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O Trauma.

Atualizado: 22 de set. de 2024



“O trauma é uma ferida invisível, cujas cicatrizes moldam nossas relações sociais e a particular jornada interior.” Dan Mena. Por Dan Mena.

Compreendendo o trauma.


O trauma, na visão geral ocorre quando uma pessoa se depara com situações que representam uma ameaça real à sua vida ou integridade física. Acontece se testemunhamos eventos que envolvem morte, lesões graves, roubos, incêndios, ameaça à vida, etc. Esses incidentes evocam reações intensas, como medo, desespero, pavor e horror, frequentemente ultrapassando a nossa capacidade e tolerância de resposta típica, inibindo os mecanismos usuais de defesa. Um evento traumático é caracterizado por sua intensidade e imprevisibilidade, ameaçando a integridade física ou psicológica de alguém incapaz de lidar com ele, resultando em reações dramáticas. A resposta psicológica a um evento dessa natureza é conhecida como “trauma”. A compreensão dessa mecânica psicológica está conectada à evolução de outras; sociais, políticas e culturais, que podem criar um mundo marcado por eles em larga escala, abrangendo questões demográficas, econômicas, territoriais, religiosas, entre outras. No entanto, também se manifestam em níveis micro, como o abuso infantil, estupro, violência de gênero, racismo e outras formas de agressão, levantando questões sobre a moralidade pessoal e familiar, que deixam uma marca emocional duradoura. Essas experiências podem resultar em distúrbios psíquicos, manifestados por sintomas, inibições, ansiedades ou angústias, como ataques de pânico. Ao contrário do'' trauma físico'', que causa lesões visíveis no corpo, o ''trauma psíquico'' é subjetivo e pessoal. Pode ser traumatizante para um sujeito, pode não ser para outro, sua intensidade pode variar amplamente. Por exemplo, o abuso sexual na infância é lancinante para todos, mas como cada um irá vivenciar essa circunstância que determinará seu impacto e gravidade envolve o particular. Essas vivências podem ser reprimidas e se tornarem parte do inconsciente, mesmo que o sujeito não esteja consciente do que ocorre naquele momento.

Boa leitura.


O trauma pela visão psicanalítica.


Proponho lembrarmos que é o trauma do ponto de vista psicanalítico não está ligado necessariamente a um acontecimento trágico, embora possa ser isso também. Tecnicamente, o que chamamos em psicanálise de trauma é uma experiência desagradável e enfadonha, uma vivência que o nosso aparelho psíquico não deu conta de metabolizar, ordenar e compreender. O que a nossa mente faz então quando isso acontece?. Ela se fragmenta, se divide para poder elaborar o evento e isolar o registro, fazendo com que a experiência traumática dessa aflição fique isolada do arquivo experiencial. Destarte, não tem como descartar registros psíquicos definitivamente, o que acontecerá e que nossa psique vai simplesmente manter esse arquivo separado, ele continuará no aparelho mental insulado e apartado. Eis o problema, o registro perturbador não é separado de fato, fica lá, ''stand by''. Por outro ângulo, acontece que nossa mente tem uma forte tendência a integração, então, o mesmo processo que levou o aparelho psíquico a separar o assentamento da ocorrência, (porque no primeiro momento não obteve o sucesso na sua integração), fara novas tentativas cíclicas de retorno, para tentar compreender essa experiência e se restabelecer. Ilhado, esse episódio vai se mover provocando sofrimento, adoecimento e mal-estar, pois para deixar de provocar angústia precisa obter um lugar de anabolismo. Imagine Maria, uma criança pequena vivenciando suas primeiras experiências no mundo. Esses traquejos de deslocamentos vão moldar sua compreensão do ambiente ao seu redor. Agora, considere uma situação como por exemplo, testemunhar ou sofrer um acidente grave de carro. Esse incidente deixará uma marca profunda em sua mente, o que tornará seu trauma complicado. Porque isso acontece?. Quando somos muito jovens ainda não desenvolvemos plenamente a capacidade de expressar nossos sentimentos, afetos e apreensões com palavras. Em vez disso, usamos gestos, expressões faciais e comportamentos para comunicar nossas emoções. Quando Maria passa por esse abalo, não consegue verbalizar essa tensão, o que vai introjetar medo, confusão e tristeza. Essas impressões poderosas ficaram “trancadas” em seu arcabouço mental, gerando efeitos altamente negativos. Com o tempo, dita comoção vai se manifestar de várias maneiras em Maria, como pesadelos, ansiedade, evitando situações sociais de todo tipo, que estarão certamente relacionadas ao acidente. Essas reações serão o resultado das emoções não processadas ligadas ao baque. Nosso trabalho será ajudar Maria a desbloquear essas emoções e revisitar o que está reprimido no seu inconsciente. Isso envolve falar livremente sobre o que a traumatizou, permitindo que ela crie sua narrativa, encontre palavras e forme estruturas para descrever a situação de maneira mais profunda, reempossando, dando um lugar ao acontecimento pregresso. Ao explorar essas emoções dolorosas de forma segura e apoiada, ela poderá começar a lidar com o trauma, o integrando sistematicamente na sua história de vida, de uma maneira que não seja mais avassalador e lhe permita recuperar o controle do processo.


A evolução do conceito.


No início de sua carreira, Freud foi confrontado com relatos frequentes de abuso sexual sofrido por seus pacientes, muitas vezes nas mãos de cuidadores, irmãos, familiares e até pais. Inicialmente, ele desenvolveu a teoria da sedução, que considerava o trauma sexual infantil como causa das neuroses. No entanto, posteriormente abandonou essa ideia, acreditando que ditos relatos de desrespeitos por seus pacientes eram na verdade, mentiras e fantasias. Essa mudança de atitude foi influenciada por várias razões, incluindo suas próprias descobertas de devaneios edipianos ligados aos seus pais e a própria autoanálise. Como resultado, o trauma sexual infantil foi relegado à categoria de fantasias, dando lugar ao desenvolvimento da teoria do ''Complexo de Édipo''. O postulado freudiano sugeriu que eventos agoniantes na infância, incluindo abusos reais e desejos reprimidos, poderiam ser fontes de traumas psicológicos. Compreender a complexidade e seus potenciais efeitos na vida cotidiana, nas relações interpessoais foi primacial para uma intelecção abrangente. Na primeira infância, os processos mentais se caracterizam pela ausência de uma simbolização adequada. Nesse estágio, os impactos traumáticos podem ser particularmente intensos e desafiadores de se processar, devido à falta de capacidade de simbolização. Essa dinâmica melindrosa, envolve tanto elementos do mundo externo quanto do interno do sujeito, desencadeando uma fantasmagórica confusão psíquica. Além disso, esse contexto não apenas coloca o sujeito em uma posição vulnerável, mas também envolve uma condição elementar e precípua: o desamparo. Nesse estágio, a criança ainda não desenvolveu completamente a habilidade de representar suas experiências por meio de símbolos e palavras. Portanto, sua comunicação depende principalmente de expressões não verbais, como gestos e expressões faciais. Esse período inicial da vida desempenha um papel indeclinável na formação da capacidade emblemática e a aquisição linguística do indivíduo. Assim, as repercussões emocionais e aflitivas podem deixar uma marca profunda na psique do infante, uma vez que não sendo elaborados nem integrados de maneira adequada, propiciam a origem dos traumas. Essa ausência de representatividade figurativa vai contribuir para o processo traumatizante.


Freud, se centra na ideia de que o trauma resulta de eventos perturbadores ou experiências que afetam o indivíduo de maneira significativa mediante a seguinte síntese;


Complexo de Édipo: O trauma pode se originar de experiências na primeira infância relacionadas ao Complexo de Édipo, onde a criança desenvolve sentimentos conflituosos em relação aos pais. O trauma sexual infantil foi inicialmente considerado uma fonte de neuroses.


Mudança de perspectiva: Posteriormente abandona a ideia de que o trauma sexual era a principal causa das neuroses e acredita que muitas das histórias relatadas por seus pacientes eram fantasias, não eventos reais.


Fantasia e desejo reprimido: Sugeriu então que o trauma poderia ser resultado de desejos reprimidos ou fantasias que causam conflito psicológico, diante que exitações reprimidas podiam ser tão perturbadores quanto eventos traumáticos reais.


Inconsciente e repressão: Destaca a importância da repressão, onde ditas experiências de comoção ou desejos perturbadores são empurrados para o inconsciente, os tornando inacessíveis à consciência. Essa repressão que causará angústia e sintomas psicológicos.


Complexo de Édipo e trauma: A relação entre o Complexo de Édipo, fantasias sexuais infantis e a inibição de desejos é central na compreensão do trauma na teoria freudiana, pois essas práticas seriam cruciais para o desenvolvimento psicológico e podem desencadear traumas.


Em “Além do Princípio do Prazer”, (1920) ele cita; “O que sofre repetição é sempre um evento, e não o que era doloroso na primeira vez. Esta característica intriga qualquer pessoa que ouça falar disso pela primeira vez; ele parece contradizer nossa expectativa de que o que foi sofrido, e suportado uma vez, não será mais resignado na próxima. Na verdade, o que era espinhoso inicialmente só raramente se encontrará na repetição; o que está em seu lugar é uma representação mnêmica, que não era penoso em si, mas que se torna, ao ser ligado a um certo evento por meio da recordação.”


Lacan reinterpreta a teoria freudiana pelo conceito de; ''O Nome do Pai''.


O “Nome-do-Pai” é uma construção conceitual que representa a função paterna, essa que vai além da figura do pai biológico. Simboliza a entrada da criança na ordem simbólica, ou seja, no mundo da linguagem, da cultura e das normas sociais. Não se refere apenas à figura do pai biológico, mas um ícone da autoridade, a lei e a ordem metafórica que entram em jogo na vida do sujeito. Seria esta responsável por introduzir a criança nessa dimensão, o separando de uma relação simbiótica com a mãe. Isso é essencial para o progresso saudável da identidade e sua psique. O Nome-do-Pai também impõe limites, estabelece regras e normas sociais que moldam o nosso comportamento. Sua função é absolutamente relevante para a regulação das relações entre o sujeito, a mãe e o mundo exterior, sua ausência, fragmentação ou falha podem levar a problemas psicológicos, como angústia e dificuldades na estruturação do self.


A Lei Simbólica:


A “Lei Simbólica” se interconecta ao Nome-do-Pai. No sistema simbólico de signos, significados e normas compartilhadas pela sociedade, aquelas que governam a interação entre os indivíduos. Ela representa a ordem cultural e linguística na qual os sujeitos estão inseridos. Impõe limites, regras e restrições às ações e desejos, influenciando como nos relacionamos e comportamos. A entrada do sujeito nesse contexto ocorre através do Nome-do-Pai simboliza a autoridade e a lei dentro dessa ordem. O trauma, em termos lacanianos ocorre quando há uma falha nessa função do Nome-do-Pai. Isso pode acontecer quando o pai não exerce sua jurisdição de poder ou quando a criança não é devidamente submetida às normas da cultura. Como resultado, a criança pode ficar presa em uma relação fixada e simbiótica com a mãe, onde não há diferenciação adequada entre o self e o ''outro''.


A função paterna e a angústia.


Às relações entre o sujeito, a mãe e o mundo exterior vão ocupar um lugar de destaque, quando dito eixo está enfraquecido ou ausente, a criança pode experienciar angústia. Isso ocorre, porque a falta de limites simbólicos cria um vazio na psique, levando a uma sensação de desorientação e insegurança.


O real e o trauma.


O “Real” como algo que está além da linguagem e da simbologia está correlacionada ao encontro com o Real. Eventos traumáticos podem ser tão perturbadores que escapam à capacidade de simbolização e compreensão conceitual. O trauma é, portanto, uma experiência que permanece inacessível à linguagem e à representação. Como ''ferida narcísica'' significa que irá tocar a imagem e identidade do indivíduo. A colisão com o indigesto pode nos levar a uma sensação de despersonalização, perda de sentido e desintegração do self. Podemos sentir que nossa identidade está fragmentada devido ao trauma. A nossa estrutura psíquica está estruturada como sujeitos em como nos relacionamos com o Real, o Simbólico e o Imaginário. Através do diálogo com o analista, você pode simbolizar e dar sentido às experiências traumáticas. Isso permite uma integração mais saudável e uma relação diferente com o problema.


Em seu Seminário “O Eu na Teoria de Freud e na Técnica da Psicanálise” (1954 – 1955). Lacan cita:


“O trauma não reside apenas no fato dê o que é imaginado tenha acontecido realmente. Está ligado ao fato de que o que aconteceu estava em perfeita conformidade com as representações, em outras palavras; ao fato de que o sujeito tinha pleno conhecimento disso.”


Neste tema gosto de me aproximar de Ferenczi e suas cooperações;


Trauma como afeto: Destacou a importância dos afetos na compreensão do trauma. Ele argumentou que ela não se limita apenas a eventos externos, mas também envolve reações emocionais intensas, como medo, raiva e desamparo. Essas afinidades podem ser duradouras e impactar profundamente a psique do indivíduo.


Apatia emocional: Observou que os pacientes que experimentaram traumas, muitas vezes desenvolviam uma apatia emocional, uma espécie de entorpecimento como mecanismo de defesa. Essa apatia é vista como uma tentativa de proteger a psique da sobrecarga.


Trauma precoce: Explorou o conceito de trauma precoce, enfatizando que negligências ou abuso, podem ter efeitos profundos e duradouros na progressão emocional e psicológica da criança.


Conhecido por sua abordagem empática e inovadora na relação terapêutica, que ele chamou de “análise didática”. Enfatizou a importância de criar um ambiente terapêutico seguro e de apoio para pacientes que sofreram trauma, onde a expressão de afetos reprimidos e a reconstrução da relação com o analista eram centrais para o processo de cura.


Confiança e respeito pelo paciente: Defendeu que os analistas deveriam demonstrar confiança e respeito pelo paciente, reconhecendo a validade de suas experiências e emoções, especialmente quando se tratava de traumas passados. Ampliou a compreensão do trauma na psicanálise ao destacar a importância dos afetos, da apatia emocional, do trauma precoce e da relação terapêutica empática na abordagem e tratamento.


Diferentes formas de traumatizar uma criança:


Para além do amor apaixonado e dos castigos, existe um terceiro meio de dominar uma criança, que é o de lhe impor o terrorismo do sofrimento. As crianças são obrigadas a suportar todo tipo de conflitos familiares, e carregar sobre as suas costas o pesado fardo emocional dos outros membros da família. Não o fazem por puro desinteresse, mas para poderem voltar a gozar a paz que lhes falta e a ternura que lhes está associada. Uma mãe que lamenta continuamente os seus sofrimentos podem transformar o seu filho num colaborador carinhoso, ou seja, um verdadeiro substituto materno, sem considerar os interesses da criança. (Ferenczi 1932).


Em resumo, ele sugere que:


— O trauma é um fenômeno real, mais abundante do que parece à primeira vista.

— Está implicado na dinâmica mental do sujeito, mas é real, aconteceu na realidade.

— Pode ser de tipo sexual, mas também de outros tipos.

— Destaca as más relações com os pais como traumáticas.

— Uma caraterística fundamental, que dá peso patogênico ao traumatismo, é a falta de ressonância do ambiente com a vítima traumatizada.

— As consequências afetam profundamente a estruturação do psiquismo e talvez a soma do sujeito.

— O sujeito se defende desesperadamente contra esta desestruturação, incluindo a identificação com o agressor e o acometedor e a assunção das projeções patológicas dos adultos.

— O analista pode voltar a traumatizar o seu paciente se não conseguir estabelecer uma relação direta com o paciente. Por exemplo, se não reconhecer a sua identidade, nem a suposta verdade das suas afirmações ou se não permite que o mesmo se identifique com suas falhas.


Ao simbolizar o trauma, se abre a possibilidade da transformação, reduzindo o seu impacto negativo na vida do indivíduo. Não se trata apenas de falar sobre os acontecimentos perturbadores, mas de construir novos significados em torno deles. Através da exploração de associações, sonhos e sintomas, procura-se o significado das experiências negativas. É como resultado, esta construção de sentido fornece uma nova perspectiva. Isso permite ao indivíduo integrar o choque na sua história de uma forma menos desconsolada. Todas as formações psicopatológicas, assim como as técnicas normais de controle, têm em comum o objetivo de evitar formas extremas de angústia, algo tão primitivo que só pode ser descrito em termos econômicos. “Esta forma de angústia automática poderia ser caracterizada como o traumatismo inicial, o traumatismo puro, sem sentido, totalmente perturbador” (Baranger 1987). Esta “experiência traumática”, segundo Benyakar, “inundada por uma angústia automática, desprovida de representação, é a lacuna psíquica que impossibilita ao sujeito pensar ou significar um acontecimento ocorrido”. Mas, conforme o que vimos, o trauma envolve sempre as pessoas que nos são mais próximas. A capacidade adaptativa, mesmo de crianças muito pequenas, para responder a ataques sexuais e outros ataques passionais são muito maior do que se imagina. A confusão traumática só é atingida, na maior parte das vezes, quando o ataque é a resposta. (Ferenczi — 1932).


"A tragédia da criança é que ela é completamente dependente dos adultos, enquanto a tragédia do adulto é que ele não compreende, e daí subestima, essa dependência que ele realmente compartilha com a criança."


Nesta citação, Ferenczi destaca como as crianças dependem dos adultos para cuidado e proteção, tornando-as vulneráveis às experiências traumáticas quando esses adultos não estão à altura de suas responsabilidades. Vejamos então, a importância da compreensão por parte dos maiores, pais, cuidadores e familiares dessa dependência infantil incomensurável, para que possamos sempre oferecer um ambiente seguro e apoiar o desenvolvimento saudável.


Traumas primários normais e patogênicos secundários.


Litchman (2000) menciona “défices estruturais primários” neste processo de elaboração, citado por Altmann de Litvan em 1995, fala de traumas primários normais no desenvolvimento e distingue entre “traumas primários normais” e “traumas patogênicos secundários. Os primeiros podem se transformar nos segundos como resultado da interação de influências ambientais negativas e fatores constitucionais. Ao considerarmos estas alterações do self, pensamos que todos estamos expostos a “esse trauma constitutivo precoce o que nos leva a resgatar a ideia da situação traumática, que se diferenciara da do trauma como situação patogênica. Um trauma pode ser entendido como necessário, porque? Ao separar a criança da fusão materna vai lhe permitir uma organização adequada do psiquismo e uma inscrição numa ordem simbólica. Tudo leva a crer que, em tais situações, o referido processo de estruturação e organização do fantasmático infantil teria falhado, dando origem a espaços mais ou menos amplos do psiquismo onde o sentido não pode ser encontrado, o que remeteria para as formas do arcaico. Esta experiência será traumática porque estará inundada de afetos e carente de uma cena, desenvolvendo um défice marcado na capacidade de representação.


Consequências do trauma no adulto.


Repressão: A mente tem mecanismos de defesa que podem levar à repressão de memórias traumáticas. Isso significa que, em alguns casos, o indivíduo pode não se lembrar conscientemente do evento, mas o trauma continua a influenciar seu comportamento e emocionalidade de maneira inconsciente.


Revivência: Em situações de estresse ou quando confrontado com experiências que lembram o trauma, o adulto pode experimentar a revivência do trauma. Isso pode envolver flashbacks, pesadelos e reações emocionais intensas relacionadas ao evento traumático.


Transtorno de estresse Pós-Traumático: A psicanálise reconhece o ''TEPT'' como um transtorno que pode se desenvolver após a exposição a eventos traumáticos. Os sintomas incluem experimentação do trauma, evitação de situações relacionadas ao trauma e sua excitação. A psicanálise entende como o trauma afeta a psique do indivíduo e como esses sintomas podem estar relacionados à repressão e à resistência.


Depressão e ansiedade: Eventos traumáticos estão frequentemente associados a sintomas de depressão e ansiedade. A psicanálise explora como esses transtornos podem ser expressões de conflitos internos relacionados ao trauma não resolvido.


Comportamentos de repetição: Adultos que sofreram trauma podem repetir padrões de comportamento disfuncionais em suas vidas, muitas vezes sem estar cientes do motivo subjacente. Esses comportamentos podem incluir relacionamentos abusivos, autossabotagem ou outras formas de autoproteção inconsciente.


Dificuldades nas relações interpessoais: Traumas não resolvidos podem afetar a capacidade do indivíduo de estabelecer relacionamentos saudáveis. Isso pode manifestar-se em dificuldades de confiança, evitação de intimidade emocional e padrões de relacionamento disfuncionais agressivos.


Busca de significado: Consideramos que o trauma pode levar o indivíduo a buscar significado do evento traumático. A terapia psicanalítica pode ser vista como um processo no qual o paciente explora a interpretação dele e suas implicações na vida presente.


Resiliência e potencial de cura: Embora a psicanálise reconheça o impacto negativo do trauma, também enfatiza o potencial da possível cura. Através da indagação das memórias reprimidas, da expressão emocional e construção de um relacionamento terapêutico seguro, é possível aliviar os sintomas e promover o crescimento pessoal.


Continuamos com às nossas vidas. Crescemos, vivemos novas experiências e nos adaptamos às diferentes perícias que nos chegam. Até que um dia um determinado acontecimento dispara o gatilho da memória desse acontecimento. Isto pode gerar diferentes sintomas. A psicanálise oferece uma visão clara das consequências do traumatismo no adulto, salientando como ditos acontecimentos podem afetar o psiquismo e o funcionamento psicológico. Até hoje, as contribuições de Freud continuam a ser revistas. Assim, autores problematizam suas ideias sobre a origem do tema central, propondo uma diferença entre o trauma mental destrutivo e o afetivo. Propõem estes, que o lance destrutivo não rompe o escudo protetor, mas transgride o princípio do prazer-desprazer. Assim, no decurso do seu domínio posterior se conduz a uma neurose traumática. Um trauma afetivo pode ser evitado sob a regra do princípio do prazer-prazer e conduzir a uma psiconeurose. Ao postular que pode ser tanto destrutivo como afetivo, nossa compreensão de desses acontecimentos externos podem afetar a realidade psíquica de um indivíduo e a mesma ser alargada.


Frases de psicanalistas que refletem o conceito dentro da nossa área de estudo:


“O trauma é o eco do passado que ressoa no presente, demandando atenção e compreensão de quem o vive.” Dan Mena.


“O trauma não é o que aconteceu conosco, mas o que deixou em nós.” Levine.


“Na psicanálise, o trauma é visto como um evento que deixa uma cicatriz na mente, afetando a psique do indivíduo.” Freud.


“O trauma é o encontro com o inesperado que nos deixa vulneráveis e transformados.” Herman.


“A psicanálise nos ensina que o trauma não se limita ao que acontece, mas à forma como o indivíduo lida com o que aconteceu.” Anna Freud.


“O trauma é a sombra que segue aqueles que não enfrentaram suas experiências dolorosas.” Winnicott


“Na psicanálise, o trauma é visto como uma ruptura na continuidade da vida psíquica, que exige um esforço de reparação.” Klein


“O trauma é como uma memória que continua a ecoar na mente, afetando o presente e o futuro.” Janet.


“A psicanálise nos lembra que o trauma não é apenas o que aconteceu, mas como o indivíduo percebe e elabora essa experiência.” Bowlby.


A rota do trauma.


Na jornada da vida, cada um de nós carrega consigo seus traumas, um fragmento importante que transcende as fronteiras do simbólico. Essas feridas emergem como a vivência do desamparo primordial, que não estão necessariamente vinculadas a comoção do nascimento como muitas vezes presumimos, mas sim, sob à insuficiência da linguagem que transborda em expressar nossa essência. Esta é, verdadeiramente a experiência inaugural do ser, uma falha íntima e natural na habilidade linguística em capturar a nossa impossível totalidade. Assim, nos defendemos para não cair na armadilha da psicose. Recordamos, lembramos, evocamos e memoramos, recorrendo à repressão, onde lhe outorgamos significados que se transformam em nossos fantasmas do amanhã. Criamos fórmulas que vão articular os contornos da nossa existência, que desenham o peculiar imperativo modo de buscarmos aprazimento e prazer...o gozo. Desta forma, o sintoma se infiltra como um intruso subversivo do nosso cotidiano, onde buscamos se abrigar em nossas defesas contra o trauma. Então descobrimos que esse excesso no gozo que tanto priorizamos, nos força a se escudar da busca por satisfação, como reféns que somos dos desejos e quereres inconscientes. Esse aspecto perturbador mora no quarto ao lado, o do corpo que goza, utopicamente, também com o traumático. Não há trauma sem uma experiência de satisfação… paradoxal não é?. O caráter dessa aflição não está atrelado à inércia ou indiferença do acometido(a), ele se faz presente em toda nossa extensão fisiológica, marcando um território, querendo uma resposta entre o vazio do real e a resposta simbólica. É assim que toda a narrativa de uma vida pode se construir, em torno desse contingente, que, por força do destino se transforma em algo que pode ser letal, sinistro e trágico para o indivíduo. No cerne dessa complexidade, reside não apenas o desarrimo e a orfandade que nos habitam, mas incluí, a incrível resiliência que nos impulsiona a encontrar significado mesmo nas sombras do trauma, construindo com determinação um caminho em direção à restauração profunda do nosso ser.


Ao poema;


Definitivo — Um poema sobre a dor e o sofrimento — Drummond.


Definitivo, como tudo o que é simples. Nossa dor não advém das coisas vividas, mas das coisas, que foram sonhadas e não se cumpriram.


Sofremos por quê?


Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido junto e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos. Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.


Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um amigo, para nadar, para namorar.


Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em nos compreender.


Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada.


Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar.


Por que sofremos tanto por amor?


O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo razoável, um tempo feliz.


Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um verso:


Se iludindo menos e vivendo mais!!!


A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade.


A dor é inevitável.


O sofrimento é opcional…


Por Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 - CNP 1199 Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 - CBP 2022130

 
 
 

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