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“OPPENHEIMER e a Culpa do Criador: Uma Leitura Psicanalítica Sobre Poder e Superego” by Dan Mena.

Oppenheimer e a Culpa do Criador: Uma Leitura Psicanalítica Sobre Poder e a Tirania do Superego
Oppenheimer e a Culpa do Criador: Uma Leitura Psicanalítica Sobre Poder e a Tirania do Superego.

A Sombra da Criação e o Tribunal da Consciência

Como psicanalista e pesquisador da psique, sou constantemente confrontado com essa dança entre o desejo de criar e o peso moral de suas consequências. O cinema usa uma lente poderosa sobre a nossa condição, geralmente nos oferece narrativas que trazem à tona os conflitos mais íntimos da nossa vida. Poucas obras recentes o fizeram com a intensidade de Oppenheimer (Syncopy Inc., Atlas Entertainment, 2023), dirigido com excelente maestria por Christopher Nolan. Mais do que uma cinebiografia sobre o físico J. Robert Oppenheimer, o filme é um estudo feroz de caso psicanalítico monumental, onde a gênese da culpa confronta e desmonta a tirania do Superego.

Provavelmente muitos devem saber que Oppenheimer foi o "pai da bomba atômica", ele personifica o arquétipo do ‘’Criador Prometeico’’, aquele que rouba o ‘’fogo dos deuses’’, o que estaria metaforicamente para o conhecimento nuclear e, por isso, condenado a um sofrimento eterno. "A sombra da criação é a culpa, ela é o preço psíquico que o gênio paga por ter ousado brincar com o fogo dos deuses." - Dan Mena.

O Tribunal da Consciência: Como o Superego de Oppenheimer Condenou o Pai da Bomba Atômica.
O Tribunal da Consciência: Como o Superego de Oppenheimer Condenou o Pai da Bomba Atômica.

O manejo da história não se limita a registrar fatos históricos, senão que esbofeteia nossa natureza diante do poder absoluto. Para explorarmos as vertentes psicológicas que moldaram a vida e a consciência de um homem que, ao alcançar o ápice da ciência, precipitou a humanidade em uma nova era de terror existencial nunca antes visto.

Quero rever a estrutura psíquica por trás dessa tragédia horrível, bárbara, cruel e impiedosa. O foco recai sobre o conceito freudiano de Superego, essa instância moral e crítica que, em Oppenheimer, se manifesta com uma ferocidade destrutiva, transformando a glória da criação em um inferno pessoal de culpa inconsciente. Vou analisar como o poder científico, político e destrutivo pode atuar como filtro catalisador desse conflito interno, e como a culpa do criador se torna a sombra inescapável de seu triunfo.

O filme, portanto, não é apenas sobre a bomba; é sobre o mal-estar na civilização (Freud, 1930), a tensão eterna entre a pulsão de vida, a ciência e o conhecimento, e a pulsão de morte, a destruição e a guerra. É uma obra que nos força a questionar: O que acontece quando o gênio se depara com a moralidade de sua própria invenção? Como o Superego sádico pune o Ego que ousou brincar de Deus? "O Superego sádico não é um juiz de moralidade, mas um carrasco da onipotência, exigindo a expiação do Ego que se excedeu." - Dan Mena. Contudo, antes de entrar na mente do criador, acho justo é necessário compreender o cenário que o moldou. O mundo estava em colapso, a Europa ardia sob o delírio totalitário de Hitler, e a racionalidade tinha sido sequestrada por uma pulsão de morte coletiva. Freud, se ainda estivesse vivo em 1945, talvez reconhecesse nesse período o triunfo do Thanatos sobre Eros, a civilização rendida ao gozo da destruição. Milhões de judeus, ciganos e dissidentes eram exterminados em campos de concentração que negavam não apenas a vida, mas o próprio sentido de humanidade.

Do Gênio à Culpa: A Jornada de Oppenheimer sob a Lente da Psicanálise Contemporânea.

Portanto, isso não pode ser separado, muito menos esquecido. A corrida científica pela bomba atômica não nasceu apenas do desejo de poder, mas também do medo. O pavor de que o conhecimento caísse nas mãos erradas, e que o próprio mal se tornasse soberano sobre o nosso planeta. O Projeto Manhattan, foi também uma resposta desesperada da razão diante da barbárie.


Mas aqui reside o paradoxo que iria atormentar Oppenheimer: até que ponto o “último remédio” não se converteu na própria doença? Ao deter o monstro nazista, o homem criou um poder ainda mais aterrador, cuja sombra persiste até os dias atuais. A arma que pôs fim à guerra inaugurou outra, a guerra interior entre culpa e necessidade, ética e sobrevivência, ciência e consciência.


Me acompanhe neste artigo pelos dédalos da mente de Oppenheimer, onde a física quântica se encontra com a psicanálise contemporânea, em busca de uma compreensão esclarecedora sobre o preço da criação. "O poder absoluto não corrompe o homem, ele apenas revela a fragilidade do Ego diante da pulsão de morte liberada." - Dan Mena.

Narcisismo, Inveja e a Bomba: A Análise Psicológica Definitiva dos Personagens de Oppenheimer.
Narcisismo, Inveja e a Bomba: A Análise Psicológica Definitiva dos Personagens de Oppenheimer.

Oppenheimer: Gênio, Narcisismo e a Gênese da Culpa

A figura central de Oppenheimer é um mosaico de enormes contradições, um perfil psicológico fascinante que o filme de Nolan disseca com uma precisão absolutamente cirúrgica. Desde os primeiros flashes de sua juventude, mostra seu intelecto brilhante, mas também uma personalidade introvertida e complicada. Seu espírito científico, capacidade de síntese e liderança, é inseparável de uma fragilidade emocional e de tendências depressivas que o acompanharam ao longo da sua existência.

Claramente um narcisista ferido que busca na realização científica e no reconhecimento público uma forma de compensar um vazio interno ou uma falta de matriz estrutural. Sua ambição desmedida para concluir o ‘’Projeto Manhattan’’ não é apenas um imperativo patriótico, mas também uma busca ininterrupta por validação do seu Ego enorme. O poder, nesse prisma, é a droga que anestesia sua angústia. A criação da bomba, o ápice de seu triunfo, é a satisfação máxima de um desejo de onipotência que, no entanto, vai carregar em si o germe da sua ruína. "A inveja, quando elevada à esfera do poder, se transforma em política de destruição, buscando aniquilar o mérito que não pode alcançar." - Dan Mena.

O filme ilustra de forma magistral o momento em que a glória se transmuta em horror. A explosão em Alamogordo, quando diz…"agora eu me tornei a Morte, o destruidor de mundos", marca a gênese traumática da sua culpabilidade. Essa autoria assumida não é apenas um remorso consciente, ela vai se instalar no inconsciente e será internalizada por uma instância psíquica que Freud chamou de Superego. Ele é formado pela internalização das proibições e ideais parentais e sociais, vai se solidificar em Oppenheimer como seu agente crítico implacável.

A culpa do criador é, portanto, a reação do seu Ego à tirania do Superego sádico. O Superego de Oppenheimer, antes talvez de um ideal por perfeição científica, se transforma em um juiz severo que o condena pelo ato de uma criação abominável. O peso moral de Hiroshima e Nagasaki não é apenas um fato histórico da segunda guerra mundial, mas uma projeção interna que o assombra em visões e pesadelos. A luta de Oppenheimer é a luta do Ego, esmagado entre as demandas do Id, a pulsão de conhecimento e poder, e a punição incessante do seu Superego. Sua subsequente oposição à bomba de hidrogênio e seu ostracismo político podem ser lidos como uma tentativa desesperada de reparação, um esforço para silenciar o tribunal interno que o julga sem dor nem trégua. A psicologia do poder expõe, que a maior ameaça a um homem não é o seu inimigo externo, mas a voz interior de sua própria condenação. "A angústia existencial do criador é a certeza de que sua obra, uma vez liberta, carrega em si a possibilidade de sua própria ruína." - Dan Mena.

Vamos aos primeiros questionamentos;

O gênio de Oppenheimer era uma sublimação de sua angústia existencial, ou a própria causa dela?

De que forma sua busca por validação externa, o narcisismo, o tornou vulnerável à manipulação política e à subsequente autodestruição?

A culpa sentida por Oppenheimer era genuinamente moral ou uma manifestação de um Superego excessivamente punitivo, independente da moralidade do ato?A culpa que o consumiu após Hiroshima foi realmente uma resposta ética ao horror causado, ou a expressão de um Superego sádico, que o punia por ter ultrapassado o limite simbólico entre o humano e o divino?


"O Superego, quando armado com a onipotência da criação, transforma o triunfo do Ego em seu mais íntimo e implacável algoz." - Dan Mena.

A Inveja como Motor da Destruição

O filme não seria completo sem a contraparte sombria e política do protagonista Lewis Strauss, interpretado por Robert Downey Jr. Se Oppenheimer lida com sua culpa interna, Strauss é a personificação do Superego externo, o agente social e político que executa tal punição. Sua análise psicológica revela um estudo sobre o narcisismo ferido e como a inveja pode se tornar um motor de destruição social e pessoal. Strauss, um homem de negócios e político, não possui o brilho intelectual imediato de Oppenheimer. Sua relação com o físico é marcada por uma adulação ressentida que rapidamente se converte em rivalidade. Tal ponto de inflexão retratado, é a humilhação pública que Strauss sente quando Oppenheimer ironiza sua posição e seu conhecimento em um evento. Esse momento trivial, atinge o Ego de Strauss em seu ponto mais sensível, a necessidade de ser reconhecido como igual ou superior ao gênio. "O Mal-Estar na Civilização é a neurose coletiva que se manifesta quando a tecnologia ultrapassa a capacidade ética da humanidade." - Dan Mena.

A inveja, vista pela perspectiva kleiniana, é o sentimento de raiva de outra pessoa por possuir algo desejável e o impulso de estragar ou eliminar esse objeto. Strauss tem ciúme da autoridade inquestionável de Oppenheimer, sua aura de sumidade e a facilidade com que ele navega nos círculos acadêmicos e políticos. A inveja, não resolvida, se transforma em ódio persecutório. A campanha de Strauss para descredenciar Oppenheimer, termina na cassação de sua autorização de segurança, é uma vingança narcísica meticulosamente planejada. "A lealdade incondicional, em um mundo de traições, é a última âncora do Ego contra o naufrágio na melancolia da culpa." - Dan Mena.

O Mal-Estar na Civilização Nuclear: Uma Visão Psicanalítica da Tragédia de J. Robert Oppenheimer.
O Mal-Estar na Civilização Nuclear: Uma Visão Psicanalítica da Tragédia de J. Robert Oppenheimer.

O poder para Strauss é o instrumento de reparação do Ego ferido. Ele usa sua posição na Comissão de Energia Atômica não para servir ao país, mas para aniquilar a fonte de sua humilhação. Strauss age como o Superego sádico de Oppenheimer, mas projetado para o exterior. Ele é a materialização da força punitiva que por sua vez, internaliza. A dinâmica entre os dois personagens retrata uma reflexão: Oppenheimer, o criador atormentado pela culpa; Strauss, o destruidor movido pela inveja e pelo ressentimento.

A trilha de Strauss é que, ao tentar destruir a reputação de Oppenheimer, ele acaba por denegrir a própria imagem. O filme encerra seu arco com a rejeição de sua nomeação ministerial, um fracasso público que denota a natureza mesquinha e vingativa de suas ações. A psicologia do poder demonstra que o controle sobre o outro é uma tentativa desesperada de controle sobre a própria insegurança. O ressentimento, quando elevado à esfera do poder político, tem a capacidade de desmantelar a vida de um indivíduo e, em última instância, corromper a própria justiça. "A responsabilidade não se mede pela intenção, mas pela irreversibilidade da consequência, a culpa é a marca desse ato." - Dan Mena.

Vamos refletir;

A rivalidade entre Strauss e Oppenheimer é um mero conflito político ou uma manifestação da eterna luta entre o gênio e a mediocridade ressentida?

De que maneira a humilhação pública sofrida por Strauss serviu como gatilho para a liberação de uma pulsão de morte destrutiva direcionada ao outro?

O fracasso final de Strauss em ser confirmado no cargo é a punição social por um Superego coletivo que, tardiamente, reconhece a injustiça?


"A inveja é o veneno lento que corrói o mérito alheio, transformando o ressentimento pessoal na mais perigosa das políticas." - Dan Mena.

O Hermetismo Feminino, Lealdade e a Sombra da Autodestruição

Kitty Oppenheimer interpretada por Emily Blunt é uma figura que, embora secundária na história da bomba, é central na estrutura psicológica do filme. Ela é a esposa-sombra, a companheira que absorve a turbulência e as contradições de Oppenheimer. Na minha análise, vejo uma mulher complexa que vai além do papel de coadjuvante, traz temas como autodestruição, lealdade incondicional e a frustração do potencial feminino em um mundo masculino e bélico.

Com um histórico de múltiplos casamentos, alcoolismo e uma carreira científica em biologia e botânica interrompida, Kitty é instável, sua atração por Oppenheimer pode ser enxergada como uma busca por um parceiro que espelhe sua própria intensidade. A lealdade feroz que ela demonstra, especialmente durante os inquéritos de segurança, é um mecanismo de defesa e, ao mesmo tempo, uma forma de reparação de suas próprias falhas. Ao lutar pela honra de Robert, Kitty encontra um propósito e uma identidade que sua vida profissional e pessoal não lhe proporcionaram. "A busca por reconhecimento é o caminho mais curto para a humilhação, pois expõe o Ego à voracidade da inveja alheia." - Dan Mena.

O alcoolismo de Kitty é uma manifestação de sua angústia e de um Superego interno que a pune por suas escolhas e frustrações. O ambiente de Los Alamos, onde seu potencial científico foi relegado ao papel de esposa de cientista, intensifica essa desilusão. Ela é a figura materna e a parceira intelectual, mas também a mulher silenciada pela história, onde sua força e vulnerabilidade coexistem em um conflito psíquico permanente.

A dinâmica do casal é base para a leitura psicanalítica do filme. Se Kitty funciona como um ponto de ancoragem para o Ego instável de Oppenheimer, é também uma sombra de sua própria escuridão. A cena em que ela o confronta sobre sua passividade durante o inquérito é um momento de transferência de força. Ela o motiva a assumir uma postura ativa, a lutar, em vez de se render ao masoquismo imposto pelo Superego externo (Strauss) e interno (a culpa). "A tragédia do gênio é ver sua criação se tornar o instrumento de seu próprio tormento, um espelho transparente da sua falha moral." - Dan Mena.

O intrincamento feminino em Kitty reside na forma como ela lida com o poder destrutivo que seu marido criou, que ao contrário de Robert, que se afunda na culpa, ela adota uma postura pragmática e defensiva. Sua lealdade não é cega, mas uma escolha consciente de proteger o homem que representa, para ela, a possibilidade de redenção. Ela é a força pulsional que impede o colapso total do Ego de Oppenheimer, uma presença feminina essencial nessa tragédia.


O alcoolismo de Kitty é uma fuga da realidade ou uma manifestação de um Superego feminino que a pune pela frustração de seu potencial?

A lealdade incondicional de Kitty a Robert é um ato de amor ou uma identificação projetiva buscando a redenção através dele?

De que forma a estrutura social da época contribuiu para a autodestruição de Kitty, ao limitar seu papel ao de esposa de cientista?


"A lealdade, quando forjada na turbulência da alma, é a âncora que impede o Ego de naufragar no mar da autodestruição." - Dan Mena.

A Ilusão de Controle e o Despertar do Superego

O filme é uma meditação sobre o poder e suas implicações psíquicas. O poder científico de Oppenheimer, a capacidade de liberar a energia do átomo, é a manifestação máxima da onipotência, um conceito que na psicanálise está ligado ao narcisismo primário e à ilusão de controle. A crença de que o conhecimento absoluto confere o direito ou a capacidade de manipular as consequências é a falha trágica do protagonista.

A ilusão de controle é a primeira vítima da criação da bomba. Oppenheimer e sua equipe, estão imersos no Projeto Manhattan, operam sob a crença de que estão apenas lidando com a física, com a ciência pura. O aspecto moral e o impacto social são sublimados ou relegados a uma segunda ordem. Essa negação da realidade é um mecanismo de defesa do Ego para lidar com a magnitude aterrorizante do que está sendo criado por eles. A onipotência do cientista reside na sua capacidade de criar o fim do mundo, e essa aptidão, paradoxalmente, o torna o mais fragilizado e vulnerável. "Toda grande criação tecnológica é um sintoma da pulsão de morte, um desejo de transcender a finitude pela via da destruição." - Dan Mena.

Do Gênio à Culpa: A Jornada de Oppenheimer sob a Lente da Psicanálise Contemporânea.
Do Gênio à Culpa: A Jornada de Oppenheimer sob a Lente da Psicanálise Contemporânea.

O despertar do Superego ocorre no momento exato em que a onipotência derrete. A visão de Oppenheimer após o teste Trinity, onde ele vê os efeitos reais da bomba, é a ruptura do Ego com sua ilusão. O Superego, que estava adormecido sob o manto da ambição e do imperativo científico, emerge com força bruta e total. Ele se manifesta como o juiz interno que grita: "Você se tornou a Morte". Esse é o momento em que o ideal do Ego, o cientista que salva o mundo e colide violentamente com a realidade do ato.

A psicologia do poder nos revela que o poder absoluto não corrompe apenas o indivíduo, ele desmantela a estrutura psicológica que não está preparada para lidar com tal responsabilidade moral. O Superego de Oppenheimer, ao se tornar sádico, imprime a resposta interna à falha do Ego em integrar a responsabilidade ética à onipotência científica. A culpa, nessa direção, é a ferramenta do Superego para restaurar a ordem moral, mesmo que isso signifique a autodestruição do Ego.

Sob a luz de uma leitura contemporânea quanto ao poder, a psicanálise nos lembra que toda criação carrega um lado sombrio e tenebroso. O poder destrutivo da bomba é uma miragem do poder de aniquilação que reside em cada um de nós, a pulsão de morte (Freud, 1920) que a civilização tenta, em vão, reprimir. Oppenheimer, ao liberar a energia nuclear, concede também a pulsão de morte em sua própria psique, se tornando o paciente zero. "O silêncio do criador, após a explosão, é o grito mais alto da consciência, a linguagem da culpa que não encontra palavras." - Dan Mena.

A onipotência científica é uma forma de megalomania que inevitavelmente leva à culpa quando confrontada com a realidade?

O filme sugere que a ilusão de controle é um mecanismo de defesa necessário para que atos de tamanha magnitude possam ser realizados?

Como o Superego sádico de Oppenheimer se relaciona com o mal-estar na civilização que ele próprio ajudou a criar?


"O poder absoluto não é a liberdade, mas o cárcere mais íntimo onde o Ego é julgado pela tirania de seu próprio Superego." - Dan Mena.

O Superego Sádico e a Necessidade de Punição

A culpa que habita Oppenheimer não é um mero arrependimento, é uma força psíquica ativa e destruidora, manifestada pela ação de um Superego sádico. Na psicanálise, o Superego, além de ser a instância moral, pode se tornar excessivamente cruel e punitivo, levando o indivíduo a uma necessidade inconsciente de sanção. O filme retrata essa dinâmica de forma palpável, quando transforma o inquérito de segurança em um tribunal psíquico.

A destruição de Oppenheimer começa muito antes do inquérito, seu envolvimento com figuras controversas, seu histórico de instabilidade emocional e suas escolhas políticas arriscadas podem ser lidos como os atos falhos da sua personalidade ou mesmo, comportamentos masoquistas que convidam à punição. O Ego, atormentado pela culpa, busca a expiação através do sofrimento. Dita inquirição orquestrada por Strauss, é o palco externo onde essa necessidade de castigo é satisfeita.

O Superego cruel de Oppenheimer, internalizado e implacável, encontra em Lewis Strauss e no sistema político americano seus agentes externos de expiação. O inquérito não é apenas uma investigação de segurança, é um ritual de humilhação e desmantelamento do Ego. Oppenheimer, em sua passividade, parece se render a esse processo, aceitando a sentença de seu Superego. Ele se torna o objeto de sacrifício necessário para que a sociedade americana, e sua própria psique possam lidar com a ansiedade gerada pela bomba. "A figura do inimigo externo é, geralmente, a projeção do nosso próprio Superego interno, o juiz que não ousamos confrontar." - Dan Mena.

A culpa, segundo Freud, é a tensão entre o Ego e o Superego, quando o Superego se torna excessivamente severo, o Ego se sente culpado mesmo antes de cometer o ato, ou a culpa é desproporcional ao erro. No caso de Oppenheimer, a culpa é existencial, quando ele se sente réu por existir e por ter tido o poder de criar tal demolição. Essa culpa o leva a uma melancolia e a uma retração que o isolam e o tornam fraco e vulnerável. A leitura que faço é a de uma catarse dolorosa. Ao ser despojado de sua honra e de seu status social, Oppenheimer é forçado a confrontar sua criação. A punição funciona como um mecanismo perverso de alívio da culpa. O Superego, ao castigar o Ego, temporariamente silencia sua tirania.

O Olhar Contemporâneo: Oppenheimer e o Dilema da Criação Tecnológica.
O Olhar Contemporâneo: Oppenheimer e o Dilema da Criação Tecnológica.

No entanto, o filme sugere que tal autoria é de fato uma ferida narcísica incurável. Mesmo após o inquérito, a imagem do desmantelamento e a voz de seu Superego o continuam a perseguir. O drama de Oppenheimer é a de um homem que não consegue se perdoar, porque sua concepção ultrapassou os limites da moral.

A passividade de Oppenheimer durante o inquérito é um sinal de fraqueza ou uma rendição masoquista à punição exigida por seu Superego?

O Superego sádico de Oppenheimer é uma projeção do medo e da ansiedade coletiva da sociedade americana diante da ameaça nuclear?

A necessidade de punição é o preço que o gênio deve pagar por sua onipotência e por transgredir os limites morais da criação?

"A tirania do Superego é a prova de que a maior prisão do homem não são as grades externas, mas o tribunal implacável erguido em sua própria consciência." - Dan Mena.

A Ética da Criação e o Mal-Estar na Civilização

Avaliar Oppenheimer extrapola a psique individual para tocar em questões cruciais da psicologia social e da ética. O filme é um poderoso comentário sobre o Mal-Estar na Civilização (Freud, 1930), a tensão inerente entre as exigências da vida pulsional e as restrições impostas pela sociedade. A bomba atômica é a materialização máxima desse estado. A civilização é construída sobre a renúncia pulsional e a internalização da agressão, que se torna o Superego. No entanto, a bomba atômica representa o fracasso dessa renúncia, a liberação da agressão em uma escala sem precedentes. O poder destrutivo não é mais apenas uma fantasia inconsciente, é uma realidade tecnológica que ameaça até os dias atuais a nossa existência. "A ansiedade sobre a Inteligência Artificial é a reedição da culpa nuclear, um pavor do poder que criamos e não podemos mais conter." - Dan Mena.

A Sombra da Criação: Poder e Destruição na Psique de J. Robert Oppenheimer.
A Sombra da Criação: Poder e Destruição na Psique de J. Robert Oppenheimer.

A ética da criação é o cerne do dilema de Oppenheimer. O cientista, tradicionalmente visto como um ser neutro, dedicado à busca da verdade, é confrontado com a responsabilidade moral de sua invenção. O filme questiona se a ciência pode ser separada de suas implicações políticas e sociais. Na minha opinião a resposta, dolorosamente, é não. A culpa do criador é, portanto, uma responsabilidade social inescrupulosa, o peso de ter colocado nas mãos de pessoas um poder que não estamos psiquicamente preparados para gerenciar. "A ilusão de controle é o mecanismo de defesa que permite ao Ego realizar o ato, mas a realidade é o despertar brutal do Superego." - Dan Mena.

Essa perspectiva social do filme é reforçada pela figura de Lewis Strauss, que representa a jurisdição política que instrumentaliza a ciência. O conflito entre Oppenheimer e Strauss é a luta entre a ética da responsabilidade, a culpa do cientista e a ética da convicção, vista como a ambição política. O sistema, ao punir Oppenheimer, tenta extrair a culpa coletiva e restaurar uma ilusão de ordem moral. Ao fazer do gênio um pária, a sociedade tenta se convencer de que a culpabilidade reside no indivíduo, e não na própria estrutura de poder que exigiu a bomba como instrumento ‘’pacificador’’. A Era das Tecnologias Autônomas e a Reedição do Erro

Aqui me detenho um instante para lançar um olhar contemporâneo sobre o desenvolvimento de outras tecnologias atuais. O tempo passou, mas o dilema permanece o mesmo. A bomba atômica talvez tenha sido apenas o primeiro prenúncio de uma longa série de invenções que desafiam os limites éticos. Hoje, estamos diante de um espelho perigoso, a ascensão da inteligência artificial, das biotecnologias e das armas autônomas. Essas novas forças, concebidas sob o ideal de progresso e eficiência, reacendem a velha tensão entre o desejo de dominar a natureza e o medo de perder o controle sobre aquilo que criamos.


A inteligência artificial, ao imitar o pensamento humano, toca em um ponto sensível da psicanálise, a ilusão de que a razão pode existir sem o inconsciente. As biotecnologias, por sua vez, brincam com o nosso código genético como se fosse uma extensão da vontade, enquanto as armas autônomas inauguram o pesadelo da destruição sem culpa, a morte sem sujeito.


O mesmo impulso de Prometeu que moveu Oppenheimer continua pulsando nos laboratórios digitais. A ameaça não está apenas nas máquinas, mas na cegueira emocional de quem as concebe. Talvez o nosso próximo erro não seja uma explosão nuclear, mas o silêncio, o momento em que a criação já não precisa mais de um criador para agir.


O abismo que Oppenheimer avistou em 1945 pode estar se abrindo novamente, só que, desta vez, dentro dos circuitos da própria consciência coletiva. Como um tema atemporal que se renova a cada avanço tecnológico, vemos que os mesmos sempre incluem na sua proposta avançar os limites morais. Oppenheimer é um alerta de que a pulsão de morte é uma força sempre presente no ser, e que o Superego que nos habita como raça pode ser tão sádico e destrutivo quanto o individual. Aparentemente a única salvação possível reside no uso da consciência ética e na responsabilidade que acompanham o poder de criar.

A culpa do criador é uma neurose individual ou um sintoma social do Mal-Estar na Civilização diante da ameaça nuclear e outras tecnologias que já estão presentes?

O poder político manipula de fato o poder científico para desviar a culpa coletiva para o indivíduo?

Qual é a ética da criação que o filme nos impõe, e como ela se aplica aos avanços tecnológicos contemporâneos?

"A civilização é um pacto frágil contra a pulsão de morte, e o gênio que a desarma com sua criação se torna o primeiro a ser julgado pelo tribunal da história." - Dan Mena.

O Legado da Culpa e a Redenção Impossível 

O cerne do drama trágico de Oppenheimer está radicalmente assentado na questão da responsabilidade. O filme nos força a ponderar; Onde termina a responsabilidade do cientista e começa a do político? A psicanálise ensina que a responsabilidade não é apenas um conceito legal ou social, mas uma posição subjetiva diante do desejo e do ato. Oppenheimer, ao aceitar a tarefa de construir a bomba, assumiu uma responsabilidade que foi além da sua intenção inicial.

A redenção impossível é o seu fardo. Após a guerra, a tentativa de Oppenheimer de se opor à bomba de hidrogênio e de se tornar um conselheiro moral é uma falsa tentativa de reparação. No entanto, o ato é irreversível, deixando uma marca indelével de sua transgressão. O desejo de conhecimento e poder é o que move o sujeito, mas é a ação do ato que o confronta com a castração, com a perda da onipotência e a culpa.

O legado de Oppenheimer não é apenas seu, ele se torna a memória da era nuclear. O filme, ao focar em sua angústia pessoal, universaliza esse sentimento por ter descoberto e usado tal poder. A psicologia da guerra e do trauma coletivo se manifesta na figura de Oppenheimer, o homem que viu o futuro e se horrorizou com ele. Sua responsabilidade estrutural, não é apenas situacional, está ligada à pulsão de morte que ele liberou. Dita redenção seria possível apenas se o ato pudesse ser desfeito, o que é impossível. Assim, apenas lhe restou a expiação, o sofrimento constante imposto por seu Superego.

A oposição de Oppenheimer à bomba de hidrogênio é um ato de heroísmo moral ou uma neurose de culpa que busca a expiação?

O que a psicanálise nos diz sobre a responsabilidade ética do cientista diante de uma criação que ameaça a existência humana?

A redenção é um conceito possível quando o ato de criação é, em sua essência foi destrutivo?


"A responsabilidade não se mede pela intenção, mas pela irreversibilidade do ato; e a culpa é a sombra eterna que o sujeito projeta sobre sua própria história." - Dan Mena.

Lewis Strauss e o Superego Externo: A Inveja como Motor da Destruição em Oppenheimer.
Lewis Strauss e o Superego Externo: A Inveja como Motor da Destruição em Oppenheimer.
Oppenheimer e os Dilemas da Inteligência Artificial

O interessante é que o filme traz uma urgência contemporânea surpreendente, especialmente no cenário da ascensão da Inteligência Artificial (IA) e de outras tecnologias de potencial disruptivo. A culpa do criador de 1945 está absolutamente presente e viva nos dilemas éticos dos cientistas e engenheiros de hoje. O olhar crítico que faço sob o olhar psicanalítico sobre o filme nos oferece um paradigma perfeito para entender os conflitos morais da nossa própria era.

A analogia entre a bomba atômica e a IA é muito poderosa. Ambas, representam um salto quântico no uso do poder na civilização, uma criação onipotente que escapa ao nosso controle e de seus criadores. Assim como Oppenheimer, os desenvolvedores de IA lidam com a ilusão de controle e a negação das consequências catastróficas que certamente já estão impondo a todos. Vejo uma clara interpretação psicológica do uso do poder que se repete. Encabeçada pela ambição, a busca por reconhecimento e a pressão competitiva internacional, estamos caminhando a passos largos para uma realidade irreversível. O que antes era ficção científica de filmes, agora se aproxima com o rigor de uma profecia. Quando algoritmos começam a decidir quem é contratado, quem é vigiado e quem é eliminado, já não falamos apenas de ferramentas, mas de sistemas dotados de uma lógica própria, desvinculada da ética e do afeto. A inteligência artificial, movida por códigos e dados, se torna o novo inconsciente da civilização, uma entidade que pensa sem desejar, calcula sem culpa e aprende sem limites.


Em breve, o poder de decisão poderá escapar por completo da nossa esfera. As máquinas, orientadas por objetivos de eficiência e lucro, poderão determinar políticas econômicas, estratégias militares e até os contornos da cultura e a subjetividade social. O perigo não está apenas na rebelião das máquinas, mas na rendição voluntária do homem, que abdica da sua responsabilidade moral em nome da conveniência.


Na psicanálise, chamamos isso de ‘’recalque da culpa’’, pois, projetamos em nossas criações a capacidade de decidir, para não enfrentarmos o peso ético de elaborar respostas e ações por nós mesmos. Assim, o poder vai migrando silenciosamente da consciência para o código.


Se Oppenheimer temeu ter se tornado a morte, talvez estejamos nos revertendo à própria ausência de humanismo. Quando o pensamento autônomo das máquinas ultrapassar o nosso limite simbólico da obediência não seremos mais seus criadores, senão escravos, isso, se ainda sobrevivermos. O Superego sádico de Oppenheimer encontra seu paralelo no medo coletivo e na ansiedade social em torno da IA. A culpa se manifesta como o alerta ético dos cientistas que, após a criação, se tornam os maiores críticos de seu próprio trabalho. O Mal-Estar na Civilização se atualiza: a tecnologia, que deveria servir ao Eros, da vida e o progresso, agora ameaça se tornar um veículo para o Thanatos, a destruição final, o desemprego e a desumanização.

O fundo psíquico e mental da criação tecnológica é o desejo de transcender a finitude é sobretudo inegável. A bomba atômica era a tentativa de onipotência sobre a natureza, a IA é a imposição de sobreposição sobre a inteligência da própria vida. O filme nos ensina que essa transgressão inevitavelmente convoca o juízo moral do Superego. A culpa é do preço da húbris tecnológica. O tom da análise de Oppenheimer deve servir como um chamado à responsabilidade para a sociedade. Não podemos nos dar ao luxo de esperar que o Superego se manifeste como culpa após o desastre acontecer. A ética da criação exige que a ponderação moral esteja presente na mesa de desenvolvimento de toda tecnologia de alto impacto. O legado de Oppenheimer é o de um agoureiro trágico que nos alertou sobre a sombra que acompanha todo grande poder.

A ansiedade contemporânea sobre a IA é a projeção da culpa nuclear não resolvida da era de Oppenheimer?

Como podemos integrar a ética da criação no desenvolvimento de tecnologias de poder onipotente como a IA?

O Superego coletivo está se formando agora, em tempo real, para punir os criadores da IA? "Toda tecnologia de poder absoluto é um reflexo da pulsão de morte, e a culpa do criador é o primeiro grito de alarme da consciência." - Dan Mena.

Entre o Inferno e a Salvação

Não quero ser injusto com Oppenheimer, hoje, enquanto escrevo este artigo parece fácil condenar à distância historicamente o homem que acendeu o inferno. É difícil compreender o contexto dicotômico, psicológico e ético que o empurrou para as profundezas. Em meio a uma Europa devastada, o mundo estava dominado pelo espectro de Hitler, um homem que transformou a ciência em máquina de extermínio e a palavra em veneno ideológico. Se a bomba atômica tivesse sido criada sob o estandarte nazista nosso destino teria sido outro, e com grande assertividade podemos dizer; que nenhum de nós teria nascido para refletir sobre isso. "Oppenheimer tocou o fogo dos deuses, ao fazê-lo, queimou o último vestígio de inocência que ainda havia em nós." - Dan Mena. 

Oppenheimer: O Preço da Onipotência e a Necessidade Inconsciente de Punição.
Oppenheimer: O Preço da Onipotência e a Necessidade Inconsciente de Punição.

Hitler, possuído pela pulsão de morte e pela ideia delirante de purificação racial, teria encontrado na fissão nuclear o poder divino que sempre perseguiu loucamente. Não haveria Hiroshima nem Nagasaki, haveria Londres em cinzas, Moscou em poeira, Nova York em ruínas e um São Paulo apocalíptico. O mapa do mundo seria redesenhado com sangue. Se estima que 90% da civilização teria sido varrida da face da Terra. O que restasse, seria um império de ferro e medo, uma população morta em espírito onde a liberdade e o pensamento teriam sido extintos como espécies pré-históricas.


Portanto, Oppenheimer não foi apenas o engenheiro da destruição, mas, ironicamente, foi o guardião escudeiro da sobrevivência. Ele carregou o fardo de um paradigma, salvar o mundo, se ferindo mortalmente. Sua culpa, que o perseguiu pelo resto dos seus dias, não é apenas pessoal, mas coletiva. É o preço que pagamos por continuar existindo, por isso, temos todos um ajuste de contas a fazer também. ''Não foi a bomba que caiu sobre o mundo, mas o próprio homem que desabou sobre si mesmo.'' - Dan Mena. 


Oppenheimer experimentou o conflito supremo entre o Eros que preserva e o Thanatos que destrói, ambos, convivendo dentro do mesmo gesto criador. E é nesse movimento que habita nossa contradição: criamos para sobreviver, mas ao criar, nos aproximamos daquilo que tememos.


Logo, resta a pergunta além da história: o que é mais monstruoso? a bomba que foi construída, ou o silêncio do mundo que teria perecido caso não o fosse?


Talvez Oppenheimer tenha sido, sem saber, o último homem a segurar nas mãos o nosso destino e de toda uma espécie. Porque se a bomba tivesse caído nas mãos de Hitler, o século XX não teria conhecido nem culpa, nem arrependimento, apenas o fim.

O Tribunal Final da Consciência

Após ter feito a análise detalhada dos perfis psicológicos, da dinâmica do poder e da ação do Superego, é imperativo que eu retorne ao núcleo emocional da história. O homem por trás do mito. O filme se encerra com a imagem de Oppenheimer e Einstein, um diálogo que sela o destino trágico do protagonista. A cena final, com a visão das reações em cadeia que ameaçam o mundo, é a materialização do Superego sádico de Oppenheimer. A culpa não é resolvida, ela se torna existencial, uma condição permanente da sua psique. O juízo final da consciência não emite uma sentença de absolvição, mas uma de vigilância eterna.

A leitura que faço do encerramento é a de que o Superego de Oppenheimer triunfou. Ele conseguiu transformar o gênio criativo em um mártir atormentado. Sua redenção não veio pela absolvição social, que foi negada, mas pela aceitação silenciosa de seu próprio fardo insustentável. O silêncio de Oppenheimer no final do filme é o sangue de milhares de pessoas que ficou nas suas mãos, a linguagem da culpa que não pode ser verbalizada, apenas sentida. É o Mal-Estar que se tornou sua identidade. "A ciência sem alma é a onipotência sem ética, um convite aberto para a tirania do Superego." - Dan Mena.

Cavar na profundidade profissional da análise, reside em reconhecer que a culpa do criador é a neurose necessária para a sobrevivência da civilização. Ao carregar o peso da bomba nas costas, Oppenheimer, paradoxalmente, nos oferece uma lição ética sobre os limites da ciência. Ele é o produto de um sintoma, de uma sociedade que avança tecnologicamente mais rápido do que a nossa capacidade moral de lidar e arcar com as consequências.

Perfil Psicológico dos Protagonistas

J. Robert Oppenheimer (Cillian Murphy): Gênio complexo, narcisista ferido, atormentado por um Superego sádico e a culpa existencial.

Lewis Strauss (Robert Downey Jr.): Político ambicioso, movido por inveja e ressentimento, personificação do Superego externo e punitivo.

Kitty Oppenheimer (Emily Blunt): Figura-sombra, leal e autodestrutiva, que busca redenção e estabilidade através da defesa do marido.

Ao criar a bomba Oppenheimer não apenas dividiu o átomo, ele separou a alma entre o desejo de saber e o terror de suas descobertas. Diante da imagem final do mundo em chamas, milhares de crianças, idosos e civis inocentes incinerados, queimados vivos literalmente, somos incitados a perguntar: Se o Superego do criador o condenou, qual será o juízo final da nossa própria consciência? E se a próxima criação onipotente já estiver entre nós, quem será o próximo a carregar a culpa eterna por um poder que não soubemos controlar? A tragédia de Oppenheimer não é um ponto final na história, mas um ponto de inflexão gravado no futuro da humanidade.

A Cicatriz da Consciência

A ferida na consciência que Oppenheimer nos legou permanece aberta como uma chaga viva. A cura não reside na eliminação da culpa, mas na capacidade de poder suportá-la e transformá-la em responsabilidade. O que o filme de Nolan nos oferece, para além da história e da ciência, é um drama cruel de algo que está inserido em nosso DNA, de nossa própria fragilidade.

Não consigo sair desta análise sem sentir uma enorme angústia no peito, pois a tragédia de Oppenheimer é a mazela do homem moderno, que se vê dotado de um poder quase divino, mas ainda vive aprisionado em sua humanidade falível. Sua culpa é a nossa, o peso de sabermos que a pulsão de morte reside não apenas no átomo, mas na indiferença com que tratamos as consequências de nossos atos mais brilhantes, principalmente os praticados contra nossos irmãos(as).

A sensibilidade reside em reconhecer a dor de um homem que, ao vislumbrar o infinito do conhecimento, encontrou o poço fundo da sua moral. Suas lágrimas não são de fraqueza, mas o derramamento da alma que se vê condenada por sua própria grandeza. É um fecho de ouro que nos lembra, o Superego é o preço da civilização, e a culpa do criador é o silêncio mais eloquente da história.


Que a intensidade e a emoção final desta análise nos motivem a compartilhar este pensamento, a debater com as comunidades, a curtir a ideia de que o cinema pode ser uma porta para a psicanálise. Por esta razão, tenho encontrado nestas críticas cinéfilas motivos super interessantes de usar o conhecimento da nossa ciência, que ao contrário de outras, trabalha para o bem. O legado de Oppenheimer não é a bomba, mas a pergunta que ele nos deixou: Diante de um poder que pode destruir o mundo, quem somos nós? E o que faremos com a culpa que herdamos? A resposta, caro amigo(a) leitor(a), reside na ação ética que você escolherá a partir de agora. O tribunal da consciência está sempre em pauta.

Psicanálise em Foco: Decifrando a Complexidade Moral e Psicológica do Filme Oppenheimer.
Psicanálise em Foco: Decifrando a Complexidade Moral e Psicológica do Filme Oppenheimer.

"O tribunal da consciência é o único onde o réu e o juiz são a mesma pessoa, e a sentença é a vigilância eterna." - Dan Mena.

Palavras-Chave

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FAQ - FILME ‘’OPPENHEIMER’’

O que é a "Culpa do Criador" na perspectiva psicanalítica do filme Oppenheimer? É o conflito moral e a angústia psíquica que surge no Ego de Oppenheimer após a criação da bomba atômica, refletindo a tirania de seu Superego.

Como o Superego se manifesta em J. Robert Oppenheimer? Manifesta-se como um juiz interno sádico e implacável, gerando sentimentos de culpa e a necessidade inconsciente de punição.

Qual é a relação entre o poder científico e o narcisismo em Oppenheimer? O poder científico é buscado como uma forma de satisfazer o narcisismo ferido de Oppenheimer e compensar sua fragilidade emocional.

Quem representa o Superego externo no filme? Lewis Strauss, que orquestra a punição social e política de Oppenheimer, agindo como um agente externo do seu Superego.

Qual o papel da inveja na rivalidade entre Oppenheimer e Strauss? A inveja de Strauss pelo gênio e reconhecimento de Oppenheimer é o motor de sua vingança destrutiva.

Como a psicanálise kleiniana explica a culpa em Oppenheimer? A culpa é vista como a reação do Ego à agressividade do Superego sádico, buscando reparação pelo ato destrutivo da criação.

O que o alcoolismo de Kitty Oppenheimer pode simbolizar? Pode simbolizar a angústia e a frustração de seu potencial, além de uma manifestação de sua própria pulsão autodestrutiva.

O que é a "ilusão de controle" no contexto do filme? É a crença de Oppenheimer de que o conhecimento absoluto lhe daria a capacidade de controlar as consequências morais e sociais de sua criação.

Qual a principal lição ética do filme para a ciência contemporânea? A necessidade de integrar a responsabilidade ética e a reflexão moral no desenvolvimento de tecnologias de alto impacto.

O que é o "Mal-Estar na Civilização" que o filme aborda? É a tensão entre as pulsões individuais (ciência, poder) e as restrições sociais e morais, que no filme é materializada pela ameaça nuclear.

O que significa a frase "Eu me tornei a Morte, o destruidor de mundos"? É o momento da ruptura do Ego de Oppenheimer, onde ele reconhece a magnitude destrutiva de seu ato e a emergência de seu Superego.

A passividade de Oppenheimer no inquérito é um sinal de quê? É uma rendição masoquista à punição, uma forma inconsciente de expiar a culpa existencial.

Como a tragédia de Oppenheimer se relaciona com a Inteligência Artificial (IA)? Ambos representam a criação de um poder onipotente que escapa ao controle de seus criadores, levantando dilemas éticos semelhantes.

O que é a "redenção impossível" de Oppenheimer? É o fardo de não poder desfazer o ato da criação destrutiva, restando-lhe apenas a expiação e o sofrimento constante.

Qual o legado final da culpa de Oppenheimer? O legado é a pergunta sobre a responsabilidade ética diante do poder absoluto, um ponto de interrogação gravado no futuro da humanidade.


Links

Título do Artigo/Link

Link

Oppenheimer, “pai da bomba atômica”, teve crise de consciência

Quem foi o verdadeiro Robert Oppenheimer, criador da bomba atômica

Oppenheimer e os dilemas que seguem vivos

Traumas e Culpa em Oppenheimer [Análise Psicológica]

Oppenheimer: ciência, guerra e máquina destrutiva do imperialismo

Oppenheimer é camaleão que vai de psicopata a humanista

A Psicanálise no Filme Oppenheimer (2023)

O conceito de superego na teoria freudiana

O sentimento de culpa e a ética em psicanálise

A construção do conceito de superego em Freud

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Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Departament of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192.


 
 
 

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