Orgasmo Feminino.
- Dan Mena Psicanálise
- 11 de nov. de 2023
- 18 min de leitura
Atualizado: 28 de abr.
O Enigma do Orgasmo Feminino: Como o Amor e a Psicanálise Desvendam o Prazer Feminino.
''Colocar o orgasmo como o ápice da sexualidade, não somente limita o prazer como é o princípio da dificuldade para sua obtenção'' Dan Mena. Por Dan Mena.

O amor no gozo feminino.
A relevância do amor no contexto do gozo feminino tem sido objeto de análise na clínica psicanalítica. A afirmação de Lacan, que; “a única coisa que fazemos no discurso analítico é falar de amor” pode surpreender, uma vez que o senso comum nos associa a exploração do sofrimento humano e ao tratamento de sintomas que impactam a vida. Contrariando essa dimensão comum, nosso discurso não se limita à abordagem científica, que embora prevalecente, deixa de investigar fundamentos como desejo, amor e gozo, assim, como outras formas de manifestação do sujeito. Ao considerarmos o amor como elemento chave, usamos uma abordagem que vai além das fronteiras das narrativas da ciência, exatamente porque acolhemos aspectos essenciais da nossa experiência, muitas vezes negligenciada, inclusive por outras terapêuticas. A própria origem da psicanálise, emerge no contexto da cientificidade moderna e contemporânea, revelando uma resposta à exclusão do sujeito por parte de muitas disciplinas. Nesse sentido, surgimos na clínica para lidar com dimensões subjetivas e afetivas excluídas das investigações. O discurso analítico, ao se dedicar à exploração do amor, reconhece a importância desses elementos na compreensão mais profunda da psique, indo além da abordagem tradicional. Abordar o tema do orgasmo suscita uma certa alegria, especialmente para as mulheres, mas também para os homens, embora de maneiras distintas. Além do prazer inerente, discorrer na perspectiva intrigante do feminino adiciona um elemento extra de gozo assegurado. Contudo, ao adentrar no contexto do discurso psicanalítico, é crucial desassociar o conceito de “gozo” dos paradigmas comuns que o vinculam estritamente ao prazer. Para a psicanálise ele extrapola a ideia convencional de jucundidade, se dissocia dos ideais de bem-estar, equilíbrio ou harmonia. Os psicanalistas o concebemos como algo que surge do defeito, da falha introduzida pela linguagem no funcionamento humano, se transformando naquilo que não opera conforme o esperado e desejado, resultando na desordem, que por sua vez induz ao sofrimento em todos os aspectos existênciais. A extensão do feminino se liga à natureza das expressões do ser, notadamente aquelas fundamentadas nas palavras, essas que afloram como o protótipo do contraste, do ''Outro'', do desconhecido, tanto para os homens quanto para as mulheres. A trajetória da psicanálise se encontra entrelaçada com a experiência com elas. Mulheres desempenharam um papel capital ao abrir as portas do inconsciente para Freud, culminando na descoberta e invenção da psicanálise. Contudo, paradoxalmente, também foram elas que obstaculizaram sua compreensão quando ele empreendeu para descifrar os enigmas da sexualidade feminina. É nele que o feminino escapa a representação, adquirindo uma indefinibilidade, logo, algo incontrolável. O aspecto decisivo reside no fato de que não existe medida que possa abranger como ou em que medida uma mulher goza. Estou falando de algo ilimitado, sem restrições, que não pode ser localizado em uma parte específica do corpo, mesmo que a sexologia persista na busca por um ponto análogo a anatomia da mulher. Essa complexidade inerente à experiência do gozo feminino desafia as tentativas de categorização anatômica e sublinha a necessidade de abordagens mais holísticas na sua compreensão. Boa leitura.
Orgasmo e excitação.
O termo “orgasmo” deriva da palavra grega “orgasmos”, cujo significado está ligado ao conceito de “excitação”; (Freud, 1905). Sob uma perspectiva fisiológica, é descrito como a liberação súbita da tensão sexual acumulada durante o ciclo de resposta sexual, que se manifesta por meio de contrações musculares rítmicas na região pélvica, que simultâneamente proporcionam o prazer. Nos primórdios de suas investigações sobre sintomas histéricos, Freud direcionou sua atenção ao corpo feminino, chegando a afirmar que a vida adulta delas permaneceria num “continente escuro”; (Freud, 1920). A construção da identidade sexual difere substancialmente entre homens e mulheres. Na obscuridade do corpo feminal, reside o vazio, uma ausencia, onde as determinações anatômicas moldam as funções psíquicas e eróticas, gerando, através do olhar do ''Outro'', uma incompletude, sugerindo tal concepção como o ''continente negro feminino'', onde reina a plenitude fálica dos homens. Como Freud (1931) afirmou; “a mulher vive numa escuridão que o homem nunca conheceu, como se ela não tivesse nenhuma experiência do falo”. Enquanto homens enfrentam a ameaça de castração, mulheres vivenciam a certeza da falta, definindo assim sua dinâmica, a busca pelo ausente e a angústia da separação. A mulher é concebida originalmente como destinada ao amor e à autêntica reciprocidade com o homem. Não obstante, um obstáculo biológico limitou o pleno desenvolvimento da sexualidade feminina, uma vez que seus órgãos genitais, (interiorizados), são menos visíveis, ao contrário dos homens (maiormente superficiais). Neste ditado da natureza, mulheres não exploram seus órgãos genitais desde a infância, resultando em uma diversidade única na forma como cada uma experimenta o prazer em seu corpo. Quando nos remetemos historicamente, vemos que a proibição da sexualidade gerava inibições, já na contemporaneidade, mulheres adquiriram maior liberdade sexual e social, diminuindo os sentimentos de culpa que estavam associados a moral da época. Destarte, algumas mulheres ainda vivenciam sua sexualidade de maneira secreta, levantando questões interessantes sobre motivações sustentadas por uma certa clandestinidade que as atraem. Como Freud afirmou; “o inconsciente é o reino do segredo, e a verdadeira natureza do indivíduo só pode ser conhecida através da revelação do inconsciente”. A incompatibilidade entre maternidade e prazer sexual é outro fator importante a ser avaliado, algumas optam por concentrar sua libido nos filhos, e abdicam de outros aspectos de suas vidas, surge então a dicotomia entre ser mãe e ser mulher, colocando um limiar entre ambos. Parece que elas precisam fazer uma escolha, como se a busca erótica e o prazer sexual implicassem numa fronteira, entre agarrar apenas a imagem da mãe pura e assexuada que precisa abrir mão da sua sexualidade.
Para que serve o orgasmo?
Uma companhia sexual satisfatória poderia ser uma boa resposta como elemento essencial para sua obtenção, o que demandaria também interesse, paciência, sensibilidade, inteligência e empatia; segundo (Masters & Johnson, 1966; Kaplan, 1979). Embora varie nas formas como é experienciado individualmente, o orgasmo é comumente caracterizado por um aumento do ritmo cardíaco, sudorese, respiração acelerada, pressão sanguínea máxima e contrações musculares rítmicas na região pélvica, incluindo a vagina, útero, ânus e músculos pélvicos, ocorrendo de cinco a dez vezes em intervalos inferiores a um segundo; (Basson 2005). Mulheres relatam experienciar o mesmo em diferentes partes do corpo, inclusive atingindo múltiplos deles, ampliando a complexidade dessa resposta sexual; (Whipple & Komisaruk, 1991). Após o clímax, se inicia a fase de resolução que vem acompanhada pelo relaxamento corporal, normalização da circulação sanguínea e respiração, acompanhada de uma sensação de prazer, cansaço e, em alguns casos, sonolência; (Basson 2005). A falta de controle sobre a ejaculação precoce, pode resultar na incapacidade masculina de atingir o gozo. Similarmente, a anorgasmia, é a incapacidade de chegar lá na mulher, regularmente ou mesmo nunca, o que destaca a importância da comunicação entre eles para melhorar a prática sexual, aprender a controlar a ejaculação no caso do homem e aumentar a excitação na mulher; (Laumann, Paik, & Rosen, 1999). Contrariamente a uma função fisiológica necessária, o orgasmo feminino é considerado uma dádiva da nossa humanização, ele difere dos padrões observados no reino animal, onde as fêmeas não manifestam o gozo como nas mulheres humanas; (Lloyd, 2005). A variável do tempo aplicado na sua obtenção será sempre fundamental para a excitação que conduz ao orgasmo feminino, muitas vezes facilitado pela masturbação ou por um parceiro paciente e experiente, enfatizando a necessidade do respeito pela mulher como uma variável essencial. Homens e mulheres apresentam diferenças significativas em relação ao orgasmo, sendo os homens mais propensos a conseguir; (Laumann 1999). Ele permanece um tema tabu no mundo ocidental, influenciando a vida sexual de milhões de mulheres e casais devido a estereótipos de gênero e percepções culturais. Embora os mitos de Freud sobre o tema tenham sido refutados pela ciência, persistem na sociedade, impactando a autoestima e confiança delas, bem como atingem negativamente suas relações emocionais. A desmistificação desses mitos é significativa para promover uma visão mais ampla e inclusiva do prazer sexual feminino.
O mistério da sexualidade feminina.
Imerso em certo mistério devido à complexidade inerente à sexualidade, o acesso à identidade delas emerge como um percurso intrincado, pois o orgasmo, como elemento central não se manifesta de forma localizável, carece de um produto visível que ateste sua existência e ocorrência. Por vezes, suscita a possibilidade da sua falsificação, uma farsa que gera confusões em relação à sua dinâmica; (Lacan, 1975). A insegurança permeia a falta de prazer ao transitar de um objeto sexual para outro, alimentando a ilusão de encontrar um homem que sirva como guia na descoberta da própria feminilidade. Assim, a ansiedade desempenha um papel pertinente na busca pelo orgasmo, ao envolver a preocupação em agradar o outro, a apreensão quanto à sua capacidade de atingir o clímax e o estigma associado à visão do sexo como algo proibido, derivado de experiências educacionais ou traumas passados, podem constituir obstáculos de acesso ao prazer. Na perspectiva feminina, há um deleite que a ultrapassa, algo mais do que a ausência do órgão fálico. Lacan destaca, que o gozo feminino não se enquadra na sua dimensão, desconstruindo a identidade do sujeito ao invés de permitir sua identificação. Em contraste, o gozo fálico, com sua localização corporal e características mensuráveis, possibilita a identificação masculina através da colocação em jogo desse prazer; (Lacan, 1975). O clímax feminino, estritamente definido como “não-todo-fálico”, transcende sua própria dimensão, destituindo o sujeito e não permitindo identificações. As mulheres, ao suportarem melhor a frigidez do que os homens, sustentam a impotência, e evidenciam que não identificam a feminilidade matematicamente pela quantidade de orgasmos que possam atingir. Essa desconexão entre orgasmos, números e identidade feminina contribui para a insegurança das mulheres quanto à sua verdadeira feminilidade, perpetuando muitos estigmas sociais. A dedução lacaniana, diferente da freudiana, esclarece a relação entre o gozo e o amor na posição feminina. A incessante busca por ele implica uma necessidade de identificação através do amor de um homem, uma vez que o gozo feminino, ao ultrapassar a mulher como sujeito, a aniquila, a levando a buscar reconhecimento através do afeto. Nesse contexto, a chamada ''pequena morte'' que trata Lacan., como uma ideia por trás do termo, é que o orgasmo sería uma espécie de morte simbólica, uma vez que envolve a liberação de tensões e uma perda temporária de controle consciente. Essa expressão sublinha a natureza paradoxal da experiência sexual, em que há uma entrega temporária do ''eu individual'', uma fusão momentânea com o gozo. O orgasmo é visto como um evento onde o sujeito experimenta uma interrupção momentânea da sua estrutura simbólica e da ordem fálica. A natureza disruptiva e, ao mesmo tempo, vital na experiência orgasmática, implica um extravio provisório de controle, seguida por um retorno à realidade. Seria então a perda simbolizada do gozo que assume nesse lugar uma relevância singular, intensificando a angústia relacionada à transição da posição de sujeito para objeto. Mulheres que experimentam esse gozo em êxtase, demandam o privilégio de serem amadas, pois, ao ultrapassar o sujeito, o clímax feminino não proporcionará sua identificação. O amor, ao contrário, lhe confere identidade, mas a exigência recai na condição de ser amada como única, esperando que o amor masculino lhe confira um valor fálico que o gozo em êxtase não pode lhe outorgar. Essa busca incessante por ser amada, reflete a necessidade de compensar a ausência de identidade proporcionada pelo gozo desejado.
Observações sobre o orgasmo.
1 — A masturbação não é a única forma de atingir o clímax, a estimulação corporal em muitos sentidos é outra forma de chegar ao orgasmo, seja num encontro sexual, quer individualmente ou com outros.
2 — A penetração não é assim tão importante, se estima pelas pesquisas que apenas 20% das mulheres atingem o orgasmo através da penetração, isso significa que 80% delas precisam de estimulação externa para alcançar o ponto e sentir suas sensações.
3 — O stress anula a capacidade orgástica, limitando significativamente a secreção dos hormônios sexuais. Os esteroides, em vez de serem convertidos em hormônios, serão revertidos em cortisol provocando esgotamento e estafa.
4 — O orgasmo pode ser totalmente experimentado nos sonhos. Mulheres conseguem essa experiência psíquica enquanto dormem, mesmo sem qualquer intenção. A função sexual do cérebro feminino continua ativa durante o sono.
5 — Fatores emocionais como a depressão e às preocupações podem interferir na capacidade do seu apogeu.
6 — Comunicação insuficiente ou ineficiente sobre desejos, fantasias ou um desconforto durante o sexo, pode criar barreiras ao prazer, por consequência não chegar ao clímax.
7 — A falta de excitação sexual é fundamental para o orgasmo, se uma mulher não estiver suficientemente excitada, pode ser difícil atingir seu ponto de frenesi.
8 — Problemas de autoestima ou a falta de confiança no corpo podem ter um impacto negativo na experiência sexual.
9 — Condições médicas, doenças neurológicas ou hormonais, podem afetar a resposta positiva.
10 — Alguns medicamentos podem ter efeitos negativos secundários sobre o desempenho sexual, interferindo com a libido.
11 — Traumas sexuais do passado, frustrações e experiências de abandono, podem ter um impacto duradouro na resposta sexual feminina.
12 — Falta de conhecimento sobre o próprio corpo, inexperiência ao não estarem familiarizadas com ele e não saber exatamente o que as excita, são fatores que jogam na obtenção do orgasmo.
13 — A estimulação inadequada, egoismo masculino, egocentrismo, falta de imaginação, ausência de fantasias e variedade nas práticas sexuais podem ser obstáculos ao orgasmo da mulher.
14 — Dificuldades de relacionamento, falta de intimidade, conflitos não resolvidos ou ausência de ligação emocional, podem ter um impacto negativo na resposta sexual.
15 — Danos nos tecidos provocados por cirurgias ginecológicas, como a histerectomia, podem afetar a capacidade de atingir o orgasmo.
16 — Pessoas podem experimentar ansiedade durante o sexo devido a fatores como a educação que recebemos, pressão sobre o desempenho sexual, ideias conservadoras sobre como devemos ou não partilhar nosso corpo, conceitos morais e religiosos. Tudo isto influência a capacidade de desfrutar e serem levados até a lubricidade. Por isso, é importante que as relações sexuais sejam como uma espécie de meditação, se concentrando e focando em sentir o corpo.
A diversidade do orgasmo.
Freud os distinguiu como clitorianos em mulheres jovens e vaginais naquelas com uma resposta sexual saudável. Por outro lado, a sexóloga Betty Dodson os define pelo menos em nove formas diferentes;
1 — Combinados ou mistos, uma variedade de experiências diferentes e misturadas.
2 — Múltiplos, uma série deles, em vez de um num curto período.
3 — De pressão, surgem da estimulação indireta da cominação aplicada, uma forma de autoestimulação.
4 — De relaxamento, resultam de uma descontração e lassidão profundos durante a estimulação sexual.
5 — Orgasmos de tensão, produto da estimulação direta, muitas vezes quando o corpo e os músculos estão tensos.
Há outras formas que Freud e Dodson rejeitam;
6 — Orgasmos de fantasias, resultantes de estimulação mental e psíquica.
7 — Orgasmos do ponto G, produto do excitamento de uma zona erótica especifica durante o ato sexual com penetração, sendo muito diferente dos orgasmos com outros tipos de instigação.
O simbólico e a construção do desejo.
O papel do simbólico na formação do desejo e, por conseguinte, a vivência do orgasmo são levantadas por Lacan em seu Seminário 20. Ele ressalta que “o corpo está em jogo no ato sexual, mas é o corpo investido de significantes”. Nesta frase podemos compreender que o ápice sexual não está apenas inserido como um fenômeno físico, mas é moldado pelos seus elementos culturais e linguísticos que permeiam a libido desde sua inserção nessa ordem simbólica. O falo não é apenas um objeto anatômico, mas um significante que estrutura essa relação do sujeito com sua própria sexualidade, portanto, influenciado diretamente pela entrada da mulher na ordem metafórica e representativa, refletindo toda uma complexidade inerente às dinâmicas psíquicas e na expressão do prazer sexual. Esse imaginário que se liga a construção da imagem corporal, será elaborado e construído através das imagens projetadas, e o orgasmo não escapa a essa lógica. A imagem que a mulher tem de si mesma e a reflexão que os outros têm dela, instigam diretamente essa experiência. Ao analisar seus seminários, percebo que ele faz uma leitura da sociedade, da cultura e expectativas sociais que contribuem para o erguimento do imaginário sexual da mulher. Portanto, não é apenas um evento íntimo, mas uma expressão que reflete as projeções e expectativas culturais relacionadas à sua sexualidade. A dimensão real do orgasmo feminino não pode ser negligenciada, deve ser reconhecido que o seu corpo desempenha uma indispensável participação na bagagem e experiência do prazer sexual. Contudo, essa dimensão é filtrada pela mediação simbólica e imaginária. A análise do real nele enseja um adentrar na compreensão das interações entre corpo, linguagem e psique na busca constante pelo comprazimento. Quanto ao momento do clímax, assume, segundo minha visão, uma dimensão peculiar. Não é meramente um evento fisiológico, mas um instante de vacilação da sustentação simbólico-fálica, uma verdadeira epifania com o Real. Quando falamos do Real em psicanálise não o dizemos no sentido velado, mas algo que está além da percepção, uma visão que podemos atribuir de fato ao feminino. Ao considerar essa sua sexualidade como algo rejeitado, não completamente aprisionado pelo significante e recalque, que nesse aspecto inclui ambos os sexos, onde há um destaque nessa conexão discreta e encoberta com ele. Este elo, comumente associado à mulher, transcende as fronteiras dos gêneros, definindo o desejo e a verdade analítica. Como observa Lacan, “o Outro sexo é a mulher”. Por trás do véu que encobre esse mistério, não há nada - uma declaração que ressoa com a necessidade de compreender a condição para desfrutar do feminino: então, a castração. Entramos assim no “ato de amor”, onde o sujeito não precisa ultrapassar os limites de seu fantasma. Permanecendo em um devaneio, onde o indivíduo evita o encontro direto com o Real, se ligando apenas à parte fálica do outro. Essa dinâmica é sustentada tanto por homens quanto por mulheres, embora Lacan aponte que a feminilidade, de acordo com sua rota, não seja fácil de suportar. Ao considerar essa dificuldade, se observa que as mulheres também deslizam para o lado fálico. Essa posição as leva a tentar o ''outro'', gerando não apenas um desejo comum, mas uma lascívia que extrapola sua consolação fantasmática. O fantasma, por sua vez, é uma tela, um ecrã que impede o encontro direto com essa realidade, mas, paradoxalmente, também deixa o sujeito no limiar desse encontro. Na “lógica do fantasma”, se aprofunda a compreensão do desmaio fálico, uma renovação constante no desvanecer do ser do sujeito, essa experiência, essencial à vivência masculina, comparada ao retorno da “pequena morte”. A função evanescente dele, mais diretamente verificada no gozo masculino, confere ao homem o privilégio da ilusão da pura subjetividade. O homem pode perder de vista a presença do ''terceiro objeto'', perdendo esse elemento crucial na relação do casal. Essa função evanescente, característica do gozo masculino, destaca a fragilidade da subjetividade diante do encontro fugaz com o Real. Essa experiência íntima do feminino na construção do desejo e da verdade analítica, promove uma reflexão crítica sobre o papel do orgasmo na experiência humana, que ultrapassa a visão convencional e adentra no domínio enigmático do Real.
Entender Lacan, é quase um impossível, veja definições que podem ajudar;
''Terceiro Objeto''...em termos práticos, perder de vista a presença desse "terceiro objeto" pode indicar uma dificuldade na compreensão ou reconhecimento de fatores externos que influenciam a dinâmica de um relacionamento. Isso pode levar a mal-entendidos, conflitos, brigas ou dificuldades na relação, uma vez que o sujeito pode estar inconscientemente projetando seus desejos ou lacunas no relacionamento sem plena consciência do impacto do "objeto a" na dinâmica do seu contexto.
“Ato de Amor”… em Lacan não se refere simplesmente a uma expressão física de afeto, mas a uma forma específica de interação psíquica e simbólica entre os sujeitos.
''Fálico''… não se refere apenas à anatomia, mas é crucial na formação da subjetividade e na estruturação do desejo humano. O fálico não é uma simples categoria biológica, mas uma construção simbólica que permeia a linguagem, a cultura e a psique, moldando a experiência do sujeito diante do desejo e da castração.
“Pequena Morte”… em termos lacanianos não se refere à morte física, mas sim à morte simbólica momentânea da identidade consciente durante o ápice do prazer sexual. Essa terminologia contribui para a rica tapeçaria de metáforas e conceitos que ele emprega para descrever a psique humana e suas interações com o desejo e o prazer.
''Real''… não é uma entidade física ou tangível, mas uma dimensão psíquica que desafia a capacidade da linguagem de representar completamente a experiência humana. O Real é um conceito que destaca as limitações da linguagem e a presença de elementos indomáveis e perturbadores na experiência subjetiva.
''Fantasma''… é uma construção psíquica complexa que desempenha um papel fundamental na formação do sujeito e na dinâmica do desejo. Ele reflete a interação entre o imaginário e o simbólico, contribuindo para a compreensão da subjetividade e da experiência psicanalítica.
''Significantes'' não são meros veículos de comunicação, mas elementos essenciais na constituição da subjetividade. Eles não apenas transmitem significados, mas também moldam a experiência psíquica, o desejo e a formação da identidade do sujeito. A análise dos significantes na psicanálise compreenderá as complexas dinâmicas entre linguagem, desejo e estruturação psíquica.
''Objeto''… existem diferentes contextos para descrever aspectos das relações psíquicas e do desenvolvimento do sujeito;
1 — ''De Desejo''…: O conceito de “objeto a” (objeto pequeno a) para se referir ao objeto perdido que se torna um ponto de fixação para o desejo. Esse objeto não é um objeto real, mas sim um simbólico que representa o que falta no sujeito, gerando um desejo constante e muitas vezes inatingível.
2 — Real e Objeto Imaginário: Distinção entre o objeto real (objeto físico, tangível) e o imaginário (construção mental, imagem). O objeto real está associado ao que é material e concreto, enquanto o objeto imaginário se refere à imagem mental que o sujeito constrói e que pode não corresponder completamente à realidade.
3 — Do Desejo: O objeto do desejo está sempre faltando, ausente ou perdido, levando a um constante movimento em direção a novos objetos. Dito elemento do desejo não é fixo e é muitas vezes inatingível, contribuindo para a dinâmica do desejo e da busca constante por satisfação.
4 — Objeto Transicional: Embora mais associado ao trabalho de Winnicott, Lacan também aborda a ideia de um objeto transicional na fase inicial do desenvolvimento infantil. Esse objeto, muitas vezes físico como um cobertor ou um brinquedo, serve como um meio de transição entre a dependência total da mãe e a independência do sujeito.
5 — Objeto na Ordem Simbólica: Se refere aos objetos e símbolos mediados pela linguagem e pela cultura. O simbólico é uma dimensão onde os objetos ganham significado sendo moldados por estruturas linguísticas e sociais.
“Outro”… existem várias instâncias no conceito de “Outro” - “outro” - ''Grande Outro'';
1 — Outro Maiúsculo… O termo “Outro”. Com letra maiúscula usado para se referir à dimensão simbólica, à ordem da linguagem e à cultura. Esse Outro simbólico é onde a linguagem adquire significado, e a identidade do sujeito é moldada por meio do processo de entrar na ordem simbólica.
2 — Outro Pequeno… “outro”. Mencionado com letra minúscula, se refere ao outro como um indivíduo específico na vida do sujeito, como a figura do pai, da mãe ou de outra pessoa significativa.
3 — ''Grande Outro'': A ideia do “Grande Outro” como uma entidade abstrata que representa a totalidade da linguagem e do simbólico. É o domínio onde as leis simbólicas, normas culturais e estruturas linguísticas operam. Também está associado à ideia do Nome-do-Pai, que introduz a ordem simbólica na vida do sujeito.
Frases de psicanalistas;
“O orgasmo feminino é um capítulo íntimo onde mente e corpo se entrelaçam” Dan Mena.
“O orgasmo feminino é um fenômeno complexo que reflete a interação única entre a psique e o corpo, revelando nuances da experiência sexual feminina.” Freud.
“A busca do orgasmo na mulher é uma jornada psicológica intrincada, muitas vezes moldada por fatores inconscientes e desejos reprimidos.” Jung.
“O orgasmo feminino, longe de ser simplesmente físico, é uma expressão profunda da psique, revelando camadas ocultas da vida emocional e afetiva da mulher.” Klein.
“A compreensão do orgasmo feminino exige uma análise das complexidades do inconsciente, onde desejos, medos e experiências passadas convergem.” Lacan.
“O orgasmo na mulher é uma manifestação da libido, um fenômeno que transcende o simples ato físico, mergulhando nas profundezas do inconsciente e da fantasia.” Reich.
“A sexualidade feminina, incluindo o orgasmo, é moldada por forças inconscientes que demandam exploração e compreensão para revelar seu verdadeiro significado.” Chodorow.
“O orgasmo feminino é uma expressão única da psique, refletindo a interação complexa entre as forças do inconsciente e as experiências conscientes.” Horney.
“A busca do orgasmo feminino é muitas vezes influenciada por construções psicológicas profundas, incluindo expectativas sociais, traumas passados e anseios inconscientes.” Yalom.
“O orgasmo feminino, ao ser estudado sob a ótica psicanalítica, revela os meandros da mente feminina, destacando a importância da introspecção e autoconhecimento.” Rank.
“Entender o orgasmo feminino requer uma abordagem holística que integre elementos psicológicos e físicos, desvendando os mistérios subjacentes à expressão máxima da sexualidade feminina.” Anna Freud.
“A psicanálise revela o orgasmo como autoconhecimento, onde cada onda de prazer é parte da experiência sensorial feminina.”
Dan Mena.
Todas as mulheres conseguem experimentar o orgasmo.
Lacan, notadamente devido à sua abordagem e linguagem labiríntica pode parecer ininteligível, pois, presumivelmente para ele, o real não necessariamente demanda uma compreensão. Antes de interpretar seus paradoxos, é imperativo permitir que ressoem na nossa mente suas palavras, e, caso não encontrem eco, aguardemos a próxima tentativa. Cumpre também ressaltar, que as perspectivas psicanalíticas acerca da sexualidade são passíveis de variação, e nem todos os psicanalistas compartilhamos a mesma interpretação e escola. Destarte, é essencial reconhecer que a psicanálise não constitui a única abordagem para a intelecção do orgasmo feminino e outros temas conectados a sexualidade. Disciplinas como a sexologia e a psicologia oferecem perspectivas valiosas. A alegação de que as mulheres supostamente possuem menos necessidades sexuais ressalta a imaterialidade e abstração quanto à sua frequência e nível de importância que elas lhe conferem. Embora seja uma atividade prazerosa, a intensidade do desejo, demanda, exigência e carecimento da sua prática, variam entre indivíduos. Homens e mulheres vivenciam a prática sexual de maneira diferente, para muitas, o desejo está atrelado à ausência de conflitos e problemas com o parceiro. No caso dos homens, essa harmonia simbiótica favorece o surgimento e a manutenção do desejo. Nesse ambiente, ambos os sexos foram culturalmente designados a desenvolver papéis sociais que podem estar distantes de uma sexualidade saudável. A psicanálise destaca a importância de proporcionar uma visão real e saudável dela, mediante uma releitura psíquica e emocional, que considere o corpo, afetos, experiências, desejos e emoções. Finalmente, quero afirmar a ideia de que todas as mulheres podem experimentar o orgasmo, sendo sua diferença mais relacionada à atitude pessoal, educação, religião, informação, verdadeiro querer e resolução sobre a sexualidade. Fundamentalmente o papel do cérebro na percepção de emoções, pensamentos, sensações, fantasias e na construção do mundo erótico é central nesse arcabouço, tanto na forma psíquica quanto fisica. Por fim cabe marcar, que uma persistente ausência de orgasmos, pode estar relacionada com o histórico de desenvolvimento psicossexual da mulher e alguns bloqueios infantis específicos. Se dita tenacidade perseverar uma vez avaliados esses aspectos, vale questionar e investigar a falta de habilidade ou perícia do parceiro(a), que pode ser apontada como uma das causas, uma vez que, com outra pessoa a experiência do orgasmo para ela tenha de fato ocorrido. Mesmo nessas circunstâncias, é possível que a presença do par esteja vinculada a sentimentos de culpa que desencadeiem um obstáculo, barreira e inibição, limitando esse cenário que demandará uma análise psicanalítica ou atenção psicológica, tanto individual quanto do casal.
É sempre no passado aquele orgasmo, é...
Carlos Drummond de Andrade.
É sempre no passado aquele orgasmo,
é sempre no presente aquele duplo,
é sempre no futuro aquele pânico.
É sempre no meu sono aquela guerra.
É sempre no meu trato o amplo distrato.
Sempre na minha firma a antiga fúria.
Sempre no mesmo engano outro retrato.
É sempre nos meus pulos o limite.
É sempre nos meus lábios a estampilha.
É sempre no meu não aquele trauma.
Sempre no meu amor a noite rompe.
Sempre dentro de mim meu inimigo.
E sempre no meu sempre a mesma ausência.
Até breve, Dan Mena.
Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 - CNP 1199
Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 - CBP 2022130
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