um olhar crítico e provocador. Em programas de TV, influenciadores vendem essa prática como um ato de cuidado: mas, será que estamos manifestando a criatividade ou maquiando a loucura? ''A glamourização retrata uma sociedade adepta a ilusão e ao confronto com a realidade.'' - Dan Mena.

É o falso desalento, esse que assiste meninos(as) passando fome, frio e necessidade e nada faz para ajudar
É o falso desalento, esse que assiste meninos(as) passando fome, frio e necessidade e nada faz para ajudar.

Transformando Patologia em Performance A mídia é a grande maestrina dessa ópera bizarra. Aparecem como figuras trágicas ou ''diferentonas'', mas raramente como objetos de análise séria. O que deveria ser questionado, é empacotado ao nível do fascínio, como se cuidar de uma boneca fosse um talento digno de ''reality show'', o BBB dos bebes de mentira onde o escenario e a vida cotidiana. Até celebridades entram na dança, Kim Kardashian, por exemplo, já posou com reborns, os transformando em acessórios de moda porque foi provavelmente remunerada para isso. Isso não é pura coincidência. o teórico Guy Debord já alertava sobre a "sociedade do espetáculo", onde o valor de uma coisa reside em sua exibição, não em sua essência. Ao dar holofotes a essa prática, a mídia não só a normaliza como a torna chique. Mas a que custo? Quem precisa de um bebê real quando se pode ter um perfeito, eterno e silencioso?


"Chamam de liberdade o direito de amar sem riscos, eu chamaria isso de covardia emocional institucionalizada." – Dan Mena. A Loucura como Estilo de Vida Idolatramos a individualidade a qualquer preço. A afeição aos reborns é defendida como a tal da "liberdade pessoal", um grito contra as normas. Então acredito que romantizamos a loucura como um ato de rebeldia, mas essa comemoração carrega um lado sombrio. Ao glamourizar o escapismo, enfraquecemos os laços reais. Zygmunt Bauman (2023) já falava a respeito sobre a "modernidade líquida", onde o simulacro substitui o autêntico. E você, meu leitor(a), o que acha? É liberdade ou uma prisão disfarçada de ternura? Até quando vamos aplaudir a insanidade enquanto ela nos consome? Olhe para o reborn e me diga: o que você vê — uma boneca(o) ou o reflexo de um mundo que perdeu o seu rumo? Simulações e a Perda do Real Jean Baudrillard, em ''Simulacros e Simulação'', nos apresenta que vivemos em uma era onde a cópia substitui o original, e a realidade se torna indistinguível da ilusão. Os bebês reborn são a materialização dessa ideia: uma simulação tão detalhada que, para alguns, substitui a experiência real. Eles são o que ele chamaria de "simulacros" — representações que não têm mais relação com a realidade, mas que criam uma ''nova concretude própria'', uma hiper-concepção. Do ponto de vista psicanalítico, vejo uma tentativa clara de lidar com traumas e perdas, onde a ruptura desses vínculos leva a comportamentos compensatórios.

Quando o Marketing Usa Bebês Reborn para Vender Estilo de Vida
Quando o Marketing Usa Bebês Reborn para Vender Estilo de Vida.

Uma sociedade feita de relações efêmeras, onde os compromissos são evitados e o individualismo reina supremo. Nesse contexto, substitutos artificiais para conexões reais, oferecem uma ilusão de companhia sem as demandas necessárias da reciprocidade. Eles são o reflexo de uma cultura exausta de si mesma, incapaz de lidar com o hermetismo das relações verdadeiras. Na era do ''burnout emocional'', onde a ansiedade é epidêmica eles oferecem um provável refúgio, com a depressão marcada pela incapacidade de elaborar perdas e pela busca por gratificações e validação. Com sua promessa de pouco ou nenhum esforço, são uma dessas recompensas ocas, uma fuga da dor que perpetua o vazio.


"Substituímos a fragilidade do outro por objetos dóceis e controláveis, onde esquecemos que só a alteridade pode nos ensina a amar." - Dan Mena. O Trauma e a Memória Inconsciente O trauma não resolvido pode se manifestar de maneiras inesperadas, onde o inconsciente guarda memórias que, embora reprimidas, continuam a influenciar o comportamento. Para alguns, essa mania pode ser uma tentativa de encenar ou reparar seus ''traumas infantis'', como a falta de cuidado parental ou a perda precoce. No entanto, essa repetição compulsiva de falhas de identidade não leva à cura, mas à perpetuação da angústia. Assim, o apego a eles é uma forma de ''acting out'', uma teatralização inconsciente que, embora possa oferecer alívio temporário, impede a verdadeira elaboração da traumatização. Onde a imagem é mais importante que a realidade, eles se tornam protagonistas de uma realidade paralela, lugar, em que a vida será constantemente encenada para o consumo público. Os adeptos, documentam suas rotinas em vídeos e fotos, recebem validação de comunidades online. Essa prática, embora pareça inofensiva, assenta em uma tendência mais ampla de substituir o cuidado real por uma representação. Tais dinâmicas e articulações grupais podem reforçar ditos comportamentos disfuncionais, criando uma metáfora da normalidade que mascara suas patologias subjacentes. Em busca por conforto e controle, trocamos a carne e o sangue pela ilusão do silicone. Tempos de desamparo, onde a dor é evitada a todo custo, mesmo que isso signifique andar a cavalo com a fantasia. No entanto, como falava Freud, ''a negação da realidade tem um preço: ela nos aprisiona em um ciclo de repetição, onde o trauma é perpetuado, nunca superado''.

Vivemos em uma era onde a cópia substitui o original.
Vivemos em uma era onde a cópia substitui o original.

"Quando o real exige mais do que o ego está disposto a dar, escolhemos a boneca — ela jamais nos rejeita." – Dan Mena. F.A.Q - Perguntas Frequentes para o Tema


O que são bebês reborn?

→ Bebês reborn são bonecas hiper-realistas feitas de vinil ou silicone, projetadas para simular bebês humanos com detalhes como pele pintada, cabelos enraizados e pesos internos, mas sem vida ou alma. Por que as pessoas criam ou compram bebês reborn?

→ Algumas pessoas os compram para lidar com luto, solidão ou infertilidade, enquanto outras os veem como hobby ou coleção. Uma tentativa de substituir relações reais por um simulacro controlável. Qual é a crítica principal aos bebês reborn?

→ A crítica é que eles representam uma negação da realidade e um escapismo emocional, refletindo uma geração infantilizada que prefere o conforto de objetos inanimados ao risco de amar seres reais. Como os bebês reborn são usados?

→ Os donos simulam cuidados reais, como dar mamadeira, trocar fraldas, fazer aniversários e até criar certidões de nascimento falsas, ritualizando uma maternidade fictícia. Qual o impacto psicológico dos bebês reborn?

→ Eles podem prolongar o luto ou a solidão, funcionando como objetos transicionais que aprisionam o indivíduo em uma fantasia, em vez de ajudá-los a enfrentar a realidade. Os bebês reborn têm benefícios terapêuticos?

→ Alguns relatam alívio temporário da ansiedade, como em asilos, mas o artigo questiona sua validade, sugerindo que podem cristalizar sintomas e afastar pessoas de relações de verdade. Como a indústria dos bebês reborn funciona?

→ É uma indústria lucrativa que transforma dor em mercadoria, vendendo bonecos em plataformas como Etsy e feiras, explorando vulnerabilidades emocionais com narrativas de adoção. Qual é a relação entre bebês reborn e o niilismo?

→ Um sintoma do niilismo moderno, onde a falta de sentido leva à substituição de valores reais por simulacros que oferecem conforto sem compromisso. Por que chamo os bebês reborn de "falácia do século"?

→ Porque eles simulam maternidade sem vida ou exercício do sacrifício, criando uma ilusão de cuidado que ignora a dor das relações e afetos autênticos. Como a mídia contribui para o fenômeno dos bebês reborn?

→ A mídia os glamouriza como tendência, com influenciadores e celebridades promovendo eles como estilo de vida, transformando patologia em performance e normalizando o absurdo. O que os bebês reborn revelam sobre a sociedade atual?

→ Uma sociedade solitária e infantilizada, que evita a dor e o risco do amor, preferindo o controle e a segurança de objetos inanimados. Os bebês reborn podem substituir filhos reais?

→ Para alguns, sim, pois supõem oferecer uma maternidade sem trabalho ou responsabilidade, enquanto oferecem a indiferença por crianças de verdade em situação de abandono. Qual é a visão psicanalítica dos bebês reborn?

→ Os vejo basicamente como ''objetos transicionais'' ou ''fetiches'' que tentam preencher um vazio inconsciente, negando a falta e a castração, mas fixando o sujeito em uma ilusão regressiva infantil. Como os bebês reborn afetam as relações sociais?

→ Contribuem para o isolamento, afastando pessoas de vínculos e laços, distorcendo a percepção de cuidado, o que leva a uma sociedade mais atomizada. O fenômeno dos bebês reborn é passageiro?

→ Não, ''esquadrinham'' uma tendência da civilização contemporânea, assim como a robotização, denotam uma era marcada pelo encapsulamento e solidão, perda de sentido, sendo mais um sintoma duradouro do que uma moda temporária.

Referências Bibliográficas Bowlby, John – Apego: A Natureza do Vínculo (2002, Martins Fontes)

Winnicott, D. W. – O Brincar e a Realidade (1975, Imago)

Freud, Sigmund – Além do Princípio do Prazer: O Estranho (2010, Autêntica)

Lacan, Jacques – Escritos (1998, Zahar)

Stark, Martha – Trabalhando com a Resistência (2002, Artmed)

Baudrillard, Jean – Simulacros e Simulação (1991, Relume Dumará)

Debord, Guy – A Sociedade do Espetáculo (1997, Contraponto)

Sontag, Susan – Sobre a Fotografia (2004, Companhia das Letras)

Bauman, Zygmunt – Modernidad Líquida (2001, Zahar)

Han, Byung-Chul – A Sociedade do Cansaço (2015, Vozes)

Žižek, Slavoj – Bem-vindo ao Deserto do Real! (2003, Boitempo)

Klein, Naomi – No Logo (2002, Record)

Diniz, Debora – Conflitos de Valor: Bioética em Debate (2005, Editora UnB)

Loftus, Elizabeth – Testemunho Ocular (2010, Contexto)

Safra, Gilberto – Psicose e Laço Social (2004, Escuta)

Souza, Neide Lira de – A Clínica do Objeto Transicional (2016, Casa do Psicólogo)

Birman, Joel – O Sujeito na Contemporaneidade: Espaço, Dor e Desamparo (2006, Civilização Brasileira)

Kehl, Maria Rita – O Tempo e o Cão: A Atualidade das Depressões (2009, Boitempo)

Roudinesco, Élisabeth – Jacques Lacan: Esboço de Uma Vida, História de Um Sistema de Pensamento (2000, Zahar)

Green, André – O Discurso Vivo: A Concepção Psicanalítica da Emoção (2002, Martins Fontes)

Kaës, René – O Sujeito do Grupo: Elementos para uma Teoria Psicanalítica do Grupo (1997, Casa do Psicólogo)

Nasio, Juan-David – O Inconsciente: Um Estudo Psicanalítico (2002, Zahar)

Mijolla, Alain de – Dicionário Internacional de Psicanálise (2005, Zahar)

Ferenczi, Sándor – Primeiras Contribuições à Psicanálise (1992, Imago)


Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Department of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. De 1 a 5 - Quantas estrelas merece o artigo? Deixe seu relato abaixo em COMENTÁRIOS.

 
 
 

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