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- Feminicídio - Violência, Perseguição e Morte.
A ferida narcísica coletiva e sua relação com o feminicídio no Brasil. Desnudando a Alma da Violência Antes de adentrar no tema profissionalmente, devo me lembrar que carrego em mim a memória viva das mulheres que me fizeram homem: uma mãe que teceu dias e noites para me proteger, irmãs que desbravaram horizontes estreitos com unhas e dentes, filhas que me ensinaram a ver o mundo não apenas com meus olhos, mas com os delas. São essas vozes — suaves, rugosas, resilientes — que me sussurram: Maria não é um nome solitário. É um espelho refletindo milhões de rostos: mães que carregam mundos nas costas, filhas que brincam sob a sombra de um medo que ainda não nomearam, avós que enterram segredos nas dobras do tempo. Ao amanhecer, a rotina de Maria parece trivial: o aroma do café se mistura ao caos matinal de filhos famintos e tarefas infindáveis. Cada gesto — abrir a janela, arrumar mochilas, esconder um bocejo na manga da camiseta — são na verdade, atos invisíveis de resistência. A esperança, aqui, não é um sentimento abstrato, pois o relógio avança enquanto ela corre contra ele. Mas quando o sol se põe, essa mesma mulher — que personifica a força em cada fissura — é silenciada. Não por um acaso do destino, mas pela mão que um dia acariciou seu rosto e depois se fechou em punho. Alguém que jurou amor, embora confunda afeto com posse, proteção com controle, ciúme com direito. O feminicídio não é um fim abrupto: é a última linha de um roteiro escrito a sangue frio. Me pergunto: que abismos psíquicos engolem um homem até que ele enxergue no extermínio da mulher um ato de "honra", "paixão" ou "justiça"? Não há respostas, podemos considerar algumas pistas. Entre elas, destaco a ‘’ferida narcísica coletiva’’ . "No feminicídio, o agressor destrói o espelho que reflete sua ruína." - Dan Mena. A psicologia por trás do feminicídio: entendendo a mente do agressor. O Retrato Social A noção de ferida narcísica remonta a Freud, ele descreveu o narcisismo como uma etapa fundamental do desenvolvimento psíquico, onde o ego investe a libido em si mesmo. Quando ferido — seja por uma rejeição, uma humilhação ou a ameaça de perder controle —, a reação pode ser violenta, uma tentativa desesperada de restaurar a ilusão de ''suposta grandiosidade ameaçada' '. Aplicada ao contexto social, se refere a uma ‘’fratura na identidade grupal’’ , especialmente em estruturas de poder historicamente dominantes (como o patriarcado). Quando um sistema baseado em hierarquias rígidas — onde homens são socializados para se verem como provedores, controladores e centrais — desafiado pela autonomia feminina, surge uma crise. A emancipação das mulheres, a contestação de papeis de gênero e a perda de "privilégios simbólicos " (como a posse sobre o corpo e o tempo da mulher) são vividas, por alguns homens, como uma ameaça existencial à sua própria identidade. Desdobramentos psíquicos e sociais: A ilusão da completude: Na psicanálise lacaniana, o sujeito é marcado por uma falta constitutiva. No patriarcado, porém, se ensina aos homens que essa falta pode ser preenchida pela dominação do "outro" (neste caso, a mulher). Quando essa fantasia é quebrada — e ela se recusa ser objeto de completude —, o golpe narcísico aflora. A violência se torna então, uma tentativa patológica de restaurar a ilusão de onipotência perdida. Masculinidade como performance frágil: A masculinidade hegemônica é construída sobre mitos de invulnerabilidade e dominação. Quando um homem é confrontado com sua própria vulnerabilidade (um divórcio, uma independência financeira da parceira, uma recusa sexual), a ferida narcísica coletiva se manifesta como ódio projetado: ele não ataca a própria debilidade, mas a mulher que a espelha. A cultura como espelho deformado: A sociedade patriarcal atua como um ‘ ’grande Outro’’ que valida e normaliza essa fenda. Piadas misóginas, a romantização do ciúme ("quem ama, cuida") , e a ideia de que a mulher é uma "propriedade" a ser defendida reforçam a narrativa de que a agressão é legítima para "reparar" a honra vista como ferimento. O assassinato como ato "restaurador": No feminicídio, o agressor não mata apenas uma mulher: mata o símbolo do que o confronta com sua própria inadequação . É um ato de negociação delirante com o próprio ego, onde extinguir o "outro" parece a única forma de recuperar uma identidade em colapso . Como escreveu Contardo Calligaris: “Os crimes passionais são crimes de orgulho: mato para não ter que admitir que não sou quem eu pensava que era”. A importância da rede de apoio na prevenção do feminicídio e violência doméstica. Ele faz uma crítica contundente à ideia de que crimes passionais são motivados por "amor" ou "paixão" . Ele desloca o foco para o ‘ ’narcisismo ferido’’ ’ do agressor: "Não sou quem eu pensava que era" : O feminicida mata para evitar o colapso de sua auto-imagem grandiosa e estereotipada (o homem provedor, dominador, "dono" da mulher'' ). A citação expõe a ‘’mentira social’’ por trás do termo 'passional' , que romantiza a violência, e revela a raiz do problema: uma identidade masculina construída sobre ilusões de superioridade, que se esfacela quando confrontada com a autonomia feminina. Por que a ferida é coletiva? Não se trata de patologia individual, mas de uma dinâmica social internalizada. A ferida narcísica coletiva é alimentada por: Mitologias culturais : Narrativas que glorificam homens como "senhores do destino" (herois, conquistadores). Falhas na simbolização : A incapacidade de elaborar simbolicamente a igualdade de gênero, substituindo hierarquias por relações de alteridade. Transmissão geracional : Meninos aprendem que "homem não chora" , mas dominam; meninas aprendem que "amar é sofrer" . Um ‘’ego’’ que só se reconhece inteiro ao reduzir o outro a fragmentos e pulverização. O assassino não é um monstro à parte da sociedade — ele é o fruto podre de uma árvore plantada em solo arcaico, regado por piadas misóginas, leniência institucional e a romantização do sofrimento feminino ("ele bate, mas ama") . "Educar é dissolver os mitos que transformam homens em algozes e mulheres em presas." - Dan Mena. Parece que estamos assistindo a um ''teatro de horror'' . Somos uma plateia silenciosa. Chamamos o feminicídio de "crime passional" , como se houvesse paixão no ato de esvaziar um corpo de sua humanidade. Minimizamos agressões como "brigas de casal" , como se o lar fosse um território neutro, não um campo de guerra invisível. Consumimos histórias onde a posse é confundida com romance, e depois nos perguntamos por que o ciclo persiste. Esse espiral exige mais que discursos — exige mudanças. Lentes que naturalizam a violência: nas escolas, onde meninas aprendem a se encolher e meninos a se expandir; nas leis, que muitas vezes chegam tarde demais; na cultura, que transforma corpos femininos em territórios a serem conquistados. Precisamos olhar para Maria e ver nela não uma vítima, mas uma guerreira interrompida. Reconhecer que cada vida truncada é um fracasso épico da humanidade compartilhada. Uma Análise Histórica da Aniquilação Feminina O termo "feminicídio" bate como um lamento que carrega o peso de séculos de opressão. Não se trata de um mero homicídio, mas de um crime impregnado de gênero, uma execução deliberada que encontra suas raízes no ódio, no controle e na subjugação da’’ mulher enquanto mulher’’. O conceito, que foi lançado na década de 1970 por ativistas feministas, ganhou contornos acadêmicos com as estudiosas Jill Radford e Diana E. H. Russell, que o definiram como "o assassinato de mulheres por homens motivado por misoginia" . Essa definição transcende a mera técnica, onde o podemos enxergar como um ato político, um espelho de uma sociedade que ainda luta para reconhecer a mulher como sujeito pleno de direitos, como diria Simone de Beauvoir em "O Segundo Sexo" . A violência contra elas é tão antiga quanto as primeiras sociedades. Gerda Lerner, em "The Creation of Patriarchy ", argumenta que o controle sobre o corpo e a vida das mulheres foi um dos pilares da construção das hierarquias sociais. Nos tempos do Código de Hamurabi, a mulher era legalmente vista como propriedade do pai ou do marido, um objeto que podia ser castigado, trocado ou destruído. Na Idade Média, as leis feudais reforçaram essa lógica, punindo com a morte a mulher que "desonrou" o marido. Tais padrões não desapareceram, apenas se metamorfoseiam na atualidade, se adaptando às eras, mas mantendo sua essência. Leis de proteção contra o feminicídio: avanços e desafios no Brasil. "A empatia é o antídoto para um mundo que normaliza a violência." - Dan Mena. No Brasil, o tema é uma chaga aberta. Jeová Rodrigues Barbosa, em "Feminicídio no Brasil" , demonstra que milhares de mulheres são assassinadas anualmente, muitas vezes por seus próprios namorados, parceiros ou ex, também isso se confirma facilmente nos noticiários. O que distingue o feminicídio de outros homicídios é a motivação: a vítima é morta por ser mulher, por desafiar o domínio masculino, mesmo que de forma sutil ou inconsciente. O crime frequentemente representa o ápice de uma escalada de abusos: insultos que evoluem para tapas, tapas que se transformam em surras, e surras que culminam na morte. Um roteiro trágico que se repete com assustadora regularidade. Por que falhamos em proteger essas mulheres? A resposta reside na história, nas leis brandas e na cultura que ainda romantiza o controle masculino, perpetuando a misoginia denunciada por Jack Holland em "Misogyny: The World's Oldest Prejudice" . "O feminicídio é a expressão mais extrema de uma guerra travada contra as mulheres, uma batalha cujas armas são o poder e o silêncio. " – Rita Segato, La Guerra Contra las Mujeres (2016). A Mente do Agressor O que leva um homem a assassinar a mulher que ele afirmava amar? A resposta não reside na superfície da raiva ou do ciúme. Estudos como os de Jackson Katz, em "The Macho Paradox" , expõem que muitos agressores compartilham traços como narcisismo, baixa tolerância à frustração e uma visão distorcida de poder . Eles não matam em um momento de fúria, mas sim, porque acreditam ter o direito de decidir sobre a vida da vítima, como se fossem donos de sua existência. Agressores sempre exibem comportamentos obsessivos, como monitorar redes sociais, ligar incessantemente ou isolar a vítima de sua rede de apoio. Um estudo recente da Universidade de São Paulo (USP) sobre violência doméstica mostra que a maioria das mulheres assassinadas por seus parceiros já havia sofrido abusos psicológicos prévios, como humilhações e ameaças. Tais atos não são aleatórios, mas sim táticas de poder, formas de "treinar " a vítima a se submeter. "A rede de apoio é o fio que costura a esperança onde o medo rasgou." - Dan Mena. Ademais, muitos deles carregam traumas não resolvidos. Um histórico de abuso na infância ou exposição a modelos violentos pode normalizar a agressividade como resposta a conflitos. Isso não justifica a violência, mas demonstra que ela é um ciclo aprendido, não um instinto inato. Romper essa configuração psíquica exige intervenção psicológica séria, algo que nossa sociedade raramente oferece. A violência também é alimentada por crenças culturais. A ideia de que o homem "deve" ser o ''provedor e a mulher " cria uma caixa fechada para o feminicídio. Quando essa ordem é desafiada, o agressor reage como se sua identidade estivesse em xeque. É um paradoxo: ele mata para afirmar poder, mas revela, na verdade, sua impotência diante da liberdade alheia , como ressalta Michael Kimmel em "The Gendered Society" . "A violência masculina não é um desvio; é um produto apreendido de uma cultura que equipara masculinidade à posse." – Michael Kimmel. Gaslighting e feminicídio: como a manipulação psicológica leva à violência extrema. O Inconsciente Patriarcal O inconsciente é como um território selvagem irrigado por um patriarcado enraizado na cultura. Lacan, com seu conceito de "Nome-do-Pai" , nos ajuda a entender como a lei simbólica masculina estrutura o desejo e o poder. O feminicídio, nesse sentido, é um ‘’acting out’’ , ("passagem ao ato") se refere a um conceito base da psicanálise que descreve a manifestação de conflitos psíquicos inconscientes por meio de ações, geralmentes impulsivas, em vez de serem elaboradas verbalmente ou simbolicamente. Seria um mecanismo de defesa distorcido, conteúdos recalcados que o sujeito não consegue acessar conscientemente) logo aparece uma explosão do inconsciente que não tolera a mulher como livre de amarras. O patriarcado não é apenas um sistema social externo, mas uma ferida psíquica internalizada. Quando uma mulher rompe o ‘’script’’ , o agressor reage como se sua própria existência estivesse em risco. Não se trata apenas sobre ela, mas sobre o que ela representa: a ameaça à ordem que o valida como homem . Psicanaliticamente, isso é uma ‘’pulsão de morte’ ’, não só contra a vítima, mas contra a possibilidade de um mundo onde ele não seja o centro. No caso do tema, o instigador pode invejar a capacidade da mulher de ser autônoma, de criar vida, de existir fora dele. Essa inveja se transforma em ódio, e o ódio em um desejo de destruir o que não pode ser possuído. Outro aspecto é o mecanismo de projeção. O acometedor projeta suas fraquezas na vítima, a transformando no "problema" a ser eliminado . Esse sujeito geralmente está preso ao "Imaginário" , incapaz de entrar no "simbólico" onde a alteridade é aceita. Entendendo ou Simbólico e o Imaginário Nossa fala reflete a dinâmica entre os registros do Imaginário e do Simbólico. O Imaginário é o campo das imagens, identificações e ilusões de completude , onde o sujeito se fixa em relações dualistas (como o "eu" versus o "outro" no espelho de si) busca desta forma uma unidade narcísica. Quando falamos na psicanalise estar "preso ao Imaginário " sugerimos que o individuo não consegue transcender essa ' 'lógica egocêntrica e fusional' ', permanecendo incapaz de reconhecer a diferença ou a alteridade (o outro como distinto) . O Simbólico, por outro lado, é o domínio da linguagem, a lei e a cultura, onde o sujeito se insere em uma ordem social que estrutura as relações e aceita a alteridade. Entrar no ''contexto simbólico'' implica reconhecer o outro como um sujeito separado, mediado pelas regras e significações compartilhadas, o que exige a renúncia à ilusão de completude imaginaria e ficcional . Assim, a expressão indica que o sujeito descrito está fixado em uma lógica narcísica e imaginária, resistindo à entrada no simbólico, onde a aceitação da alteridade e a mediação pela linguagem permitiriam relações mais estruturadas e menos centradas no eu . Isso pode apontar para dificuldades em lidar com a diferença, a castração (no sentido lacaniano) ou a inserção na ordem social. "O patriarcado é uma neurose coletiva que transforma o outro em ameaça." – ''Shulamith Firestone, The Dialectic of Sex' ' (1970). Feminicídio no Brasil: a violência de gênero e o silêncio da sociedade. A Sociedade que Sustenta a Violência A sociedade não apenas tolera essa violência, mas o alimenta com normas, silêncios e justificativas. Judith Butler, em "Gender Trouble" , nos lembra que o gênero é uma performance imposta, e quando a mulher sai desse palco predeterminado, o castigo é brutal. No Brasil, as estruturas sociais criam um panorama acolhedor para o tema. A desigualdade econômica deixa muitas mulheres presas a parceiros abusivos por falta de recursos. A romantização do amor possessivo normaliza o controle. Carla Cristina Garcia, em "Feminicídio: Uma Análise Sociojurídica" , destaca que a impunidade é o oxigênio desse crime historicamente. Quando agressores saem impunes ou recebem penas leves, a mensagem é clara: a vida delas importa menos . A mídia também tem seu papel sombrio, tratando o tema como espetáculo, focando na brutalidade, mas raramente nas causas. Precisamos de uma mídia que eduque, que mostre os sinais de alerta e cobre responsabilidade. As instituições, por sua vez, falham miseravelmente, com delegacias sobrecarregadas e sub-financiadas. Muitas vítimas não denunciam por medo, vergonha ou desconfiança no sistema, que também não protege eficazmente. Mulheres que fizeram dezenas de boletins de ocorrência, tem medidas judiciais protetivas consolidadas, chamaram a policia dezenas de vezes, acabam mortas. Alguma coisa está muito errada, não é verdade? Isso denota uma crise na ordem simbólica da ordem social , onde as instituições falham em sua função de mediar as pulsões, proteger os sujeitos e simbolizar o trauma. Esse erro, deixa as vítimas presas entre o Imaginário (vergonha, medo) e o Real (violência, morte) , sem acesso a uma elaboração estrutural que poderia interromper o ciclo de violência. Esse laço civilizatório, sustentado pelo Simbólico, está quebrado, permitindo que a pulsão de morte prevaleça. A educação é outro ponto cego. Crianças crescem vendo modelos de gênero rígidos, e sem uma educação que desconstrua isso desde cedo, o patriarcado se renova a cada geração. Somos todos cúmplices quando fechamos os olhos. Cada piadinha sexista, cada silêncio diante de um grito, tipo "deixa pra lá" é um passo rumo a próxima vítima. R.W. Connell, em "Gender and Power ", nos lembra: "A violência contra as mulheres é um mecanismo de controle social que mantém o patriarcado intacto." – R.W. Connell, Gender and Power (1987). A interseccionalidade no feminicídio: raça, classe e vulnerabilidade das mulheres. Redes Sociais: Amplificadoras da Misoginia ou Ferramentas de Denúncia? As redes são como uma alma coletiva, e o que refletem nem sempre é bonito. Por um lado, dão voz às vítimas com movimentos como o #NiUnaMenos. Por outro, são um megafone para a misoginia, com posts que culpam mulheres por "provocarem" seus agressores ou que romantizam os ciúmes doentios. Sara Ahmed, em "The Cultural Politics of Emotion" , nos alerta que as emoções circulam online e constroem realidades, algumas delas tóxicas. O ódio digital muitas vezes é o primeiro passo para a violência física. Grupos de ódio usam plataformas para atacar mulheres que desafiam normas de gênero. A linha entre o virtual e o real é tênue, e o feminicídio muitas vezes começa com palavras digitadas. A polarização também complica o cenário. Enquanto feministas lutam por visibilidade, a ‘’backlash’’ online cresce. Redes ampliam tanto o grito das vítimas quanto o veneno dos agressores. Para mudar isso, precisamos de educação digital e moderação mais rigorosa nas plataformas. Ensinar empatia online desde cedo e punir discursos de ódio com agilidade pode reduzir o impacto negativo. "O digital não cria o ódio; ele o organiza e o amplifica." – Sara Ahmed, ' 'The Cultural Politics of Emotion' ' (2004). A Luta Pela Liberação Feminina e o Contra-Ataque do Patriarcado Simone de Beauvoir escreveu: "Não se nasce mulher, torna-se." Mas o que acontece quando esse "se tornar" desafia o mundo ao seu redor? Susan Faludi, em "Backlash" , descreve como cada avanço feminino provoca uma reação violenta. A autonomia das mulheres é vista como uma ameaça existencial por homens presos a tradições. A mídia reforça essa tensão, muitas vezes retratando mulheres independentes como "frias" ou "arrogantes" , enquanto homens ciumentos são "apaixonados" . Esse ‘’backlash’ ’ não é só individual, mas estrutural, com políticos conservadores defendendo "valores tradicionais" que colocam a mulher como subordinada. O feminicídio é a expressão mais extrema dessa resistência: se mata a mulher para "restaurar" a ordem. Vítimas Vulneráveis Nem todas elas enfrentam o problema da mesma forma. Raça, classe e gênero se cruzam, criando camadas de vulnerabilidade que não podemos ignorar. Mulheres afrodescendentes e menos favorecidas economicamente são desproporcionalmente alvo desse crime. No Brasil, elas têm o dobro de chance de serem assassinadas em comparação com as caucasianas. Esses números são o resultado de um sistema que abandona quem está nas margens. A ‘’interseccionalidade’’, termo criado por Kimberlé Crenshaw, nos obriga a olhar além do óbvio. Não basta falar de "mulheres" como um grupo homogêneo, pois as opressões se entrelaçam. "A violência de gênero é inseparável das hierarquias de raça e classe." – Rita Segato, Feminicidio en América Latina (2010). Como prevenir o feminicídio: estratégias de proteção e conscientização social. Estratégias de Prevenção e Intervenção Desconstruir mitos de gênero é o primeiro passo para combater o problema. Na clínica, vejo que terapias focadas em ‘’masculinidade tóxica’’ podem desarmar agressores em potencial, enquanto o acolhimento às vítimas é essencial para romper o silêncio. Socialmente, precisamos de leis mais rigorosas e políticas públicas que funcionem. A prevenção começa na educação, com crianças aprendendo desde cedo que respeito e igualdade não são negociáveis. A intervenção psicológica é outro pilar. Homens com histórico de violência, podem se beneficiar de terapias que explorem suas inseguranças e que derrubem a ideia de posse . Para as vítimas, o apoio é vital. Terapias que validem a dor e ofereçam ferramentas práticas podem salvar vidas. Socialmente, precisamos de mais abrigos, linhas de apoio 24 horas e treinamento para policiais e médicos reconhecerem sinais de risco. A justiça também precisa agir, com juízes sensibilizados e processos ágeis. Por fim, a sociedade deve se envolver. Vizinhos que ouvem gritos, amigos que notam hematomas, familiares que percebem o isolamento, todos têm um papel. Identificando o Perigo: Perfis Homicidas e Estratégias de Proteção Os passos desse agressor seguem um padrão : aproximação com charme e idealização, controle e isolamento, escalada com ameaças e violência, e, por fim, o feminicídio com a destruição final. Sinais de alerta incluem ciúmes extremos, controle sobre finanças, mudanças de humor bruscas e ameaças. Estratégias de proteção incluem confiar em seus instintos, manter uma rede de apoio, planejar uma saída e continuar denunciando (a pesar da falha). É fundamental enfatizar que a independência feminina é um direito, não uma provocação. Mulheres são livres para expressar sua sexualidade sem medo, e homens devem aprender a respeitar isso . Eu vejo um futuro onde o silêncio não seja mais arma, mas ponte para o entendimento, onde as mulheres não sejam sombras de roteiros alheios, mas autoras de suas próprias histórias, livres para amar, trabalhar e existir sem medo. Esse amanhã não é utopia, é uma escolha. A mudança começa com homens questionando o privilégio que os cega, mulheres se erguendo sem culpa e a sociedade dizendo "basta" com ações, não só palavras. O Gaslighting É uma forma de manipulação psicológica em que uma pessoa ou grupo semeia dúvidas na mente da outra, a fazendo questionar sua própria memória, percepção ou sanidade. O termo vem do filme ‘’Gaslight (1944)’’ no qual um marido manipula a esposa ao alterar o ambiente (como diminuir luzes de gás) e negar as mudanças, a levando a acreditar que está enlouquecendo. Táticas Principais - Negação e Mentiras O ‘’gaslighter’’ nega fatos ou conversas, mesmo diante de evidências. Banalização dos Sentimentos : Despreza emoções do outro como "drama" ou "frescura" . Distorção da Realidade : Apresenta versões falsas de eventos para confundir. Isolament o: Afasta a vítima de amigos/família para aumentar a dependência. Projeção : Acusa a vítima de comportamentos que ele mesmo pratica. Motivações Controle : Dominar a vítima emocionalmente. Fuga de Responsabilidade : Evitar culpa por ações próprias. Manipulação : Mantém a vítima insegura e submissa. Sinais Dúvida constante sobre suas memórias ou percepções. Se perceber excessivamente sensível. Pedir desculpas frequentes, mesmo sem culpa. Isolamento progressivo de pessoas próximas. Impactos na Vítima Emocionais : Ansiedade, depressão, autoestima fragilizada. Cognitivos : Dificuldade de confiar no próprio julgamento. Sociais : Isolamento e dependência emocional. Contextos Comuns Relacionamentos abusivos, famílias disfuncionais, ambientes de trabalho tóxicos. Pode ocorrer de forma intencional (para controle) ou inconsciente. Diferença de Conflitos Normais A diferença de embates se dá observando que não se trata de desentendimentos pontuais, mas de um ‘’padrão sistemático’’ para minar a autopercepção da vítima. Gaslighting é uma forma grave de ''abuso emocional'' . Se identificar esses sinais, priorize sua saúde mental. Provocações Sensuais e Reflexão Um ponto sensível: às provocações públicas sensuais. Quero ser claro: nada justifica o ato. A violência é sempre culpa do agressor . Mas, em um mundo ainda patriarcal, algumas mulheres usam a sexualidade como poder ou até como forma de "testar" o parceiro , o que pode gerar tensões. Por exemplo, uma mulher que busca independência, mas mantém o homem como "projeto" emocional ou financeiro , vai desenvolver um conflito de expectativas. Isso não é culpa dela, mas, uma contradição que merece reflexão. Como a educação pode combater o feminicídio nas futuras gerações. “A violência não é uma resposta ao desejo; é a falência do diálogo.” - Dan Mena. Observação Importante ; As fotos utilizadas para ilustrar este artigo são meramente produtos fotográficos profissionais sob licença da Pixabay concedidas ao autor do artigo. Equivalem a representações teatrais de maquiagem, cenários e figurações de atores(as). Em hipótese alguma devem ser consideradas como reais, ter ligação ou associação com crimes, ódio contra a mulher, violência doméstica, assassinatos, armas são cenográficas, racismo ou perseguições contra quem seja. Referências Bibliográfica s Ahmed, Sara – The Cultural Politics of Emotion (2004, Routledge) Barbosa, Jeová Rodrigues – Feminicídio no Brasil (2019, Editora Appris) Beauvoir, Simone de – The Second Sex (1949, Vintage Books) Butler, Judith – Gender Trouble: Feminism and the Subversion of Identity (1990, Routledge) Connell, R. W. – Gender and Power: Society, the Person, and Sexual Politics (1987, Stanford University Press) Dobash, R. Emerson & Dobash, Russell P. – Violence Against Women: A Critique of the Due Diligence Standard (2015, Open University Press) Engels, Friedrich – The Origins of the Family, Private Property and the State (1884, Penguin Classics) Faludi, Susan – Backlash: The Undeclared War Against American Women (1991, Crown) Firestone, Shulamith – The Dialectic of Sex: The Case for Feminist Revolution (1970, Bantam Books) Foucault, Michel – The History of Sexuality (1976, Pantheon Books) French, Marilyn – The War Against Women (1992, Summit Books) Friedan, Betty – The Feminine Mystique (1963, W.W. Norton & Company) Garcia, Carla Cristina – Feminicídio: Uma Análise Sociojurídica da Violência Contra a Mulher no Brasil (2018, Editora Juruá) Holland, Jack – Misogyny: The World’s Oldest Prejudice (2006, Carroll & Graf) Johnson, Allan G. – The Gender Knot: Unraveling Our Patriarchal Legacy (1997, Temple University Press) Katz, Jackson – The Macho Paradox: Why Some Men Hurt Women (2006, Sourcebooks) Kimmel, Michael – The Gendered Society (2000, Oxford University Press) Lerner, Gerda – The Creation of Patriarchy (1986, Oxford University Press) Mies, Maria – Patriarchy and Accumulation on a World Scale (1986, Zed Books) Millett, Kate – Sexual Politics (1970, Doubleday) Radford, Jill & Russell, Diana E. H. – Femicide: The Politics of Woman Killing (1992, Twayne Publishers) Segato, Rita – La Guerra Contra las Mujeres (2016, Prometeo Libros) Segato, Rita (Editora) – Feminicidio en América Latina (2010, Universidad Nacional de Quilmes) Wolf, Naomi – The Beauty Myth: How Images of Beauty Are Used Against Women (1990, Chatto & Windus) Palavras Chaves #Feminicídio #ViolênciaContraMulheres #Patriarcado #Misoginia #CrimePassional #AgressãoDoméstica #EmpoderamentoFeminino #IgualdadeDeGênero #LeisDeProteção #RedeDeApoio #ConscientizaçãoSocial #EducaçãoDeGênero #SaúdeMental #Trauma #CulturaMachista #DireitosDasMulheres #PrevençãoDeViolência #MovimentoFeminista #JustiçaSocial#PolíticasPúblicas#DanMenaPsicanalise#Violência#Agressão# Visite minha loja ou site: https://uiclap.bio/danielmena https://www.danmena.com.br Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130.Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Department of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. De 1 a 5 - Quantas estrelas merece o artigo? Deixe seu relato abaixo em COMENTÁRIOS.
- Psicodélicos: "A Nova Fronteira da Terapia".
Benefícios da Terapia Psicodélica para a Saúde Mental. Tendências de 2025: O Futuro da Psiquiatria - Psicologia e a Psicanálise Enquanto a crise global de saúde mental atinge níveis epidêmicos, com milhões de pacientes fracassando em tratamentos convencionais para depressão, ansiedade e TEPT, um fenômeno científico surge ineditamente com respostas: a terapia assistida por psicodélicos. Distante de misticismos ou tendências passageiras, essa revolução é sustentada por evidências muito robustas, garanto que estudei o assunto muito a fundo: (leia bibliografia ao final do artigo). Pesquisas recentes conduzidas pelo Imperial College London, Johns Hopkins e pelo Instituto de Psiquiatria de São Paulo demonstram que compostos como psilocibina e MDMA alcançam taxas de remissão de até 70% em casos resistentes, desempenho que antidepressivos tradicionais levariam décadas para igualar. Estamos diante do surgimento de uma ferramenta acessória terapêutica inédita, no qual o rigor científico e avanços farmacológicos se alinham para confrontar os limites da psiquiatria contemporânea. Você já ouviu falar em psicodélicos para depressão ou ansiedade? Se tantos remédios não funcionam, por que não olhar para caminhos que a ciência está redescobrindo? O Colapso do Modelo Tradicional e a Urgência de Alternativas A psiquiatria atual enfrenta uma encruzilhada sem precedentes. Inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRSs), considerados padrão-top desde os anos 1980, falham em 30% a 50% dos casos, enquanto abordagens como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) demandam meses para obter resultados parciais. Nesse enquadramento, os pacientes não são meros "náufragos da alma" , mas vítimas de um sistema fragmentado, que reduz diagnósticos a desequilíbrios químicos simplistas. A neurociência moderna, contudo, pode afirmar que transtornos mentais envolvem redes neurais hipercomplexas, memórias traumáticas consolidadas e padrões cognitivos inflexíveis – justamente, os alvos onde os psicodélicos atuam com precisão inusitada segundo as pesquisas. Além da Serotonina, Rumo à Neuroplasticidade Diferentemente de fármacos que regulam sintomas superficialmente, psicodélicos clássicos (psilocibina, LSD) e entactógenos (MDMA) induzem a uma reestruturação cerebral. Estudos de neuroimagem evidenciam que essas substâncias suprimem a atividade da rede de modo padrão (DMN), estrutura hiperativa em quadros depressivos crônicos e associada à ruminação autodepreciativa. Paralelamente, estimulam a neurogênese no hipocampo e ampliam a conectividade entre hemisférios cerebrais, mecanismos que fundamentam relatos de "reinicialização mental" . Em ensaios clínicos de fase III, financiados por organizações como a MAPS e a Compass Pathways, ‘’sessões únicas de psilocibina combinadas à psicoterapia’’ produziram efeitos antidepressivos por até 12 meses – um avanço exponencial frente ao paradigma da medicação contínua. "Os psicodélicos não são remédios, mas ‘ferramentas de reinicialização’ que reescrevem a arquitetura cerebral, dissolvendo padrões rígidos como ácido sobre uma placa de metal" (GOLDSMITH, Psychedelic Healing, 2011). Será que estamos tratando doenças da alma apenas com química e esquecendo nossa complexidade? Experiências Psicodélicas Podem Expandir Sua Consciência Quantas pessoas você conhece que vivem medicadas, mas continuam sofrendo? O Papel da Ciência na Mudança de Narrativa A reinserção dos psicodélicos na medicina não é fortuita. Após meio século de proibição, impulsionada pela Guerra às Drogas, o ressurgimento dessas pesquisas se deve a três pilares: (1) Metodologia rigorosa: protocolos com dosagens controladas, ambientes sensoriais monitorados e integração psicológica pós-experiência; (2) Inovações tecnológicas: técnicas de ressonância magnética funcional permitem decifrar em tempo real a atividade cerebral durante as sessões; (3) Demanda social: iniciativas como o Decriminalize Nature e investimentos de US$ 2,5 bilhões em startups do setor, aceleram mudanças regulatórias. A própria Food and Drug Administration (FDA) - USA, concedeu status de "Terapia Inovadora " ao MDMA para TEPT. Por que tantos cientistas sérios estão investindo tempo e dinheiro nisso agora? Você confiaria em um tratamento que já foi considerado perigoso, mas hoje é apoiado por grandes universidades? Psicanálise e Psicodélicos: Diálogos no Labirinto Mental A interseção entre psicanálise e psicodélicos oferece perspectivas interessantes para compreender os mecanismos simbólicos e arquetípicos ativados durante as sessões analíticas. Enquanto como psicanalistas adentramos no inconsciente através da ‘’associação livre’’ e ‘’da transferência’’ , os psicodélicos funcionam como catalisadores que dissolvem as defesas do ego, expondo conteúdos reprimidos com intensidade cinematográfica. Carl Jung, ao discutir o ‘’inconsciente coletivo’’ e os arquétipos, antecipou metaforicamente a experiência de universalidade relatada por usuários de psilocibina, que descrevem encontros com imagens mitológicas ou narrativas existenciais compartilhadas. Na prática da clínica moderna, tem muitos psicanalistas envolvidos em pesquisas com psicodélicos – como os protocolos da MAPS – destacam que a substância não substitui a escuta analítica, senão que amplifica o processo de elaboração. Durante a experiência, resistências são temporariamente suspensas, permitindo que traumas infantis, conflitos edipianos ou fantasias primárias possam emergir com clareza em sessões convencionais. A integração pós-experiência, etapa fundamental, se assemelha à interpretação de sonhos em escala ampliada, onde auxiliamos o paciente a tecer significados a partir do material bruto do inconsciente. Esse sincretismo entre farmacologia e hermenêutica psicanalítica pode inaugurar uma nova era de terapias ampliadas, onde ciência e subjetividade coexistem sem hierarquias. "A experiência psicodélica é um convite, não uma resposta. Cabe ao analista evitar que o paciente confunda êxtase químico com iluminação" (FADIMAN, The Psychedelic Explorer's Guide, 2011). Afinal, como lembra Terence McKenna: "A cura está no caos, mas o sentido está na integração" (MCKENNA, Comida dos Deuses, 2010). Será que os psicodélicos nos ajudam a ver o que escondemos até de nós mesmos? O que você faria se pudesse acessar memórias e emoções que hoje estão adormecidas? Ética, Acesso e Sustentabilidade Apesar do cenário promissor, os dilemas críticos persistem. Como impedir a exploração comercial de substâncias sagradas para povos originários? Como assegurar acesso democrático em nações periféricas, onde 80% dos casos de depressão permanecem sem tratamento? Especialistas do Centro Global de Saúde Mental sugerem modelos híbridos: parcerias com comunidades indígenas para uso ético de conhecimentos ancestrais, aliadas a protocolos digitais de terapia de integração via plataformas online. O objetivo é transformar a "revolução silenciosa" em um movimento inclusivo, nos distanciando dos erros históricos da indústria farmacêutica, como a elitização de tratamentos. Estamos assim, diante de um marco histórico. A psicodelia não é uma panaceia, mas pode simbolizar a mais disruptiva inovação em saúde mental desde a descoberta dos antipsicóticos nos anos 1950. Seu diferencial reside na capacidade de abordar não apenas sintomas, mas as raízes existenciais do sofrimento – promovendo não só sua remissão, mas ressignificação. À medida que instituições como Harvard e a UNIFESP inauguram centros especializados nessa área, se torna cada dia mais evidente: o século XXI será definido pela ousadia de adentrar a mente em sua absoluta complexidade multidimensional, orientada não por dogmas, mas por empirismo. A odisseia transcende a metáfora – se consolida como empreendimento científico, ético e, sobretudo, necessário. Eu acredito firmemente que essa possível convergência entre psicanálise e psicodélicos não apenas enriquece a prática clínica, mas resgata um diálogo interrompido pela medicalização excessiva. Enquanto a ciência mapeia circuitos neurais, a nossa escuta decifra narrativas íntimas, nos lembrando que a (cura) de processos psicológicos exige tanto precisão farmacológica quanto coragem de iluminar as sombras do ‘’Self’’ . Entrando pela porta dos fundos, me pergunto: Por que a ciência, em seu incessante afã por desvendar os mistérios do universo, redescobre agora o que culturas ancestrais já cultivavam em seus rituais sagrados? Ayahuasca e DMT: Explorando as Moléculas que Alteram a Mente. "Se o século XX medicaliza a alma, o século XXI corre o risco de espiritualizar a farmácia. Cabe a nós garantir que a revolução psicodélica não troque um reducionismo por outro" (POLLAN, How to Change Your Mind, 2018). Esse tipo de tratamento vai estar disponível só para quem pode pagar caro? Como garantir que não repitamos os erros do passado, o que é sagrado apenas para alguns? Revisitando a História e Desvendando a Ciência dos Psicodélicos Essa relação entre a humanidade e os psicodélicos se tece desde os primórdios da civilização, vem entrelaçada com a busca sempre infindável do ser pelo sagrado, pelo transcendente. Michael Pollan, em sua obra "Como Mudar Sua Mente" , nos lembra que "a cronologia dos psicodélicos se confunde com a memória de uma queda e de um possível renascimento" . Desde os rituais ancestrais com a ayahuasca nas entranhas da Amazônia, onde o espírito da floresta se manifesta em visões caleidoscópicas, até os laboratórios de Basel, na Suíça, onde Albert Hofmann sintetizou o LSD em 1943, essas substâncias sempre serviram como pontes entre o mundano e o transcendental, entre a realidade ordinária e as dimensões ocultas da consciência. Na década de 1960, o LSD, que outrora foi tão celebrado como um portal para a expansão da mente, foi sendo tragado pelas sombras do pânico moral, estigmatizado e banido para a ilegalidade. No entanto, o tempo, esse grande mestre implacável, traz consigo a redenção. Hoje, neurocientistas visionários como Robin Carhart-Harris, munidos de ferramentas de última geração, mapeiam meticulosamente os efeitos da psilocibina no cérebro. Seus estudos revelam que essa substância é capaz de reduzir a atividade do ‘’Default Mode Network’’ (DMN) que traduzida seria algo como "Rede de Modo Padrão" ou "Rede Cerebral em Repouso" . Trata aqui de um circuito neural interconectado, envolvendo regiões como o córtex pré-frontal medial, o córtex cingulado posterior, o lobo parietal inferior e o hipocampo. Essa rede é ativada quando o indivíduo não está focado em tarefas externas, funcionando como um "piloto automático" da mente durante estados de introspecção, devaneio ou autorreflexão, a região cerebral associada ao ego, à ruminação obsessiva e à incessante tagarelice psíquica. ''Será que o ‘reset cósmico’ é realmente novo?'' Ou é apenas a ciência, em sua lentidão burocrática, finalmente alcançando o que os curandeiros já sabiam há milênios?" (POLLAN, How to Change Your Mind, 2018). É como se o cérebro, antes aprisionado em padrões rígidos de pensamento e comportamento, ganhasse um "reset cósmico" , uma oportunidade de se reinventar, de se libertar das amarras do passado. Tais sinapses, antes enrijecidas pela repetição, se tornam maleáveis e abertas a novas conexões e possibilidades. A mente se torna assim uma terra fértil, pronta para ser cultivada com novas sementes. "O ‘psicodélico’ não tem o poder de criar o novo; seu potencial reside em revelar o antigo que jaz soterrado sob as ruínas do eu, esperando o momento certo para ressurgir." - Dan Mena. Um Diálogo no Limiar do Inconsciente DMT: A Molécula do Espírito e Suas Implicações para a Consciência Humana. Diante desse ‘’tsunami psicodélico’’ , levanto uma pergunta que desafia a própria noção de cura: e se Freud, ao invés de seu charuto, segurasse um cogumelo? O que ele faria com uma molécula que não pede licença para arrombar os porões da mente, rasgando os véus que a fala que por vezes, apenas acaricia? Quando Freud falava da compulsão à repetição como um rio subterrâneo que arrastava o sujeito de volta à cena traumática ou um retorno, que é ao mesmo tempo seria uma prisão na tentativa fracassada de restauração. Mas, eis o paradoxo dos psicodélicos: eles não desviam o rio, mas o transbordam. Como observou Grof, pacientes em estados alterados não relembram traumas — eles os reencarnam, reverberados em memórias pré-verbais, quase mitológicas, onde o corpo é palco e a consciência, espectadora atordoada. É a recorrência elevada ao potencial do ritual, onde o sofrimento, antes enclausurado, ganha asas de fênix. A psicanálise, com sua paciência arqueológica, varre camada por camada. Os psicodélicos, são como alquimistas que transformam essa escavação em erupção: derretem as muralhas do ego, e expõem fósseis psíquicos sob a luz crua de uma lanterna química. Mas cuidado — como argumenta James Fadiman, a substância é a chave, mas o terapeuta é o ladrão, aquele que sabe roubar segredos do caos e deve ter a proficiência de poder devolvê-los como narrativas conciliadoras. Como escreve Stanislav Grof, “as experiências psicodélicas frequentemente trazem à tona memórias perinatais e transpessoais, ampliando a consciência para além da biografia individual” – LSD Psychotherapy, 1980). E aqui, Lacan sussurra nos ouvidos da ciência: o Real não é um tesouro enterrado, mas o terremoto que revela que o chão sob nossos pés sempre foi ilusão. Os psicodélicos não "mostram" o Real — eles são o Real, uma erupção que dissolve a fantasia de controle, deixando o sujeito nu diante do espelho quebrado de si mesmo. Será que a psicanálise, em nosso rigor interpretativo, não teme justamente essa nudez? Ou será, afinal das contas, a única capaz de costurar uma nova roupagem para o rei desnudo, transformando delírio em diálogo? "O inconsciente não é um baú de segredos, mas um teatro em chamas. Os psicodélicos são os incendiários. Nossa tarefa? Aprender a dançar nas suas cinzas." - Dan Mena. O Renascimento Psicodélico: Como Está Transformando a Psicoterapia Moderna. Enquanto a ciência mede os neurotransmissores, a psicanálise pergunta: quem é o dono desse laboratório interno? E quando a química derruba as portas, será que o sujeito encontra o trauma ou apenas uma distorção de sua própria sede de infinito? "O Real não é aquilo que se esconde atrás do véu; é o véu que se dissolve quando o sujeito ousa olhar sem medo de ser despedaçado, quando se permite encarar a verdade nua e crua de sua própria existência." Dan Mena. Você acredita que algumas dores emocionais são tão cavadas que só podem ser acessadas por vias diferentes do diálogo ou da escuta? Quando a Química Se Encontra com a Alma A depressão resistente, aquela que teima em persistir apesar dos tratamentos convencionais, é um labirinto implacável, onde o Minotauro não é uma criatura externa, mas a própria escuridão que habita o interior do indivíduo. No entanto, a esperança renasce com os estudos promissores da MAPS (Multidisciplinary Association for Psychedelic Studies), que demonstram que uma única dose de psilocibina, combinada com terapia de apoio, é capaz de reduzir os sintomas da depressão em até 80% dos casos, com efeitos duradouros por até 6 meses. Por que essa substância possui um poder tão transformador? A resposta reside na neuroplasticidade, a capacidade do cérebro de se reorganizar, de formar novas conexões sinápticas. Enquanto os antidepressivos tradicionais atuam como "amortecedores químicos" , aliviando os sintomas sem abordar a causa raiz, os psicodélicos parecem promover uma reconfiguração sináptica, permitindo que o indivíduo construa novas estradas neurais, caminhos e estradas para a Disney e o bem-estar. É a diferença entre tapar um buraco na estrada e reconstruir a estrada por completo. Nietzsche, em sua obra "Assim Falou Zaratustra" , antecipou: "É preciso ter caos dentro de si para dar à luz uma estrela dançante" . Poderíamos dar a essa frase esse peso em relação ao psicodélicos, esse caos organizado, uma força disruptiva que pode impulsionar para romper com o ‘’status quo’’ , questionando crenças limitantes e a sua própria reinvenção. "A cura não reside na fuga da sombra, mas na coragem de dançar com ela sob a luz de um sol para cada um, abraçando nossos demônios internos e os transformando em aliados." - Dan Mena. O que aconteceria se, ao invés de esconder nossos traumas, os percebêssemos com intensidade ritual? Na sua opinião: isso ajudaria a curar? O Potencial Terapêutico dos Psicodélicos: Desafios e Oportunidades. Ayahuasca e o Renascimento do Sagrado Esse ' 'chá ancestral dos povos amazônicos'' foi sempre um portal para o sagrado, um facilitador de experiências de morte e renascimentos simbólicos. Francisco Londoño, em sua obra "Trippy: The Awakening of Ayahuasca" , descreve cerimônias onde pacientes confrontam "fantasmas intergeracionais", traumas transmitidos de geração em geração, que aprisionam o indivíduo em padrões de sofrimento. "O sagrado não habita a substância; ocupa o espaço entre o que foi vomitado e o exposto, entre a purgação do sofrimento e a iluminação da compreensão." - Dan Mena. Ética, Risco e os Limites Psíquicos As palavras de Foucault batem com força: "Todo poder clínico carrega o risco de uma nova disciplina" . A comercialização desenfreada de retiros de ayahuasca e o uso recreativo descontrolado de psicodélicos são armadilhas perigosas. Rick Strassman, em sua obra "DMT: A Molécula do Espírito" , advertiu: "Experiências místicas não são atalhos para a maturidade espiritual" . A terapia psicodélica exige (preparo mental), ‘’setting’’ (ambiente seguro) e ‘’guidance’’ (acompanhamento). Sem essa tríade, o que poderia ser um facilitador terapêutico se transforma em um pesadelo, um gatilho para psicoses latentes. “As experiências psicodélicas têm o poder de desarmar os mecanismos de defesa do ego, permitindo acesso direto ao inconsciente profundo, onde reside não apenas a dor, mas também a sabedoria arquetípica” – Psychology of the Future, 2000.) - Stanislav Grof. É básico que o terapeuta possua uma formação sólida, um conhecimento assertivo dos efeitos psicodélicos e uma sensibilidade aguçada para lidar com as emoções raras que surgem, sem dúvidas durante a experiência. "A banalidade do mal reside também na ilusão de que a transcendência pode ser engarrafada e vendida como mercadoria, de que a iluminação pode ser alcançada através de um atalho químico." - Dan Mena. Será que estamos preparados para ver tudo o que o inconsciente guarda, de forma tão direta como os psicodélicos permitem? Reconstrução do Trauma (TEPT) O MDMA, conhecido popularmente no Brasil como "ecstasy" , surge como alternativa medicamentosa para aqueles que sofrem com o Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Temos relatos de psicanalistas americanos que em sessões controladas, essa substância reduz o medo e aumenta a confiança, permitindo que os pacientes revisitem memórias traumáticas sem se dissociarem da realidade. Ben Sessa, em sua obra "The Psychedelic Renaissance" , defende que o MDMA "não apaga o trauma, mas desarma sua carga emocional" . É uma reprogramação do arquivo cerebral, onde o evento permanece, mas perde o poder de definir quem somos. O trauma deixa de ser uma sentença de condenação perpétua e se torna uma cicatriz, uma marca de superação. Superando Vícios com Psicodélicos: Uma Abordagem Inovadora. Democratizando o Acesso à Cura Enquanto clínicas de elite cobram somas exorbitantes por tratamentos psicodélicos, comunidades periféricas continuam à margem dessa revolução terapêutica. A psicologia ambiental nos ensina que contexto é destino. Negar seu acesso é perpetuar uma violência epistêmica, uma injustiça social. Projetos como o Santo Daime no Brasil demonstram que é possível integrar tradição e ciência, mas a regulamentação ainda caminha a passos lentos aqui no Brasil. Como diz Byung-Chul Han, "a sociedade do cansaço prefere anestesiar a questionar" , a perpetuar o sofrimento em vez de buscar soluções inovadoras. "A descolonização da mente exige mais que discursos; exige soluções que quebrem as algemas invisíveis da angústia internalizada, que permitam ao indivíduo se libertar das opressões arcaicas." - Dan Mena. O Futuro da Terapia – Integração ou Ilusão? Estamos no limiar de um novo paradigma. A ketamina, já aprovada para depressão resistente nos EUA, é apenas a ponta de um iceberg. Mas a pergunta seria: "O que queremos dessa nova realidade?" A resposta pode estar na integração. Uma sessão psicodélica sem acompanhamento pós-experiência é como ler um livro sem sua interpretação, como assistir a um filme sem refletir sobre sua mensagem. Neal M. Goldsmith fala: "A trilha psicodélica é 10% experiência e 90% assimilação" . A integração é o processo de dar sentido a esse traquejo, e, traduzir as visões acolhidas em ações concretas e mudanças positivas. Você já sentiu que seu corpo “lembra” de coisas que sua mente esqueceu? "Na modernidade, até a cura deve aprender a se inserir entre a efemeridade do êxtase e a solidez do sentido, entre a promessa de transformação instantânea e a necessidade de um trabalho contínuo de autoconhecimento." - Dan Mena. Essa capacidade de romper com padrões mentais cristalizados remete ao conceito de “campo mórfico” de Rupert Sheldrake, onde “mudanças sondas em um indivíduo reverberam no campo coletivo, permitindo que outros também encontrem novas formas de ser” (The Presence of the Past, 1988). Minha Visão Psicanalítica da Terapia com Psicodélico s Apesar de Freud não ter vivenciado diretamente os efeitos dessas substâncias, lançou bases para uma teoria da mente que se mostra surpreendentemente relevante no contexto da amostragem psicodélica. Seguindo seus passos por exemplo, na noção de recalque, central na teoria freudiana, Aqui descreve o mecanismo pelo qual impulsos e memórias dolorosas são banidos da consciência, relegados ao reino obscuro do inconsciente. Os psicodélicos, ao diminuírem a atividade do ‘’default mode network’’ , parecem afrouxar ditas amarras do recalque, permitindo que conteúdos inconscientes afloram à consciência com maior facilidade. Essa emergência pode ser tanto libertadora quanto desafiadora. Por um lado, o indivíduo tem a oportunidade de confrontar traumas e conflitos não resolvidos, de elaborar emoções reprimidas e integrar partes de si mesmo que haviam sido negadas. Por outro, a avalanche de conteúdos inconscientes pode ser desestruturante e até mesmo traumatizante, caso não haja um terapeuta qualificado para guiar o processo. Ouvindo Lacan, outro mestre gigante da psicanálise, ao introduzir o conceito de "Real" , como dimensão da vivência que transcende a linguagem e a representação. O Real é o indizível, o traumático, o que resiste à simbolização. Dita experimentação psicodélica, em sua intensidade e estranheza, pode levar o sujeito a confrontar o ‘’Real’’ de maneira abrupta, vislumbrando sua fragilidade da realidade construída, e a questionar a própria identidade. Como psicanalista nesta posição, não sou apenas um guia, mas também uma testemunha, um ouvinte atento e compassivo, capaz de acolher o sofrimento do paciente e de ajudá-lo(a) a dar sentido à sua singularidade. O terapeuta, à semelhança do ‘’analista lacaniano’’ , deve se situar como um "objeto a" , um objeto causa de desejo, que impulsiona o paciente a buscar sua própria verdade, e construir sua narrativa particular. Assim como o poeta Arthur Rimbaud proclamava: "É preciso ser absolutamente moderno" , a terapia com psicodélicos nos convida a desafiar o novo, a questionar o estabelecido e a nos aventurarmos nos territórios desconhecidos da consciência. No entanto, é um percurso que deve ser amplamente discutido e guiada pela ética, pela responsabilidade e pelo respeito à integridade do indivíduo. Até que ponto o nosso "eu" é uma construção frágil que teme ser desfeito? Você já teve alguma experiência onde sentiu que perdeu o controle, mas ao mesmo tempo se encontrou? Cura Espiritual com Psicodélicos: Uma Perspectiva Contemporânea. A Última Fronteira É o Próprio Humano Ao longo deste artigo, desafiei, me arrisquei a abordar um tema que muitos psicanalistas nem ousam tocar na primeira letra. É portanto uma trilha tênue, uma corda quase invisível, como linha de pesca, que separa o ceticismo da crença, o racional do místico. A nova fronteira da terapia mental não se encontra nas moléculas em si, mas na nossa ousadia em redescobrir que a mente é um território incógnito ainda, vasto e inexplorado, repleto de mistérios e potencialidades. Os psicodélicos não representam a panaceia universal, a solução mágica para os males da alma. Eles são, antes de tudo, um repensar nossa concepção do que significa ser, questionando nossas crenças limitantes e provocando expandir a percepção da realidade. Como escrevi no início, citando Jung: "O psicodélico revela o antigo". Talvez o "antigo" que ansiamos resgatar seja a capacidade de nos maravilharmos com o infinito que reside em nosso interior, de nos conectarmos com a essência primordial, e a capacidade inata de amar, criar e nos transformar. "A única maneira de lidar com um universo absurdo é se tornar um revolucionário da própria existência — e nisso, os psicodélicos são tanto espelho quanto martelo: espelho que reflete nossa sombra e luz, martelo que quebra as correntes do conformismo’’ - Dan Mena. O que te parece mais curativo: calar a dor com medicamentos ou entender o que ela quer dizer? Ketamina e Outros Psicodélicos no Tratamento da Depressão: O Que a Ciência Revela. Por fim, quero fechar com duas citações pertinentes: “Não exploramos o mundo externo porque o conquistamos, mas porque temos medo de entrar em nós mesmos” - Clarice Lispector. E talvez, como sabiamente diz Lacan: ‘’não é o inconsciente que nos assusta, é o fato de que ele sabe demais sobre nós’’ . Referências Bibliográficas POLLAN, Michael. How to Change Your Mind: What the New Science of Psychedelics Teaches Us About Consciousness, Dying, Addiction, Depression, and Transcendence. 2018. Penguin Press. POLLAN, Michael. Como Mudar Sua Mente: O Novo Poder da Psicodelia. 2018. Companhia das Letras. FADIMAN, James. The Psychedelic Explorer's Guide: Safe, Therapeutic, and Sacred Journeys. 2011. TarcherPerigee. GROF, Stanislav. LSD Psychotherapy. 1980. Grove Press. GOLDSMITH, Neal M. Psychedelic Healing: The Promise of Entheogens for Psychotherapy and Spiritual Development. 2011. MAPS. SESSA, Ben. The Psychedelic Renaissance: Reassessing the Role of Psychedelic Drugs in 21st Century Psychiatry and Society. 2012. Muswell Hill Press. LEVINE, Stephen M. The Ketamine Papers: Science, Therapy, and Hope. 2020. Synergetic Press. Não disponível. KRIPPNER, Stanley; PITCHFORD, Daniel B. Psychedelic Psychotherapy: The Healing Potential of Expanded States. 2019. Inner Traditions. STRASSMAN, Rick. DMT: The Spirit Molecule: A Doctor's Revolutionary Research into the Biology of Near-Death and Mystical Experiences. 2000. Park Street Press. STRASSMAN, Rick. DMT: A Molécula do Espírito: Uma Pesquisa Revolucionária sobre a Biologia das Experiências de Quase-Morte e Místicas. 2010. Cultrix. SHRODER, Tom. Acid Test: LSD, Ecstasy, and the Power to Heal. 2014. Blue Rider Press. LONDOÑO, Francisco. Trippy: The Awakening of Ayahuasca. 2023. Celadon Books. BROWN, David Jay. Maps of the Mind: Interviews with Researchers, Therapists, and Designers of Consciousness-Altering Drugs. 2006. MAPS. MCKENNA, Terence. Food of the Gods: The Search for the Original Tree of Knowledge. 1992. Bantam Books. MCKENNA, Terence. Comida dos Deuses: A Busca pela Árvore do Conhecimento Original. 2010. Cultrix. GROF, Stanislav. Realms of the Human Unconscious: Observations from LSD Research. 1975. Viking Press. NARANJO, Claudio. The Healing Journey: New Approaches to Consciousness. 1973. Ballantine Books. WINKELMAN, Michael J.; ROBERTS, Thomas B. (Eds.). Psychedelic Medicine: New Evidence for Hallucinogenic Substances as Treatments. 2007. Praeger. Palavras Chaves #TerapiaComPsicodélicos #SaúdeMental #Psilocibina #MDMA #LSD #Ayahuasca #Psicoterapia #Depressão #Ansiedade #TEPT #Neurociência #Inconsciente #BemEstar #PsicologiaPositiva #TerapiaOnline #InclusãoPsicológica #PsicologiaAmbiental #PsicologiaEsporte #ViésesCognitivos #Felicidade #danmenapsicanalise #blogpsicanalise FAQ - Perguntas Frequentes para a Escuta Psicanalítica Observações Importantes; No momento o uso terapêutico de psicodélicos no Brasil, incluindo a ayahuasca, só pode ser realizado dentro de pesquisas científicas previamente autorizadas pelas autoridades competentes: (ANVISA). Está autorizada em diversos países, embora com diferentes regulamentações e condições. Alguns deles onde existem programas ou autorizações para terapia incluem: Estados Unidos : Existe um interesse crescente em ensaios clínicos autorizados pela FDA que estão em andamento para tratar condições como transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e depressão resistente ao tratamento. Canadá : O uso terapêutico de psicodélicos, como a psilocibina, está sendo explorado com ensaios clínicos e autorizações específicas. Reino Unido : O NHS (Sistema de Saúde do Reino Unido) conduz ensaios clínicos com psilocibina para tratamento de depressão resistente. Brasil : Recentemente, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) autorizou o uso compassivo de psilocibina e MDMA para tratamento de doenças mentais graves. Holanda : Embora não oficialmente aprovada, há discussões e programas de pesquisa em andamento com psicodélicos. Suíça : Psicoterapeutas têm permissão para usar psicodélicos em terapia, em contextos específicos e com regulamentação rigorosa. Verifique as regulamentações locais específicas, pois a legalidade e as condições para terapia com psicodélicos podem variar significativamente de país para país. O que é terapia com psicodélicos? → É o uso de substâncias como psilocibina e MDMA em sessões clínicas controladas, com o objetivo de tratar transtornos mentais e promover experiências terapêuticas profundas. Quais substâncias são usadas na terapia psicodélica? → Psilocibina, MDMA, LSD, ayahuasca e ketamina são as mais utilizadas, cada uma com propriedades específicas que facilitam diferentes formas de acesso ao inconsciente. É seguro fazer terapia com psicodélicos? → Quando realizada em ambientes clínicos controlados e com acompanhamento profissional, é considerada segura. Fora desse contexto, há riscos físicos e psíquicos importantes. Quais transtornos a terapia psicodélica pode tratar? → Depressão, ansiedade, TEPT, dependência química e transtornos relacionados a traumas são as indicações mais comuns, com resultados promissores em estudos clínicos. Como a psilocibina funciona na terapia? → Ela altera a percepção e diminui as barreiras do ego, permitindo o contato com conteúdos emocionais profundos e reprimidos, favorecendo insights e reestruturações internas. O que é MDMA na terapia? → O MDMA facilita o processamento de traumas ao reduzir o medo e aumentar a empatia, sendo especialmente eficaz no tratamento do TEPT, segundo estudos internacionais. A terapia com psicodélicos é legal no Brasil? → Ainda não é regulamentada, mas existem pesquisas em andamento, como as desenvolvidas pelo Instituto Phaneros, que buscam embasamento científico e respaldo ético. Como a neurociência apoia a terapia psicodélica? → Estudos demonstram que psicodélicos alteram redes neurais e aumentam a plasticidade cerebral, o que favorece novas conexões e formas de pensar, sentir e agir. Qual é o papel do inconsciente na terapia psicodélica? → Os psicodélicos facilitam o acesso a conteúdos inconscientes, como memórias reprimidas e emoções não verbalizadas, permitindo que sejam ressignificados terapeuticamente. Psicodélicos podem melhorar o bem-estar? → Sim. Muitos relatos e pesquisas apontam para aumento na sensação de conexão, felicidade e propósito de vida após sessões terapêuticas bem conduzidas. O que é psicologia positiva e como se relaciona? → É uma abordagem que valoriza aspectos como resiliência, gratidão e felicidade — dimensões que também emergem nas experiências com psicodélicos, ampliando seus efeitos. Como a terapia online se conecta aos psicodélicos? → A psicoterapia online pode ser uma aliada na preparação para sessões com psicodélicos e, especialmente, na integração das experiências vividas, tornando-as mais transformadoras. Por que a inclusão é importante na terapia psicodélica? → A inclusão garante que pessoas de diferentes origens e culturas tenham acesso seguro e ético ao tratamento, respeitando suas histórias e singularidades. Como o meio ambiente afeta a saúde mental? → A crise climática e a degradação ambiental geram angústias existenciais e ecológicas, que podem ser acolhidas e transformadas em processos terapêuticos com psicodélicos. O que são vieses cognitivas na psicologia? → São distorções inconscientes do pensamento que afetam decisões e percepções. Na terapia psicodélica, esses vieses podem ser revelados e trabalhados com mais clareza. Visite minha loja ou site: https://uiclap.bio/danielmena https://www.danmena.com.br Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130.Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Department of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. De 1 a 5 - Quantas estrelas merece o artigo? Deixe seu relato abaixo em COMENTÁRIOS.
- A Arte de Escutar - Existir com o Outro
Como ouvir alguém com empatia no dia a dia. A Arte de Escutar - Ouvir é Existir com o Outro A Escuta Psicanalítica: Para Além do Espelho do Eu No âmago da prática psicanalítica habita uma competência aparentemente trivial, mas de enredo vertiginoso: a arte de acolher a palavra do outro . Freud e Lacan sublinharam que o ato de ouvir ultrapassa a mera decodificação verbal, o que exige um despojamento radical das nossas próprias referências internas para permitir a emergência do inédito no dizer do alheio. No entanto, o nosso impulso inicial é de filtrar histórias através das particulares vivências, o que transforma essa escuta — ou melhor, essa recepção — convertendo a ação em um exercício contraditório. Aquilo que se apresenta como um gesto de aproximação — a tentativa de encontrar paralelos entre experiências — apaga o traço de singularidade do interlocutor. O Narcisismo da Audição Cotidiana No tecido ordinário das conversas, é natural que sintonizemos com as narrativas apartadas, as comparando inconscientemente com nossas singulares memórias, afetos e percepções. Quando alguém compartilha algo doloroso, é quase instintivo que procuremos psiquicamente o próprio repertório emocional para situações semelhantes, como se a empatia dependesse de uma equivalência biográfica . Usamos comumente expressões como “Compreendo exatamente o que você está sentindo” ou “Já passei por algo parecido” - não é desse jeito? - palavras que num primeiro momento parecem angariar um esforço de empatia e acolhimento, mas, que também denunciam um mecanismo de redução da alteridade — ‘’o outro’’ é convertido em espelho e voz da nossa própria teia e narrativas. Esse movimento, que funciona como uma cola para os vínculos sociais, se tornou um empecilho no ‘’setting analítico’’ , onde o propósito é precisamente dar vida a aquilo que escapa aos padrões da fala. Essa operação psíquica, que pertence a uma articulação do registro imaginário — é uma zona onde os vínculos se constroem por meio de imagens especulares, comparações e rivalidades. Quando o(a) analista se deixa capturar por essa lógica, corre o risco de interpretar os conteúdos do paciente como extensões de si — se perguntando, por exemplo, se uma crítica à figura paterna não seria, em última instância, uma afronta disfarçada à sua suposta autoridade. Esse ouvir autocentrado empaca os elementos disruptivos da linguagem falada do paciente: lapsos, vacilações, repetições enigmáticas e detalhes resistem bravamente à lógica corrente. A capacidade de escutar é tão antiga quanto a linguagem, mas tão negligenciada quanto o som de uma folha caindo na rua. Num mundo saturado por ruídos — notificações de todos os tipos, falas incessantes, debates polarizados inflamados —, retiramos a verdadeira atenção ‘’ao outro’’ , tornando essa oitiva um gesto insurgente e contra-hegemônico. Por que ouvir o outro melhora relacionamentos? "Aquilo que se apresenta como um gesto de aproximação — a tentativa de encontrar paralelos entre experiências — apaga o traço de singularidade do interlocutor. Já a escuta analítica, como sugere Christopher Bollas, 'é um ato de entrega ao desconhecido do outro' (Bollas, 1987, p. 14), um movimento que privilegia a abertura em vez da assimilação." “Ouvir é resistir à tirania do óbvio” - Dan Mena. Não se trata de uma atividade passiva, mas de um gesto de abertura radical ao discursante, à sua narrativa, ao não-dito que ele(a) carrega em silêncio e, que na maioria dos casos, sequer reconhece em si. Esse tipo de atenção é ponte entre existências insuladas e subjetividades que, por breves momentos, podem comungar de um mesmo espaço simbólico. Neste artigo, vamos falar dessa sensível, lúdica e crítica diária— para redescobrir essa escuta como um gesto do ser inaugural. O Silêncio: Subterrâneo das Palavras Vamos fazer uma metáfora e pensar o silêncio como se fosse um oceano na sua profundidade, muito sereno na superfície, mas repleto de correntes marítimas que se movimentam no seu fundo. As palavras, por sua vez, seriam como frágeis embarcações que ousam navegar nessas águas encobertas. “As palavras são barcos; o silêncio, o oceano profundo que as sustenta”- Dan Mena. Sem essa vastidão imensa, os vocábulos perdem sua densidade, direção e mistério. É nas pausas entre uma remada e outra, uma frase, e nas hesitações, lapsos, chistes, etc, que os conteúdos mais íntimos são insinuados. O mutismo provocado não é portanto ausência — é origem. “O silêncio não é vazio — é o útero onde nascem as palavras essenciais” - Dan Mena . Ainda assim, quantas vezes fugimos dele, como se seu esvaziamento ameaçasse nos engolir. Preenchemos cada intervalo com ruídos, gritos, interrupções, pontos de vista e reclamações, atropelando o que poderia florescer em plena quietude. Sustentar o silêncio é um gesto corajoso, uma forma de insurgência íntima. “Cada silêncio que retemos é uma semente de revolução interior” - Dan Mena. Nesse solo mareado da escuta silente, o inconsciente encontra espaço para se expressar com suas metáforas enigmáticas. Como ouvir as emoções do outro com cuidado. “O inconsciente sussurra em metáforas; cabe a nós decifrar seus poemas” Dan Mena. Escutar, nesse contexto, transcende o esforço de atenção — é um gesto de acolhimento desarmado. Despojamento é a palavra-chave: abrir mão de armamentos, como o julgamento, a pressa, a resposta automática, aquele ‘’fazer de conta que estou ouvindo’’ . Isso vale para todos, não apenas para o analista. É, em síntese, oferecer ao outro um espaço temporário de refúgio, um lar onde se possa ser o que ainda tememos reconhecer em si. “Ouvir é permitir que o outro habite temporariamente seu silêncio, é dar asilo ao que o outro receia ser” - Dan Mena. Vamos imaginar uma situação bastante comum, uma criança tentando nos contar uma história, com sua voz quase sempre trêmula, entrecortada, cheia de pausas, tropeços e fragmentos recortados. Um adulto, normalmente impaciente a iria corrigir ou tentar abreviar seu relato, ‘’como se fosse possível’’ . Um ouvinte verdadeiro, porém, acolhe esse caos linguístico. Seja, portanto, um “jardineiro de almas”. “Escutar é plantar flores em desertos emocionais" - Dan Mena . Cada tropeço verbal dessa criança é uma semente, pedindo ajuda, tempo e cuidados para florescer. Ouvir atentamente é como embarcar numa viagem sem mapa — um improviso delicado entre duas subjetividades em busca de sintonia, elaboração e compreensão. “A escuta verdadeira não tem roteiro — é um súbito despertar de duas almas em busca de acordes desconhecidos” - Dan Mena . Como entender melhor o que o outro diz? Cada hesitação prolongada e suspiros, contém uma pista de sentidos ocultos, tente praticar isso, você pode se surpreender. Essa navegação, que requer uma paciência quase mística, está cada vez mais rara numa cultura da velocidade e do imediatismo. “A verdadeira escuta não tem pressa — ela sabe que os frutos mais doces amadurecem no tempo da terra” Dan Mena . Trata-se de um processo orgânico, não industrial; de uma experiência de cultivo, não de colheita antecipada. A Harmonia no Caos Verbal As conversações que travamos são territórios de confusão: palavras que se atropelam, ideias que se perdem, sentimentos que transbordam em desordem aparente. Mas, para o ouvido sensível existe como uma música para o caos. “A escuta é a arte de encontrar música no ‘’pandemonium’’ das palavras”- Dan Mena . Tal como uma orquestra afina seus instrumentos, esse barulho e ruído inicial é prelúdio de algo que ainda virá — uma melodia ainda por nascer para ser tocada. Dita harmonia escondida se expõe não nas frases explícitas , nas entrelinhas, nos gestos silenciosos que acompanham o discurso. “As maiores verdades não são ditas — são sussurradas nas entrelinhas da palavra, perscrutar é a única forma de apalpar uma alma sem violá-la - Dan Mena. Num tempo em que a maioria grita para ser ouvido(a), o valor parece ter passado a residir no volume e na visibilidade, auscultar a voz, se transformou em resistência ética. É uma recusa a participar do espetáculo do vazio, uma competição por atenção que pretende eliminar o outro para se afirmar. Como destaca Donald Winnicott em Playing and Reality (1971), ‘’O analista deve criar um ambiente onde o paciente possa sentir-se seguro para ser quem é, sem medo de ser julgado ou interrompido. Esse espaço de ‘’holding’’ é essencial para que possa explorar sua própria experiência e encontrar sua voz autêntica’’ (p. 56). “Ouvir é resistir à tirania do óbvio” - Dan Mena. Logo interpretamos que ouvir é ação, também uma postura ativa de presença, curiosidade e entrega. Ao reconhecermos que o outro carrega em si um enigma irredutível, um universo, que talvez jamais possamos compreender por completo, mas, possível de ser contemplado — ainda que por breves instantes. A escuta não transforma apenas o falante — ela modifica, de forma sutil e poderosa, o que se oferece ao papel de ouvinte. Cada narrativa é uma fresta por onde somos desafiados, provocados, deslocados a abrir à possibilidade de rever nossas certezas, permitindo a necessária metamorfose interna. Trata-se de um processo que nos humaniza e vitaliza. Essa transformação é calada, não acontece em grandes gestos, mas nas pequenas escolhas: escutar sem interromper, perguntar sem invadir, acolher sem controlar. É uma revolução sem armas nem trincheiras — feita de escuta, presença e entrega. Como podemos integrar essa forma de posicionamento da escuta à vida comum? Essa condição está na matéria prima mais importante da clínica. A "escuta flutuante" (ou "atenção flutuante" , como também é conhecida) é um conceito fundamental na psicanálise freudiana e pós-freudiana, representando uma postura técnica e ética do analista durante as sessões. Destarte, minha intenção hoje é poder oferecer a você meu leitor, um insight valioso que possa ser usado— no supermercado, na sala de aula, no convívio doméstico, nos relacionamentos, no trato com os filhos, etc — essa qualidade de atenção rara. Se fosse dar uma dica para quem deseja promover tal virtude, diria que: a proposta está no gesto simples de se deixar tocar pelo que o outro diz sem correr para responder. É um convite ao encantamento cotidiano, diante da singularidade de cada voz, uma chance de transformar encontros banais em grandes e importantes revelações. O que significa ouvir o outro de verdade. E não é este o maior dos desafios? O de sustentar o nascimento do outro sem o anestesiar com as certezas que nos confortam? Ouvir é, paradoxalmente, aceitar não entender — ou ao menos, não captar de imediato. É sustentar a angústia de não saber o que fazer com o que ouvimos, permitir que a palavra do outro reverbere em nós, não para que se encaixe em nosso mundo, mas para que desestabilize suas bordas. Pode ser uma casa sem móveis: um espaço onde tudo pode entrar, sem saber o que vai permanecer. E nesse vazio — radical, desconcertante, transformador —, um espaço, onde encontraremos algo de nós mesmos que ainda não conhecíamos. No fundo, quem ouve sensivelmente também se escuta, não como repetição, mas como reflexo. Quem se debruça no próximo com honestidade se vê diante de sua própria incerteza, a das suas projeções. Nesse confronto inaudível que o sujeito se transforma, portanto, não é técnica, se desprende como ética. Não é método, enquanto experiência, não é domínio. É entrega. Há, nesse gesto, uma incrível generosidade que ultrapassa a clínica e invade a vida comum. Dar atenção a fala de alguém sem esperar nada em troca, sem tentar salvar, corrigir ou ajustar, é permitir que ele(a) exista, ainda que por alguns minutos, fora das exigências sociais. Tal movimento, por mais simples que pareça, é uma forma de cura — ainda que não promova seu alívio imediato, fato que seria da presença que muitas vezes realmente precisamos e carecemos. Não seriam também respostas, mas de alguém que não fuja quando dizemos algo sem sentido, que permaneça mesmo diante do absurdo. Talvez esse exercício seja a única forma de amor que não tenta possuir, que não se planeja, nem se molda. Um afeto que acolhe sem devorar e respeita a alteridade como impenetrável do seu enigma. Porque há algo no outro que jamais será dito, haverá certamente esse infindável ponto cego no núcleo do calado, como um resto inassimilável. Estamos acostumados a pensar que o conhecimento vem da fala, mas existe a possibilidade que venha antes da escuta. Do que ouvimos sem compreender e aceitamos sem reduzir, daquilo que sustentamos sem tentar traduzir. Essa postura rompe com a lógica do consumo, do controle e da previsibilidade. Assim, pare o tempo e diga: “Estou aqui. Não para te consertar, mas para te escutar. Mesmo que isso me desmonte um pouco, sem que eu precise sair de mim para te receber” . Benefícios de ouvir com atenção nas amizades. Seria isso um retorno a uma forma antiga de encontro? . Não à moda das redes sociais, onde tudo é exposto, exibido. Mas à tendencia dos encontros reais que podem se converter sem alarde e deixam marcadores invisíveis. Estes não produzem respostas, senão fecundam perguntas. Acredito que seja este um fator fundamental perdido que nos falta hoje: perguntas sinceras para vencer, que abram caminho e acolham o desconhecido para sustentar a dúvida. Estendamos a Fé, na possibilidade de que mesmo atravessados(as) por feridas, angústias e barulhos ensurdecedores, desencontros e traumas, ainda possamos tocar sem ocupar, ouvir sem capturar. Estar com o outro sem estar, nos perder — sem querer encontrá-lo(a) dentro de nós. A escuta é ao final, esse lugar onde o outro pode finalmente ser ‘’o outro’’ . Quem sabe só reste isso: dois seres, lado a lado, tentando, com harmonia, se ouvir na desordem. ''A escuta não transforma apenas o falante — ela modifica, de forma sutil e poderosa, o que se oferece ao papel de ouvinte.'' Como Freud descreveu em Recomendações aos que Exercem a Psicanálise (1912), ''O analista deve voltar sua própria atividade mental inconsciente, como um órgão receptor, para o inconsciente transmissor do paciente'' (p. 112). Nesse movimento, o ouvinte se torna um espaço vivo, aberto ao que o outro traz, desafiando suas próprias certezas e permitindo que a palavra alheia provoque deslocamentos internos.” Como escutar com paciência em conflito. A Escuta no Cotidiano Como reintegrar a escuta sensível à vida comum? A proposta não exige uma ruptura radical com a rotina, mas sim o granjeio de pequenas atenções — brincar com o tempo: desacelerar, dar margem ao improviso, permitir que o outro surpreenda. A escuta cotidiana pode ser um jogo poético entre mundos distintos. Em vez de reagir automaticamente, por que não fazer uma pausa? Em lugar de responder com um conselho apressado, que tal oferecer uma pergunta sucinta? “Escutar é brincar de existir no tempo do outro” - Dan Mena. Ao adotarmos uma postura lúdica, absorvemos sons e escavamos sentidos. “Ouvir é dar sem esperar — é oferecer hospitalidade à assimetria do outro”- Dan Mena. A escuta, compreendida em sua plenitude, é uma forma de coabitar o mundo do outro sem querer colonizá-lo. Um modo de ser que exige abertura radical ao desconhecido, uma ética do acolhimento que desmonta defesas, dissolve fronteiras e instaura vínculos reais. Uma arte ancestral esquecida, que com olhos novos pode ser reinventada e amplificada. “Ouvir e tocar o invisível com os ouvidos do coração” - Dan Mena. Uma Poética da Presença Há dias em que o mundo fala alto demais. As vozes se atropelam, as imagens piscam sem cessar, e tudo parece urgente — como se a própria existência dependesse de sermos ouvidos, vistos, notados. No entanto, há algo que desaparece nessa pressa: o espaço para a escuta. Não a escuta funcional, que responde e resolve, mas aquela outra — feita de demora e ressonância. Talvez nunca tenhamos tido tanto acesso ao que os outros dizem, e, ironicamente, escutemos tão pouco. Em tempos digitais, a escuta rareia. Não porque perdemos a capacidade auditiva, mas porque o que se cala foi expulso de nossas relações. Tudo deve ser dito, imediatamente, as palavras foram convertidas em conteúdos e suas pausas se tornaram suspeitas. Mas o que é uma escuta sem pausa? ou: Um encontro sem demora? Um ato que precisa de sombra. De um tempo que não exige eficiência, mas comparência. De um espaço onde as palavras não servem para explicar, mas para existir. Por isso, ela é tão rara quanto necessária. Na clínica, vejo isso com clareza. Pacientes chegam carregando um cansaço que não sabem nomear. A narrativa passa por um excesso de exposição, de expectativa, e auto-exigência. Querem falar, mas também não sabem mais o que dizer. Estão esvaziados de si. Na escuta analítica não oferecemos respostas, devolvemos espaço. Ao sustentar o silêncio, permitimos que a fala emerja de outro lugar — mais cavado, confuso e verdadeiro. Essa função terapêutica, devolve ao sujeito a dignidade de não saber o que sente. E ainda assim ser acolhido(a). Há também a escuta dos afetos miúdos, aquela que se faz no cotidiano: escutar um suspiro, um desvio no olhar, uma frase dita pela metade. Nem sempre é necessário um divã para que essa escuta exista, basta um coração desarmado, disposto a não atravessar o outro com suas certezas. Esse, "estou aqui" que não pede aplausos — que revela seu valor. Como uma lareira acesa numa noite fria: não fala, mas aquece. Como praticar escuta empática no trabalho? “Há escutas que salvam sem dizer uma só palavra.” - Dan Mena. Mais escuta, menos diagnósticos, menos conselhos, mais mãos dadas. Seria este o último refúgio de um mundo cansado de estampidos? ...um antídoto contra a pressa. Escutar é aceitar que não há solução imediata para o que doí. É permitir que o sofrimento tenha lugar antes de querer curá-lo. Também é espiritual, desde que possamos reconhecer o outro como uma charada, não como problema. Podemos enxergar no vazio da linguagem não uma ausência, senão uma potência, afinal, é um jeito de dizer: você não está só .Como escreve Emmanuel Levinas em Totalidade e Infinito (1961), “A relação com o outro é a ausência de resposta, é a pergunta sem resposta, é a pergunta que não tem resposta, é a pergunta que é a resposta” (p. 89). Referências Bibliográficas FREUD, Sigmund. Interpretação dos Sonhos . 1900. Editora Companhia das Letras. LACAN, Jacques. Escritos . 1966. Editora Zahar. FANON, Frantz. Pele Negra, Máscaras Brancas . 1952. Editora UFMG. HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço . 2010. Editora Vozes. FOUCAULT, Michel. A História da Loucura . 1961. Editora Perspectiva. BUTLER, Judith. Problemas de Gênero . 1990. Editora Civilização Brasileira. VYGOTSKY, Lev. Pensamento e Linguagem . 1934. Editora Martins Fontes. BEAUVOIR, Simone. O Segundo Sexo . 1949. Editora Nova Fronteira. DURKHEIM, Émile. O Suicídio . 1897. Editora WMF Martins Fontes. JUNG, Carl Gustav. O Homem e Seus Símbolos . 1964. Editora HarperCollins. NIETZSCHE, Friedrich. Assim Falou Zaratustra . 1883. Editora Martin Claret. RECALCATI, Massimo. Complexo de Telêmaco . 2013. Editora Âyiné. SKINNER, B.F. Ciência e Comportamento Humano . 1953. Editora Universidade de Brasília. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida . 2000. Editora Zahar. CHOMSKY, Noam. Linguagem e Pensamento . 1968. Editora Unesp. KLEIN, Melanie. Inveja e Gratidão . 1957. Editora Imago. BANDURA, Albert. Aprendizagem Social . 1977. Editora Artmed. MASLOW, Abraham. Motivação e Personalidade . 1954. Editora Harper Row. BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina . 1998. Editora Bertrand Brasil. WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo . 1905. Companhia das Letras. Palavras Chaves #Psicanálise #SaúdeMental #EscutaAnalítica #Freud #Lacan #Terapia #Inconsciente #ClínicaPsicológica #Trauma #SociedadeDoCansaço #EscutaAtiva #Psicoterapia #Autoconhecimento #MentalHealth #Psicologia #Filosofia #ComportamentoHumano #Empatia #SigmundFreud #ByungChulHan FAQ - Perguntas Frequentes sobre a Escuta Psicanalítica Qual é a essência dessa técnica terapêutica? → É um método clínico que transcende a audição superficial, focando no que não é vocalizado : hesitações, repetições e nuances do discurso. Como a prática de ouvir sem interromper transforma diálogos? → Suspender respostas automáticas permite que o inconsciente se revele. Exemplo: um paciente que sempre mudava de assunto ao mencionar a mãe descobriu, meses depois, um luto não elaborado. Essa abordagem pode ser útil em conflitos familiares? → Sim! Evitar frases como "Eu também passei por isso" abre espaço para histórias únicas. Experimente substituir por: "Como isso soa em você?" . Quanto tempo leva para se tornar proficiente nesse método? → Domina-se na prática constante. Sugestão: inicie com 2 minutos diários de silêncio ativo em conversas, observando o que surge nas pausas. É possível aplicar isso com adolescentes? → Totalmente. Eles comunicam-se por metáforas (músicas, jogos). Um jovem que só falava de Dark Souls estava, na verdade, descrevendo seu medo do fracasso. Essa estratégia substitui tratamentos psiquiátricos? → Não. Enquanto remédios atuam na química cerebral, o processo terapêutico trabalha significados simbólicos. São complementares. Por que iniciantes acham essa habilidade tão desafiadora? → Porque exige desconstruir o impulso de ajudar. Parafraseando Dan Mena: "Ouvir é um ato de resistência contra o próprio ego" . Como evitar cair em falsas conexões emocionais? → Troque "Entendo sua dor" por "O que essa dor está lhe dizendo?" . A verdadeira conexão nasce da curiosidade, não da projeção. Funciona em sessões online? → Sim, mas perde-se 38% da comunicação não verbal (dados de um estudo da Universidade de Stanford). Dica: peça para o paciente descrever gestos espontâneos. Qual o equívoco mais frequente entre terapeutas novatos? → Querer salvar o paciente com interpretações rápidas. Lacan dizia: "A cura está no ritmo do não saber" . E se o paciente inventar histórias? → Mentiras são sintomas narrativos . Em vez de desmascarar, explore: "Que verdade essa ficção está protegendo?" . Posso treinar sozinho essa competência? → Exercício prático: ouça um podcast em velocidade 0.75x, anotando como as palavras são ditas (tom, pausas) mais que o quê . Por que ‘’millennials e Gen Z’’ precisam disso urgentemente? → Cresceram em ambientes digitais onde a fala virou commodity. A técnica restaura a profundidade perdida nas interações. Como lidar com traumas intensos nesse contexto? → Respeite o tempo psíquico . Traumas são como vidro congelado: pressa quebra, paciência derrete. Qual a diferença entre isso e métodos de autoajuda? → Autoajuda oferece respostas. A clínica psicanalítica faz perguntas que o paciente nunca soube que tinha. Visite minha loja ou site: https://uiclap.bio/danielmena https://www.danmena.com.br Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199.Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130.Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Department of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. De 1 a 5 - Quantas estrelas merece o artigo? Deixe seu relato abaixo em COMENTÁRIOS .
- Do Corpo ao Avatar.
"Do corpo físico à identidade digital: como os avatares moldam nossa presença." A Crise Identitária Digital Em 2024, uma paciente me confessou, com os olhos fixos no chão: " Dan, meu Instagram tem mais vida que eu" . Seu relato não era obviamente sobre inveja ou vaidade, mas sobre um luto — o luto de um ‘’eu real’’ abandonado em prol de ‘ ’um avatar’’ . Essas palavras, que sempre lembro quando o assunto vem à tona, tocam numa verdade incômoda ao sujeito: a tela se tornou o novo divã. Se Freud analisava sonhos, hoje deciframos feeds. Se Lacan falava do espelho, hoje confrontamos algoritmos. Essa falsa migração do corpo físico ao ente digital não é apenas uma mudança de suporte — é uma revolução ontológica. Nas redes sociais, o desejo não se manifesta: é programado. Bytes convertem vulnerabilidades em produtos, corpos em transfiguração e intimidade em espetáculo. A construção da identidade virtual não é totalmente inocente, se reconhecer em uma imagem é o primeiro passo para a ilusão de ‘’unidade do eu’’ . Nas redes, porém, o espelho é infinito: cada postagem, um fragmento; cada like, um tijolo nesse edifício imaginário. O resultado? Um ‘’eu’’ disperso, refém da validação alheia. Mariana, 22 anos, passa 6 horas por dia editando várias ''selfies'', e fala: "Se não posto, sinto que não existo" , Seu caso ilustra a síndrome do "eu espectral" : quanto mais se expõe, menos se reconhece. Na psicanálise, descobrimos que sua ‘’projeção imaginária do perfeito’ ’ era uma fuga da rejeição parental na adolescência. Por esta razão, pela importância e atualidade do tema, vou abrir este artigo com algo muito novo em termos de contexto narrativo: '' O AVATAR'' . "Algoritmos do desejo: entenda como as redes sociais reprogramaram sua mente." O Avatar na Era Moderna — Entre o Espelho e o Algoritmo Donna Haraway, em ‘’Manifesto Ciborgue’’ originalmente publicado em (1985) como parte do livro ‘’Simians, Cyborgs, and Women: The Reinvention of Nature’’. A obra foi escrita em um contexto de intensas transformações tecnológicas (como o surgimento da internet) posteriormente, o texto se tornou um marco teórico para os estudos de gênero, ciência e tecnologia. Tive a grande oportunidade de ler, onde já previa essa fusão entre humano e máquina. Para ela, o avatar não é apenas uma extensão, mas um organismo político — um campo de batalha onde lançamos medos e desejos reprimidos. Em sua essência, é uma metáfora da nossa condição em tempos tecnológicos. O termo ‘’AVATAR’’ é originário do sânscrito ‘’avatara’’ — que designava a encarnação terrena de divindades para restaurar a ordem cósmica —, hoje, descreve o arremesso de nós mesmos em pixels, algoritmos e perfis filtrados. Não foi por acaso que essa palavra migrou do sagrado ao eletrônico, o avatar contemporâneo cumpre uma função quase religiosa, pois oferece redenção através da reinvenção. Nele, buscamos não apenas interligações, mas expiação — uma chance de apagar falhas reais e reescrever narrativas em ''timelines'' imaculadas. Como Lacan previu, a identidade se constroi na tensão entre o corpo real e sua imagem idealizada. Nas redes, esse estágio é revisitado quase diariamente. Cada selfie, post, atualização de perfil é um ato de reconhecimento: olhamos para esse novo ''Aladim'' como a criança olha para o espelho, buscando uma unidade que nunca se completa. A diferença cabal é que, enquanto ele falava de um ‘’espelho físico’’ , hoje temos ‘’cânones algorítmicos’’ — plataformas que não apenas sugerem, mas distorcem, ampliando partes de nós que geram engajamento e apagando as que não se encaixam no feed. Como nota Byung-Chul Han em Psicopolítica (2020), ‘’o avatar é menos uma expressão de liberdade e mais um campo de batalha onde lutamos por visibilidade em uma economia de atenção que nos consome.’’ Assim chegamos a um paradoxo: quanto mais nos esforçamos para sermos autênticos online, mais nos tornamos prisioneiros de scripts pré-definidos. O Instagram, por exemplo, não é uma ‘’vitrine passiva’ ’, mas um roteiro cultural que dita desde filtros até horários ideais para postar. Shoshana Zuboff, em A Era do Capitalismo de Vigilância (2019), explica como as plataformas transformam nossa busca por identidade em dados comercializáveis. O avatar, nesse sentido, é um produto de dupla face: enquanto nos permite adentrar em novas versões de nós mesmos, simultaneamente nos reduz a pacotes de informações comercializados a anunciantes. A liberdade de ser "quem você quiser" encontra um esbarro na dura realidade de que, no universo digital, até a rebeldia é categorizada em hashtags. Se vou pelo caminho da literatura filosófica, consigo encontrar outras respostas, principalmente chegando em Foucault, que ao questionar a noção de autoria em ‘’O Que é um Autor? ’’ (1969), parece antever essa pulverização do sujeito neste ambiente atual. O avatar não tem um único autor: é co-escrito por algoritmos, seguidores, tendências e até por aqueles que nunca interagem, mas cujo olhar ‘’imaginado’’ nos obriga a performar. Logo, Haraway, em seu Manifesto Ciborgue, vai além: propõe que somos todos híbridos de carne e código, seres liminares para quem a distinção entre humano e máquina já não faz muito sentido. O avatar, seria então, não uma mentira, mas uma desejada verdade aumentada — uma extensão inevitável de um eu que já não cabe na pele. Existe esperança nesse hibridismo? Em jogos como Second Life, (esse eu joguei), ' 'avatars'' tem minorias marginalizadas — LGBTQIA+, pessoas com deficiência, sobreviventes de traumas — reivindicam espaços de existência que são negados, limitados ou fóbicos no offline. Um estudo da Universidade de Stanford (2022) mostrou que 62% dos usuários de ambientes virtuais se sentem mais confortáveis expressando sua identidade de gênero através de avatares do que no mundo físico. Aqui, a tecnologia não é vilã, mas ferramenta de emancipação: um espelho que, ao invés de refletir opressões, as subverte de alguma forma. Destarte, a mesma fluidez que liberta, também aliena. Žižek, em ‘’Bem-Vindo ao Deserto do Real’’ (2003), nos adverte que vivemos em uma era de "fantasias desmaterializadas" , onde o corpo digital substitui o fisiológico como locus do desejo "locus do desejo" (do latim locus, "lugar" ) se refere ao espaço simbólico, psíquico ou material onde o querer se origina, se estrutura ou manifesta. Na psicanálise, essa ideia é central para entender como o desejo opera em contextos como os citados, onde esses novos códigos sociais reconfiguram nossa relação com o que desejamos.) Quando passamos mais tempo alimentando perfis online do que relações presenciais, arriscamos nos tornar estrangeiros de nós mesmos. A ‘ ’síndrome do impostor digital’’ — uma sensação de que o avatar é mais "real" que o eu offline — não é uma patologia individual, mas um sintoma coletivo de uma cultura que confunde existir com ser visto. Penso aqui com meus botões, que a saída, talvez, esteja em resgatar o avatar como metáfora, não como prisão. Em ‘’O Brincar e a Realidade’’ (1971), Winnicott fala dos "objetos transicionais" — como um cobertor ou um ursinho — que ajudam a criança a sobreviver à ansiedade da separação. O avatar, nesta comparação com o infantil, poderia ser nosso objeto transicional adulto: um mediador entre o eu íntimo e o mundo externo, desde que lembremos que mediadores não são fins, senão meios. Como escrevi em versos recentes: "Na tela, sou heroi, vilão, poeta, / Mas na carne, sou um verso ainda inacabado. / Que o avatar não apague minha sombra: / Ela é o que me faz real, mesmo desfocado." - Dan Mena. "Metaverso e psicanálise: o que Freud diria sobre avatars digitais?" A ética do ente robótico, portanto, não está em que o neguemos, mas, em usá-lo com lucidez. Isso exige questionamento a cada postagem: "Estou me expressando ou me editando?" . Também, isso requer reconhecer que, por trás de cada perfil, há um corpo que envelhece, cansa e deseja — uma alma que, no fim das contas, é a única capaz de sentir o abraço, o gozo e a dor que nenhum algoritmo pode simular. Afinal, como Lacan nos lembrava, "o real é o que resiste à simbolização" . E é nessa resistência — teimosa, imperfeita, gloriosamente nossa — que reside nossa chance de equilíbrio entre o que somos e o que as telas nos convidam a ser. "O avatar é a máscara que não oculta, mas expõe a ferida narcísica de uma geração que troca a intimidade por likes" - Dan Mena. A Metamorfose do Desejo na Era dos Avatares Se a jornada psicanalítica começa no inconsciente freudiano — território de pulsões reprimidas e fantasias cifradas —, ela termina, hoje, nos símbolos binários que regem nossos corpos digitais. Entre esses dois pólos, o erotismo vive uma metamorfose sem precedentes. Nas redes sociais, o desejo já não é apenas uma força íntima: é um script algoritmicamente otimizado, uma coreografia performática. A sexualidade, antes vivida como campus subjetivo, se tornou uma vitrine de corpos maquiados, relações líquidas e encontros descartáveis. Apps como Tinder e Instagram não mediam apenas conexões — reprogramam nossa libido, a transformando em dados navegáveis. Como escrevi em outro artigo: "O like é a moeda do desespero contemporâneo: compramos visibilidade com migalhas da alma." - Dan Mena. Essa transição da pulsão carnal ao cenário digital não é apenas trivial. Freud, ao falar da sexualidade como motor psíquico, jamais imaginou que um dia a genitalidade seria substituída por swipes e emojis. O "locus do desejo" , antes ancorado no corpo, migrou para as telas — um fenômeno que Byung-Chul Han descreve como "a pornificação da existência" , onde até a intimidade vira conteúdo. Há uma ironia cruel nesse processo, onde a promessa de liberdade sexual via redes, esbarra na padronização de corpos e fetiches. Esses novos cupidos ‘’tecnos’’ , nos empurram para nichos pré-definidos — fitness, geek, goth, etc —, reduzindo nosso hermetismo voluptuoso a categorias binárias. Do ‘’OnlyFans’’ aos avatares hipererotizados da IA e o Metaverso, eu pergunto? : o que perdemos quando o prazer vira produto, e o corpo, um perfil? Como pegar de volta a autenticidade do desejo em um mundo onde até o orgasmo é mensurável em curtidas? "Autoestima em colapso: o impacto das comparações digitais na saúde mental." A busca por validação altera a percepção do próprio corpo e das lascivas, conduzem a um estado de alienação em relação à própria sensualidade. A promessa de encontros rápidos e descomplicados enfrenta a superficialidade da interação, transformando a busca amorosa em um jogo de descartes. Os ''crushs digitais'' deslocam o erotismo para a imediatez do aquisitivo: ''o outro'' não é mais um sujeito desejável, mas um ‘ ’objeto de satisfação momentânea’’ . O impacto psíquico da ''hiper-exposição'' não pode ser subestimado. O aumento de transtornos como ansiedade e depressão tem sido correlacionado com a utilização acentuada dessas mídias, especialmente no que tange à autoestima e à percepção corporal. A comparação, seguida de relatos fictícios de prazer, geram uma distorção da realidade sexual e afetiva. Entretanto, não quero de forma alguma demonizar a tecnologia ou defender um retorno a um passado de telefones fixos. Pelo contrário, o que se faz necessário é uma educação emocional e digital que permita ao indivíduo usar esses espaços como ferramentas de expressão e autoconhecimento, e não como arcabouços psicológicos que se pretende. Encontrar um equilíbrio entre a vida eletrônica e a autenticidade dos desejos é um desafio contemporâneo, mas também uma oportunidade de ressignificar o prazer. A chave para essa integração está no autoconhecimento e na capacidade de reconhecer que, apesar das inovações, a estrutura do desejo permanece imutável: buscamos, acima de tudo, ser vistos e compreendidos, dentro e fora das telas. "A ilusão do eu virtual não é uma fuga, mas um sintoma contemporâneo: quanto mais nos mostramos, menos nos encontramos." - Dan Mena . Projeção de Fantasias e a Busca por Validação Navegamos por uma cisão primordial: de um lado, o consciente, território iluminado das escolhas racionais; de outro, o inconsciente, abismo onde residem os desejos recalcados, fantasias arquetípicas e pulsões que desafiam a lógica. Quanto mais buscamos controle sobre nossa identidade, mais somos governados por forças subterrâneas que escapam à razão. Nas redes sociais, essa dinâmica ganha contornos dramáticos. Elas não são meras ferramentas de angariar amizades, são teatros do inconsciente coletivo, onde projetamos, em tempo real, nossas sombras e anseios. A construção da identidade virtual, assim, não se limita à autorrepresentação: é um processo de transubstanciação psíquica. Nas plataformas, convertemos impulsos recalcados (a necessidade de ser amado, o medo da invisibilidade) em narrativas visuais. Instagram e TikTok operam como espelhos lacanianos amplificados — refletem não quem somos, mas quem desejamos que o ‘ ’Outro’’ acredite. Essa hiper-realidade simbólica, cria uma dupla incongruência: quanto nos aproximamos do ‘’ideal projetado’’, mais nos distanciamos do ‘’eu autêntico’’ , gerando a fratura interna que Winnicott chamaria de divórcio entre o “verdadeiro self” e o “falso self” . A compulsão à repetição — mecanismo psíquico que nos leva a reviver traumas na esperança inconsciente de serem dominados, nas redes, assumem forma algorítmica: rolamos infinitamente o feed, buscando em posts alheios a chave para preencher nosso vazio interior, enquanto a plataforma monetiza essa angústia. Portanto, não estamos simplesmente participando de um jogo social: é uma verdadeira economia libidinal, onde trocamos fragmentos afetivos por moedas de aprovação efêmera. O resultado? Uma identidade em colapso, esfacelada entre a ânsia de autenticidade e a sedução da ‘’persona’’ . A Tirania do Tempo no Metaverso Se Freud via na memória um "arquivo vivo" do inconsciente, o metaverso propõe um novo paradigma: a ‘’memória como commodity’’ . Aqui, não apenas registramos experiências, mas as recriamos, editamos e monetizámos em loops infinitos. Um passeio romântico em Paris, uma conversa com um ente querido falecido, uma reunião de trabalho — tudo pode ser revivido, reescrito ou apagado com um clique. O que isso significa para a psique, estruturada em narrativas temporais lineares (passado, presente e futuro)? A resposta está na crise do luto. No mundo físico, a morte impõe um limite à nossa identidade: somos o que lembramos, e o esquecimento é parte do processo de cura. Neste ambiente, porém, avatars de falecidos podem ser "ressuscitados" via IA generativa, mantendo conversas, enviando mensagens e até celebrando aniversários. Startups como ‘’HereAfter AI’’ já oferecem esse serviço, prometendo "eternizar" entes queridos como chatbots. O luto exige um trabalho de desapego; aqui, ele é sabotado por uma ilusão de imortalidade que Lacan chamaria de "gozo perverso" — o prazer mórbido de negar a falta que nos constitui. Essa distorção temporal vai além. Plataformas como ‘ ’Somnium Space’’ permitem que usuários "congelem" momentos em cápsulas de tempo virtual — um jantar, uma conquista, um trauma — para serem revisitados quando quisermos. É a realização extrema da pulsão de repetição freudiana: revivemos compulsivamente traquejos na esperança de poder domá-los, mas no metaverso, essa reiteração é literal, não simbólica. Qual o risco? A cristalização do eu: ficarmos presos em versões idealizadas de nós mesmos, como insetos arqueológicos em âmbar digital. A temporalidade desta esfera também desafia a noção de presente. Em ambientes como ‘’Decentraland’’ , o tempo é elástico: podemos participar de um show dos anos 70, depois de uma reunião corporativa em 2025, e terminar o dia em uma taverna medieval — tudo sem sair do avatar. Essa esquizofrenia cronológica, dilui a experiência do self, que já não se reconhece em uma linha narrativa coerente, sem ter um ‘’continuum temporal’’ , o "verdadeiro self" perde seu chão existencial, flutuando entre realidades paralelas como um fantasma sem história. Aqui surge uma pergunta impertinente: o que acontece com o inconsciente quando o tempo vira um playground? Se para Jung, o ‘ ’inconsciente coletivo’’ seria um reservatório de arquétipos atemporais; no metaverso, ele se torna um banco de dados, onde memórias são armazenadas, indexadas e vendidas. Empresas como ‘ ’Neurogress’’ já testam interfaces que convertem pensamentos em avatares, transformando sonhos em NFTs. É a capitalização do imaginário, onde até nossos devaneios mais íntimos têm preço. (NFTs são certificados digitais únicos, registrados em ’’ blockchains’’ , que atestam a propriedade e originalidade de um ativo (arte, música, avatares, terrenos virtuais). "Da selfie ao deepfake: a evolução da identidade na era tecnológica." Diferente de criptomoedas, são insubstituíveis: cada NFT é um item exclusivo, conjecturando a busca por singularidade em um mundo de reproduções infinitas. No metaverso, eles simbolizam ‘’status’’ : (roupas de avatar, propriedades virtuais) e alimentam a economia do desejo — onde "ter" substituí " ser". Como psicanalista, vejo nestas mecânicas dois caminhos. O primeiro é patológico: uma geração que substitui a elaboração psíquica pelo consumo de vivências pré-fabricadas, trocando a riqueza do conflito interno pela pobreza do entretenimento sem fim. O segundo é terapêutico: o metaverso como espaço de ressignificação, onde pacientes revisitam traumas com a mediação segura de ‘’avatars’’, ou se reconectam com memórias perdidas através de reconstruções digitais. A mediação, como sempre, está no uso crítico. Se o mundo virtual for apenas um novo shopping center de identidades, repetiremos os erros das redes sociais. Mas se o encararmos como uma lupa — que retrata não apenas quem somos, mas quem poderíamos ser —, talvez encontremos nele um aliado no espírito freudiano de "recordar, repetir, elaborar" . Hiper conexão, Isolamento e Narcisismo Na era da hiper-globalização, a sensação que temos é que hoje tudo parece estar ao alcance de um clique. Isso determina um paradoxo crescente, pois o que se verifica na clínica é o aumento dos sentimentos de encapsulamento, isolamento e solidão. Essa contradição utópica, será muito bem detalhada por Byung-Chul Han, que de forma perspicaz em sua obra; “A Sociedade do Cansaço” de (2015) descreve. Apesar dessa aparente articulação conectiva proporcionada pelas redes, vivemos em uma sociedade exausta, onde a comunicação se tornou um fluxo incessante e frívolo de informações. Ele assevera, que a comunicabilidade não é mais do que simplesmente uma constante sequência de dados e elementos sem sentido, destacando como tal a proliferação de opiniões, pareceres e apreciações, que podem, incoerentemente, isolar mais do que ligar. Esses fatores alargam o narcisismo e amplia exponencialmente o egocentrismo, criando um ambiente onde o indivíduo se vê como um projeto contínuo de atuação. Observa Han: “O narcisismo reflete uma sociedade que valoriza a produtividade e o desempenho acima de tudo, resultando em uma desconexão emocional” (Han, 2015). Nesse universo, não apenas projetamos uma imagem produzida e pré-fabricada de si, mas também envolvemos sentimentos de corroboração. A exibição pública, e a necessidade de sustentar uma imagem impecável, podem obscurecer o verdadeiro eu, criando uma ruptura psicológica. Logo, posso convocar uma frase de Freud; “O narcisismo é a forma mais primitiva de amor que o ego pode ter por si.” "O narcisismo virtual nos obriga a existir como personagens de nós mesmos, medindo nossa relevância por curtidas." - Dan Mena. Plataformas Digitais Redefinem - Proximidade e Intimidade Nesta era informática, a percepção de proximidade não mais se limita ao físico. Sabemos que interações genuínas envolvem trocas emocionais, afetos e empatia — elementos regularmente enfraquecidos no ambiente virtual. Elas criam a sensação de estarmos sempre conectados, mas essa proximidade virtualizada pode ser muito ilusória. Embora estejamos continuamente presentes nelas, a ausência de contato físico direto pode intensificar a sensação de solidão, ao invés de ser um atenuante. Essa nova forma de distanciamento íntimo, enseja compartilhar aspectos pessoais da nossa vida com um público vasto, sem a vulnerabilidade inerente ao contato presencial. Nessa dinâmica, exercemos controle sobre o que revelamos de si, e, ao mesmo tempo, expomos assuntos particulares para o olhar constante e crítico de outros, moldando imperceptivelmente a nossa identidade, conforme tais observações de terceiros. Nesse sentido, a vizinhança é radicalmente transformada, o ''outro'' está próximo no campus virtual, mas permanece longe em termos de verdadeira vinculação. As interações oferecem encontros e cruzamentos rápidos, imediatos e instantâneos, mas carecem da necessária introspecção que caracteriza as relações autenticamente humanas. Essa redefinição das noções de proximidade e distância, mudam as fronteiras entre o real e o virtual. Redes, enquanto teatros de construção de identidades, intensificam, tanto a alienação quanto o desejo de reconhecimento. Destarte oscilamos, entre presença e ausência, autenticidade e interpretação, enfrentamos não apenas novas formas de ligação ao outro, mas também, sofremos severamente os desafios afetivos e psíquicos decorrentes dessa transição. "Na sociedade do cansaço, onde a produtividade define o valor do indivíduo, até o amor se tornou uma atuação, e o descanso, um ato de resistência." - Dan Mena. "Privacidade vs. Exposição: qual o preço de ser visto nas redes sociais?" Identidades Despedaçadas A autoestima, outrora ancorada na congruência interna, agora flutua na instabilidade das métricas externas — "você é suficiente" ou "falhe melhor na próxima tentativa" . Destarte, o espelho digital tem uma duplicidade perversa. Enquanto nos mostra corpos esculpidos, vidas perfeitas e conquistas irreais, ele nos devolve uma imagem fragmentada de nós mesmos. O paradoxo do descuido é coreografado, o "espontâneo" é ensaiado e a autoexploração substituiu a disciplina externa. Caçamos falhas como se fôssemos curadores de um museu que nunca aceitará nossa própria exposição. Identifico aqui uma mutação da pulsão de morte: não mais dirigida à autodestruição física, mas à compulsão por editar, apagar e retocar. A medicalização da autoimagem é o desdobramento mais sombrio dessa lógica. Cirurgiões plásticos relatam pacientes que exigem "nariz de influencer" ou "lábios de avatar" , trazendo prints de filtros como referência. Um estudo da Faculdade de Medicina de Boston (2023) noticiou que 68% dos jovens entre 18 e 25 anos consideram realizar procedimentos estéticos para se assemelhar a suas versões editadas online. A fronteira entre o real e o virtual se dissolveu, e o corpo físico se tornou uma tela a ser corrigida. Nem tudo, porém, é distopia. Movimentos como #NoFilter e #FaceCheck desafiam a ditadura da perfeição, enquanto artistas como Lauren Lee McCarthy expõem a vigilância algorítmica em instalações que escancaram como nossos rostos são rastreados, categorizados e vendidos. São atos de desobediência ontológica, no espírito de Haraway, que lembram que a tecnologia pode ser ferramenta de emancipação, não só de opressão. ‘’Nem tudo está perdido, — podemos a qualquer momento reatar com a desconexão, retomando o diálogo entre corpo e self.’’ - Dan Mena. Efeitos na Identidade Juvenil e nas Gerações Digitais Olhando agora para os jovens que crescem nesse mar digital, a identidade é como uma embarcação no estaleiro, em constante construção. A crise identitária na adolescência é um período de grandes questionamentos e estabelecimento de definições. Essas tribulações se intensificam, à medida que os adolescentes amadurecem tentando se adaptar a uma identificação frouxa, onde a autenticidade é incessantemente sacrificada pela busca dessa validação. Às reflexões íntimas que deveriam se desenvolver naturalmente pelo contato físico — são substituídas por uma ininterrupta troca de mensagens e interações virtuais. A elaboração da personalidade e individualidade dos pubescentes, se transformaram em um jogo de ‘’playstation’’ , onde o objetivo é se tornar visível, pop, famoso, popular e curtível, muitas vezes, à custa de explorar verdadeiramente quem se é. "Como os avatars redefinem a identidade humana no metaverso: uma análise psicanalítica." Ciberbullying e outros Tipos de Violência Digital Onde a conexão parece à primeira vista uma ponte que nos une, se esconde a sua sombra a importunação, uma forma progressista e sorrateira de atentado. Se no passado recente, as agressões precisavam de proximidade física, hoje, por trás de uma tela, o agressor encontra um disfarce perfeito, envolto num manto de invisibilidade que facilita suas investidas. Se bem que Freud nos recorda, que a agressividade é parte inerente da nossa condição, agora, ela encontra outro espaço manifestado no anonimato, sem a necessidade de enfrentar sua vítima de frente, diretamente. É uma investida ofensiva, que surge como um grito no vazio, sem a culpa de ver as consequências imediatas de suas palavras. Para melhor compreender esse comportamento nada melhor que Lacan. Ele introduz o conceito de gozo, que revela o ''prazer inconsciente'' que o sujeito pode carregar, ao extrair do sofrimento alheio seu próprio deleite. Onde tudo é instantâneo, o júbilo da arremetida digital é multiplicado, especialmente, porque o invasor sente que está distante, seguro e imune às repercussões diretas de seus atos. Essa violência online, é muitas vezes mascarada de chistes, sarcasmo, humor, piadinhas e brincadeiras, mas pode deixar grandes cicatrizes e feridas emocionais nas suas vítimas. Viver esse mundo virtualizado, onde tudo está sempre à vista, é como habitar uma casa feita de vidro. Um cenário expresso, escancarado, transparente e exposto à constante crítica, onde não importa qual a natureza delas, ao poder provocar efeitos devastadores sobre o bem-estar psicológico do seu habitador. Vale aqui lembrar, trecho inerente da psicanalista Nancy McWilliams, que destaca como nossa autoestima se constrói na maioria com base em como imaginamos sermos vistos. Na internet se forma essa visão distorcida, que por ângulos extraordinários e prismas diáfanos transpassa uma constante competição pela atenção. A cada curtida, há um impulso de validação, mas sua ausência pode desencadear sentimentos de incongruência. Não tenha dúvidas, o uso excessivo das redes pode levar ao apagão emocional, criando uma sensação paradoxal. Podemos estar cercados de pessoas virtualmente, mas, nos sentimos mais sozinhos do que nunca. Uma comunicação que foca na quantidade, e carece de qualidade, o que esvazia a fundura das relações e interações interpessoais, gerando uma busca perene por abonação, que nunca será o suficiente, é não é mesmo. A vítima de ''ciberbullying'' , pode ser atacada(o) justamente na importância que dá ao seu corpo, na formação da identidade, na aparência, hábitos e gostos. Desta forma, encontra o agressor um ambiente propício, com informações particulares e detalhadas da sua provável e próxima vítima. Isso pode gerar depressão e ansiedade, e, em casos extremos, levar ao isolamento ou até mesmo a pensamentos suicidas. "Cyberbullying: quando a violência migra para o mundo virtual." "O paradoxo do mundo digital é cruel: ele oferece conexões, mas nos devolve uma solidão aprimorada, onde somos vistos, mas nunca verdadeiramente compreendidos." - Dan Mena . Educação Digital e os Paradoxos da Privacidade Meu texto não é um manual de instruções para usar nas redes sociais, mas um tratado de sobrevivência psíquica em um mundo onde a linha entre o real e o virtual se esfarela. Ensinar alguém a "navegar com segurança" vai além de evitar golpes ou senhas fracas: é prepará-lo(a) para decifrar as sombras que projetamos e as que nos são impostas. Nas redes, como escrevi certa vez, "o excesso de conexões virtuais não compensa a ausência de vínculos reais; a solidão moderna é a ironia de estarmos sempre cercados, mas nunca visíveis" . Esse exílio não é falta de likes, mas a desconexão de um eu que se perdeu entre performances e algoritmos. A conscientização sobre comportamentos tóxicos começa com um ato radical: reconhecer que o ódio online é sempre autorretrato. O troll que ataca anonimamente, o influencer que humilha para ganhar views, o ex-parceiro que expõe ‘’nudes’’ — todos são sintomas de uma cultura que transformou a agressividade em mercadoria. Plataformas como o Twitter (X) ‘’pagam pela polarização’’ , ‘’premiando posts inflamatórios’’ com viralidade. A educação digital precisa ser descolonizadora: não basta bloquear perfis, é preciso questionar por que a crueldade vende. Como promover autoconhecimento em um ambiente que glorifica a autoficção? A resposta está em pedagogias do imperfeito. Projetos como o ‘’Digital Mindfulness’’ (EUA) ensinam usuários a mapear padrões emocionais: "Você posta por impulso ou por necessidade? ", "Sua timeline reflete quem você é ou quem teme ser? ". Na prática, é a aplicação do "conhece-te a ti mesmo" socrático ao universo digital — um mergulho nas próprias motivações para escapar da armadilha da comparação. Nestes termos, a privacidade deixa de ser um direito abstrato e se torna o útero simbólico — espaço íntimo onde o self pode existir sem curadoria. Lacan sugere que o olhar do ‘’Outro’’ nos constitui, mas nas redes, esse ‘’mirar’’ é pervertido em vigilância constante. Cada check-in, cada foto íntima, cada busca no Google é rastreada, vendida e usada para alimentar algoritmos que nos conhecem melhor que nossos psicanalistas. Startups como a ‘’Spyware’’ já oferecem serviços para monitorar parceiros via app, normalizando a violação como prova de "amor" . Seria logo a patologização do controle, onde ciúme vira recurso? A privacidade não é sobre esconder segredos, mas preservar a soberania sobre a própria narrativa. Quando um adolescente expõe sua sexualidade no TikTok antes de se assumir em casa, ou quando um funcionário é demitido por posts políticos antigos, vemos o preço dessa prática: o eu é reduzido a um quebra-cabeça de dados, onde peças íntimas viram armas. A solução? Ferramentas como criptografia de ponta a ponta e autocuidado digital (ex.: dias sem postar) devem andar de mãos dadas com políticas públicas. Na UE, o GDPR tenta frear a coleta predatória, mas enquanto a educação não ensinar que "não postar" é tão válido quanto "postar" , continuaremos reféns. A oposição final é esta: a mesma tecnologia que nos permite existir em múltiplas identidades é a que ameaça apagar nossa humanidade. Como escrevi em outro contexto, "a imagem é a máscara moderna: feita para impressionar, programada para esconder, condenada a nunca revelar o que realmente somos" . ‘’A educação no convívio com a tecnologia deve ser um ato de resistência — não contra as máquinas, mas contra aquela parte de nós que acredita que valemos mais filtrados do que crus.’’ - Dan Mena. A geopolítica da privacidade revela outra ponte: enquanto países ricos debatem ética na IA, na periferia global, dados são extraídos como minérios. No Brasil, comunidades são mapeadas por câmeras de reconhecimento facial, e trabalhadores de apps têm seus movimentos vigiados por algoritmos. Essa instrução digital, muito presente em países latinos precisa ser antirracista e decolonial, denunciando como corpos afrodescendentes, indígenas e periféricos são hipervigilados. Projetos como o Tecnopolítica (UFBA) já conectam segurança digital a direitos humanos, ensinando comunidades a usar VPNs e criptografia para proteger seus legítimos protestos. Já a psicologia das redes mostra que a dependência digital não é vício, mas sintoma de vazios. Um estudo da Universidade de Cambridge (2023) associou o uso compulsivo do Instagram à carência de espaços de pertencimento offline. A educação, portanto, deve ir além do "controle de tempo de tela" e criar oásis de acolhimento — oficinas de arte, grupos de diálogo, etc. Mas, há luz nesse cenário, ONGs como a ‘’SaferNet’’ oferecem mentoria para vítimas de ‘’cyberbullying’’ , enquanto influencers usam plataformas para discutir saúde mental e auto-aceitação. Essas iniciativas são atos de desobediência pedagógica, provando que as redes podem ser humanizadas. A saída? Reescrever o contrato social digital. Exigir que plataformas priorizem bem-estar sobre engajamento (como o Modo Bem-Estar do TikTok), ensinar crianças a codificar para entenderem a manipulação algorítmica, e, sobretudo, lembrar que — "nenhum feed captura o cheiro da chuva, o tremor das mãos em um primeiro encontro, ou o silêncio que acolhe". Impactos Positivos e Negativos das Redes Este mundo digital que herdamos é palco sem limites geográficos, no fundo da nossa essência busca seus objetos de amor, recompensa e satisfação. Assim, fica fácil compreender por que nos parecem tão sedutoras, ao criarem laços e comunidades, Elas nos conectam com pessoas ao redor do globo, oferecendo oportunidades para moldar e expressar com bastante liberdade, inclusive aquilo que não somos. Por vezes, encontro certo paradoxo, como se estivesse em um grande parque de diversões, saltando de um perfil para o outro, absorvendo o fluxo de informações, validando experiências e ampliando um repertório de relações. Porém, ao mesmo tempo, elas trazem uma provocação. Jacques Lacan, ao falar sobre o ''Grande Outro'' , ressalta o papel da alteridade na formação do sujeito. Presença Virtual: Acredito que muitas pessoas, das quais me incluo, mantêm inúmeras conexões por motivos variados, como curiosidade ou desejo de visibilidade. Esses contatos, são mais uma forma de manter uma presença digital do que de engajamento ativo. Essa rede que vamos formando com o tempo, funciona como uma vitrine, onde a quantidade pode ser mais valorizada do que a profundidade das interações. "O gozo da exposição online é tão sedutor quanto traiçoeiro – na ânsia de sermos vistos, abrimos mão do direito de sermos protegidos." - Dan Mena. ''O gozo da exposição online pode ser tão sedutor quanto traiçoeiro." Função: Redes funcionam como plataformas para partilhar atualizações pessoais, acompanhar atividades de outros e manter uma presença online. A manutenção de muitos contatos, pode ser uma forma de reafirmar a própria identidade em diversos contextos, mesmo que a interação real seja limitada ou nula. Diferenças na Participação: O nível de engajamento varia significativamente entre os usuários. Alguns preferem uma postura mais observadora, enquanto outros se envolvem de maneira mais ativa. Essa disparidade entre o número de conexões e a angariação real pode refletir essa diversidade no comportamento dos amigos. Psicologia das Conexões: Do ponto de vista psicológico, manter um extenso número de conexões pode ser uma forma de lidar com inseguranças ou mesmo buscar validação. Valor das Interações: A qualidade das interatividades deve superar a quantidade. Ter um círculo menor, mas genuinamente significativo, pode ser mais gratificante do que possuir milhares de contatos com pouca interação real. Isso destaca a importância de focar em conexões autênticas e valiosas. Refletir e Avaliar: O que esperamos delas e como essas expectativas estão sendo atendidas pode nos ajudar a ajustar nossas práticas, promovendo uma maior qualidade nas trocas. "A comparação é a nova prisão do sistema; quanto mais olhamos para o outro, mais nos afastamos de nós mesmos." - Dan Mena. Navegando pela Pressão dos Padrões Sociais Freud, em sua análise que faz sobre o mal-estar na civilização, observa que a sociedade impõe restrições que sufocam nossos impulsos. Essa tensão se reflete na constante atuação de um ''eu performático'' , sempre em busca de aplausos. Para fechar, diante desse cenário, a questão que surge é: como encontrar o equilíbrio entre a vida digital e a preservação da saúde mental? Winnicott fala; ao desenvolver o conceito de espaço transicional, descreve um lugar intermediário onde o indivíduo pode se expressar criativamente sem ser consumido pelas exigências do mundo exterior. Esse espaço é cada vez mais necessário. Precisamos de um ponto de fuga, um lugar onde possamos nos reconectar com nossas raízes, longe das pressões modernas. Navegar nelas, exige também a habilidade de se afastar e olhar com distância crítica, usando o autoconhecimento como chave para manter o equilíbrio. Em um ambiente que nos convida constantemente a nos comparar é importante a autopercepção como ferramenta indispensável para evitar a armadilha de medir nosso valor com base em padrões alheios. "A verdadeira conexão não acontece nas curtidas, mas nos encontros fora da tela, onde não há filtros nem edições." - Dan Mena. Gratificação Instantânea e o Encontro Fiel Consigo Mesmo Assim como no balé, onde o aprumo entre força e leveza é a base da bailarina, nas redes, precisamos de uma coreografia cuidadosa. Não se trata de abandonar as plataformas, pelo contrário, devemos aprender a dançar com elas, sem perder o compasso da nossa vida interior. Estarmos atentos, e trabalhar entre o princípio do prazer e da realidade, pois o verdadeiro contentamento não vem da gratificação imediata que possam fornecer os vínculos, mas do encontro fiel consigo mesmo. Para escapar das armadilhas que suas propostas podem criar e apresentar, é vital adotar uma postura crítica e consciente. Pensar sistematicamente sobre como a tecnologia nos transforma em consumidores passivos. Não sermos arrastados pela correnteza de conteúdos infinitos, ficar ligados para não se perder nessa imensidão eletrônica de ‘’fake news’’ , em vez de criar nosso próprio texto. Essa abordagem consciente começa com a aceitação de que a vida digital é uma articulação positiva, não uma realidade definitiva. Precisamos de um espaço, sim, onde possamos brincar e criar, longe das críticas e julgamentos. O que pode ser entendido como um retorno à autenticidade — uma maneira de engajamento sem sermos absorvidos completamente por elas. "Como escapar da gratificação instantânea das redes sociais e reencontrar sua autenticidade?" "Usar a internet de forma consciente é a arte de equilibrar presença e ausência, interação e solidão, visibilidade e privacidade." - Dan Mena. Identidade e Ilusão - Dan Mena. Na era digital, ser lúcido é urgente Navegar com clareza, seguir consciente Não só para evitar o perigo voraz Ver no espelho o que a tela traz. A bússola é o saber que nos orienta Distinguir o que fere, o que nos alimenta Aceitar-se por inteiro, sem disfarçar É o passo mais nobre para se equilibrar. Na rede, a visibilidade é tentadora Sua moeda cobra em dor duradora O “olhar do Outro” com precisão Na tela nos fere sem compaixão. Viver exposto é viver vigiando Privacidade? Um fio se esvaindo Cuidar da imagem é gesto vital Para não naufragar no digital. Luzes e sombras formam esse palco Onde o “eu” se exibe sob brilho opaco Likes seduzem, mas não preenchem E as máscaras caem quando não se entende. Seguidores mil, mas a troca é vazia, Por que tanta gente, se falta harmonia? Buscamos o olhar, a aprovação Mas o afeto real mora fora da mão. Como num balé, oscilamos no ar Entre o “ser” e o “parecer” a nos empurrar A gratificação é veloz, viciante Mas nos tira o centro, nos torna errantes. A vida online não é a verdade É só ferramenta, não identidade Brinque, crie, sem medo ou prisão A liberdade nasce da expressão. Contentamento não vive em curtida Mas no silêncio que pulsa a vida Na era da imagem, o maior labor É ser fiel ao que vibra no interior. Referências Bibliográficas FREUD, Sigmund. O Mal-Estar na Civilização. São Paulo: L&PM, 2011. LACAN, Jacques. Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Petrópolis: Vozes, 2015. HARAWAY, Donna. Manifesto Ciborgue: Ciência, Tecnologia e Feminismo-Socialista no Final do Século XX. São Paulo: Ubu, 2020. BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. TURKLE, Sherry. Alone Together: Why We Expect More from Technology and Less from Each Other. Nova York: Basic Books, 2011. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópolis: Vozes, 1987. WINNICOTT, Donald. O Brincar e a Realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975. ZUBOFF, Shoshana. A Era do Capitalismo de Vigilância. São Paulo: Intrínseca, 2019. ORBACH, Susie. Bodies. Londres: Profile Books, 2009. DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. São Paulo: Contraponto, 1997. 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Palavras Chaves #CriseIdentitáriaDigital #PsicanáliseETecnologia #AvatarEIdentidade #NarcisismoVirtual #SaúdeMentalNasRedes #FOMO #CapitalismoDeVigilância #AutoestimaDigital #Ciberbullying #Metaverso #EducaçãoDigital #PrivacidadeOnline #AlgoritmosDoDesejo #FragmentaçãoPsíquica #ComparaçãoSocial #DependênciaDigital #AutenticidadeVirtual #SociedadeDoCansaço #SolidãoDigital #ÉticaNasRedes FAQ - Perguntas Frequentes O que é a crise identitária digital? → É a fragmentação do "eu" entre o mundo real e o virtual, gerada pela busca de validação online. Como as redes sociais afetam a autoestima? → Através da comparação constante e da dependência de likes como métrica de valor. O que é FOMO? → Medo de ficar de fora (Fear of Missing Out), ansiedade causada pela idealização de vidas alheias nas redes. Como o metaverso impacta a identidade? → Permite criar ‘’avatars’’, mas pode aprofundar a cisão entre o "eu real" e o virtual. O que são NFTs e como se relacionam com a identidade? → Tokens digitais únicos que transformam aspectos do eu em produtos comerciais. Como proteger minha privacidade online? → Use criptografia, evite ‘’oversharing’’ e reflita antes de postar. O que é a "sociedade do cansaço" de Byung-Chul Han? → Cultura que substitui a disciplina externa pela autoexploração compulsiva. Como o cyberbullying afeta a saúde mental? → Gera ansiedade, depressão e, em casos extremos, pensamentos suicidas. Qual a relação entre Lacan e os algoritmos? → Ambos moldam o desejo através do "Outro" (seja humano ou inteligência artificial). O que é um "falso self" digital? → Persona criada para agradar algoritmos, em detrimento da autenticidade. Como equilibrar a vida online e offline? → Estabeleça "dias de detox digital" e priorize interações presenciais. Por que o corpo virou uma "vitrine" nas redes? → A pressão por padrões estéticos transformou a imagem física em moeda social. O que Freud diria sobre o Instagram? → Que é um palco para a pulsão de morte disfarçada de busca por perfeição. Como a educação digital pode ajudar? → Ensinando a criticar algoritmos e a usar redes como ferramentas, não vícios. Qual o futuro da identidade no metaverso? → Será definido pela ética: ou nos libertamos dos avatares ou nos tornamos seus reféns. Visite minha loja ou site: https://uiclap.bio/danielmena https://www.danmena.com.br Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Department of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. De 1 a 5 - Quantas estrelas merece o artigo? Deixe seu relato abaixo em COMENTÁRIOS .
- Feridas Emocionais Moldam Quem Você É.
'' Rejeição, Abandono, Humilhação, Traição e Injustiça'' Vamos nos imaginar caminhando por uma floresta densa, onde cada passo mostra uma digital da trilha marcada pelo nosso histórico de dores antigas. Você já sentiu, em algum momento, um vazio que não tem explicação? Uma angústia que parece pulsar e vir de um lugar desconhecido, como se carregasse uma pústula que não se vê, mas se sente? Hoje eu quero falar de um território delicado: as cinco feridas emocionais. De onde elas vem? — Emergem de raízes existenciais essenciais, tão antigas quanto a consciência. São arquétipos esculpidos na mente coletiva, resíduos de uma época em que nossa sobrevivência como raça dependia da aceitação tribal. Numa síntese inicial, a rejeição nasce do medo ancestral de exclusão, quando ser deixado para trás significava a morte. O abandono expõe a vulnerabilidade infantil diante de um ambiente hostil à época. A humilhação, reflete a hierarquia primitiva onde a vergonha preservava a conformidade. A traição surge da quebra de pactos essenciais à cooperação, injustiça, a revolta contra a desproporção na divisão de recursos, base da organização social imemorial. Essas demarcações são como sinais invisíveis que formatam nossas relações, escolhas, e até a forma como nos percebemos diante do mundo. Mas, como bem nos lembra Jung, "aquilo que não enfrentamos em nós mesmos, encontramos no mundo como destino" — e é nesse entroncamento, entre o íntimo e o coletivo, que nosso percurso se perfaz. Era uma tarde de sol — (para variar) aqui no Nordeste do Brasil não tem estações, é verão o ano inteiro, quando ouvi uma paciente — vamos lhe chamar de Clara — sussurrar baixinho: “Por que sempre sinto que não sou o suficiente?” A pergunta dela, tão simples e ao mesmo tempo antagonicamente densa, abriu uma porta para eu definir o que chamo de “arquitetura emocional” , um conceito que entrelaça a psicanálise com a filosofia existencial de Simone de Beauvoir. Obviamente que Clara não sabia, mas estava tocando no centro da rejeição, uma das cinco aflições mais expressivas que vou abordar neste artigo. Percebo que essas chagas não são apenas conceitos; senão narrativas vivas, histórias que contamos a nós mesmos sem perceber. Como toda boa história, elas deixam o leitor curioso — você — querendo saber o que vem depois. O que Clara descobriu sobre si mesma? E o que você descobrirá sobre si ao final desta resenha? Espero que o tema seja do seu interesse. "Como curar a ferida da rejeição? Psicanálise e autoconhecimento para reconstruir a autoestima" Vou usar metáforas, reflexões e um diálogo direto, como se estivéssemos sentados frente a frente. Como disse Freud, “A mente é como um iceberg; apenas uma pequena parte dela emerge à superfície, enquanto a maior parte permanece oculta” . Mas hoje, inspirado pela ética do cuidado de Chul Han e pela crítica social de Bauman, vamos além do inconsciente: uma arqueologia das emoções, onde cada escoriação pode nos mostrar os traumas pessoais e as fraturas fundas de um firmamento que nos ensina a performar felicidade, usar máscaras, enquanto sopra inseguranças. "As feridas não são falhas, mas mapas", como escrevi em ‘’O Silêncio dos Afetos’’ (2022). ‘’Elas nos mostram onde doeu — e onde ainda doi —, mas também, apontam rotas de resiliência.’’ - Dan Mena. "Somos treinados para curar feridas físicas, mas deixamos as emoções sangrarem em silêncio"- Dan Mena. Convido você a olhar para suas cicatrizes, não como fracassos, mas como testemunhas de uma humanidade que insiste em renascer. "A cura não está em apagar as feridas, mas em aprender a dançar com seus vestígios remanescentes" - Dan Mena. O que suas escoriações afetivas mostram sobre suas buscas mais interiorizadas? Como a sociedade atual amplifica ou silencia essas dores? É possível transformar sinais em símbolos de resistência? Em um mundo que idolatra a perfeição, lembre-se: A cura não está na ausência de dor, mas na coragem de poder nomeá-la. “As feridas da alma não sangram, mas gritam em silêncio, pedindo para serem ouvidas.” - Dan Mena. Rejeição — A Dor de Não Ser Visto A rejeição, esse pesar primordial, finca suas raízes no solo da nossa necessidade básica de aceitação. É um traquejo visceral que nos atinge em cheio, deixando uma baliza demarcatória na forma como nos relacionamos. A refusão não se limita a grandes eventos traumáticos; ela se manifesta em sutilezas, em olhares de indiferença, em comentários aparentemente inofensivos que, no entanto, batem em nosso interior como um tremor: — "Você não é desejado(a). Não pertence." Na perspectiva kleiniana, a criança, em seus primeiros momentos de vida, projeta no outro suas próprias ansiedades e medos. Tal sensação de não ser amada(o), de não ser suficiente, pode ser projetada nos pais ou cuidadores, criando um ciclo de expectativa e decepção. Essa dinâmica, molda o "objeto interno" , via a representação mental que carregamos do outro e que vai influenciar nossos laços futuros. Voltando para Clara, ela personifica essa dinâmica. Sua constante sensação de incongruidade não era um reverbero de sua realidade presente, mas sim uma ressonância de rejeições passadas, internalizadas e transformadas em uma crença limitante: "Eu não sou o suficiente." Essa doutrina impregnada, a impedia de se conectar genuinamente com os outros, de se permitir ser vulnerável, de acreditar em seu valor. O desacolhimento se manifesta em uma miríade de comportamentos, desde a autossabotagem, que nos impedem de alcançar nossos objetivos por medo de não sermos aceitos, até o isolamento social, que nos protege da dor do abandono, mas também nos priva da alegria da fusão. A busca incessante por validação, a necessidade de agradar a todos, também é uma face da denegação, uma tentativa desesperada de preencher o vazio deixado pela falta de aceitação. Bourbeau descreve isso como a "máscara do fugitivo" , adotada por aqueles que foram feridos(as) pela rejeição. Essa paramenta, se manifesta na evitação de junções, no medo de se comprometer e dificuldades em se entregar a relacionamentos íntimos. Como escapista em que se transforma o sujeito nessa condição, preferem a superficialidade e distanciamento, a ilusão de segurança que o isolamento oferece. Para curar a ferida provocada, é preciso, antes de tudo, reconhecer sua existência, aceitar sua dor e se dar permissão para sentir. "Abandono emocional: o vazio existencial e estratégias terapêuticas para superar a dependência afetiva" A autorreflexão guiada, a escrita de cartas para a criança interior, a colaboração terapêutica na re-elaboração desses momentos de cancelamento, são ferramentas poderosas para estruturar a narrativa e transformar a crença limitante em uma afirmação de valor. A dor da reprovação, de não ser reconhecido(a) como um ser desejante, como um sujeito com seus próprios anseios e necessidades, passa pelo reconhecimento do próprio querer, e a afirmação da identidade. A busca de uma vida autêntica é um processo de auto-descoberta e libertação das amarras do passado. Abandono — O Vazio de Ser Deixado O desamparo, essa sombra persistente que paira sobre nossas relações, se manifesta como um medo paralisante: geralmente na forma de ser deixado(a) para trás, esquecido(a), ou substituído(a). Diferente da rejeição, que nega nossa existência, o abandono nos faz questionar nossa capacidade de manter os outros por perto, de sermos amados e cuidados de forma consistente. É a fenda que se abre quando a confiança é quebrada, promessas de presença que são desfeitas, no momento que nos sentimos desamparados(as) e vulneráveis. As medulas do abandono podem ser encontradas em experiências precoces de separação, de perda e negligência. A mãe que parte sem explicar nada, o pai que se ausenta emocionalmente, o amigo que se distancia sem motivo aparente, todos contribuem para a formatação desse agravo, que se manifesta como uma constante sensação de insegurança e instabilidade. O abandono, visto pelo arquétipo do "órfão" , como uma figura universal, procura obstinadamente por pertencimento e proteção. Privado(a) que é de seus pais ou cuidadores, se sentem perdidos(as), desamparados(as), ansiando por um lar, uma família ou um lugar onde possam se sentir seguros(as e amados(as). Quando a frustração da partida indesejada não é elaborada, vai gerar dois padrões de comportamento opostos, mas igualmente destrutivos: a dependência emocional e a recusa em se conectar. O oprimido busca essa anuição e afeto, se agarrando aos outros com unhas e dentes, temendo ser deixado(a) para trás novamente. O recluso(a), por outro lado, evita qualquer tipo de envolvimento emocional, construindo muralhas ao redor de si mesmo(a), para se proteger da dor da perda. O desabrigo não é unicamente a ausência física do outro; é o eclipse de si mesmo na presença desse outro, a perda da identidade em detrimento e função da necessidade de agradar e manter o outro por perto. É também a renúncia aos próprios desejos e necessidades, a submissão aos caprichos alheios, anulação da individualidade em prol da manutenção do(s) relacionamento(s). A "máscara do dependente" , descrita muito bem por Lise Bourbeau, é uma armadura que esconde a fragilidade e a hesitação daquele que foi ferido(a). Essa máscara se manifesta na descoberta constante por apoio externo, na dificuldade em tomar decisões sozinho(a), e na carência de ter alguém ao lado para se sentir supostamente assegurado(a). Pedro, meu paciente, personifica essa dinâmica. Após um divórcio traumático e difícil dos pais na sua infância, se tornou excessivamente complacente em seus relacionamentos, temendo ser abandonado novamente. Ele se anula em função dos outros, sacrificando seus próprios quereres, apenas para ter que evitar atravessar essa experiência dolorosa novamente. Para curar, é preciso fortalecer a autonomia, aprender a confiar em si mesmo(a), a se bastar, a encontrar a alegria dentro de si. A prática de momentos de solitude intencional, como escrever um diário, meditar, praticar um hobby, é fundamental para construir confiança em sua própria companhia, para aprender a se amar e se aceitar incondicionalmente. "Traição e confiança: como ressignificar a deslealdade e reconstruir relacionamentos saudáveis" A solidão nos lembra que ela não vem da falta de companhia, mas da incapacidade de comunicar as coisas que parecem importantes, da dificuldade em expressar nossos sentimentos e pensamentos. Isso passa pela habilidade de se articular consigo, de se manifestar autenticamente e construir rede de contatos baseados na confiança e respeito mútuo. Humilhação — O Peso da Vergonha A vexação mina nossa autoestima e nos faz sentir pequenos e insignificantes, surge em momentos em que nossa dignidade é atacada, vulnerabilidades expostas e nosso valor questionado. Dita experiência de ser ridicularizado(a), alvo de críticas destrutivas e negativas, como ser tratado(a) com desprezo e desrespeito. A humilhação nos deixa marcados(as) pela vergonha, como um sentimento predatório, onde ansiamos querer desaparecer, nos esconder do mundo e de todos. Enxergo isso como uma violência à nossa auto-imagem, uma investida ao direito de existir com orgulho e dignidade. Michel Foucault, analisa isso pelas relações de poder, ele nos mostra que a sujeição está conectada à dinâmica do domínio e da submissão. O outro, em uma suposta e fantasiosa posição de superioridade, exerce seu mando pretendendo nos rebaixar, usando a inferiorização ao nos fazer sentir envergonhados de quem somos. Usa da inveja e à culpa como instrumentos manipuladores, emoções que amplificam a vergonha e nos fazem sentir merecedores(as) do desprezo. A ganância, inveja, ambição, ciúme, sofreguidão e o desejo de possuir o que o outro tem, também nos leva a fazer comparações horríveis e nos sentimos inferiorizados, enquanto a culpa, e o sentimento de termos feito algo errado, faz sua parte pela responsabilização do próprio rebaixamento. A afronta vexatória cria a "máscara do masoquista" , uma estratégia de defesa que consiste em se submeter ao outro para evitar mais dor. O masoquista acredita que, ao se rebaixar voluntariamente, pode controlar a situação e evitar ser minimizado de forma mais cruel. No entanto, esse parâmetro acaba perpetuando sua própria desvalorização, reforçando a crença de que não é digno(a) de respeito e amor. Pessoas com a ferida aberta neste sentido, podem evitar situações de exposição, como falar em público, apresentar seus projetos, expressar suas opiniões, por medo de serem julgadas(os) e ridicularizadas(os). Podem adotar concomitantemente comportamentos auto-depreciativos, como fazer piadas sobre si mesmos, desmemoriar propositalmente seus talentos e conquistas, para "desarmar" as críticas e evitar serem rebaixadas(os) por outros. Ana, me conta, cresci ouvindo que era "desajeitada" "burra" e "incompetente" . Essas críticas, que foram sendo repetidas ao longo de sua infância, a marcaram psiquicamente, gerando uma constante sensação de inadequação e vergonha. Na vida adulta, ela evita liderar projetos ou pessoas, por medo de falhar e ser escrachada. Ela se sabota constantemente, se bloqueando de alcançar seu pleno potencial por causa do medo da depreciação. "Feridas da alma gritam! Aprenda a identificar e transformar rejeição, abandono e humilhação em resiliência" Para reescrever tal narrativa do passado, é preciso reconstituir os momentos de dor e vergonha, se permitir sentir raiva e tristeza, é resgatar a própria dignidade. Confrontar diretamente os "humilhadores" do passado, para expressar esses sentimentos reprimidos e construir uma nova auto-imagem, baseada no amor próprio. Praticar exercícios de assertividade, muito valiosos para aprender a dizer "não" , a expressar opiniões, e a defender seus direitos. Aprender a se posicionar de forma firme e confiante. Desenhar, pintar, escrever, dançar, praticar esportes, ajudam a externalizar o demérito, mudar a forma da dor, transformando os sentimentos negativos em expressão criativa e força interior. A humilhação não é unicamente um golpe na alma, mas também um convite a recuperar o próprio brio e lutar contra as opressões, uma batalha contra todas as formas de discriminação, exclusão e preconceito. Traição — A Quebra dos Pactos e a Confiança A deslealdade que dilacera a confiança nos faz questionar a prevaricação daqueles que amamos, a qual se manifesta de diversas formas: a quebra de uma promessa, a infidelidade conjugal, a decepção com um amigo(a), a corrupção em uma instituição, etc. A traição nos deixa desorientados(as), confusos(as), incrédulos(as). Nos faz duvidar da nossa capacidade de julgar, confiar e amar. Não se resume ao ato em si; nos confronta com a nossa vulnerabilidade, somados a fragilidade dos laços e a incerteza do futuro. Está ligada ao "desejo do Outro" , onde ancoramos muitas das nossas expectativas e esperanças, idealizando-o(a), atribuindo qualidades que talvez não possua. Quando somos traídos, enfrentamos o vazio do desejo não correspondido, a desilusão da realidade, e a dor da perda da imaginação. Ela cria a "máscara do controlador(a)" , como uma estratégia de defesa que consiste em tentar dominar os outros para evitar novas decepções. O regulador(a), vai se tornar possessivo(a), ciumento(a), desconfiado(a), tentando dominar cada aspecto do relacionamento, na vã tentativa de evitar ser traído(a) novamente. Quem viveu a traição pode desenvolver desconfiança crônica, dificuldade em formar laços, medo de se entregar aos afetos e ao amor. Pode se tornar cínica(o), amargurada(o), ressentida(o), perdendo a fé na paixão e a humanidade. A história de Lucas passa por essa quimera, após ser traído por sua parceira, passou a monitorar seu par, vasculhando o celular, checando as redes sociais, interrogando seus parceiros. Esse comportamento gerou tensões e minou seus relacionamentos, perpetuando seu ciclo de desconfiança. Para reconstruir a confiança em si mesmo e nos outros, teve que aprender a perdoar (não necessariamente o ato em si, mas o sofrimento causado) , a se libertar do ressentimento e da amargura que lhe acompanharam por longos anos. Essa reconstrução da firmeza é um processo gradual, que começa com pequenos atos de vulnerabilidade, como compartilhar algo pessoal com alguém confiável, pedir ajuda quando necessário e expressar seus sentimentos e necessidades de forma sincera e aberta. Ditas crenças disfuncionais que se formam, como; "ninguém é confiável", "todos vão me trair" , apenas perpetuam o medo e a indisposição. A meditação da gratidão, com foco nas relações positivas e nos momentos de alegria ajudam a reequilibrar o desconforto e a cultivar a esperança no outro. Traição destapa que o ‘’Outro’’ também falha, que é igualmente imperfeito, quanto quem é traído, que por analogia do ser é também capaz de errar. A cura, portanto, passa pela aceitação da imperfeição, e a compreensão de que todos somos vulneráveis e capazes de fraquejar, frustrar, malograr, mentir, faltar e titubear. "Psicanálise e sociedade: como hierarquias e opressões amplificam feridas como humilhação e abandono" Injustiça — A Revolta Contra o Desequilíbrio A injustiça, arde e inflama nossa alma, nos faz clamar por equidade e retidão, emerge irada quando nos sentimos tratados de forma desigual, se somos vítimas de preconceito, discriminação ou opressão. É a dor de ser punido por algo que não fizemos, de ter uma oportunidade negada por motivos arbitrários, de sermos criticados de forma desproporcional. A iniquidade nos faz questionar a ordem do mundo, a bondade da natureza e a existência de um poder superior que zela pela arbitrariedade. Todos nós ansiamos por um mundo onde as ações tenham consequências justas, onde o bem seja recompensado e o mal seja punido. Quando essa ordem é quebrada, nos tornamos vítimas de injustiça, nossa fé no mundo é abalada, a sensação de segurança é ameaçada e a autoestima rachada. A justiça é a base da dignidade, todos, independentemente de raça, gênero, orientação sexual ou condição social, têm o direito de serem tratados com integridade, assim, sendo injustiçados, nossa moralidade é desafiada e ultrajada. Bourbeau associa a ferida da injustiça à "máscara do rígido" , uma técnica defensiva que consiste em se tornar perfeccionista, controlador, inflexível, na tentativa de evitar ser visto como imperfeito. O engessado no seu arbítrio, se cobra de forma excessiva, exige demais dos outros, se torna intolerante com os erros e falhas alheios. Pessoas com essa delimitação emocional podem ser muito cruéis e críticas, tanto consigo mesmas quanto com os outros, julgando, apontando e condenando com severidade. Elas também podem desenvolver uma visão cínica, perdendo a fé na bondade e a fraternidade. Após ser demitida injustamente de seu emprego, Sofia se tornou hiper-controladora em seu novo trabalho, requerendo, demandando e reclamando altos níveis de desempenho de seus colegas, se irritando com qualquer sinal de imperfeição ou negligência. Não estava senão temendo ser novamente vítima de injustiças, se agarrando ao controle como meio de se proteger. Ao reconhecer a própria raiva e revolta, expressando e dando voz aos seus sentimentos de forma saudável e construtiva, aprendeu a perdoar (não a injustiça em si, mas o sofrimento que lhe causaram). Desta forma, canalizou a energia da indignação em ações positivas e construtivas. A terapia a ajudou a identificar os padrões de pensamento anômalos, desenvolvendo o enfrentamento saudável baseado na resiliência, paciência e benevolência. A prática e o exercício da empatia é importante para tentar compreender as intenções dos outros, mesmo em situações de desequilíbrio, podemos minimizar e reduzir a ira e o ressentimento. Novas narrativas e ângulos sobre acontecimentos negativos ajudam a recontar as histórias dos injustiçados, dando a si mesmo o poder de mudar o desfecho emocional, de recriar o traquejo atravessado e de encontrar um novo sentido. O ativismo consciente, consiste em inverter a revolta em boas ações, como o voluntariado, participação em movimentos sociais, defesa dos direitos humanos, como uma forma poderosa de restaurar o senso de harmonia e contribuindo para a construção de um mundo mais igualitário. "Autoconhecimento profundo: técnicas para identificar suas máscaras emocionais e libertar sua essência" As Máscaras que Criamos Cada uma das feridas emocionais que apresentei anteriormente – rejeição, abandono, humilhação, traição e injustiça – nos impulsionam a criar uma máscara, uma persona que constituímos como forma de nos salvaguardar da dor e da vulnerabilidade. Ditos artifícios como o fugitivo (rejeição) , o dependente (abandono) , o masoquismo (humilhação) , o controlador (traição) e o rígido (injustiça) . Embora sirvam como subterfúgios psíquicos em um primeiro momento, se tornam arcabouços do tempo para o sujeito, limitando totalmente sua capacidade de ser autêntico(a) e de se socializar genuinamente. Do ponto de vista da psicanálise, as máscaras representam mecanismos de defesa do ego, como proposto por Freud, visam lidar com a ansiedade e a angústia. São mecanismos e artimanhas inconscientes que desenvolvemos para evitar o sofrimento que tanto driblamos, que nos tutelam aparentemente de sermos magoados. No entanto, ao nos escondermos atrás desses fetiches sociais, nos desligamos de nossa verdadeira essência, de sentimentos e de ser supridos por necessidades autênticas. O controlador(a), por exemplo, pode parecer forte e confiante, mas por trás da sua fachada dissimulada, reside um medo constante de perder o controle, de ser traído(a) ou enganado(a). O(a) dependente, por sua vez, se agarra aos outros em busca de segurança e validação, mas essa dependência o(a) impede de desenvolver sua própria autonomia e de encontrar a felicidade interior. "As máscaras que usamos para nos proteger são as mesmas que nos aprisionam," essa frase resume o problema. Elas nos oferecem uma falsa sensação de proteção, mas ao mesmo tempo nos impedem de viver o real. Para desmontar essas peças teatrais, é necessário desenvolver um processo de autoconsciência. O primeiro passo é identificar o seu protagonista: você tende a fugir de relacionamentos? A controlar tudo ao seu redor? A se submeter aos desejos dos outros? Responder a essas perguntas pode ser o início para encontrar as respostas necessárias. Freud, em sua obra "Uma Dificuldade no Caminho da Psicanálise", nos legou que "o ego não é o mestre em sua própria casa." Nossas hipocrisias, são construções inconscientes que nos dominam e nos impedem de ir adiante. Desmontá-las, exige um trabalho árduo de autoconhecimento e de aceitação. "Da dor à cura: 5 passos alquímicos para transformar feridas emocionais em sabedoria existencial" A (Cura) como Processo Alquímico A cura não é um evento pontual, é um destino a ser alcançado, mas sim, um processo contínuo de transformação e crescimento. Assim como na alquimia, a arte de modificar a caminhada da mente em direção à totalidade envolve a transmutação da dor em sabedoria, da sombra à luz. Acredito sinceramente que ‘’curar’’ talvez não seja a palavra que mais me deixa confortável em dizer, não acredito em pessoas doentes emocionalmente. Por que a Psicanálise Não Considera as Pessoas "Doentes"? Na psicanálise rompemos com a lógica patologizante ao compreender que os sofrimentos que transpassamos não são "doenças" a serem extirpadas, mas sintomas a serem decifrados. Enquanto a medicina busca curar, a psicanálise escuta. Ela não enxerga um "paciente" , mas um sujeito cujos conflitos — angústias, repetições, traumas — são mensagens cifradas do inconsciente, vestígios de uma história absolutamente singular e particular. Por esta razão, "o inconsciente é estruturado como uma linguagem" , e seus desarranjos não são falhas biológicas, mas diálogos interrompidos entre desejo e realidade. A noção de "adoecimento" pressupõe um ideal de ‘’normalidade’’ , para nós, analistas, não há "normal" : há particularidades, traços, facetas, predicados, etc, em luta com as exigências da vida. A depressão, a ansiedade ou os traumas não são vírus a serem eliminados, senão, sinais de que algo, na trama psíquica pede para ser reescrito. A ‘ ’cura’’ , aqui, não é o apagar o sintoma, mas dar voz ao que ele(a) cala, mesmo no silêncio da fala. "Não tratamos mentes 'quebradas'; acompanhamos almas em busca de sentido" - Dan Mena. Humanizamos o ser ao reconhecer que sofrer não é fraqueza, mas parte do existir em si. Seu rigor está em não reduzir o hermetismo humanístico a diagnósticos laboratoriais, e sim em abrir espaço para que cada um encontre, nas próprias feridas a chave de sua liberdade. Esse é um caminho para a integração dos aspectos conscientes e inconscientes do self. Cada úlcera emocional representa uma oportunidade de crescimento, um convite para nos tornarmos mais inteiros. Ao invés de evitarmos ou negarmos nossas dores, podemos abraçá-las como parte integrante da nossa constituição, seriam lições preciosas que nos ensinam sobre nós mesmos e sobre o mundo. Carl Gustav Jung, em sua obra "O Livro Vermelho", remete a lembrar que "onde o amor reina, não há desejo de poder; onde o poder predomina a falta do amor. " Um Olhar Sociológico Feridas emocionais são na verdade, um espelho das dinâmicas e estruturas da sociedade em que vivemos. A rejeição pode ser amplificada por carcaças que valorizam a aparência física e o sucesso material. Sejam o abandono por desestruturas familiares frágeis e instáveis, a humilhação por hierarquias opressivas e sistemas de poder desiguais, a traição por promessas políticas não cumpridas e a corrupção generalizada, a injustiça de sistemas jurídicos falhos e leis que não protegem os mais vulneráveis. A sociologia nos oferece esclarecimentos para analisarmos como as diretrizes sociais contemporâneas, os valores culturais e as bases estabelecidas de poder configuram e regulam ao seu bel prazer nossas vivências emocionais. Ditas estandardizações contribuem para a formação das feridas que carregamos. Pierre Bourdieu, em sua teoria do "capital simbólico" , nos ensina que o valor de uma pessoa é determinado por ‘’normas sociais’’ que nem sempre são equitativas. Quando essas ‘’regras estabelecidas’’ excluem determinados grupos ou indivíduos, se aprofundam as diferenças e se tornam mais difíceis de curar. Somos uma sociedade ‘’doente’’ , ‘’aqui sim o termo se aplica’’ , porque trata da política, da guerra, da fome, desigualdade, injustiça, racismo, desinclusão, entre outras tantas centenas de desequilíbrios doentios sociais provocados propositalmente. Por isso é preciso provocar e questionar as estruturas de poder que perpetuam a opressão e lutar por um mundo mais justo. "Nossas feridas não são apenas nossas; elas retinem as dores de um mundo fragmentado e insensível," - Dan Mena. "Arquitetura Emocional: Entenda as Raízes Filosóficas da Humilhação, Traição e Injustiça'' O Convite à Transcendência Chegamos ao fim desta pernada pelas cinco feridas emocionais mais relevantes da nossa experiência. Ao invés de encerrar este artigo com um sentimento de desesperança ou resignação, quero propor uma virada, uma mudança de dimensão. E se essas escoriações não fossem apenas fontes de dor e sofrimento, mas sim portas, portais para um entendimento de quem somos, de como amamos e resistimos às adversidades da vida? Cada marco particular conta uma história de sobrevivência, de luta, de beleza, dores superadas nos tornam mais fortes. Pense nisso: e se, ao invés de temer suas feridas, você as abraçasse como um(a) mestre(a)? E se cada angústia fosse um telegrama urgente para criar, amar, transformar e construir um mundo melhor? O que você faria com as marcas que carrega? Como você as transformaria em fonte de luz e inspiração para você e o mundo? "Do Vazio Existencial à Cura Criativa: Transforme Feridas Antigas em Arte, Ativismo e Resistência Social" Referências Bibliográficas Bourbeau, L. (2000). As Cinco Feridas que Impedem de Ser Você Mesmo . Sextante. Freud, S. (1917). Uma Dificuldade no Caminho da Psicanálise . Editora Imago. Jung, C. G. (1961). Memórias, Sonhos, Reflexões . Record. Jung, C. G. (2009). O Livro Vermelho . Vozes.Lacan, J. (1966). Écrits . Zahar. Lacan, J. (1973). O Seminário, 11: Os Quatro Conceitos Fundamentais da Psicanálise . Zahar. Klein, M. (1975). Envy and Gratitude and Other Works . Free Press. Foucault, M. (1976). História da Sexualidade: A Vontade de Saber . Graal. Bourdieu, P. (1998). A Dominação Masculina . Bertrand Brasil. Rawls, J. (1971). A Theory of Justice . Harvard University Press. Kant, I. (1785). Fundamentação da Metafísica dos Costumes . Martins Fontes. Nietzsche, F. 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São marcas psicológicas (rejeição, abandono, humilhação, traição e injustiça) que influenciam comportamentos e relações. Como a rejeição afeta a autoestima? A rejeição cria uma narrativa de desvalorização, levando à auto-sabotagem ou busca por validação externa. O que é a máscara do fugitivo? É a defesa usada por quem sofreu rejeição, marcada por isolamento e evitação de conexões. Como superar o medo do abandono? Fortaleça a autonomia com práticas de solitude intencional e explore gatilhos em terapia. Por que a humilhação causa vergonha? Ela fere a dignidade, amplificando a sensação de inadequação e criando comportamentos auto-depreciativos. O que fazer após uma traição? Reconstrua a confiança com pequenos atos de vulnerabilidade e trabalhe crenças disfuncionais em terapia. Como lidar com a sensação de injustiça? Pratique empatia, reescreva narrativas de injustiça e canalize a revolta em ações positivas. O que são máscaras emocionais? São defesas psíquicas criadas para evitar a dor, como o controlador (traição) ou o rígido (injustiça). A cura emocional é possível? Sim, por meio de autoconsciência, terapia e práticas integrativas, como mindfulness e análise de sonhos. Como as feridas emocionais afetam a sociedade? Elas refletem dinâmicas sociais, como exclusão, desigualdade e hierarquias opressivas. Qual é a relação entre feridas e psicanálise? A psicanálise ajuda a explorar o inconsciente, revelando como feridas moldam comportamentos. Como identificar minha ferida principal? Observe padrões emocionais, como medo de rejeição ou controle excessivo, e discuta-os com um terapeuta. Por que usamos máscaras emocionais? Para proteger o ego da dor, mas elas podem nos desconectar de nossa autenticidade. Como a terapia pode colaborar nas feridas emocionais? Ela oferece ferramentas para ressignificar experiências e integrar aspectos reprimidos do self. O que significa dançar com as feridas? É abraçar as dores como parte da caminhada da vida, transformando tudo em sabedoria e crescimento. Visite minha loja ou site: https://uiclap.bio/danielmena https://www.danmena.com.br/ Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Department of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. Comente e avalie o artigo; De 1 a 5 - Quantas estrelas merece o artigo? Deixe seu relato abaixo em COMENTÁRIOS.
- Orgasmo Feminino.
O Enigma do Orgasmo Feminino: Como o Amor e a Psicanálise Desvendam o Prazer Feminino. ''Colocar o orgasmo como o ápice da sexualidade, não somente limita o prazer como é o princípio da dificuldade para sua obtenção'' Dan Mena. Por Dan Mena. O amor no gozo feminino. A relevância do amor no contexto do gozo feminino tem sido objeto de análise na clínica psicanalítica. A afirmação de Lacan, que; “a única coisa que fazemos no discurso analítico é falar de amor” pode surpreender, uma vez que o senso comum nos associa a exploração do sofrimento humano e ao tratamento de sintomas que impactam a vida. Contrariando essa dimensão comum, nosso discurso não se limita à abordagem científica, que embora prevalecente, deixa de investigar fundamentos como desejo, amor e gozo, assim, como outras formas de manifestação do sujeito. Ao considerarmos o amor como elemento chave, usamos uma abordagem que vai além das fronteiras das narrativas da ciência, exatamente porque acolhemos aspectos essenciais da nossa experiência, muitas vezes negligenciada, inclusive por outras terapêuticas. A própria origem da psicanálise, emerge no contexto da cientificidade moderna e contemporânea, revelando uma resposta à exclusão do sujeito por parte de muitas disciplinas. Nesse sentido, surgimos na clínica para lidar com dimensões subjetivas e afetivas excluídas das investigações. O discurso analítico, ao se dedicar à exploração do amor, reconhece a importância desses elementos na compreensão mais profunda da psique, indo além da abordagem tradicional. Abordar o tema do orgasmo suscita uma certa alegria, especialmente para as mulheres, mas também para os homens, embora de maneiras distintas. Além do prazer inerente, discorrer na perspectiva intrigante do feminino adiciona um elemento extra de gozo assegurado. Contudo, ao adentrar no contexto do discurso psicanalítico, é crucial desassociar o conceito de “gozo” dos paradigmas comuns que o vinculam estritamente ao prazer. Para a psicanálise ele extrapola a ideia convencional de jucundidade, se dissocia dos ideais de bem-estar, equilíbrio ou harmonia. Os psicanalistas o concebemos como algo que surge do defeito, da falha introduzida pela linguagem no funcionamento humano, se transformando naquilo que não opera conforme o esperado e desejado, resultando na desordem, que por sua vez induz ao sofrimento em todos os aspectos existênciais. A extensão do feminino se liga à natureza das expressões do ser, notadamente aquelas fundamentadas nas palavras, essas que afloram como o protótipo do contraste, do ''Outro'', do desconhecido, tanto para os homens quanto para as mulheres. A trajetória da psicanálise se encontra entrelaçada com a experiência com elas. Mulheres desempenharam um papel capital ao abrir as portas do inconsciente para Freud, culminando na descoberta e invenção da psicanálise. Contudo, paradoxalmente, também foram elas que obstaculizaram sua compreensão quando ele empreendeu para descifrar os enigmas da sexualidade feminina. É nele que o feminino escapa a representação, adquirindo uma indefinibilidade, logo, algo incontrolável. O aspecto decisivo reside no fato de que não existe medida que possa abranger como ou em que medida uma mulher goza. Estou falando de algo ilimitado, sem restrições, que não pode ser localizado em uma parte específica do corpo, mesmo que a sexologia persista na busca por um ponto análogo a anatomia da mulher. Essa complexidade inerente à experiência do gozo feminino desafia as tentativas de categorização anatômica e sublinha a necessidade de abordagens mais holísticas na sua compreensão. Boa leitura. Orgasmo e excitação. O termo “orgasmo” deriva da palavra grega “orgasmos”, cujo significado está ligado ao conceito de “excitação”; (Freud, 1905). Sob uma perspectiva fisiológica, é descrito como a liberação súbita da tensão sexual acumulada durante o ciclo de resposta sexual, que se manifesta por meio de contrações musculares rítmicas na região pélvica, que simultâneamente proporcionam o prazer. Nos primórdios de suas investigações sobre sintomas histéricos, Freud direcionou sua atenção ao corpo feminino, chegando a afirmar que a vida adulta delas permaneceria num “continente escuro”; (Freud, 1920). A construção da identidade sexual difere substancialmente entre homens e mulheres. Na obscuridade do corpo feminal, reside o vazio, uma ausencia, onde as determinações anatômicas moldam as funções psíquicas e eróticas, gerando, através do olhar do ''Outro'', uma incompletude, sugerindo tal concepção como o ''continente negro feminino'', onde reina a plenitude fálica dos homens. Como Freud (1931) afirmou; “a mulher vive numa escuridão que o homem nunca conheceu, como se ela não tivesse nenhuma experiência do falo”. Enquanto homens enfrentam a ameaça de castração, mulheres vivenciam a certeza da falta, definindo assim sua dinâmica, a busca pelo ausente e a angústia da separação. A mulher é concebida originalmente como destinada ao amor e à autêntica reciprocidade com o homem. Não obstante, um obstáculo biológico limitou o pleno desenvolvimento da sexualidade feminina, uma vez que seus órgãos genitais, (interiorizados), são menos visíveis, ao contrário dos homens (maiormente superficiais). Neste ditado da natureza, mulheres não exploram seus órgãos genitais desde a infância, resultando em uma diversidade única na forma como cada uma experimenta o prazer em seu corpo. Quando nos remetemos historicamente, vemos que a proibição da sexualidade gerava inibições, já na contemporaneidade, mulheres adquiriram maior liberdade sexual e social, diminuindo os sentimentos de culpa que estavam associados a moral da época. Destarte, algumas mulheres ainda vivenciam sua sexualidade de maneira secreta, levantando questões interessantes sobre motivações sustentadas por uma certa clandestinidade que as atraem. Como Freud afirmou; “o inconsciente é o reino do segredo, e a verdadeira natureza do indivíduo só pode ser conhecida através da revelação do inconsciente”. A incompatibilidade entre maternidade e prazer sexual é outro fator importante a ser avaliado, algumas optam por concentrar sua libido nos filhos, e abdicam de outros aspectos de suas vidas, surge então a dicotomia entre ser mãe e ser mulher, colocando um limiar entre ambos. Parece que elas precisam fazer uma escolha, como se a busca erótica e o prazer sexual implicassem numa fronteira, entre agarrar apenas a imagem da mãe pura e assexuada que precisa abrir mão da sua sexualidade. Para que serve o orgasmo? Uma companhia sexual satisfatória poderia ser uma boa resposta como elemento essencial para sua obtenção, o que demandaria também interesse, paciência, sensibilidade, inteligência e empatia; segundo (Masters & Johnson, 1966; Kaplan, 1979). Embora varie nas formas como é experienciado individualmente, o orgasmo é comumente caracterizado por um aumento do ritmo cardíaco, sudorese, respiração acelerada, pressão sanguínea máxima e contrações musculares rítmicas na região pélvica, incluindo a vagina, útero, ânus e músculos pélvicos, ocorrendo de cinco a dez vezes em intervalos inferiores a um segundo; (Basson 2005). Mulheres relatam experienciar o mesmo em diferentes partes do corpo, inclusive atingindo múltiplos deles, ampliando a complexidade dessa resposta sexual; (Whipple & Komisaruk, 1991). Após o clímax, se inicia a fase de resolução que vem acompanhada pelo relaxamento corporal, normalização da circulação sanguínea e respiração, acompanhada de uma sensação de prazer, cansaço e, em alguns casos, sonolência; (Basson 2005). A falta de controle sobre a ejaculação precoce, pode resultar na incapacidade masculina de atingir o gozo. Similarmente, a anorgasmia, é a incapacidade de chegar lá na mulher, regularmente ou mesmo nunca, o que destaca a importância da comunicação entre eles para melhorar a prática sexual, aprender a controlar a ejaculação no caso do homem e aumentar a excitação na mulher; (Laumann, Paik, & Rosen, 1999). Contrariamente a uma função fisiológica necessária, o orgasmo feminino é considerado uma dádiva da nossa humanização, ele difere dos padrões observados no reino animal, onde as fêmeas não manifestam o gozo como nas mulheres humanas; (Lloyd, 2005). A variável do tempo aplicado na sua obtenção será sempre fundamental para a excitação que conduz ao orgasmo feminino, muitas vezes facilitado pela masturbação ou por um parceiro paciente e experiente, enfatizando a necessidade do respeito pela mulher como uma variável essencial. Homens e mulheres apresentam diferenças significativas em relação ao orgasmo, sendo os homens mais propensos a conseguir; (Laumann 1999). Ele permanece um tema tabu no mundo ocidental, influenciando a vida sexual de milhões de mulheres e casais devido a estereótipos de gênero e percepções culturais. Embora os mitos de Freud sobre o tema tenham sido refutados pela ciência, persistem na sociedade, impactando a autoestima e confiança delas, bem como atingem negativamente suas relações emocionais. A desmistificação desses mitos é significativa para promover uma visão mais ampla e inclusiva do prazer sexual feminino. O mistério da sexualidade feminina. Imerso em certo mistério devido à complexidade inerente à sexualidade, o acesso à identidade delas emerge como um percurso intrincado, pois o orgasmo, como elemento central não se manifesta de forma localizável, carece de um produto visível que ateste sua existência e ocorrência. Por vezes, suscita a possibilidade da sua falsificação, uma farsa que gera confusões em relação à sua dinâmica; (Lacan, 1975). A insegurança permeia a falta de prazer ao transitar de um objeto sexual para outro, alimentando a ilusão de encontrar um homem que sirva como guia na descoberta da própria feminilidade. Assim, a ansiedade desempenha um papel pertinente na busca pelo orgasmo, ao envolver a preocupação em agradar o outro, a apreensão quanto à sua capacidade de atingir o clímax e o estigma associado à visão do sexo como algo proibido, derivado de experiências educacionais ou traumas passados, podem constituir obstáculos de acesso ao prazer. Na perspectiva feminina, há um deleite que a ultrapassa, algo mais do que a ausência do órgão fálico. Lacan destaca, que o gozo feminino não se enquadra na sua dimensão, desconstruindo a identidade do sujeito ao invés de permitir sua identificação. Em contraste, o gozo fálico, com sua localização corporal e características mensuráveis, possibilita a identificação masculina através da colocação em jogo desse prazer; (Lacan, 1975). O clímax feminino, estritamente definido como “não-todo-fálico”, transcende sua própria dimensão, destituindo o sujeito e não permitindo identificações. As mulheres, ao suportarem melhor a frigidez do que os homens, sustentam a impotência, e evidenciam que não identificam a feminilidade matematicamente pela quantidade de orgasmos que possam atingir. Essa desconexão entre orgasmos, números e identidade feminina contribui para a insegurança das mulheres quanto à sua verdadeira feminilidade, perpetuando muitos estigmas sociais. A dedução lacaniana, diferente da freudiana, esclarece a relação entre o gozo e o amor na posição feminina. A incessante busca por ele implica uma necessidade de identificação através do amor de um homem, uma vez que o gozo feminino, ao ultrapassar a mulher como sujeito, a aniquila, a levando a buscar reconhecimento através do afeto. Nesse contexto, a chamada ''pequena morte'' que trata Lacan., como uma ideia por trás do termo, é que o orgasmo sería uma espécie de morte simbólica, uma vez que envolve a liberação de tensões e uma perda temporária de controle consciente. Essa expressão sublinha a natureza paradoxal da experiência sexual, em que há uma entrega temporária do ''eu individual'', uma fusão momentânea com o gozo. O orgasmo é visto como um evento onde o sujeito experimenta uma interrupção momentânea da sua estrutura simbólica e da ordem fálica. A natureza disruptiva e, ao mesmo tempo, vital na experiência orgasmática, implica um extravio provisório de controle, seguida por um retorno à realidade. Seria então a perda simbolizada do gozo que assume nesse lugar uma relevância singular, intensificando a angústia relacionada à transição da posição de sujeito para objeto. Mulheres que experimentam esse gozo em êxtase, demandam o privilégio de serem amadas, pois, ao ultrapassar o sujeito, o clímax feminino não proporcionará sua identificação. O amor, ao contrário, lhe confere identidade, mas a exigência recai na condição de ser amada como única, esperando que o amor masculino lhe confira um valor fálico que o gozo em êxtase não pode lhe outorgar. Essa busca incessante por ser amada, reflete a necessidade de compensar a ausência de identidade proporcionada pelo gozo desejado. Observações sobre o orgasmo. 1 — A masturbação não é a única forma de atingir o clímax, a estimulação corporal em muitos sentidos é outra forma de chegar ao orgasmo, seja num encontro sexual, quer individualmente ou com outros. 2 — A penetração não é assim tão importante, se estima pelas pesquisas que apenas 20% das mulheres atingem o orgasmo através da penetração, isso significa que 80% delas precisam de estimulação externa para alcançar o ponto e sentir suas sensações. 3 — O stress anula a capacidade orgástica, limitando significativamente a secreção dos hormônios sexuais. Os esteroides, em vez de serem convertidos em hormônios, serão revertidos em cortisol provocando esgotamento e estafa. 4 — O orgasmo pode ser totalmente experimentado nos sonhos. Mulheres conseguem essa experiência psíquica enquanto dormem, mesmo sem qualquer intenção. A função sexual do cérebro feminino continua ativa durante o sono. 5 — Fatores emocionais como a depressão e às preocupações podem interferir na capacidade do seu apogeu. 6 — Comunicação insuficiente ou ineficiente sobre desejos, fantasias ou um desconforto durante o sexo, pode criar barreiras ao prazer, por consequência não chegar ao clímax. 7 — A falta de excitação sexual é fundamental para o orgasmo, se uma mulher não estiver suficientemente excitada, pode ser difícil atingir seu ponto de frenesi. 8 — Problemas de autoestima ou a falta de confiança no corpo podem ter um impacto negativo na experiência sexual. 9 — Condições médicas, doenças neurológicas ou hormonais, podem afetar a resposta positiva. 10 — Alguns medicamentos podem ter efeitos negativos secundários sobre o desempenho sexual, interferindo com a libido. 11 — Traumas sexuais do passado, frustrações e experiências de abandono, podem ter um impacto duradouro na resposta sexual feminina. 12 — Falta de conhecimento sobre o próprio corpo, inexperiência ao não estarem familiarizadas com ele e não saber exatamente o que as excita, são fatores que jogam na obtenção do orgasmo. 13 — A estimulação inadequada, egoismo masculino, egocentrismo, falta de imaginação, ausência de fantasias e variedade nas práticas sexuais podem ser obstáculos ao orgasmo da mulher. 14 — Dificuldades de relacionamento, falta de intimidade, conflitos não resolvidos ou ausência de ligação emocional, podem ter um impacto negativo na resposta sexual. 15 — Danos nos tecidos provocados por cirurgias ginecológicas, como a histerectomia, podem afetar a capacidade de atingir o orgasmo. 16 — Pessoas podem experimentar ansiedade durante o sexo devido a fatores como a educação que recebemos, pressão sobre o desempenho sexual, ideias conservadoras sobre como devemos ou não partilhar nosso corpo, conceitos morais e religiosos. Tudo isto influência a capacidade de desfrutar e serem levados até a lubricidade. Por isso, é importante que as relações sexuais sejam como uma espécie de meditação, se concentrando e focando em sentir o corpo. A diversidade do orgasmo. Freud os distinguiu como clitorianos em mulheres jovens e vaginais naquelas com uma resposta sexual saudável. Por outro lado, a sexóloga Betty Dodson os define pelo menos em nove formas diferentes; 1 — Combinados ou mistos, uma variedade de experiências diferentes e misturadas. 2 — Múltiplos, uma série deles, em vez de um num curto período. 3 — De pressão, surgem da estimulação indireta da cominação aplicada, uma forma de autoestimulação. 4 — De relaxamento, resultam de uma descontração e lassidão profundos durante a estimulação sexual. 5 — Orgasmos de tensão, produto da estimulação direta, muitas vezes quando o corpo e os músculos estão tensos. Há outras formas que Freud e Dodson rejeitam; 6 — Orgasmos de fantasias, resultantes de estimulação mental e psíquica. 7 — Orgasmos do ponto G, produto do excitamento de uma zona erótica especifica durante o ato sexual com penetração, sendo muito diferente dos orgasmos com outros tipos de instigação. O simbólico e a construção do desejo. O papel do simbólico na formação do desejo e, por conseguinte, a vivência do orgasmo são levantadas por Lacan em seu Seminário 20. Ele ressalta que “o corpo está em jogo no ato sexual, mas é o corpo investido de significantes”. Nesta frase podemos compreender que o ápice sexual não está apenas inserido como um fenômeno físico, mas é moldado pelos seus elementos culturais e linguísticos que permeiam a libido desde sua inserção nessa ordem simbólica. O falo não é apenas um objeto anatômico, mas um significante que estrutura essa relação do sujeito com sua própria sexualidade, portanto, influenciado diretamente pela entrada da mulher na ordem metafórica e representativa, refletindo toda uma complexidade inerente às dinâmicas psíquicas e na expressão do prazer sexual. Esse imaginário que se liga a construção da imagem corporal, será elaborado e construído através das imagens projetadas, e o orgasmo não escapa a essa lógica. A imagem que a mulher tem de si mesma e a reflexão que os outros têm dela, instigam diretamente essa experiência. Ao analisar seus seminários, percebo que ele faz uma leitura da sociedade, da cultura e expectativas sociais que contribuem para o erguimento do imaginário sexual da mulher. Portanto, não é apenas um evento íntimo, mas uma expressão que reflete as projeções e expectativas culturais relacionadas à sua sexualidade. A dimensão real do orgasmo feminino não pode ser negligenciada, deve ser reconhecido que o seu corpo desempenha uma indispensável participação na bagagem e experiência do prazer sexual. Contudo, essa dimensão é filtrada pela mediação simbólica e imaginária. A análise do real nele enseja um adentrar na compreensão das interações entre corpo, linguagem e psique na busca constante pelo comprazimento. Quanto ao momento do clímax, assume, segundo minha visão, uma dimensão peculiar. Não é meramente um evento fisiológico, mas um instante de vacilação da sustentação simbólico-fálica, uma verdadeira epifania com o Real. Quando falamos do Real em psicanálise não o dizemos no sentido velado, mas algo que está além da percepção, uma visão que podemos atribuir de fato ao feminino. Ao considerar essa sua sexualidade como algo rejeitado, não completamente aprisionado pelo significante e recalque, que nesse aspecto inclui ambos os sexos, onde há um destaque nessa conexão discreta e encoberta com ele. Este elo, comumente associado à mulher, transcende as fronteiras dos gêneros, definindo o desejo e a verdade analítica. Como observa Lacan, “o Outro sexo é a mulher”. Por trás do véu que encobre esse mistério, não há nada - uma declaração que ressoa com a necessidade de compreender a condição para desfrutar do feminino: então, a castração. Entramos assim no “ato de amor”, onde o sujeito não precisa ultrapassar os limites de seu fantasma. Permanecendo em um devaneio, onde o indivíduo evita o encontro direto com o Real, se ligando apenas à parte fálica do outro. Essa dinâmica é sustentada tanto por homens quanto por mulheres, embora Lacan aponte que a feminilidade, de acordo com sua rota, não seja fácil de suportar. Ao considerar essa dificuldade, se observa que as mulheres também deslizam para o lado fálico. Essa posição as leva a tentar o ''outro'', gerando não apenas um desejo comum, mas uma lascívia que extrapola sua consolação fantasmática. O fantasma, por sua vez, é uma tela, um ecrã que impede o encontro direto com essa realidade, mas, paradoxalmente, também deixa o sujeito no limiar desse encontro. Na “lógica do fantasma”, se aprofunda a compreensão do desmaio fálico, uma renovação constante no desvanecer do ser do sujeito, essa experiência, essencial à vivência masculina, comparada ao retorno da “pequena morte”. A função evanescente dele, mais diretamente verificada no gozo masculino, confere ao homem o privilégio da ilusão da pura subjetividade. O homem pode perder de vista a presença do ''terceiro objeto'', perdendo esse elemento crucial na relação do casal. Essa função evanescente, característica do gozo masculino, destaca a fragilidade da subjetividade diante do encontro fugaz com o Real. Essa experiência íntima do feminino na construção do desejo e da verdade analítica, promove uma reflexão crítica sobre o papel do orgasmo na experiência humana, que ultrapassa a visão convencional e adentra no domínio enigmático do Real. Entender Lacan, é quase um impossível, veja definições que podem ajudar; ''Terceiro Objeto''...em termos práticos, perder de vista a presença desse "terceiro objeto" pode indicar uma dificuldade na compreensão ou reconhecimento de fatores externos que influenciam a dinâmica de um relacionamento. Isso pode levar a mal-entendidos, conflitos, brigas ou dificuldades na relação, uma vez que o sujeito pode estar inconscientemente projetando seus desejos ou lacunas no relacionamento sem plena consciência do impacto do "objeto a" na dinâmica do seu contexto. “Ato de Amor”… em Lacan não se refere simplesmente a uma expressão física de afeto, mas a uma forma específica de interação psíquica e simbólica entre os sujeitos. ''Fálico''… não se refere apenas à anatomia, mas é crucial na formação da subjetividade e na estruturação do desejo humano. O fálico não é uma simples categoria biológica, mas uma construção simbólica que permeia a linguagem, a cultura e a psique, moldando a experiência do sujeito diante do desejo e da castração. “Pequena Morte”… em termos lacanianos não se refere à morte física, mas sim à morte simbólica momentânea da identidade consciente durante o ápice do prazer sexual. Essa terminologia contribui para a rica tapeçaria de metáforas e conceitos que ele emprega para descrever a psique humana e suas interações com o desejo e o prazer. ''Real''… não é uma entidade física ou tangível, mas uma dimensão psíquica que desafia a capacidade da linguagem de representar completamente a experiência humana. O Real é um conceito que destaca as limitações da linguagem e a presença de elementos indomáveis e perturbadores na experiência subjetiva. ''Fantasma''… é uma construção psíquica complexa que desempenha um papel fundamental na formação do sujeito e na dinâmica do desejo. Ele reflete a interação entre o imaginário e o simbólico, contribuindo para a compreensão da subjetividade e da experiência psicanalítica. ''Significantes'' não são meros veículos de comunicação, mas elementos essenciais na constituição da subjetividade. Eles não apenas transmitem significados, mas também moldam a experiência psíquica, o desejo e a formação da identidade do sujeito. A análise dos significantes na psicanálise compreenderá as complexas dinâmicas entre linguagem, desejo e estruturação psíquica. ''Objeto''… existem diferentes contextos para descrever aspectos das relações psíquicas e do desenvolvimento do sujeito; 1 — ''De Desejo''…: O conceito de “objeto a” (objeto pequeno a) para se referir ao objeto perdido que se torna um ponto de fixação para o desejo. Esse objeto não é um objeto real, mas sim um simbólico que representa o que falta no sujeito, gerando um desejo constante e muitas vezes inatingível. 2 — Real e Objeto Imaginário: Distinção entre o objeto real (objeto físico, tangível) e o imaginário (construção mental, imagem). O objeto real está associado ao que é material e concreto, enquanto o objeto imaginário se refere à imagem mental que o sujeito constrói e que pode não corresponder completamente à realidade. 3 — Do Desejo: O objeto do desejo está sempre faltando, ausente ou perdido, levando a um constante movimento em direção a novos objetos. Dito elemento do desejo não é fixo e é muitas vezes inatingível, contribuindo para a dinâmica do desejo e da busca constante por satisfação. 4 — Objeto Transicional: Embora mais associado ao trabalho de Winnicott, Lacan também aborda a ideia de um objeto transicional na fase inicial do desenvolvimento infantil. Esse objeto, muitas vezes físico como um cobertor ou um brinquedo, serve como um meio de transição entre a dependência total da mãe e a independência do sujeito. 5 — Objeto na Ordem Simbólica: Se refere aos objetos e símbolos mediados pela linguagem e pela cultura. O simbólico é uma dimensão onde os objetos ganham significado sendo moldados por estruturas linguísticas e sociais. “Outro”… existem várias instâncias no conceito de “Outro” - “outro” - ''Grande Outro''; 1 — Outro Maiúsculo… O termo “Outro”. Com letra maiúscula usado para se referir à dimensão simbólica, à ordem da linguagem e à cultura. Esse Outro simbólico é onde a linguagem adquire significado, e a identidade do sujeito é moldada por meio do processo de entrar na ordem simbólica. 2 — Outro Pequeno… “outro”. Mencionado com letra minúscula, se refere ao outro como um indivíduo específico na vida do sujeito, como a figura do pai, da mãe ou de outra pessoa significativa. 3 — ''Grande Outro'': A ideia do “Grande Outro” como uma entidade abstrata que representa a totalidade da linguagem e do simbólico. É o domínio onde as leis simbólicas, normas culturais e estruturas linguísticas operam. Também está associado à ideia do Nome-do-Pai, que introduz a ordem simbólica na vida do sujeito. Frases de psicanalistas; “O orgasmo feminino é um capítulo íntimo onde mente e corpo se entrelaçam” Dan Mena. “O orgasmo feminino é um fenômeno complexo que reflete a interação única entre a psique e o corpo, revelando nuances da experiência sexual feminina.” Freud. “A busca do orgasmo na mulher é uma jornada psicológica intrincada, muitas vezes moldada por fatores inconscientes e desejos reprimidos.” Jung. “O orgasmo feminino, longe de ser simplesmente físico, é uma expressão profunda da psique, revelando camadas ocultas da vida emocional e afetiva da mulher.” Klein. “A compreensão do orgasmo feminino exige uma análise das complexidades do inconsciente, onde desejos, medos e experiências passadas convergem.” Lacan. “O orgasmo na mulher é uma manifestação da libido, um fenômeno que transcende o simples ato físico, mergulhando nas profundezas do inconsciente e da fantasia.” Reich. “A sexualidade feminina, incluindo o orgasmo, é moldada por forças inconscientes que demandam exploração e compreensão para revelar seu verdadeiro significado.” Chodorow. “O orgasmo feminino é uma expressão única da psique, refletindo a interação complexa entre as forças do inconsciente e as experiências conscientes.” Horney. “A busca do orgasmo feminino é muitas vezes influenciada por construções psicológicas profundas, incluindo expectativas sociais, traumas passados e anseios inconscientes.” Yalom. “O orgasmo feminino, ao ser estudado sob a ótica psicanalítica, revela os meandros da mente feminina, destacando a importância da introspecção e autoconhecimento.” Rank. “Entender o orgasmo feminino requer uma abordagem holística que integre elementos psicológicos e físicos, desvendando os mistérios subjacentes à expressão máxima da sexualidade feminina.” Anna Freud. “A psicanálise revela o orgasmo como autoconhecimento, onde cada onda de prazer é parte da experiência sensorial feminina.” Dan Mena. Todas as mulheres conseguem experimentar o orgasmo. Lacan, notadamente devido à sua abordagem e linguagem labiríntica pode parecer ininteligível, pois, presumivelmente para ele, o real não necessariamente demanda uma compreensão. Antes de interpretar seus paradoxos, é imperativo permitir que ressoem na nossa mente suas palavras, e, caso não encontrem eco, aguardemos a próxima tentativa. Cumpre também ressaltar, que as perspectivas psicanalíticas acerca da sexualidade são passíveis de variação, e nem todos os psicanalistas compartilhamos a mesma interpretação e escola. Destarte, é essencial reconhecer que a psicanálise não constitui a única abordagem para a intelecção do orgasmo feminino e outros temas conectados a sexualidade. Disciplinas como a sexologia e a psicologia oferecem perspectivas valiosas. A alegação de que as mulheres supostamente possuem menos necessidades sexuais ressalta a imaterialidade e abstração quanto à sua frequência e nível de importância que elas lhe conferem. Embora seja uma atividade prazerosa, a intensidade do desejo, demanda, exigência e carecimento da sua prática, variam entre indivíduos. Homens e mulheres vivenciam a prática sexual de maneira diferente, para muitas, o desejo está atrelado à ausência de conflitos e problemas com o parceiro. No caso dos homens, essa harmonia simbiótica favorece o surgimento e a manutenção do desejo. Nesse ambiente, ambos os sexos foram culturalmente designados a desenvolver papéis sociais que podem estar distantes de uma sexualidade saudável. A psicanálise destaca a importância de proporcionar uma visão real e saudável dela, mediante uma releitura psíquica e emocional, que considere o corpo, afetos, experiências, desejos e emoções. Finalmente, quero afirmar a ideia de que todas as mulheres podem experimentar o orgasmo, sendo sua diferença mais relacionada à atitude pessoal, educação, religião, informação, verdadeiro querer e resolução sobre a sexualidade. Fundamentalmente o papel do cérebro na percepção de emoções, pensamentos, sensações, fantasias e na construção do mundo erótico é central nesse arcabouço, tanto na forma psíquica quanto fisica. Por fim cabe marcar, que uma persistente ausência de orgasmos, pode estar relacionada com o histórico de desenvolvimento psicossexual da mulher e alguns bloqueios infantis específicos. Se dita tenacidade perseverar uma vez avaliados esses aspectos, vale questionar e investigar a falta de habilidade ou perícia do parceiro(a), que pode ser apontada como uma das causas, uma vez que, com outra pessoa a experiência do orgasmo para ela tenha de fato ocorrido. Mesmo nessas circunstâncias, é possível que a presença do par esteja vinculada a sentimentos de culpa que desencadeiem um obstáculo, barreira e inibição, limitando esse cenário que demandará uma análise psicanalítica ou atenção psicológica, tanto individual quanto do casal. É sempre no passado aquele orgasmo, é... Carlos Drummond de Andrade. É sempre no passado aquele orgasmo, é sempre no presente aquele duplo, é sempre no futuro aquele pânico. É sempre no meu sono aquela guerra. É sempre no meu trato o amplo distrato. Sempre na minha firma a antiga fúria. Sempre no mesmo engano outro retrato. É sempre nos meus pulos o limite. É sempre nos meus lábios a estampilha. É sempre no meu não aquele trauma. Sempre no meu amor a noite rompe. Sempre dentro de mim meu inimigo. E sempre no meu sempre a mesma ausência. Até breve, Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 - CNP 1199 Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 - CBP 2022130
- A Liberdade.
A liberdade na Psicanálise está inscrita na lógica relacional, com a qual Lacan propõe: ''Tudo é afetado pela dimensão da alteridade, (relações de contraste, distinção, diferença). Se o desejo é o desejo do Outro, se o inconsciente é o discurso do Outro, se o Eu é a imagem do Outro, … a liberdade não é sem o Outro''. A Liberdade por Dan Mena. O que é liberdade? É uma palavra enorme. O que realmente implica; existe a liberdade mesmo? Como uma idealização da maior importância para o ser humano, vejamos inicialmente alguns conceitos apresentados no decorrer do tempo; A liberdade na Psicanálise está inscrita na lógica relacional, com a qual Lacan propõe: ''Tudo é afetado pela dimensão da alteridade, (relações de contraste, distinção, diferença). Se o desejo é o desejo do Outro, se o inconsciente é o discurso do Outro, se o Eu é a imagem do Outro, … a liberdade não é sem o Outro''. Kant, que foi um dos grandes pensadores do Iluminismo, um movimento que revitalizou os ideais de liberdade na Europa dos séculos XVII e XVIII, refere-se a mesma: Libertar o homem da prisão da sua ignorância e mediocridade. Para ele, liberdade é a autonomia para cumprir o nosso dever, conforme às Leis da Natureza; assim, somos senhores de nós próprios e das nossas ações. Uma das concepções mais radicais de liberdade foi desenvolvida por Jean-Paul Sartre, que acreditava que somos sempre livres, mesmo em situações em que a maioria diria não haver escolha. Para o filósofo, “o homem é liberdade”. O seu ponto de partida do pensamento sobre ela é a ideia de que “a existência precede a essência”. Em outras palavras, o homem primeiro existe, e só depois define o que ele é. Por outro lado, não possui uma essência, ele não é o fruto da criação de um ser superior que determinou a sua natureza e propósito. Assim, o homem primeiro existe no mundo, e só depois define o que será. Segundo ele, “no início não somos nada: só mais tarde, seremos algo, existiremos, segundo o que fizermos de si”. Numa das suas frases sanciona: estamos “condenados a ser livres”. O que é liberdade, segundo Berlin? É querer que nossas vidas e decisões dependam de si próprios e não de forças externas. Sermos dirigidos, movidos por nada mais do que o nosso grau de maturidade, e autoconhecimento. Pressupõe, também, a existência de uma faculdade autônoma da vontade do indivíduo. E para Platão? Há um consenso em considerar Platão como representante de uma concepção positiva da liberdade, entendida como autocontrole racional. De acordo com esta abordagem, uma pessoa é livre se os seus desejos pragmáticos dominarem os seus irracionais, e os mesmos, determinarem suas ações. O que diz Hegel; O direito à liberdade é fundado na própria liberdade. Só o exercício efetivo dela o faz possuir tal direito. A liberdade nos torna livres, é um direito, porque o direito já é a própria liberdade. Me sinto muito confortável em ler Erich Fromm: Amor e Liberdade: A essência humana. Este sociólogo e psicanalista chegou à conclusão de que seres humanos experimentam frequentemente um medo profundo de assumir sua liberdade, onde abdicamos dos nossos direitos a ela. Sua teoria parte da imagem bíblica da expulsão do paraíso. “O ato de desobediência do homem, como uma premissa de liberdade, é o início da razão. O mito, refere-se às consequências do nosso primeiro feito de liberdade, onde a harmonia entre o homem e a natureza foi quebrada. Deus proclama a guerra entre o homem e a mulher, entre a natureza e o homem (…). A liberdade, recentemente conquistada, aparece como uma maldição; liberta dos doces laços do Paraíso, mas não livre de se governar a si próprio”. Face a este medo original da liberdade que produzimos no paraíso, entregamos nossa responsabilidade por três mecanismos; Conformidade: Regulamos nossa personalidade, moldada ao que a sociedade prefere e espera dela, sacrificando o verdadeiro Eu. Autoritarismo: Cedemos o controle de si próprios a terceiros, como uma atitude sadomasoquista. Destruição: Destruir os outros e, em última análise, o mundo, para que terceiros não nos dominem. Em outras palavras, construímos um terreno fértil para o totalitarismo, por um lado, o consumismo que nos engana sob uma fuga escapista, por outro, construímos sentimentos de culpa e vergonha, que estão na raiz do medo de exercer a liberdade. Estes, só podem ser transcendidos pelo desenvolvimento do melhor de si mesmo, o que nos torna únicos, no nosso pleno potencial humano: com a capacidade de raciocínio, produção, afetos e amor. O sujeito moderno, em contraste com o medieval, sabe que é o mestre da sua liberdade, no entanto, não a pode desenvolver plenamente, devido a contextos globais que transformaram nosso trabalho, energia e formas de amar. Portanto, sequestrados que fomos, sob certas circunstâncias e conjunturas, convertidos e transformados em produtos, prateleiras ambulantes, objetos e mercadorias. Consequentemente, é o preço que pagamos nesse contexto capitalista, acompanhados de sentimentos de isolamento, fragilização, impotência e angustia, agora, privados dos laços fundamentais que costumavam nos oferecer segurança. Assim, transformamos a liberdade num fardo insuportável, vidas sem significados, da qual muitas vezes queremos nos livrar, delegar ou entregar. Retornemos a Freud que disse; ''os seres humanos não querem realmente ser livres'', porque toda a liberdade requer responsabilidade, e a maioria de nós tem medo dela. Podemos pensar que muitas vezes o discurso sobre a liberdade permanece estritamente no seu próprio dizer, como uma narrativa. Abandonar um trabalho que nos escraviza, terminar uma relação que não é boa, mudar um hábito, pode ser um passo ainda mais difícil, que muitos de nós tem dificuldades para avançar. Vivemos num mundo regulado pelos mesmos códigos, isto nos mantém de certa forma vinculados, atrelados, o que significa que a maioria das escolhas que acreditamos serem voluntárias, são inconscientemente condicionadas a um meio social, por conseguinte, nossa liberdade é de alguma forma relativa. Poderíamos associá-la à vontade, e isto nos remete à consciência, de modo que se a nossa consciência é limitada e há muito que nela nos escapa, podemos concluir que é tanto mais cerceada e delimitada quanto gostariamos. Se associada ao inconsciente, com a consciência restrita que sabemos nos habita, respondemos de fato a uma ordenação pré-definida, da qual somos todos reféns. A Psicanálise desde Lacan, tem toda uma reflexão sobre a noção de liberdade, acredito particularmente que esta sua frase magistral possui um legado muito assertivo sobre nossa condição: “O homem sonha com o sonho de liberdade, e liberdade não é mais do que um sonho”. Sob diversas perspectivas, quem na minha opinião se aproxima da forma mais contundente sobre nossa contemporaneidade, é um autor pelo qual tenho grande aprecio e admiração, aprendi muito com ele: desde muitos livros Zygmunt Bauman, aborda este tema, especialmente trata da liberdade em "Thinking Sociologically" (Aprendendo a pensar com a sociologia). Editora Zahar, Recomendo. Seguindo e nos aproximando do final: de uma forma mais prática, cada um de nós enfrenta problemas diários que exigem um reajuste de vida. Quando mudamos de emprego, de casa, iniciamos um aprendizado, divorciamos, casamos, começamos um relacionamento, nos tornamos pais ou mães, somos acometidos por doenças, atravessamos ciclos, envelhecemos. Devemos pensar e ponderar sobre essas relações entre liberdade e dependência como um processo de contínua mudança. Ditas complexidades começam a se apresentar com nossa chegada a este mundo, e terminam, ''hipoteticamente'' com a morte. A sensação que experienciamos ocupa um lugar de que nossa liberdade nunca está completa. Nossas ações são moldadas, forçadas pelas atitudes passadas, somos diariamente confrontados com escolhas que, embora atraentes, são inatingíveis ou quase impossíveis. A liberdade na modernidade tem um custo, varia com determinadas circunstâncias sociais, na medida que procuramos por novas oportunidades, onde essa viabilidade de recomeçar vai ficando mais distante, frustrada, na medida que os ciclos de maturidade se cumprem. Simultaneamente, a liberdade para uns pode ser comprada, ao custo de uma maior dependência de outros. Neste ponto, o papel que os recursos materiais e simbólicos desempenham no processo das escolhas como propostas viáveis e realistas, o que nos conduz a afirmar que nem todas às pessoas usufruem do acesso a eles. Assim, enquanto todas as pessoas são livres e só podem ser livres — somos obrigados a assumir a responsabilidade por tudo o que fazemos. Algumas mais que outras, porque seus horizontes e escolhas de ação são mais amplos, e isso, por sua vez, pode depender da restrição de perspectivas impostas por terceiros. Podemos dizer, que a relação entre liberdade e dependência é um indicador da posição relativa que cada um ocupa na sociedade. Finalmente, podemos entender o impulso de escapar de uma situação difícil como uma libertação, quando na realidade estamos escravos do medo que ela provoca. A liberdade nunca é total, nem plena, estaremos sempre dependentes de algo, condicionados a alguma situação, pensar de outra forma é negação da ''realidade''. Destarte, estar em sintonia com o nosso desejo, tem a ver com não ceder a ele, abrindo espaço também, para arriscar o máximo possível na forma como ele nos dirige e conduz de acordo com nossos quereres. Tomar conta dele implica em responsabilidade, significa estabelecer seus limites, onde muitas situações jogam em conjunto com o ambiente, para que se mantenham no bom caminho. A liberdade é sempre relativa a muitos outros fatores; nunca somos livres para escolher uma linha exclusiva de ação, independente das causas que rejam a vida psíquica. Uma solução pode ser aplicada nessa gangorra através da análise, onde é possível alcançar pela Psicanálise uma maior compreensão das nossas motivações inconscientes, é assim, dar a melhor resolução possível. Vamos para a poesia da vida! Liberdade, de Miguel Torga — Liberdade, que estais no céu… Rezava o padre-nosso que sabia, A pedir-te, humildemente, O pio de cada dia. Mas a tua bondade onipotente Nem me ouvia. — Liberdade, que estais na terra… E a minha voz crescia De emoção. Mas um silêncio triste sepultava A fé que ressumava Da oração. Até que um dia, corajosamente, Olhei noutro sentido, e pude, deslumbrado, Saborear, enfim, O pão da minha fome. — Liberdade, que estais em mim, Santificado seja o vosso nome. Uma -ótima semana a todos! Até breve, Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 - CNP 1199 Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 - CBP 2022130
- Psicanálise e Saúde Mental Moderna
''Trauma e resistência na saúde mental contemporânea" Como Entender a Alma Humana em um Mundo em Colapso Imaginemos uma jovem de 27 anos, gerente de marketing digital, que passa 11 horas por dia conectada. Ela tem um apartamento, uma carreira de sucesso, e uma vida que, aos olhos de muitos, parece invejável. Mas, há seis meses, seu avô faleceu. Ela não chorou, não sentiu nada — ou pelo menos foi o que pensou. Até que, um dia, seu celular quebrou. E aí, sim, as lágrimas vieram, torrenciais, incontroláveis. Não pelo avô, mas pelo aparelho. Parece absurdo né? Talvez. Mas, se você parar para refletir, essa história revela algo muito maior sobre o jeito como vivemos hoje. Nossas emoções estão entrelaçadas com a tecnologia de uma forma que nunca imaginamos. Não é que a jovem não sentisse a perda do avô; ela simplesmente não sabia como processar isso. O luto, que antigamente era vivido em comunidade, com rituais, reuniões familiares, conversas e tempo para digerir a dor, hoje se fragmenta, se dilui em pedaços minúsculos. Choramos em pílulas, não em ondas, esses sedativos provisórios e viciantes vêm disfarçados de vídeos de gatinhos fofos ou memes que nos arrancam um sorriso rápido, enquanto a tristeza verdadeira está ali, quieta, escondida, esperando a oportunidade para o seu próximo ataque. ''A jovem que chora pelo celular quebrado carrega o luto que não nomeou; a psicanálise me convida a acolher essas lágrimas como um portal para a reconexão com sua alma.'' - Dan Mena. ''O ‘Eu ideal’ das telas é uma ilusão frágil; a saúde mental começa quando ousamos atravessar a ponte até o ‘Eu real’, com todas as suas imperfeições.'' - Dan Mena. Freud já dizia, em Luto e Melancolia, que a dor não some — ela se transfere. Para essa jovem, o celular virou o depositário dessa dor represada. Quando ele parou de funcionar, foi como se a barreira que ela havia construído para não encarar o luto desabasse. O digital, nesse caso, não é o vilão da história, é uma ponte intermediária para as emoções que nossa mente, sozinha, não dá conta de embater. Mas por que vídeos de gatinhos? É uma injeção de dopamina, um alívio instantâneo. Já a psicanálise vai além do óbvio: o gato, com sua independência e mistério, pode ser um símbolo do que ela deseja ser — livre, sem as amarras emocionais que a sociedade tem cobrado dela. Em Topologia da Violência - Byung-Chul Han espreme que a sociedade hiper-conectada trocou os rituais por essas descargas emocionais. Não temos mais tempo para sentir de verdade. Estamos sempre correndo, sempre online, sempre distraídos. E, enquanto isso, a dor vai se acumulando, escondida atrás de um consumo de bytes frenéticos, como se estivéssemos tentando tapar um vazio existencial com likes, stories e scrolls infinitos.' 'Em um século de conexões fugazes, a psicanálise é uma bússola, ela guia para os rituais de introspecção que resgatam a humanidade soterrada pelo frenesi online.'' - Dan Mena. Agora, pense no que acontece com nosso inconsciente nesse cenário. Lacan usa o ''Estádio do Espelho'', aquele momento em que a criança se vê no reflexo e começa a construir uma ideia de si mesma, um ‘’Eu ideal’’ . Hoje, esse espelho é a tela do celular, perfis nas redes sociais são como avatares, versões polidas, recortadas e fantasiosamente perfeitas de quem gostaríamos de ser. Mas a realidade bate à porta. Já ouvi de um influencer de 35 anos, com 200 mil seguidores: “Me sinto invisível” . Ou de uma mãe blogueira: “Minha família parece perfeita nas fotos, mas meu casamento está em pedaços” . Essas translações mostram que, por mais que tentemos projetar uma imagem impecável online, o que sentimos por dentro não acompanha essa missão fictícia. Tal descompasso entre o ‘’Eu ideal’’ das redes e o ‘’Eu real’’ estão separados por uma longa ponte — e é aí que a angústia do século XXI se instala, silenciosa, mutilante e avassaladora. ''O inconsciente, pode dançar entre carrusels e stories, mas é na solitude intencional que encontramos os símbolos que curam nossa saúde mental.'' - Dan Mena. Então, como podemos sair desse ciclo? Como reconectar nossas emoções e resgatar um pedaço da autenticidade perdida? Não há fórmula mágica, mas algumas práticas podem ajudar. Escrever um diário à mão, por exemplo, sem filtros ou curtidas, só você e seus pensamentos. Ou reservar dez minutos por dia para uma “meditação da tela preta” — sem celular, sem notificações, apenas silêncio e o que vier à mente. Criar espaços de desconexão também funciona: uma caminhada, cantar no chuveiro; já fez isso? , qualquer coisa que te dê espaço para sentir sem interferências. E, claro, buscar conversas de verdade, daquelas em que você pode dizer o que realmente está sentindo, sem medo de ser julgado(a). Quando foi a última vez que você ligou para seu amigo(a) para tomar um café e jogar conversa fora? ''Os desafios do trauma no século XXI" Esses passos não resolvem tudo, mas abrem brechas importantes para que possamos voltar a nos ouvir. Porque a angústia deste século, não é só sobre internet e conexão o tempo todo — é sobre estar desconectado de nós mesmos. Freud tinha razão: a dor não desaparece, ela se transfere. Resta a nós decidir, se vamos transferir o problema para mais um vídeo de gatinhos ou se encaramos isso com coragem. ''Quando o celular se torna o espelho, a psicanálise te desafia a desligá-lo e olhar para dentro, onde sua verdadeira imagem espera ser reconhecida.'' - Dan Mena. A Angústia do Século — Entre Redes e Lacunas Nesta passagem do tempo, nossas ansiedades assumiram uma nova forma. “O sujeito moderno não tem mais medo do pai; teme o silêncio da própria tela em branco.” - Dan Mena. Não é apenas uma frase de efeito; ela aponta uma mudança em como nos percebemos. Antes, era não atender às expectativas de figuras de autoridade; hoje, nos angustiamos com nossa presença digital — será que somos vistos, curtidos, validados? As velhas estruturas de disciplina — como fábricas ou escolas — deram lugar à auto-exploração. Não somos mais apenas conduzidos por ordens externas; agora, nós esgotamos voluntariamente, sempre performando, otimizando. Isso é especialmente visível na atualidade: cada postagem é uma apresentação, cada perfil, uma marca cuidadosamente construída. Não vivemos apenas; curamos uma versão de nós mesmos. O conceito do Estádio do Espelho, nos ajuda a entender esse fenômeno. Ele sugere que nossa identidade se forma pelo reflexo do que vemos — primeiro no espelho, depois nos olhos dos outros. Hoje, esse retrovisor é a tela do celular. Nossos perfis refletem uma imagem idealizada, polida, mas nem sempre verdadeira. A distância entre esse “eu digital” e nosso ‘’eu real’’ gera angústia e vazio existencial. Pense em um profissional que brilha no trabalho, sendo “o cara” , mas que, em casa, se sente perdido, sem saber quem é. Ou no influenciador que posta uma vida ideal, mas vive isolado e inseguro. Esses exemplos mostram um descompasso comum: nossas ‘’personas públicas’’ não refletem as vidas privadas. Essa ruptura não afeta só o indivíduo; ela tensiona relações e alimenta problemas emocionais. Focados na imagem online, podemos nos afastar de quem está ao nosso lado. Técnicas como a ‘’livre associação’’ podem mostrar que essa obsessão por curtidas esconde uma necessidade de validação, ou que nossas publicações mascaram fragilidades não enfrentadas. ''A tecnologia constrói casas virtuais e simula afetos frios, mas, apenas no vínculo humano, imperfeito e vivo, damos sentido ao lar da alma.'' - Dan Mena. Atividades Reais: Um Antídoto para Cair Fora Quando foi a última vez que você foi acampar, pescar ou caminhar sem destino? Atividades como essas nos re-conectam ao mundo físico e a nós mesmos. Acampar nos força a desplugar, a enfrentar o silêncio e a beleza crua da natureza. Pescar exige paciência, atenção focada e presença — algo que raramente praticamos, acelerados(as) e cheios(as) de notificações. Caminhar por uma trilha, subir morros ou montanhas, atravessar vales, podem ser uma metáfora para o próprio percurso da vida, com seus desafios e recompensas. Jardinar nos conecta à terra, ao ciclo de plantar e colher, oferecendo um senso de propósito tangível. Até uma simples conversa cara a cara, sem celulares interrompendo, sem conversas de whatsapp, reacendem a chama do elo fraternal, nos lembrando que o ‘’outro’’ é mais do que um avatar na tela. Essas experiências são um contraponto à superficialidade, nos ancoram no presente, exigem a presença física de corpo e mente, e nos afastam da curadoria constante de quem somos atrás da tela. ''Robôs podem imitar emoções, mas, é na escuta analítica que se encontra o que nenhuma máquina oferecer: a empatia que acolhe nossas fragilidades.'' - Dan Mena. ''Tudo Começa em Casa na era da hiperconexão" Quando a Máquina Toma o Lugar A tecnologia não está apenas facilitando nossas vidas; está assumindo papeis que antes eram exclusivamente nossos. Veja o “pedreiro” da Tesla, um robô capaz de construir uma casa sozinho. Ele substitui trabalhadores em uma tarefa que já foi símbolo de esforço coletivo e habilidade artesanal. Mas o avanço vai além do trabalho físico. Robôs como o Paro, já possuem um selo terapêutico usado em lares de idosos, projetados para oferecer conforto emocional. Há também robôs sexuais, que prometem substituir parceiros em relações íntimas. Máquinas estão invadindo até os espaços mais pessoais da vida. O que isso significa para nós? Um androide pode construir uma casa, mas não entende o significado de lar. Pode simular afeto, mas não sente emoções. Pode estar ao nosso lado, mas não compartilha nossa história. Ao delegar essas funções a máquinas, corremos o risco de perder a base da humanidade: algo que demorou milhares de anos para ser elaborado, a imperfeição, a empatia, o vínculo genuíno. Estamos trocando relações autênticas por versões controláveis, mas vazias? ''Jardinar, pescar, acampar e conversar sem telas: são rituais simples, destarte, ancoram o real, onde a angústia digital perde sua força.''- Dan Mena. ''São nos gestos simples, borrados pelo tempo presente, que o real se faz íntimo e a urgência virtual desmaia.'' Amigos Virtuais vs. Amigos Reais Nossas relações sociais também estão mudando. Plataformas como Instagram, Facebook e Twitter nos permitem acumular centenas ou até milhares de “amigos” . Mas quantos deles realmente conhecemos? Quantos estariam ao nosso lado em uma crise? Um like ou um comentário rápido é fácil, mas não substitui o esforço de uma conversa longa, o apoio em um momento difícil ou o calor de um abraço. As conexões online são convenientes, mas muitas vezes superficiais, reduzidas a interações que cabem em 280 caracteres ou em uma foto filtrada. Já trocamos, em parte, os amigos reais pelos virtuais. Preferimos a validação instantânea de um estranho na internet à construção lenta e às vezes desafiadora de uma amizade verdadeira. Mas essa troca tem um custo: a solidão que sentimos mesmo estando “conectados” o tempo todo. Vai pagar para ver? ''Entre avatares e máquinas, a saúde mental nasce do imperfeito, dos laços afetivos, vínculos frágeis e histórias compartilhadas.'' - Dan Mena. Amor Líquido e Vínculos Virtuais — A Crise da Intimidade ''Swipe à direita é o novo ‘fuja do Édipo’.” - Dan Mena. Neste momento o amor se tornou tão fluido quanto as telas que deslizamos com os dedos. Nesta frase, aponto para uma verdade incômoda: o gesto de deslizar para a direita em aplicativos de namoro não é apenas uma busca por conexão, mas também uma fuga emocional que o amor verdadeiro exige. Bauman, com seu conceito de “amor líquido” , descreve relações frágeis e transitórias, onde compromissos são flexíveis e muitas vezes descartáveis. Essa fluidez é intensificada por plataformas que bombardeiam com um fluxo de potenciais parceiros, tornando os elos afetivos mais efêmeros do que nunca. Por outro lado, temos uma chave para entender essa dinâmica: “o excesso de opções paralisa o desejo” . Em um mar de escolhas infinitas ele não se perfaz — se congela. A crise da intimidade nasce deste paradoxo: quanto mais opções disponíveis, mais difícil é investir emocionalmente em uma única pessoa. ''Vejo que a intimidade moderna se dissolve em telas, precisamos construir laços que resistam à transitoriedade digital.'' - Dan Mena. Amor Líquido na Era Digital O “amor líquido” de Bauman captura a essência dos relacionamentos contemporâneos: são efêmeros, moldados por uma lógica de rapidez e descartabilidade. Aplicativos de relacionamento, como Tinder e Bumble, transformam a busca por um parceiro em um jogo de perfis, onde a próxima opção está sempre a um deslize de distância. Essa facilidade reduz as pessoas a imagens e textos curtos, dificultando o investimento emocional necessário para conhecer alguém de fato. A tecnologia, não só facilita esses encontros, mas também amplifica a transitoriedade das relações. Surge então o antagonismo da escolha: com tantas possibilidades, a satisfação diminui. Há sempre a sensação de que alguém melhor pode estar a um clique, alimentando o medo de perder algo = (FOMO) corroendo a capacidade de se comprometer. O resultado é uma intimidade frágil e fragmentada. A Paralisia do Desejo Como vimos, o excesso de predileções estaciona os quereres, e isso se torna evidente no universo dos relacionamentos virtuais. A abundância de perfis em aplicativos de namoro cria uma ilusão de possibilidades infinitas, mas, na prática, isso gera um ciclo de busca constante e vínculos pulverizáveis. A cada swipe, cresce a expectativa de encontrar a “pessoa perfeita” , mas essa procura impede a construção de laços fortes. Dita paralisia não se limita ao campo romântico. Amizades e relações familiares também são impactadas pela mesma lógica de escolha e transitoriedade. A facilidade da virtualização substitui o esforço necessário para sustentar relações reais. O custo psicológico é significativo: ansiedade, depressão e uma insatisfação crônica com as próprias escolhas. Apesar desses desafios, é possível cultivar intimidade. Outras estratégias podem incluir reservar tempo para conversas significativas, praticar a escuta ativa e se permitir ser vulnerável, pode ajudar na inversão do processo. ''A paralisia do desejo, nascida de escolhas infinitas, encontra alívio quando conectamos ao pulsar da intimidade genuína.'' - Dan Mena. Entre o Coaching e a Análise O coaching promete respostas; a psicanálise, perguntas que libertam.” — Dan Mena. Na busca pelo autoconhecimento, dois caminhos se destacam: o coaching, com sua abordagem prática e orientada a resultados, e a psicanálise, que mergulha no inconsciente. Enquanto o coaching oferece soluções rápidas e diretas, psicanalistas oferecem perguntas que desafiam certezas, abrindo portas para uma compreensão mais rica de si. A Moda do Mindset Positivo A tendência do ''mindset positivo'' (se refere a uma forma de pensar e agir que se concentra no positivo, nas oportunidades e no crescimento, em vez de se centrar no negativo, nos obstáculos e nas limitações. É uma mentalidade que promove a confiança em si mesmo, a resiliência diante dos desafios e a busca por soluções criativas.), amplamente difundida no coaching que propõe técnicas para reprogramar a mente. Essa visão, embora atraente, ignora a costura labiríntica do inconsciente. Ela simplifica o ser a um conjunto de hábitos ajustáveis, desconsiderando as emoções, os traumas e os desejos reprimidos que moldam nossa construção. Citando Massimo Recalcati: “A felicidade não é um destino, mas um efeito colateral da verdade.” Esse prisma, sugere que a verdadeira realização não vem de um otimismo forçado, mas de um confronto honesto com nossa realidade interior. ''O mindset positivo pode prometer felicidade, mas, é na verdade interior que encontramos sentido, não em fórmulas prontas.'' - Dan Mena. ''A esquizoanálise contra a patologização da vida" Diferenciação Clínica: Metas vs. Preço Emocional O coaching e a psicanálise divergem em seus focos fundamentais, destarte detesto fazer comparações, agora necessárias: Coaching : Orientado para metas, ele pergunta: O que você quer alcançar? e fornece estratégias práticas para chegar lá. Seu objetivo é o sucesso externo — seja na carreira, nos relacionamentos ou na produtividade. Psicanálise : Questiona: Qual o preço emocional dessa meta? Em vez de apenas buscar resultados, exploramos as motivações inconscientes por trás dos desejos, revelando o que realmente impulsiona os atos. Por exemplo, alguém pode buscar o coaching para conquistar uma promoção no trabalho. O coach oferecerá ferramentas para alcançar esse objetivo. Já a psicanálise pode perguntar: Por que essa promoção é tão importante? Talvez a resposta revele uma necessidade de validação ou um medo de fracasso enraizado em experiências passadas. Enquanto o coaching foca em “como” , a psicanálise investiga o “porquê” . Neurodiversidade e Inclusão — A Clínica Ampliada “O autista não é um quebra-cabeça a ser montado, mas um universo a ser decifrado.” - Dan Mena. A psicanálise moderna está passando por uma transformação ao abraçar a neurodiversidade, um conceito que reconhece e valoriza as variações neurológicas como parte essencial da nossa experiência. Longe de se prender a padrões rígidos de aparente “normalidade” que por décadas moldaram práticas clínicas, propomos uma perspectiva mais acolhedora e inclusiva. Vou certamente muito inspirado por pensadores como António Damásio e Frances Tustin, onde a psicanálise moderna rejeita a ideia de que diferenças como AUTISMO, TDAH ou DISLEXIA sejam patologias a serem corrigidas. Em vez disso, as estamos contemplando como expressões únicas e singulares da mente, linguagens próprias que merecem ser compreendidas e respeitadas. ''Cada mente neuro divergente é um cosmos único, minha missão é ouvir suas estrelas, não forçá-las a brilhar como as demais.'' – Dan Mena. "Cada mente desenha constelações próprias: ouvir é honrar a luz que recusa mapas alheios." Redefinindo a Normalidade A neurodiversidade desafia a concepção tradicional de que existe um único modelo de funcionamento “normativo” para o cérebro. Pessoas diferentes — como aquelas com autismo — não estão incompletas ou quebradas; elas simplesmente percebem, processam e interagem com o mundo de maneiras distintas. Damásio, com sua visão neurocientífica, e Tustin, com sua expertise psicanalítica no autismo, nos lembram que essas diferenças não são déficits, mas formas de comunicação que refletem a heterogeneidade da psique. ‘’Cada indivíduo neuro-divergente é um universo singular, cheio de nuances e riquezas que escapam às tentativas de padronização.’’ - Dan Mena. ''Neoliberalismo e adoecimento emocional" Essa mudança de paradigma exige que os terapeutas abandonem a busca por uma “cura” que force a adaptação aos moldes neurotípicos. O objetivo não é consertar, mas decifrar — ouvir atentamente as mensagens que surgem dessas mentes únicas e ajudá-las a florescer em seus próprios termos, condições e condutas. Essa clínica ampliada aparece como uma resposta prática a essa nova realidade. Se adapta aos princípios psicanalíticos para criar um espaço terapêutico que respeite as particularidades dos pacientes dessemelhantes. Mediante o uso de metáforas visuais, como infográficos, desenhos ou mapas mentais, especialmente úteis para indivíduos não verbais ou com dificuldades de abstração. O inconsciente, afinal, não se restringe às palavras — ele se manifesta em imagens, símbolos e sensações. “O inconsciente fala todas as línguas, cabe ao terapeuta aprender quanto a sua interpretação.’’ - Dan Mena. Além disso, vale incorporar ferramentas como objetos transicionais, inspirados em Winnicott, que ajudam a construir acessos entre o mundo interno e externo do paciente. O ‘’setting terapêutico’’ também se torna mais flexível, permitindo movimentos ou interações que façam o paciente se sentir seguro e acolhido. Essas adaptações transformam a terapia em um processo criativo, onde a singularidade de cada pessoa é o ponto de partida. Trabalhar com diversidade exige uma postura aberta e adaptável. Aqui estão algumas diretrizes práticas para terapeutas: Escuta sensível : Evite julgamentos baseados em padrões neuro-típicos e busque compreender a lógica interna do paciente. Metáforas visuais : Use infográficos, desenhos ou diagramas para facilitar a comunicação, especialmente com pacientes não verbais. Essas ferramentas ajudam a acessar o inconsciente de forma acessível e concreta. Flexibilidade : Respeite o ritmo do paciente, permitindo que o processo terapêutico se desenvolva sem pressa ou imposições. Colaboração : Trabalhe em conjunto com outros profissionais, como terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos, para oferecer um suporte mais completo. Abandonemos a rigidez da “normatização” e celebremos as diferenças como parte essencial da vida. Nesse cenário, sejamos os verdadeiros guias da curiosidade, e pelo respeito, estejamos prontos para decifrar os universos únicos que recebemos como um presente. ''Neuro-divergência não é defeito ou falha, mas uma melodia distinta; minha tarefa é aprender sua partitura, não tentar reescrevê-la para soar como as outras.'' – Dan Mena. Quando o Morto Vive Online “Perdi minha mãe, mas seu perfil ainda ‘curte’ minhas fotos. Como chorar um fantasma?” — diz uma paciente. Talvez você tenha dúvidas quanto a veracidade desta fala, mas, garanto a vocês leitores, é real. As redes sociais criam um limbo para o luto, onde a morte não é final, mas um perfil inativo. A presença eletrônica de falecidos transforma a perda em algo ambíguo, onde o conforto da memória colide com a dificuldade de aceitar o fim. Esse fenômeno, que chamo de ‘ ’luto digital’’ , é uma realidade nova, que desafia as formas tradicionais de elaboração da dor. Freud argumentou, que o luto exige uma retirada gradual do apego emocional ao ente querido perdido, um processo que permite ao enlutado seguir em frente. Mas como realizar esse trabalho psíquico quando o falecido parece ainda "vivo" online para alguns? "Os algoritmos são os novos oráculos, reencarnam fantasmas em pixels, desafiando nossa capacidade de sepultar o que já não respira." - Dan Mena. O Limbo do Luto Tecnológico Nas plataformas, os perfis de pessoas falecidas não desaparecem com a morte. Amigos e familiares continuam a interagir com eles, postando mensagens, compartilhando fotos ou até recebendo notificações automáticas que sugerem a presença do ausente. Para o paciente anônimo, ver o perfil da mãe “curtindo” suas fotos é um lembrete constante dessa presença fantasmagórica. Isso pode ser reconfortante em alguns momentos, oferecendo um espaço para manter a conexão emocional. No entanto, também pode dificultar a aceitação da morte, criando uma ilusão de continuidade que prende o enlutado ao passado. O luto saudável depende da capacidade de reconhecer a realidade da perda e redirecionar a energia emocional para novos vínculos. Quando a presença on-line persiste, esse processo pode ser interrompido, levando a um estado de melancolia — uma tristeza persistente marcada pela incapacidade de soltar o laço. O luto digital, assim, não é apenas uma extensão, mas uma experiência distinta que exige novas formas de compreensão e enfrentamento. "Enquanto os mortos ‘curtem’ nas redes, os vivos se perguntam: como re-significar a dor quando a morte perdeu sua fronteira física?" - Dan Mena. ''Como chorar quem ainda 'vive' em pixels?" Historicamente, o luto era guiado por rituais claros e objetos tangíveis. Um enterro marcava o fim físico, enquanto cartas ou fotografias serviam como lembranças estáticas. Esses mementos, embora preciosos, não interagiam com o enlutado — eram finitos e imóveis. Já os perfis digitais são dinâmicos: algoritmos podem trazer à tona memórias antigas, amigos podem adicionar novos conteúdos, e notificações inesperadas podem reacender a dor. Essa interatividade constante dificulta o encerramento das fases, tornando a morte menos definitiva e mais fluida. Essa diferença tem implicações, o enlutado pode sentir alegria ao revisitar uma postagem antiga, mas também angústia ao perceber que a vida segue sem a pessoa amada. A pergunta do paciente — “Como chorar um fantasma?” — reflete essa tensão: o espírito tecnológico persistente é uma sombra que não pode ser plenamente abraçada nem totalmente deixada para trás. Impactos Psicológicos e Sociais O luto digital pode prolongar a dor de maneiras que o luto tradicional raramente fazia. A exposição contínua à presença online pode manter a ferida aberta, impedindo a cicatrização emocional. Isso pode aumentar o risco de complicações, caracterizado por sintomas de depressão, ansiedade e dificuldade de retomar a vida cotidiana. Para o paciente anônimo, cada “curtida” da mãe é um gatilho que mistura saudade com confusão. Além disso, o aspecto público das redes sociais adiciona outra camada de problemas. O luto, que antes era um processo íntimo, agora é performado diante de uma audiência online. Comentários de apoio podem ser bem-vindos, mas também podem vir acompanhados de expectativas sociais que pressionam o enlutado a parecer “forte” ou “superado” . Essa falta de privacidade pode inibir a expressão genuína da dor, transformando o luto em um ato público em vez de um processo pessoal. "Memorializar um perfil é um ato de coragem, é necessário escolher e transformar a dor em legado, sem permitir que o passado colonize o futuro." - Dan Mena. Ritual de Despedida Digital Para enfrentar esses desafios, é possível criar um ritual que ajude a trazer o fechamento do quadro. Esse exercício envolve duas etapas: Escrever um Comentário Final: O enlutado pode redigir uma mensagem final no perfil do falecido, expressando sentimentos não ditos, agradecimentos ou um adeus definitivo. Essa ação simbólica permite que a pessoa coloque em palavras o que precisa ser liberado, dando voz à dor e à saudade. “Arquivar” o Perfil : Após a mensagem, o enlutado pode optar por deixar de seguir o perfil, silenciar notificações ou até criar um memorial offline (como imprimir uma foto ou salvar uma captura de tela). Isso não apaga a memória, mas reduz a exposição constante, ajudando a estabelecer um limite emocional. Esse ritual não elimina a presença digital do falecido, mas oferece uma maneira de reconhecê-la e, ao mesmo tempo, dar um passo em direção à aceitação. É um ato de equilíbrio entre honrar o passado e abrir espaço para o futuro. O Papel das Plataformas e da Comunidade As redes sociais também têm responsabilidade nesse processo. Recursos como contas memoriais — disponíveis em plataformas como o Facebook — permitem que perfis sejam preservados sem sugerir que o falecido ainda está ativo. Essas opções, porém, precisam ser mais acessíveis e amplamente divulgadas. Além disso, as plataformas poderiam oferecer ferramentas para que os usuários definam como desejam que suas próprias presenças digitais sejam gerenciadas após a morte, dando mais controle sobre esse legado. Toda essa temática é um reflexo da era em que vivemos — onde a tecnologia redefine até mesmo as experiências mais fundamentais da existência. Ele nos força a repensar o que significa dizer adeus quando os mortos continuam a “viver” de formas subjetivas. O desafio é encontrar um equilíbrio: permitir que a memória digital console sem que ela se torne uma corrente que impede o movimento em direção à cura. Assim, podemos chorar nossos fantasmas — e, com o tempo, deixá-los descansar. O Futuro da Psicanálise — Entre o Divã e o Metaverso “O divã não será substituído, mas multiplicado em infinitas realidades.” - Dan Mena. A psicanálise sempre foi um mergulho no invisível: os desejos reprimidos, as narrativas inconscientes, o peso do outro em nossas mentes. Em um mundo onde o real e o virtual se misturam, porém: o que significa confrontar o inconsciente? Em 2025, terapias em realidade virtual (VR) já são usadas para tratar fobias, transtornos de ansiedade e traumas. Pacientes enfrentam aranhas digitais, voam em aviões simulados ou revisitam memórias recriadas em ambientes controlados. A tecnologia oferece um palco seguro para o enfrentamento do medo. Contudo, a tecnologia pode simular a empatia, mas nunca substituir a presença física. Como analistas, desenvolvemos uma escuta rara e singular, não é um algoritmo de respostas calibradas — somos o espelho vivo que reflete o sujeito em sua vulnerabilidade. No metaverso, a psicanálise enfrenta uma oposição: a promessa de um espaço infinito para a subjetividade e o risco de dissolver o sujeito em avatares desprovidos de história. Plataformas já oferecem “terapeutas-IA” baseados em modelos de linguagem avançados, prometendo insights instantâneos. Mas o inconsciente não se deixa enganar. Ele não é um banco de dados a ser minerado; é um fluxo caótico, um labirinto de significantes que exige tempo, silêncio e relação. Como Lacan nos lembra, o analista é o “sujeito suposto saber” — uma figura que sustenta a transferência, algo que nenhuma máquina pode replicar. "A transferência no metaverso é um fio de voz em meio ao ruído digital, frágil, mas capaz de costurar presença mesmo onde os corpos são hologramas." - Dan Mena. A Psicanálise em um Mundo Descentrado Em 2030, a psicanálise não será mais sobre “curar ou guiar” a mente, mas sobre ensiná-la a caminhar em um mundo sem centro — onde a própria noção de “saúde mental” será redescoberta. Em um planeta saturado de narrativas e pulverizado por realidades paralelas, o sofrimento psíquico não será definido por categorias diagnósticas rígidas, como depressão ou ansiedade, mas por uma nova angústia: a incapacidade de encontrar sentido em um real que se dissolve. A tarefa do analista será menos reparadora e mais cartográfica — ajudar o sujeito a mapear seus desejos em um território onde as bordas e fronteiras entre o eu, o outro e a máquina vão se tornam indistintas. No futuro não abandonaremos o divã, mas o reinventaremos. Poderemos ver “divãs virtuais” onde analistas e analisados se encontram em espaços oníricos projetados para evocar o inconsciente. Interfaces cérebro-máquina, como as desenvolvidas por empresas como a Neuralink, poderão captar sinais neurais em tempo real, permitindo acessar estados emocionais com uma precisão nunca antes vista. Dispositivos vestíveis, já em uso para monitoramento de saúde, poderão evoluir para mediar intervenções psicanalíticas em tempo real, ajustando o ambiente virtual com base em respostas fisiológicas do paciente. Contudo, essas tecnologias trazem tanto possibilidades quanto perigos. A Ética da Presença Virtual Como manter a autenticidade da relação analítica em ambientes digitais? A transferência, motor da análise, pode operar em um espaço onde corpos não se encontram? Wilfred Bion, com seu conceito de “continência” , nos oferece uma pista: ''o analista deve ser um continente capaz de acolher e transformar os afetos brutos do paciente'' . No virtual, essa moderação pode ser desafiada pela ausência do corpo físico, mas também ampliada por ambientes projetados para amplificar a ressonância emocional. Precisaremos desenvolver uma ética para lidar com a desmaterialização do encontro, garantindo que a presença, mesmo mediada permaneça humanística. Lembro agora que Jean Baudrillard, com sua noção de hiper-realidade sinalizou que o metaverso não seria uma extensão do real, mas uma simulação que substitui o real. As IAs que analisam padrões de comportamento já tentam prever nossos desejos antes que os reconheçamos, criando uma ilusão de transparência. Mas o inconsciente é o que resiste à lógica do capital e da tecnologia. Ele é o “real” que insiste em aparecer, mesmo em um mundo de signos digitais. A psicanálise deve se posicionar como uma prática de resistência à redução humana, ao calculável, lembrando que o desejo sempre irá escapar às previsões algorítmicas. ''Qual o lugar do silêncio analítico quando o algoritmo dita o ritmo do desejo?'' Seria este o Fim da Psicanálise? Nem todos são otimistas sobre o seu futuro. Críticos como o filósofo tecnológico Evgeny Morozov argumentam que estamos condenados tecnicamente em um mundo dominado por soluções rápidas e tecnológicas. Para ele, terapias cognitivo-comportamentais (TCC) mediadas por IA, que oferecem resultados mensuráveis em semanas, tornarão a análise freudiana ou lacaniana obsoleta: argumenta, “Por que passar anos no divã quando um algoritmo pode estruturar seus padrões de pensamento em meses? ” Além disso, a crescente dependência de interfaces digitais levanta preocupações éticas: se o inconsciente pode ser “lido” diretamente por dispositivos, a privacidade psíquica estará em risco, e a psicanálise, com seu respeito pelo mistério do sujeito, pode parecer anacrônica. No entanto, esses argumentos subestimam a força centenária da psicanálise. A TCC e suas IAs podem tratar sintomas, mas não abordam a complexidade do desejo. Painéis digitais podem mapear sinais neurais, mas não interpretam o significado singular de uma fantasia ou trauma. A psicanálise, com sua aposta no tempo e na relação, oferece algo que a tecnologia não pode: um espaço para o sujeito se reinventar, não como um produto de software otimizado, mas como um ser em constante transformação. "Enquanto a IA busca otimizar mentes, a psicanálise celebra a arte imperfeita de existir, com suas fendas e rachaduras onde a luz do desejo penetra." - Dan Mena. Como Bion sugeriu, a análise é um ato de contenção; entanto Baudrillard nos provoca. É uma resistência à hiper-realidade; como Žižek insiste, um confronto com o real. O divã, seja de couro ou de pixels, continuará sendo o espaço onde o sujeito se encontra com sua verdade — não para eliminá-la, mas para aprender a dançar com ela. Em 2030, nossa técnica será menos uma cura e mais uma navegação: um mapa para atravessar a matrix do metaverso sem perder o seu lado humano. Minha Defesa Implacável da Psicanálise A ideia de que a psicanálise seria um extemporâneo em face dos avanços tecnológicos, como interfaces cérebro-máquina e terapias mediadas por inteligência artificial, não é apenas uma leitura míope, mas uma capitulação ridícula. Tratar a psicanálise como obsoleta é sucumbir à ilusão narcísica de que a tecnologia pode domesticar o inconsciente, como se o real pudesse ser capturado por sensores ou se rebaixar ao reducionismo positivista que ameaça reduzir o humano a um amontoado de linhas de código. Tal perspectiva não apenas subestima a resiliência de uma disciplina que atravessou um século de revoluções epistemológicas, mas também ignora sua capacidade singular de confrontar “o traumático do real” — aquele núcleo irredutível da subjetividade que resiste à lógica do capital e da simulação. Este adendo que faço, é uma defesa provocadora sim, necessária para desmontar as críticas banais com o rigor acadêmico que merecem, reafirmando sua pertinência em um mundo que se afoga na hiper-realidade, hipnotizando sujeitos que nada entendem do ser humano. "Reduzir o humano a linhas de código é não apenas uma arrogância cientificista, mas uma fuga covarde àquilo que Lacan chamou de 'o não-todo': o vazio estruturante que nos define." - Dan Mena. ''Somos mais que dados, existimos como o vazio que nenhum código pode preencher'' A Transferência como Ato de Subversão Críticos como Evgeny Morozov celebram a eficiência da terapia cognitivo-comportamental (TCC) mediada por IA, como se a psique pudesse ser reprogramada. Essa visão tecnocrática que pretende antes que nada reduzir o ser a um autômato comportamental, desprovido do aprofundamento que a psicanálise, em sua ousadia, insiste, e tem demonstrado ser efetiva. A transferência, como conceito central na obra de Lacan, não é uma mera técnica, mas um evento ontológico: um encontro intersubjetivo que desestabiliza as certezas do ego e abre o sujeito ao abismo de seu inconsciente. Nenhum algoritmo, por mais avançado que seja, pode replicar a presença viva do analista — menos ainda, podem captar o peso de um silêncio, a ironia de um lapso ou a densidade de um sonho. A psicanálise sobrevive gloriosamente a qualquer tecnologia, enquanto a desafiamos. Somos o que escapa ao cálculo, a equação, o que resiste, o que insiste por natureza em ser singular, único e irreplicável. Contexto Histórico Que tal mencionar Einstein, que como o maior físico da historia, valorizava métodos empíricos e matemáticos, enquanto via a psicanálise como uma disciplina interpretativa, não quantificável. Sua postura refletia o debate da época entre ciências "duras" e "humanas" . Apesar disso, reconhecia que Freud havia aberto caminhos para entender a subjetividade — ''algo que a física jamais alcançaria'' . Portanto, vemos aqui que sua crítica era menos sobre Freud e mais sobre os ''limites do reducionismo'' : para ele, (o chefe de vocês) , que certas dimensões humanas (como a ética e a subjetividade) exigiam abordagens distintas das equações físicas. Uma outra citação poderosa nessa tensão entre ciências exatas e a subjetividade vem do matemático e filósofo Henri Poincaré, pioneiro da ''teoria do caos'' e crítico do reducionismo positivista: "A ciência é feita de fatos, assim como uma casa é feita de pedras. Mas um amontoado de fatos não é ciência, assim como um monte de pedras não é uma casa. [...] O que distingue o verdadeiro cientista não é apenas seu método, mas sua capacidade de contemplar o invisível — aquilo que os números não podem medir." ''O verdadeiro cientista não é apenas seu método, mas sua capacidade de contemplar o invisível — aquilo que os números não podem medir." Por que essa citação se alinha ao debate? Poincaré, como Einstein, questionavam a ideia de que tudo pode ser reduzido a dados ou equações, algo diretamente relacionado às críticas à tentativa de "domesticar o inconsciente" com tecnologia. Valorização do intangível: A frase ressalta que há dimensões humanas (como o inconsciente freudiano) que escapam à métrica científica, mas não perdem validade por isso, é neste sentido estou totalmente de acordo. Diálogo com a psicanálise: A menção ao "invisível" clarifica a noção lacaniana de Real — aquilo que resiste à simbolização, seja por algoritmos ou linguagem técnica. Para sintetizar esta minha defesa, convoco, Werner Heisenberg (físico quântico). Heisenberg, em "Física e Filosofia" , também refletiu sobre os limites da ciência frente ao humano: "A cada passo, descobrimos que o mundo não pode ser totalmente objetificado. O observador sempre pertence ao sistema, e isso inclui suas dúvidas, seus desejos — tudo que a psicanálise chamaria de 'inconsciente'." Todas as citações reforçam que, mesmo em campos como a física e a matemática, incluindo a quântica, há reconhecimento de que a imaterialidade desafia a lógica empírica. Isso não invalida a ciência, mas mostra que ela coexiste com outras formas de conhecimento — como a psicanálise — para explorar o que Heisenberg chamou de "o território inacessível às equações" . ''O 'sujeito suposto saber' agora é um avatar, mas os quereres ainda escapam, intocáveis pelas frestas do código." - Dan Mena. O Inconsciente como Resistência ao Controle Algorítmico A fantasia de que o inconsciente pode ser “lido” por interfaces é ''uma expressão do delírio totalitário que Baudrillard descreve'' . Não somos um banco de dados a ser minerado, mas um campo de rupturas, contradições e desejos que se manifestam em sintomas, atos falhos e narrativas fragmentadas. Em uma era de vigilância digital, onde a privacidade é mercantilizada e a subjetividade reduzida a padrões previsíveis, a psicanálise se equilibra como uma prática ética, salvaguardando o mistério do sujeito contra a tirania do transparente. Chamar isso de anacronismo é endossar uma distopia que se ilude ao tentar descartar o ser de sua opacidade, tentando o transformar em um produto consumível. Outra crítica vazia é de que a psicanálise é lenta demais em comparação com a TCC mediada por IA, isso reflete a lógica perversa do que Byung-Chul Han chama de “sociedade do desempenho” . Nesta cultura, o sofrimento é um defeito a ser eliminado, e a felicidade, um mandato neoliberal. Vamos continuar nos recusando obstinadamente de prometer ' 'curas rápidas'' ou oferecer uma alternativa radical: a validação do conflito, da falta, do imperfeito como elementos constitutivos. Longe de buscarmos a “otimização” do sujeito, o convidamos a habitar sua singularidade, a confrontar o que o torna ímpar — habitar seus desejos, romper com seus traumas, revalidar suas contradições. Avatares padronizados e ''nudges algorítmicos'' ameaçam dissolver a individualidade em simulacros, a psicanálise é o ato puro de subversão ética. Ela não promete eficiência, mas transformação; não oferece respostas, mas a coragem de perguntar. Essa é sua força: em um mundo que exige conformidade, defendemos o direito de sermos incompletos. A Psicanálise como Máquina de Guerra Epistemológica A acusação de arcaico, presume a psicanálise como artefato imutável, mas nossa história é opostamente uma reinvenção contínua . Desde Freud, que dialogou com a nascente neurociência, até os analistas contemporâneos que exploram a realidade virtual como espaço para o inconsciente, demonstra adaptabilidade que desmente qualquer obituário prematuro como alguns poucos pretendem. Longe de ser ameaçada por tecnologias, estamos nos apropriando delas, nos servindo ao bel prazer do seu uso, utilizando dados fisiológicos para enriquecer a escuta analítica sem sucumbir ao simplismo. Como Deleuze e Guattari poderiam sugerir, a psicanálise é uma “máquina de guerra” de última geração, epistemológica, capaz de desterritorializar os discursos dominantes — sejam eles científicos, tecnológicos ou mercadológicos — e reafirmar com toda certeza a primazia do sujeito. Sua relevância não está em competir com ''terapias de curto prazo'' , mas em oferecer uma crítica equilibrada às ideologias que sustentam essas abordagens. Essa polarização pretendida, bem instrumentada, muito articulada e camuflada de propósitos puramente capitalistas não vai nos contaminar. Antes de matar a psicanálise, vão precisar exterminar um exército poderoso de seres pensantes e preparados para elucidar tentativas de manipulação. "Contra a ditadura da transparência erguemos um altar ao opaco, o inconsciente é nossa última trincheira contra a colonização do ser." - Dan Mena. "Na névoa do que não se revela, resistimos: o inconsciente é a sombra que nenhum zoom da razão ilumina." Um Antídoto Filosófico à Hiper-Realidade Os defensores da superioridade da IA ''caem como patinhos'' no que Žižek identificaria como uma armadilha ideológica: a crença de que a tecnologia pode abolir o real. A psicanálise, ao contrário, confronta o real em sua forma mais crua — ''o desejo que não se submete, a falta que não se preenche, o trauma que retorna'' . Baudrillard avisou, que o metaverso substitui a experiência vivida por simulacros, e a psicanálise é a prática que resgata o sujeito desses buracos negros de signos vazios. Não apenas vamos confrontar o simplismo tecnológico, mas, ''vamos cair de pau'' , oferecendo uma crítica filosófica à lógica do capital que pretende transformar a psique em mercadoria. ''Não seremos sob qualquer argumentação: ‘’inputs e outputs’’. - Dan Mena. Somos o Farol Cultural e Político Além de potência clínica que a psicanálise representa, é um holofote intelectual que ilumina os dilemas de nossa era. Conceitos como repressão, pulsão de morte e estádio do espelho não são apenas ferramentas terapêuticas; são chaves para decifrar a cultura, a política e a subjetividade em um mundo saturado por narrativas binárias ou quânticas. Enfrentamos com realismo as questões existenciais da inteligência artificial e da realidade virtual, a psicanálise oferece sua linguagem única para articular as tensões entre o ’’ eu e o outro’’ , o ‘’real e o simulado’’ . A capacidade analítica de diagnosticar as patologias do presente — do narcisismo coletivo à alienação tecnológica — e de propor uma ética do desejo que transcende as promessas triviais, vulgares, genéricas e vazias do progresso. A Técnica da Insistência do Real Tal falácia da psicanálise como um resquício do passado expõe da forma mais ridícula uma cegueira voluntária para sua potência disruptiva. Ela não é uma relíquia; é uma força viva que desafia a hegemonia do mensurável, do otimizado e controlado. Maquinas podem oferecer soluções paliativas, mas apenas a psicanálise ousa confrontar o sujeito com sua verdade mais incômoda: ele é dividido, incompleto, desejante. Como Bion nos legou, a análise é um ato de continência; como Baudrillard nos provoca, é uma resistência à hiper-realidade; e como Žižek insiste, é um enfrentamento do real. Façam suas apostas, a psicanálise vai responder aos avanços tecnológicos com mais um século de reinvenção. Até lá, nenhum de nos estará aqui para reclamar seu prêmio, mais uma coisa é ''certa e liquida'' , estaremos os psicanalistas, muito bem representados para receber. ‘’A psicanálise moderna é uma arqueóloga do caos, escavando sentido onde vemos apenas ruínas.’’ - Dan Mena. Referencias Bibliográficas HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Vozes, 2015. FREUD, Sigmund. Além do Princípio do Prazer. Companhia das Letras, 1920. LACAN, Jacques. Escritos. Zahar, 1998. RECALCATI, Massimo. O Complexo de Telêmaco. Paz e Terra, 2014. SAFATLE, Vladimir. O Circuito dos Afetos. Autêntica, 2016. WINNICOTT, Donald. Tudo Começa em Casa. Martins Fontes, 1989. BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido. Zahar, 2004. DAMÁSIO, António. 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Palavras Chaves #SaúdeMentalModerna, #PsicanáliseContemporânea, #BurnoutEmocional, #TerapiaOnline, #AutoconhecimentoProfundo, #AngústiaExistencial, #AmorLíquido, #LutoDigital, #Neurodiversidade, #InconscienteTecnológico, #FreudNaEraDigital, #SolidãoDigital, #AnsiedadeModerna, #FuturoDaTerapia, #PsicanalistaOnline#IA Visite minha loja ou site 🔗 https://uiclap.bio/danielmena 🔗 https://www.danmena.com.br/ Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Departament of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. Comente e avalie o artigo; De 1 a 5 - Quantas estrelas merece o artigo? Deixe seu voto e relato abaixo em COMENTÁRIOS.
- Relacionamentos Tóxicos
Por Que o Cérebro Transforma Dor em Vício? O Silêncio que Grita Há feridas que não sangram, mas doem mais do que qualquer corte. Há amores que não matam, mas lentamente asfixiam a alma. Você já se encontrou preso em um relacionamento que, em vez de acolher, aprisiona? Que promete felicidade, mas só entrega angústia? Laura, uma paciente que chegou à consulta com um sorriso cansado, expressou. "Dan, eu amo ele... mas por que isso me detona?" Suas palavras ressoavam contradição: como algo tão sublime quanto o amor pode se tornar uma fonte de sofrimento? O psicólogo russo Bluma Zeigarnik descobriu que nosso cérebro lembra melhor de tarefas interrompidas do que das concluídas. É por isso que relacionamentos tóxicos nos perseguem — ficamos presos no "e se? ", por que não deu certo? na esperança de que o outro mude. Neste artigo, também vou modificar a forma de apresentar o tema da semana , vou citar mais ‘’cases de atendimento’’ e dar algumas dicas, (um tanto quanto contrário a nossa prática) , quanto ao combate. Vou seguir a escuta de alguns leitores(as), que embora fazem críticas, na sua maioria positivas, apresentam alguma dificuldade em compreender a linguagem psicanalítica, que concordo, nem sempre é muito linha reta. Seguimos então após este parêntesis com os mecanismos invisíveis que nos mantém acorrentados a vínculos doentios. Se prepare para compreender definitivamente, sobre quando o amor deixa de ser cura e vira sintoma. A Química do Sofrimento O amor tóxico é como uma droga: vicia, ilude e destroi aos poucos. Neurocientificamente, a oscilação entre carinho e abuso ativa os mesmos circuitos de recompensa que o vício em jogos ou substâncias. "O sujeito do desejo não é senão aquele que se deixa enganar pelo objeto que acredita completá-lo" , escreve Lacan em O Seminário, Livro XI. "Amar demais quem nos faz mal é confundir fome com apetite — comemos o que nos envenena só para não sentir o vazio." - Dan Mena. A Parábola do Cacto e da Rosa Há uma história que ouvi de um paciente anos atrás e nunca esqueci: uma rosa, fascinada pela força do cacto, decidiu se enraizar ao seu lado. Dia após dia, seus galhos eram perfurados pelos espinhos, mas ela insistia: "Ele me protege do vento, e um dia aprenderá a ser delicado." A rosa morreu sem entender que sua beleza não dependia da dor que suportava. Assim somos muitos de nós. Permanecemos em relações que nos ferem, convencidos de que o amor pode domesticar até os espinhos mais afiados. Mas por que insistimos em algo que claramente nos faz mal? A resposta está em uma combinação perversa de neuroquímica, repetição de padrões inconscientes e uma distorção do que chamamos de "amor". Neurociência do Amor Tóxico: O Cérebro Viciado Quando Laura descreveu seu relacionamento, usei uma metáfora: "Imagine que seu cérebro é um cassino, e seu parceiro, uma máquina caça-níqueis. Às vezes, ele dá moedas de afeto, e essa imprevisibilidade libera dopamina — o mesmo neurotransmissor ativado em viciados em jogos. Estudos de neuroimagem mostram que relacionamentos abusivos ativam o ‘’núcleo accumbens’’ , região ligada à recompensa, e o ‘’córtex pré-frontal’’ , responsável por decisões racionais, fica inibido. É por isso que, mesmo sabendo que algo é ruim, sentimos uma compulsão irracional a continuar. Helen Fisher, antropóloga especialista em amor, explica: "A rejeição intermitente cria um estado de craving (fissura) semelhante ao de dependentes químicos." Não é à toa que pacientes relatam sintomas de abstinência — tremores, insônia, ansiedade — ao tentar romper o ciclo. ‘’Amar alguém tóxico é como fumar no pulmão perfurado: cada tragada alivia a ansiedade, mas aprofunda a ferida." - Dan Mena. Como a Neurociência Explica a Dependência O Teatro da Repetição: Por Que Reencarnamos Nossos Traumas? Freud chamou de "compulsão à repetição" nossa tendência a reviver traumas na esperança inconsciente de resolvê-los. Um paciente, me disse: "Minha mãe era fria e crítica; hoje, me apaixono por mulheres que me tratam igual." Na psicanálise, entendemos que repetimos padrões não por masoquismo, mas porque ''o cérebro prefere o inferno conhecido ao paraíso desconhecido'' - Dan Mena . Como escreve Alice Miller em ‘’O Drama da Criança Bem-Dotada’’; "A lealdade ao sofrimento familiar é muitas vezes confundida com amor." A Síndrome de Estocolmo Afetiva: Quando a Dor Vira Afeto Em 1973, após um assalto em Estocolmo, reféns desenvolveram afeição por seus sequestradores. Vejo algo similar em algumas oportunidades, pacientes que justificam agressões, dizendo "ele está estressado" ou "ela teve uma infância difícil". O mecanismo é sutil: o cérebro, para evitar o colapso, reinterpreta a violência como "prova de amor". Judith Herman, em ‘’Trauma and Recovery’’, alertou; "A ligação traumática não é amor, mas uma estratégia de sobrevivência emocional." "Cuidado quando o 'eu te amo' vem acompanhado de pedidos de desculpas. O amor não precisa delas." - Dan Mena . A Armadilha da Esperança: "Um Dia Ele Vai Mudar" Laura me perguntou: Mas e se ele mudar? E se eu desistir agora e perder a chance de sermos felizes?" Respondi com outra pergunta: "Quantas primaveras você está disposta a esperar por uma flor que nunca brotou?" A esperança, nessas relações, não é virtude, mas vício. Como diz Byung-Chul Han em ‘’A Agonia do Eros’’: "O neoliberalismo afetivo nos faz acreditar que relacionamentos são projetos de auto ajuda, onde o outro é sempre uma 'obra inacabada'." O Círculo Vicioso Idealização: Ele é "o amor da sua vida"; as red flags são romantizadas como "paixão intensa". Desvalorização : Críticas, comparações, gaslighting. Reconciliação : Promessas de mudança, sexo reconciliatório, presentes. Calmaria : Período de "paz" que gera falsa esperança. Esse ciclo libera cortisol (estresse) na fase 2 e dopamina na fase 3, criando dependência. Bessel van der Kolk, em ‘’O Corpo Guarda as Marcas’’, explica: "O corpo viciado no pêndulo entre medo e alívio perde a capacidade de discernir segurança." ‘’Relacionamento saudável não é montanha-russa emocional. É chão firme onde se pode dançar sem medo de cair." - Dan Mena. A Raiz Invisível: Feridas de Infância e a Busca por Réplicas Familiares Muitos escolhem parceiros que replicam dinâmicas parentais disfuncionais. Uma paciente, Ana, descobriu em terapia que seu pai alcoólatra a preparou para tolerar o comportamento violento do marido. Winnicott falava da "mãe suficientemente boa" , mas; e quando internalizamos a "mãe tóxica" como modelo de amor. Como Quebrar o Feitiço: Passos Terapêuticos Nomeie o Inominável : Escreva em um diário: "O que eu toleraria se visse minha irmã passando por isso?" Mapeie os Gatilhos : Identifique quais feridas infantis o parceiro ativa (abandono, rejeição, invisibilidade). Experimento Mental : Imagine sua vida daqui a 5 anos se permanecer nessa relação. O que vê? Crie Novos Circuitos : Substitua o contato com o parceiro por atividades que gerem dopamina saudável (exercícios, arte, voluntariado). A cura começa quando você troca a pergunta 'Por que ele faz isso?' por 'Por que eu me permito isso?'. Epifania Clínica: O Dia em que Laura Entendeu Após meses de terapia, Laura trouxe um insight: "Percebi que não amo ele, amo a versão de mim que acreditei ser quando estávamos juntos." Esse é o cerne: relacionamentos tóxicos são espelhos distorcidos onde confundimos dependência com identidade. Lacan diria que: ‘’buscamos no ‘’Outro’’ o que falta em nós’’. "Nenhum amor externo preencherá o vazio que só seu próprio abraço pode curar." - Dan Mena. Sinais Invisíveis de um Relacionamento "O amor não doi. O que fere é a confusão entre amor e posse, entre cuidado e controle." - Dan Mena. Amor Que Asfixia: A Psicologia por Trás dos Laços Doentios A Parábola do Cão e da Coleira Invisível Um homem caminhava pela rua quando viu um cão deitado sob o sol, uivando de dor. Ao se aproximar, notou que o animal estava preso por uma coleira invisível — tão fina que quase não se via, mas tão forte que marcava seu pescoço. O dono, ao lado, disse: "Ele nem percebe que está preso. Acho que ele escolheu ficar aqui." Assim funcionam os relacionamentos tóxicos: as amarras mais perigosas são aquelas que não vemos, mas sentimos na alma. Quando a Realidade Vira um Pesadelo Mariana chegou ao consultório certa vez dizendo: "Sou muito dramática. Ele diz que invento coisas." Seu parceiro a convencera de que suas memórias eram distorcidas — como quando ele sumiu por três dias e jurou que havia avisado. O ‘’gaslighting’’ — termo inspirado na peça ‘’Gas Light’’ (1944), onde um marido manipula a esposa para duvidar de sua sanidade — é uma forma de violência emocional que corroi a autopercepção. Robin Stern, em ‘’The Gaslight Effect’’, define: "Não se trata de uma mentira, mas de um sistema de manipulação que faz você questionar sua própria realidade." "Quem te ama não te faz duvidar do que sente. Amor é espelho que reflete, não névoa que confunde." - Dan Mena. Sinais de Gaslighting Frases como "Você está louca/o", "Isso nunca aconteceu", "Exagera tudo". Minimizar seus sentimentos: "Você é muito sensível." Contar versões alternativas de eventos que você viveu. O Controle Disfarçado de Proteção Paulo, um paciente, relatou: "Ela checa meu celular porque 'se preocupa comigo'. No início, achei fofo." O controle patológico muitas vezes se veste de cuidado — mas, como diz Byung-Chul Han em Psicopolítica: "O excesso de positividade ('eu só quero seu bem') é a forma mais perversa de dominação." O parceiro controlador não invade sua privacidade por amor, mas por insegurança. Cria uma dinâmica onde você precisa "provar lealdade" constantemente, como em um tribunal afetivo. Sinais de Controle Emocional Exigir senhas de redes sociais ou justificativas para atrasos. Isolar você de amigos/família sob o pretexto de "não gostam de nós". Criticar suas roupas, amigos ou hobbies como "não adequados". Intermitência Afetiva Julia descreveu seu relacionamento como: "Um jogo de esconde- esconde emocional": "Quando estou quase desistindo, ele volta com presentes e promessas." Esse padrão, chamado ‘’intermittent reinforcement’’ (reforço intermitente), é usado até em cassinos — recompensas imprevisíveis criam dependência. B.F. Skinner, pai do behaviorismo, provou que ratos pressionam mais vezes uma alavanca quando recebem comida aleatoriamente. Nas relações, a lógica é a mesma: a incerteza "será que hoje ele vai me tratar bem?" o que gera obsessão. "O cérebro viciado em migalhas esquece que merece um banquete. Você não está apaixonado; está em abstinência." - Dan Mena. Sinais de Intermitência Afetiva Ciclos de idealização (carinho excessivo) e desvalorização (frieza). Promessas não cumpridas acompanhadas de justificativas emocionais. Sensação de que "precisa conquistar" o amor do outro diariamente. Culpa como Moeda de Troca: "Se Você Me Amasse..." Ricardo chorou no divã: "Ela ameaça se matar se eu for embora. Como posso abandoná-la?" Essa é a chantagem emocional, onde o amor é usado como moeda de troca. John Bradshaw, em ‘’Healing the Shame That Binds You’’, alerta: "A culpa tóxica não é sobre seus erros, mas sobre não atender às expectativas irreais do outro." "Amor verdadeiro não negocia afeto. Se alguém condiciona seu cuidado à sua obediência, isso não é amor: é barganha emocional." - Dan Mena. A Química Mortal dos Relacionamentos Abusivos Sinais de Chantagem Afetiva Frases como "Se você me amasse, faria isso" ou "Vou morrer sem você". Usar doenças, tristeza ou solidão para mantê-lo preso. Fazer você se sentir responsável pela felicidade alheia. Epifania Clínica: O Caso de Clara Clara, uma arquiteta de 32 anos, percebeu a toxicidade do relacionamento quando lhe pedi que desenhasse sua relação. Ela ilustrou um labirinto com uma placa: "Saída proibida para quem se ama." Na próxima sessão, trouxe um novo desenho: ela mesma, segurando uma chave. "A saída sempre esteve no meu bolso", disse. "Só precisava parar de pedir permissão." "Relacionamentos saudáveis não têm portas trancadas. Se você precisa de uma chave que o outro controla, está na cela errada." - Dan Mena. A Síndrome Afetiva de Estocolmo - A Distorção da Realidade Quando a violência se torna cotidiana, a mente cria narrativas alternativas para evitar o colapso. Frases como "ele só age assim porque me ama" ou "eu também erro" não são desculpas, mas escudos contra a verdade insuportável. Pela psicanálise explicamos isso através do conceito de identificação com o agressor, descrito por Sándor Ferenczi em ‘’Análise de uma Neurose Traumática’’ : "A criança, para sobreviver ao poder esmagador do adulto, introjeta a culpa e passa a amar seu opressor como forma de autopreservação." Na vida adulta, repetimos esse padrão: internalizamos a crueldade do parceiro como "merecida" e transformamos a dor em prova de devoção. "Quem vive sob espelhos distorcidos acaba acreditando que a imagem quebrada é seu verdadeiro rosto." - Dan Mena. A Química do Medo e do Alívio: Dopamina e Cortisol em Colisão Relacionamentos abusivos operam em ciclos de tensão e reconciliação. Na fase de violência (seja verbal, emocional ou física), o corpo libera cortisol (hormônio do estresse). Na fase de "lua de mel" — quando o agressor pede perdão ou se torna carinhoso —, há uma inundação de dopamina (neurotransmissor do prazer). Essa oscilação cria um vício bioquímico. Como explica Bessel van der Kolk em ‘’O Corpo Guarda as Marcas’’: "O cérebro traumatizado busca repetir o ciclo de medo e alívio, pois a estabilidade, embora saudável, parece entediante para um sistema nervoso hipervigilante." "Viciar-se em picos emocionais é como preferir raios a luz do sol: você se acostuma a viver na escuridão entre um clarão e outro." - Dan Mena. A Solidão como Cúmplice O medo do abandono é um dos maiores aliados da Síndrome de Estocolmo Afetiva. Muitos permanecem em relações tóxicas não por amor ao parceiro, mas por horror ao vazio. Fala Winnicott, do "medo do colapso" , onde descreve: "O que assombra o sujeito não é o trauma em si, mas o pavor de reviver a sensação de desamparo original." Assim, a relação tóxica torna-se uma muleta existencial: preferimos a dor conhecida ao desafio de reconstruir uma identidade fora do cativeiro. Quantas vezes você trocou sua liberdade pela ilusão de pertencimento? A Filosofia do Cativeiro: Quando o Amor Vira uma Prisão A violência moderna não se impõe por força bruta, mas por sedução. Nas relações tóxicas, o agressor raramente é um monstro óbvio; é alguém que diz "te amo" enquanto ergue muros invisíveis. Aqui, a Síndrome de Estocolmo Afetiva se alimenta de uma contradição: O mito do salvador: "Se eu amá-lo o suficiente, ele vai mudar." A fantasia da redenção: "Meu amor pode curar suas feridas." Essas crenças transformam o parceiro em um projeto emocional, não em uma pessoa real. Como escreve Massimo Recalcati em ‘’El Complex de Telêmaco’’: "Amar o potencial do outro, e não sua realidade, é uma forma de narcisismo: amamos nossa própria capacidade de transformação, não o ser humano à nossa frente." "Nenhum amor cura alguém que não quer se curar. A única pessoa que você pode salvar em um relacionamento é você mesmo." - Dan Mena. O Dilema de Quem Confunde Dor com Amor Passos Terapêuticos Baseados na Psicanálise Reconhecer a Ilusão : Se Pergunte? "Se eu visse essa relação de fora, o que diria?" Esse distanciamento revela a diferença entre amor e dependência. Nomear a Violência: Use diários para registrar comportamentos do parceiro sem justificativas. Exemplo: "Hoje, ele gritou comigo por chegar 10 minutos tarde" (em vez de "Ele estava estressado"). Resgatar a Autorresponsabilidade: Troque "Por que ele faz isso?" por "Por que eu permito isso?". A resposta geralmente revela feridas de abandono ou baixa autoestima. Criar Novos Circuitos de Prazer: Substitua a dopamina tóxica por atividades que gerem satisfação autônoma: arte, exercícios, voluntariado. A Virada Filosófica: Do Cativeiro à Autonomia A Síndrome de Estocolmo Afetiva não é uma condenação, mas um convite à reinvenção. Jacques Lacan falava do "desejo como falta" , mas é possível transcender essa lógica. "O verdadeiro amor não nasce da carência, mas da completude. Quando você pára de buscar no outro o que falta em si, descobre que a liberdade é a única forma de amar sem medo." - Dan Mena. O Tribunal da Alma "Se a sentença for de sofrimento contínuo, talvez seja hora de apelar para a maior autoridade: você mesmo." - Dan Mena. O Luto do Amor Impossível — Como Deixar Quem Não Nos Faz Bem? "Desapegar não é esquecer; é lembrar sem sangrar." - Dan Mena. A Ilusão do Controle: Por Que Seguramos o Que Nos Afunda? A cultura romantizou a ideia de que "o amor tudo suporta" , mas raramente questionamos: o que acontece quando resistir se torna sinônimo de autodestruição? O apego a esses relacionamentos impiedosos muitas vezes esconde uma tentativa desesperada de ‘’controlar o incontrolável’’ — a fantasia de que, com esforço suficiente, poderemos moldar o outro à imagem do amor que idealizamos. Na psicanálise, esse mecanismo é chamado de ''reparação compulsiva'' , descrito por Melanie Klein como uma tentativa de curar feridas infantis através da relação atual. Não se trata de amor pelo parceiro, mas de uma luta inconsciente para reescrever um passado onde nos sentimos impotentes. "Agarramos fantasmas porque temos medo de descobrir que nossas mãos estão vazias. Mas só soltando o que não existe podemos segurar o que é real." - Dan Mena. Os Estágios do Luto Emocional Negação: "Ele vai mudar." "Desta vez será diferente." Raiva: "Como fui trouxa de aceitar isso?" Barganha: "Se eu for mais compreensivo(a)..." Depressão: "Nunca vou encontrar alguém como ele." Freud, em ‘’Luto e Melancolia’’, diferencia o luto saudável (que reconhece a perda) da melancolia (onde o ego se identifica com o objeto perdido). Em relacionamentos tóxicos, muitos ficam ilhados transformando a raiva em autopunição e a tristeza em resignação. A Filosofia do Desapego: Entre Sartre e o Zen Enquanto Sartre dizia que "o inferno são os outros" , o budismo ensina que ''o sofrimento nasce do apego'' . Esses dois pensamentos se encontram: o inferno é se apegar a quem nos transforma em estranhos de nós mesmos . "O amor degenerou em um contrato onde o outro deve preencher todas as lacunas existenciais — uma tarefa impossível que gera frustração infinita." Dan Mena. Os Mitos que Impedem o Desapego "Sem ele, seria incompleto(a)."Lacan diria que o desejo é estruturalmente incompleto, mas essa falta não deve ser preenchida por outro — e sim transformada em motor de crescimento. "Nunca vou amar assim de novo. "Repetimos padrões até curar suas raízes, novos amores surgirão quando você deixar de buscar réplicas do passado.'' É melhor isso do que solidão."Winnicott falava da "capacidade de estar só" como marco de maturidade emocional. Solidão saudável é pré-requisito para relacionamentos verdadeiros. "Quem tem medo de ficar sozinho consigo nunca realmente esteve com alguém — apenas fugiu de si em corpos alheios." - Dan Mena. Desapego em 4 Passos Ritualizar o Fim - Escreva uma carta não enviada detalhando tudo o que tolerou. Reescreva a Narrativa - Troque "Ele me destruiu" por "Eu sobrevivi e aprendi". Crie uma "Lista de Crimes - Relacione comportamentos inaceitáveis do ex-parceiro. Reconecte-se com o Prazer Solitário. Redescubra hobbies abandonados. O prazer autogerado fortalece a autonomia. "Não tente 'esquecer'. A cura está em lembrar sem reviver, como quem observa uma foto antiga sem sentir o peso do quadro." - Dan Mena. A Metáfora do Rio: Quando Deixar de Lutar é Nadar Imagine-se em um rio turbulento, agarrado(a) a uma pedra que o(a) machuca. Soltar parece perigoso, mas só ao se deixar levar pela correnteza que você descobre que flutuar é possível. Relacionamentos tóxicos são essa pedra: machucam mais pelo medo de soltar do que pela queda em si. Massimo Recalcati, em O Complexo de Telêmaco, afirma: "Renunciar ao amor impossível não é derrota, mas o primeiro ato de fé na vida que ainda está por vir." "Desapego não é perda; é devolução. Você entrega à vida o que nunca deveria ter carregado." - Dan Mena. Por Que Escolhemos Sempre o Mesmo Tipo de Pessoa? A escolha de parceiros amorosos raramente é aleatória. Mesmo quando afirmamos buscar "alguém diferente" , é comum nos encontrarmos repetindo padrões inconscientes, como se uma força invisível nos guiasse de volta a dinâmicas familiares. Minha proposta neste artigo é explorar os mecanismos psicológicos, biológicos e socioculturais que sustentam essa repetição e proponho os caminhos para romper esses ciclos autolimitantes. Psicologia da Repetição: Por Que o Cérebro Prefere o Conhecido A repetição de esquemas relacionais está enraizada em mecanismos evolutivos e cognitivos. ‘’O cérebro foi otimizado para conservar energia, tende a privilegiar o familiar — mesmo que doloroso — em detrimento do incerto.’’ - Dan Mena. Como a Mente Distorce Violência em ‘Prova de Paixão' Neurobiologia do Hábito : Circuitos neurais como o núcleo accumbens (associado à recompensa) e a amígdala (ligada ao medo) reforçam padrões conhecidos. Relacionamentos Previsíveis : ainda que disfuncionais, ativam menos o estresse do que o desconhecido. Memória Emocional : Segundo a teoria do apego (Bowlby), modelos internos formados na infância moldam expectativas sobre relacionamentos. Uma criança negligenciada pode buscar parceiros distantes na vida adulta, reinterpretando a frieza como "normalidade" . A Tirania do Inconsciente: Repetição Compulsiva e Projeção Freud cunhou o termo ‘’repetição compulsiva’’ para descrever a tendência de reviver traumas não resolvidos. Jung ampliou essa ideia com o conceito de ‘’Sombra’’ , parte da psique que projeta conflitos internos em figuras externas. Projeção e Fantasia Relacional : Escolhemos parceiros que encarnam aspectos recalcados de nós mesmos. Por exemplo, alguém reprimido pode se atrair por pessoas impulsivas, buscando completar sua própria psique. O Mito da Química : A atração intensa muitas vezes reflete ressonância com feridas não curadas. Estudos mostram que a "faísca" inicial frequentemente está ligada a padrões de hiperestimulação emocional (ex.: oscilações entre carinho e abandono), o famoso ''vai e vem''. Os Programas Secretos que Dirigem Nossas Escolhas A Terapia do Esquema (Young) - identifica padrões cognitivos formados na infância que distorcem percepções adultas. Esquemas como Abandono ou Desconfiança criam profecias auto realizáveis. Como Reprogramar o Cérebro para o Novo Romper ciclos exige mais que força de vontade — é necessário usar sistemas de crença e emoção. Autoconhecimento Radical : Técnicas como ‘’journaling’’ e meditação ajudam a identificar gatilhos emocionais. "O que estou repetindo aqui que já vi antes?" Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT): Foca em valores pessoais em vez de padrões passados. Ex.: "Se liberdade é meu valor, como esse parceiro(a) vai me aproximar dela?" Neuroplasticidade e Novas Experiências : Se expor a interações fora da zona de conforto (ex.: grupos sociais diversos) reduz o viés de familiaridade. Crítica aos Modelos Românticos Dominantes A repetição também é cultural. Narrativas de "amor romântico" vendem a ideia de que o sofrimento é sinal de paixão autêntica. Desromantizar o Sofrimento : Relacionamentos saudáveis são menos dramáticos, mas mais nutritivos. Amor como Ação, Não como Destino : Escolher com base em compatibilidade prática (valores, projetos) em vez da conhecida "química" cega. A repetição não é uma sentença vitalícia, mas um convite à autorreflexão. Revolucionar padrões amorosos requer coragem para enfrentar o desconforto do novo e compaixão para entender que nossos erros passados foram tentativas de cura. Como escreveu Rilke: "Amar não é fusionar, mas proteger a solidão do outro" — talvez a verdadeira revolução esteja em: ''aprender a escolher não pelo que supostamente nos completa, mas pelo que nos permite crescer'' . A Psicologia do Recomeço A neurociência revela que o fim de um relacionamento ativa regiões cerebrais associadas ao luto físico (como o córtex cingulado anterior), mas também estimula a neurogênese — a formação de novos neurônios. A plasticidade cerebral permite que, mesmo em meio à dor possamos reescrever narrativas internas. Luto e Crescimento Pós-Traumático A psicóloga Ann Masten fala da "resiliência comum" , a capacidade inata de reorganizar a vida após crises. Estudos mostram que 70% das pessoas relatam ganhos emocionais após términos como maior autoconhecimento. Teoria do Apego e Reconfiguração : Romper um vínculo reativa padrões de apego, mas também abre espaço para reavaliar necessidades. "Que partes de mim dependiam desse relacionamento para existir?" Filosofia do Renascimento Filósofos e tradições espirituais há milênios enxergam o fim como parte do ciclo da existência. Heráclito e o Fluxo Perpétuo: "Ninguém entra duas vezes no mesmo rio" — os finais de uma relação nos lembram que a identidade é fluida, não fixa. Budismo e o Desapego : A ideia de Anicca (impermanência) convida a abraçar o fim como oportunidade de libertação de ilusões. Existencialismo e Autenticidade : Para Sartre, crises existenciais forçam a confrontar a liberdade radical de se reinventar. A Alquimia Emocional O processo de renascimento exige metabolizar a perda. Não se trata de esquecer, mas de ressignificar. Desintegração : Aceitar a morte simbólica do "eu" associado ao relacionamento. Incubação : Período de introspecção e reconstrução de valores. Reconexão : Reengajar com o mundo a partir de uma nova perspectiva. Integração : Assimilar a experiência ao senso contínuo de identidade. Arte e Criatividade como Ferramentas : Escrever, pintar ou compor sobre a dor externaliza emoções e revela padrões invisíveis. Por que Romantizamos o Sofrimento? A cultura popular trata os finais como tragédias, não como transições. O Mito do "Grande Amor Único" : A ideia de alma gêmea limita a possibilidade de múltiplos amores em diferentes fases da vida. A Estética do Sofrimento : Filmes e músicas glorificam a melancolia amorosa, ignorando a potência do recomeço. Rituais de Passagem Modernos : Criar novos rituais (ex.: queimar cartas simbolicamente, plantar uma árvore) ajuda a marcar o fim como cerimônia de transformação. Estratégias Práticas para o Renascimento Como navegar o caos emocional e emergir mais inteiro? Redesenho de Rotinas : Substituir hábitos vinculados ao ex-parceiro por novos rituais (ex.: aulas de dança, voluntariado). Ecologia Social: Reavaliar círculos de amizade e evitar "ambientes tóxicos" que alimentam a saudade. Tecnologia a Serviço da Cura : Usar apps de mindfulness (ex.: Headspace) ou diários digitais para mapear progressos. Psicologia do Futuro : Visualização de self futuro — perguntar-se: "Quem serei daqui a cinco anos se honrar meu crescimento hoje?" Pessoas que Renascem Transformam o Mundo Indivíduos em processo de renovação questionam normas sociais. Movimentos de Reinvenção Pessoal : Como a onda self-care ajudou a desestigmatizar o recomeço. Ativismo e Empatia Radical : Pessoas que transformam dor pessoal em causas coletivas (ex.: fundação de ONGs, assistência social, etc). Como Reconfigurar Seu Cérebro para o Amor Saudável O Código Afetivo do Cérebro Em algum lugar entre o silêncio que ressoa e a coragem de escutar a própria alma, existe um jardim íntimo dentro de cada um de nós. Um espaço onde o amor não é labirinto, mas horizonte; não é espinho, mas semente que germina. Talvez a maior revolução não seja fugir da dor, mas descobrir, a chama que jamais se extinguiu — mesmo quando tudo à volta pareça sombra. Os laços que nos machucam são como vendavais passageiros: podem curvar nossos ramos, desfolhar pétalas, fazer o solo estremecer. Mas nenhuma tormenta é capaz de desenraizar o que está plantado na alma. Existe um afeto que dispensa justificativas para florescer, que não se mistura com posse ou martírio, que não exige que você ofusque seu brilho para iluminar o outro. Ele aguarda paciente, além do receio, além dos "quem sabe?", longe da fantasia. Cada coração é uma constelação única: não é preciso apagar suas estrelas para que outra luz brilhe. - Dan Mena. Quando a rosa desiste de tentar transformar o cacto, ela entende que sua graça sempre foi suficiente — e que há vastos campos onde desabrochar sem se ferir. O amor genuíno não é uma batalha a ser travada, nem um enigma a ser decifrado. É um diálogo de liberdades, onde duas almas se elegem cotidianamente, não por carência, mas por transbordamento. ''Amar-se é como um rio que, ao parar de lutar contra suas margens, descobre o oceano dentro de si próprio''. - Dan Mena. O amor, em sua forma mais essencial, não é silêncio que clama. É melodia que pulsa. É refúgio. É aurora, ousadia de apenas existir — íntegro, sereno e radiante. Você já carrega, em si mesma(o), um cosmos merecedor de amor, além do divino. Que este giro das minhas singelas palavras não seja sobre esquecer cicatrizes, mas sobre lembrar que, mesmo nas rachaduras e fendas, há espaço para brotar vida. Porque você não é flor que se curva ao vento, mas terra fértil onde o amor se enraíza sem medo. Referências Bibliográficas "Apego e Perda" (Vol. 1: Apego) - John Bowlby, 1969, Basic Books (EUA) "Para Além do Princípio do Prazer" - Sigmund Freud, 1920, Internationaler Psychoanalytischer Verlag (Áustria) "O Corpo Guarda as Marcas: Cérebro, Mente e Corpo na Superação do Trauma" - Bessel van der Kolk, 2014, Penguin Books (EUA) "Trauma and Recovery: The Aftermath of Violence" - Judith Herman, 1992, Basic Books (EUA) "O Drama da Criança Bem-Dotada" - Alice Miller, 1979, Basic Books (EUA) "A Agonia do Eros" - Byung-Chul Han, 2012, Editora Vozes (Brasil) "Os Quatro Conceitos Fundamentais da Psicanálise" (Seminário XI) - Jacques Lacan, 1973, Editora Zahar (Brasil) "Inveja e Gratidão" - Melanie Klein, 1957, Imago Editora (Brasil) "O Ambiente e os Processos de Maturação" - Donald Winnicott, 1965, Artmed (Brasil) "Por Que Amamos? A Natureza e a Química do Amor Romântico" - Helen Fisher, 2004, Henry Holt and Company (EUA) "O Ser e o Nada" - Jean-Paul Sartre, 1943, Editora Vozes (Brasil) "O Complexo de Telêmaco: Pais e Filhos após o Declínio do Pai" - Massimo Recalcati, 2013, Editora Ideias & Letras (Brasil) "O Efeito Gaslight: Como Reconhecer e Lidar com a Manipulação Psicológica" - Robin Stern, 2007, Harmony Books (EUA) "Terapia do Esquema: Guia de Técnicas Cognitivo-Comportamentais Inovadoras" - Jeffrey E. Young, 2003, Artmed (Brasil) "A Arte de Amar" - Thich Nhat Hanh, 2014, Editora Rocco (Brasil) "Inteligência Emocional: Por Que Ela é Mais Importante que o QI?" - Daniel Goleman, 1995, Editora Objetiva (Brasil) "A Coragem de Ser Imperfeito" - Brené Brown, 2010, Editora Sextante (Brasil) "O Homem em Busca de um Sentido" - Viktor Frankl, 1946, Editora É Realizações (Brasil) "Mindset: A Nova Psicologia do Sucesso" - Carol S. Dweck, 2006, Editora Objetiva (Brasil) Palavras-Chaves #AmorTóxico, #RelacionamentoAbusivo, #SíndromeDeEstocolmoAfetiva, #Gaslighting, #CompulsãoÀRepetição, #NeurociênciaDoAmor, #Dopamina, #Cortisol, #ChantagemEmocional, #IntermitênciaAfetiva, #ControleEmocional, #Desapego, #LutoEmocional, #RepetiçãoDePadrões, #FeridasDeInfância, #TerapiaPsicanalítica, #EsperançaTóxica, #ViolênciaEmocional, #DependênciaAfetiva, #Autoconhecimentol Meta Descrição (SEO) Visite minha loja ou site 🔗 https://uiclap.bio/danielmena 🔗 https://www.danmena.com.br/ Até breve; Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Departament of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192. Comente e avalie o artigo; De 1 a 5 - Quantas estrelas merece o artigo? Deixe seu relato abaixo em COMENTÁRIOS.
- O Sussurro da Libido.
O Inconsciente Não Cala – Ele Sussurra em Sonhos A Linguagem Silenciosa da Libido A interseção entre sexualidade e inconsciente é uma das facetas mais emaranhadas da psicanálise, em nosso campo buscamos permanentemente investigar os mistérios mais côncavos da mente. Explorar aquilo que muitas vezes permanece encoberto e submerso na opacidade do inconsciente. A sexualidade, em suas múltiplas dimensões, transcende o ato físico para se situar em um território simbólico, emocional e cultural. Como um fio que atravessa os estágios do desenvolvimento, ela é moldada por experiências, traumas, repressões e fantasias que, em sua maioria, operam fora da consciência. Com isso, surge a primeira pergunta desafiadora: como os desejos inconscientes, muitas vezes reprimidos, influenciam nossa percepção de nós mesmos, nossas relações e, por extensão, a sociedade? "A libido não grita; ela sussurra em metáforas através dos sonhos, transformando desejos proibidos em paisagens oníricas onde o ego não ousa pisar." - Dan Mena. Freud Sabia: A Libido Fala em Metáforas A psicanálise, desde seus primórdios, colocou a sexualidade no centro de sua investigação. Freud, foi o pioneiro a propor que grande parte de nossos desejos e comportamentos sexuais fossem governados pelo inconsciente. Ao fazê-lo, ele desafiou a ideia predominante de que o sexual era uma questão puramente biológica ou moral. Para ele, esse espectro abarcava muito mais do que o ato em si; seria uma força pulsional, um motor que orientava nossas ações, fantasias e conflitos. Também introduziu o conceito de desenvolvimento psicossexual, sugerindo que a sexualidade evolui em estágios – oral, anal, fálica, latente e genital – cada uma, marcada por incitações e experiências que deixam marcas duradouras em nossa psique. Essa teoria nos convida a questionar até que ponto esses ensejos infantis configuraram nossa vida libidinosa adulta. Será que os desejos que reprimimos na infância desaparecem ou encontram outras formas de expressão, mais sutis e simbólicas, na maturidade? "Nossas fantasias são cartografias íntimas do inconsciente: mapas de um território erótico que a cultura insiste em chamar de 'proibido'." - Dan Mena. O inconsciente, por sua vez, é um território repleto de simbolismos que frequentemente se manifestam de maneira disfarçada. É nos sonhos, nas fantasias e nos atos falhos que ele encontra formas de se expressar, eles desempenham um papel fascinante nesse contexto. Freud os chamou de "a via régia para o inconsciente" , pois é neles que os desejos reprimidos podem emergir, ainda que travestidos por mecanismos de censura. Por exemplo, um indivíduo pode sonhar com imagens aparentemente banais, mas que, quando analisadas, ilustram desejos sexuais ocultos ou conflitos não resolvidos. Essa capacidade do inconsciente de se expressar por meio de símbolos levanta interrogações: até que ponto somos capazes de interpretar nossos próprios sonhos e compreender os desejos que eles escondem? E, mais importante, como esses quereres inconscientes desenham a maneira como nos relacionamos com nossa sexualidade? O Que Escondemos no Quarto Escuro da Mente? Embora o inconsciente seja uma força interior, ele não opera isoladamente. A cultura, como uma matriz de normas, valores e tabus, exerce uma influência sobre a maneira como vivemos e percebemos nossa sexualidade. Desde tempos imemoriais, foi cercada por regras que ora a reprimem, ora a exaltam. Em muitas sociedades, as normas culturais impõem limites rígidos à expressão sexual, criando um ambiente em que o desejo se torna fonte de culpa e vergonha. Essa articulação de gangorra na dinâmica cultural não apenas opera ao seu bel-prazer, mas também impacta os indivíduos e o inconsciente coletivo, criando uma tensão entre a necessidade de se conformar às expectativas sociais e o desejo de se libertar delas. A repressão sexual, nesse contexto, oferece um dos temas centrais da psicanálise. Reprimir significa empurrar para o inconsciente aquilo que a consciência considera inaceitável. No caso da sexualidade, ela ocorre em resposta a normas de diversas índoles, inclusive morais, que desencorajam a expressão livre dos quereres. Contudo, aquilo que é contido não desaparece; pelo contrário, ele encontra outras formas de se manifestar, muitas vezes de maneira disfuncional. A repressão sexual pode gerar uma série de consequências psicológicas, como ansiedade, depressão, compulsões, fobias e dificuldades nas relações interpessoais. "O verdadeiro erotismo não está no que é revelado, mas no que permanece encoberto: o véu do desejo é mais sedutor que sua nudez." - Dan Mena. Desejos Proibidos: Entre a Repressão e a Revelação Essa constatação nos leva a ponderar: como podemos criar um ambiente em que as pessoas se sintam livres para navegar sua sexualidade sem medo de julgamento ou repressão? Por esta razão, a psicanálise oferece uma abordagem única e metodicamente singular para lidar com o problema, ao proporcionar um espaço seguro para que os indivíduos possam adentrar em seus desejos e conflitos sem medo de serem censurados ou cancelados. Via técnicas como a associação livre e a análise dos sonhos, o(a) analista guia o paciente a trazer à consciência os conteúdos sufocados que plasmaram sua vida. Esse método, embora provocante, pode ser altamente abolidor, visto que ao reconhecer e integrar aspectos censurados da sexualidade pode alcançar o indivíduo num maior senso de autenticidade. No entanto, essa caminhada de autodescoberta levanta questões: será que estamos prontos para enfrentar os desejos que reprimimos por tanto tempo? E, se sim: como podemos usar esse conhecimento para transformar nossas vidas e as relações afetivas? Além da dimensão individual, temos as implicações sociais e políticas. Nos últimos anos, questões ligadas à diversidade sexual e à identidade de gênero têm ganhado destaque no debate público, desafiando as normas tradicionais e propondo novas narrativas sobre o que significa ser sexualmente saudável e livre. Esses movimentos têm o potencial de transformar não apenas a maneira como as pessoas vivenciam sua sexualidade, mas também como a sociedade lida com questões de poder, controle e liberdade. Contudo, essas mudanças também geram resistências, alimentadas pelo medo do desconhecido. Esse embate cultural reflete uma colisão entre o desejo de mudança e a necessidade de afirmar a nossa segurança. "Libertar a sexualidade não é romper todas as barreiras, mas entender que os muros mais opressivos foram construídos dentro de nós." - Dan Mena. Podemos, então, navegar por essas águas ameaçadoras e criar uma sociedade que valorize a diversidade e a expressão sexual? Sexualidade é Linguagem – E o Corpo Sabe a Gramática A educação nessa direção, se apresenta como uma ferramenta de manejo fundamental para promover uma compreensão mais saudável e equilibrada da sexualidade. No entanto, em muitas partes do mundo, essa linha ainda é tratada de maneira superficial ou negligenciada, perpetuando a desinformação e os tabus. Além de ser um prisma abrangente, deve ir além da anatomia e abordar também aspectos emocionais, psicológicos e sociais.Consentimento, diversidade, identidade e desejo são temas que precisam ser discutidos de maneira aberta e respeitosa, para que as novas gerações cresçam com uma visão mais equilibrada e menos repressiva. Sendo assim é importante reformular os modelos de educação sexual para que eles atendam às necessidades do mundo contemporâneo. Mais importante ainda: como usar o conhecimento para combater a inibição e promover a saúde mental e emocional? No entanto, essas mudanças também geram reações contrárias, muitas vezes alimentadas por forças conservadoras que buscam preservar uma visão mais rígida e tradicionalista. Essa tensão entre progresso e conservantismo reflete um repto mais amplo entre liberdade e freio. Um bom caminho pode ser encontrar um equilíbrio entre essas forças opostas e criar um ambiente nivelado, onde todos possam viver sua sexualidade de maneira equânime. "A repressão sexual é uma cicatriz coletiva: sociedade e inconsciente brigam pelo direito de narrar quem podemos amar — e como." - Dan Mena. A psicanálise, com sua ênfase na exploração do inconsciente, oferece uma perspectiva ampla para entender essas dinâmicas. Ela nos convida a olhar além do óbvio e a mergulhar nas forças subjacentes das nossas atitudes em relação ao assunto. Ao fazê-lo, a confrontamos com nossos próprios preconceitos e medos, nos impulsionando a buscar uma compreensão mais aberta e inclusiva do que significa ser sexuado. Essa imersão não é apenas uma tarefa individual, mas também um esforço coletivo para criar uma sociedade mais justa e acolhedora. Ambos territórios, sexualidade e inconsciente são geografias peculiares, repletas de camadas que exigem coragem para sua revisão. Compreender a relação entre elas não é apenas uma questão de curiosidade intelectual; é uma necessidade prática e urgente em um mundo que ainda luta para conciliar suas singularidades de desejos, moralidade, individualidade e coletividade. Nossa matéria nos permite não apenas compreender melhor a nós mesmos, mas também motiva a imaginar um futuro em que a sexualidade seja reconhecida como uma parte essencial e saudável do ser, livre das amarras do recalcamento e do arbítrio. Sonhos São Cartas do Inconsciente – Você as Decifra? "A sexualidade não habita apenas o corpo; ela mora nas entrelinhas de um olhar, na pausa entre duas palavras, no tremor que antecede um toque." - Dan Mena. Estamos preparados para abraçar plenamente nossa sexualidade, com todo seu hermetismo e beleza, e usá-la adequadamente como uma força reformadora? Palavras Chaves; #Psicanálise #Sexualidade #Inconsciente#danmenapsicanalise #meuanalista# #Freud#Libido#DesenvolvimentoPsicossexual #RepressãoSexual #Sonhos #DesejosReprimidos #Cultura #EducaçãoSexual #Diversidade #IdentidadeDeGênero #SaúdeMental #Tabus #AnáliseDosSonhos #Psicoterapia #Autoconhecimento #Libertação# como entender meus desejos reprimidos? # identidade de gênero Até breve, Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Departament of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192.
- Libido: A Ciência Por Trás dos Quereres.
A Libido A Linguagem Silenciosa da Libido Antes de adentrarmos nas complexidades contemporâneas, é crucial desconstruir um equívoco primordial que permeia nosso imaginário coletivo: a redução da libido ao ato sexual. Essa visão míope, produto de uma cultura obcecada por resultados mensuráveis, ignora sistematicamente que o desejo se manifesta nos interstícios do cotidiano - no suspiro compartilhado, no toque que antecede o encontro carnal, no abraço que perpetua a intimidade, mesmo após a separação física dos corpos. A verdadeira energia libidinal não se confina aos genitais como nos querem fazer crer; ela pulsa nas pontas dos dedos entrelaçados durante caminhadas, no calor das coxas que se roçam despretensiosamente no sofá durante um filme, no aroma único do parceiro(a). Casais que alegam com angústia "falta de desejo" descobrem, após análise cuidadosa, que perderam não a capacidade de sentir - essa chama raramente se apaga completamente -, mas sim, a urgência genital que a sociedade insiste em equiparar com vitalidade sexual. Confundimos volúpia com performance, como se o êxtase pudesse ser medido em ereções ou graus de lubrificação, e não naquele impulso primordial do laço que nos move desde o primeiro respiro. A psicanálise nos revela com clareza que as primeiras manifestações libidinais na infância não são genitais - são orais, cutâneas, residem no prazer de ser embalado, no calor do corpo materno, na segurança do contato pele a pele. Por que então, na vida adulta, insistimos tão obstinadamente em amputar essas dimensões de nossa experiência erótica? A Experiência Erótica ''A genitália é apenas um dialeto no vasto idioma do prazer - quem reduz a libido ao ato sexual comete um empobrecimento ontológico.'' - Dan Mena. A Tirania da Performance e o Esvaziamento do Erótico Um fenômeno clínico revelador surge repetidamente: pacientes que afirmam categoricamente ter "perdido o tesão" mantêm, quando questionados com cuidado, diversas formas de carícias e contato físico, mas as consideram "insuficientes" ou "inferiores" . Essa hierarquização do prazer não é acidental - a indústria do entretenimento sexual e certas abordagens terapêuticas reducionistas venderam com sucesso a ideia perniciosa de que a excitação saudável deve necessariamente culminar na penetração, quando na verdade a libido é um rio caudaloso com múltiplos afluentes, cada um com seu valor intrínseco. Nossa cultura hiper genitalizada validou apenas o desejo que gera fricção física mensurável, ignorando descaradamente que o erotismo se alimenta igualmente de pausas, olhares e espaços vazios carregados de significado. Medicalizamos precipitadamente a questão, tratando como disfunção patológica o que simplesmente não se encaixa no modelo mecânico ultrapassado de excitação/orgasmo/resolução. Qual a ironia trágica dessa abordagem? Quanto mais obcecados nos tornamos com o desempenho sexual quantificável, mais empobrecemos nosso vocabulário libidinal, reduzindo o desejo a meros indicadores fisiológicos. Analfabetismo Erótico: A Verdadeira Crise Esse colapso que enfrentamos não reside na impotência ou frigidez como diagnósticos isolados, mas na incapacidade generalizada de decifrar os micro desejos que pulsam sob a cintura, essa surdez para a polifonia do prazer. Quando casais afirmam com certa vergonha "não transamos há meses" , minha primeira indagação é sempre: "Mas como se tocam?" . O desejo que inclui as partes íntimas, pode hibernar em certas fases da vida a libido - enquanto energia básica das inter relações - a qual só desaparece quando asfixiada, estrangulada nas expectativas sociais estreitas e definições limitantes. ''A tecnologia nos ofereceu conexão sem pele, sexo sem suor, orgasmo sem espasmo - e agora nos perguntamos, perplexos, por que o desejo murcha em nossa era hiperconectada?'' - Dan Mena. O Paradoxo do Prazer A neurociência ilumina com precisão cirúrgica aspectos desse quebra-cabeça complexo. Sabemos agora que o circuito dopaminérgico mesolímbico responde não ao prazer em si, mas à sua antecipação - descoberta esta que explica a frustração recorrente de pacientes presos na busca incessante do objeto idealizado, sempre fugidio. Freud, alertava sobre a natureza insatisfatória do desejo; onde Lacan radicaliza essa visão, ao afirmar categoricamente que "não há relação sexual" no sentido da sintonia perfeita entre os desejos. Os ISRS - Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina, uma classe de antidepressivos, são o tipo de medicamento mais prescrito, usados para tratar a depressão. Apresentam sistematicamente uma oposição cruel que deveria nos fazer refletir: ao elevar os níveis de serotonina, estabilizam o humor à custa da volúpia, como se houvesse uma troca inevitável entre bem-estar e desejo. Isso expõe de forma transparente que nossa capacidade de desejar está ligada a certa dose de inquietude, a uma falta essencial que nos mantém em movimento existencial. Pacientes que encontram alívio medicamentoso estranham a nova paz como um vazio perturbador, refletindo a sabedoria psicanalítica de que é na falta que o desejo se sustenta. ''Os antidepressivos curam a tristeza mas roubam a volúpia - eis o preço paradoxal que pagamos por silenciar o grito primordial dos quereres.'' - Dan Mena. Fantasias Obrigatórias Fantasias Obrigatórias e a Arqueologia do Trauma Casos particularmente interessantes envolvem as chamadas "fantasias obrigatórias" - cenários psíquicos específicos sem os quais a excitação se torna impossível, verdadeiros atalhos inconscientes para o prazer. Homens que só alcançam o ápice através de humilhação (identificando-se paradoxalmente com seus próprios agressores), mulheres que só desejam relações proibidas (repetindo dramas edípicos não resolvidos) - esses padrões apresentam muito sobre nossa arquitetura mental oculta. A pornografia digital agravou exponencialmente esse cenário, substituindo construções pessoais lentas e orgânicas por arquétipos padronizados e instantâneos. O resultado disso? Uma geração que confunde intimidade com performance, que lê o desejo como um roteiro de cinema pré-escrito em vez de uma linguagem viva e mutável. ''A pornografia digital se tornou a nova cartilha da excitação sexual, criando uma geração que decifra códigos mas não compreende sua língua erótica.'' - Dan Mena. O Trabalho Terapêutico Como Tradução Existencial A intervenção clínica bem-sucedida não deve visar superficialmente "aumentar a libido" ou "normalizar práticas" segundo padrões arbitrários, mas sim, decifrar a linguagem única que cada inconsciente criou para expressar suas necessidades recalcadas. O desejo sexual, quando escutado em sua totalidade, nunca é apenas sobre sexo - é sobre poder, amor, morte, sobre tudo que nos constitui como seres desta raça em nosso hermetismo. ''Chamamos precipitadamente de 'disfunção sexual' o que simplesmente o corpo sábio identifica dizendo ‘’não’’ ao que a alma já não suporta mais.'' - Dan Mena. Analfabetismo Corporal A Libido no Século XXI: Paradoxos da Pós-Modernidade Vivemos uma incongruência cruel e ao mesmo tempo fascinante: nunca soubemos tanto sobre os mecanismos fisiológicos e psicológicos do desejo, mas jamais nos sentimos tão perdidos e desorientados(as) sobre o que realmente queremos em nossa intimidade. A libido freudiana, essa força vital primordial, se debate hoje nos laboratórios farmacêuticos prometendo soluções químicas e telas digitais, oferecendo simulacros de conexão, entre protocolos médicos padrões e expectativas sociais cada vez mais distorcidos. Adolescentes desenvolveram um certo "analfabetismo corporal" preocupante - sabem tudo sobre sexo virtual e performatividade erótica, mas tremem diante da simplicidade crua de um simples primeiro beijo. Robôs sexuais e parceiros virtuais representam não tanto uma ameaça moral como alguns conservadores alegam, mas sim a capitulação diante do desafio do ser por excelência: lidar com a arquitetura intransigente do outro em sua alteridade radical. Pacientes transgêneros oferecem lições valiosas sobre a fluidez essencial do desejo. Um homem trans de 25 anos descreveu sua experiência com uma metáfora: "Antes era como ouvir música com fones de ouvido - agora é como estar num show ao vivo, com toda a intensidade que isso implica" , também acrescentou; "Perdi a urgência genital típica da testosterona, mas ganhei uma sensibilidade cutânea, uma capacidade de prazer difuso que nunca imaginei ser possível" . Esses relatos deveriam nos fazer questionar minimamente todos nossos pressupostos sobre o que é presumivelmente "normal" em matéria de desejo sexual. O Sexo Performático Prazer Além do Performático Um casal septuagenário conta que redescobriu o prazer não através da penetração - que havia se tornado fisicamente desafiadora, mas em massagens matinais com óleos aromáticos, no prazer tátil redescoberto, na intimidade sem pressa. "Temos mais vida sexual agora do que quando criamos nossos filhos" , declaram entre risos constrangidos e olhares cúmplices. Por que nossa sociedade insiste tão obstinadamente em fingir que o desejo tem prazo de validade, como se a sexualidade fosse privilégio dos corpos jovens? Dados recentes pintam um quadro bastante esclarecedor: 56% dos usuários abandonam antidepressivos devido a seus efeitos na libido (Harvard, 2023) 1 em cada 3 jovens adultos prefere pornografia a sexo real (The Guardian) Idosos sexualmente ativos apresentaram 40% menos risco de desenvolver demência (Age and Ageing). Esses números gritam uma verdade que não pode mais ser ignorada por ninguém: a saúde sexual não é um departamento separado do bem-estar geral - é seu termômetro mais sensível, o primeiro a registrar tais desequilíbrios. ''O desejo não é um interruptor que se liga e desliga à vontade, mas uma rede elétrica que encontra seu caminho até a luz.'' - Dan Mena. Psicologia Evolutiva do Desejo: Ancestralidade e Atualidade Os mecanismos de seleção sexual esculpidos por milênios de evolução, se adaptaram aos novos tempos com impressionante resiliência. Homens acumulam matches no Tinder como seus antecessores exibiam troféus de caça; mulheres avaliam parceiros não mais pela força física, mas pela capacidade de oferecer segurança emocional - eu o chamo do ‘’novo status social’’ em nossa era pós-industrial. A monogamia vista como experimento social relativamente recente na escala evolutiva, vive sua crise mais aguda no século XXI. Pesquisas antropológicas revelam um informe intrigante: quanto mais uma cultura a enfatiza e a propõe como ideal exclusivo, maior a taxa de divórcios e traições conjugais - não por alguma falha moral intrínseca, mas porque nosso hardware cerebral ainda carrega a ambiguidade ancestral entre a necessidade de vínculos estáveis e a atração pela diversidade genética. Seria esta uma justificativa para a traição? Certamente não , por esta razão, no meu livro Eros - ‘’O Poder do Desejo’’ tem um capítulo que trata do tema de forma abrangente. O Corpo como Projeto Inacabado Adolescentes internalizaram atualmente de forma patológica a noção de que seus corpos reais são "defeituosos" quando comparados a avatares digitais de proporções impossíveis. Meninas de 15 anos apresentam listas de cirurgias plásticas desejadas como quem enumera upgrades necessários para um software, se submetendo a ‘’corsets’’ que comprometem a respiração e a mobilidade em busca de silhuetas quiméricas. Tribos urbanas emergentes exemplificam essa disforia digital: Bimbos : corpos moldados para imitar bonecas sexuais com proporções anatomicamente impossíveis Dollies : jovens que adotam lentes de contato coloridas e perucas anime não como estilo, mas como negação de sua humanidade básica Sigma males : rapazes que tratam relacionamentos como jogos de estratégia, reduzindo mulheres a NPCs (personagens não-jogáveis), entre outras tantas tribos. ''Chamamos eufemisticamente de ‘’liberdade sexual’’ o que é, na prática, uma nova forma de escravidão - agora com filtros e métricas de engajamento.'' - Dan Mena. Desejo Reinventado A Reinvenção do Desejo O futuro do erotismo autêntico não está em um retorno nostálgico ao passado nem em uma rendição acrítica às novas tecnologias, mas na capacidade de habitar plenamente o presente nesse corpo libidinal que somos aqui e agora - com todas suas limitações, traumas e, principalmente, sua capacidade infinita de reinvenção e resiliência. E você, leitor(a); quando foi a última vez que experimentou um desejo genuinamente espontâneo, não formatado por algoritmos ou expectativas alimentadas pela mídia? Essa que não cabia em categorias pré-existentes, que não renderia likes ou aprovação externa? A resposta, como tudo na psicanálise, não está nas teorias ou estatísticas, mas no silêncio entre seus próprios suspiros - aquele espaço íntimo que nenhuma tecnologia pode prever, nem hormônio replicar, como a tela não consegue capturar com a devida precisão. Existe desejo autêntico na vida pulsante, um traquejo existencial que se recusa a ser catalogado com a esperança da reinvenção contínua. Essa, talvez seja a nossa maior resistência e legado mais precioso como seres desejantes em um mundo cada vez mais padronizado. "O desejo é a última fronteira da liberdade - quando o compreendemos em sua plenitude, re-descobriremos o mapa de uma autêntica humanidade." - Dan Mena. Palavras Chaves; #Libido #DesejoSexual #FaltaDeDesejo #Excitação #PrazerSexual #DisfunçãoSexual #PsicologiaDoDesejo #EnergiaSexual #RelacionamentoÍntimo #ToqueSensual #Carícias #IntimidadeNoCasal #AntidepressivosELibido #PerformanceSexual #Erotismo #PrazerAlémDoSexo #DesejoNaMaturidade #SexualidadePósModerna #PornografiaEDesejo #ReconectarComOPrazer Até breve, Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Departament of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192.
- A Arte Psíquica de Fantasiar.
"A arte de fantasiar não é uma fuga da realidade, mas um retorno criativo a ela, transformando o ordinário em extraordinário."- Dan Mena. A fantasia não é apenas um mero devaneio; ela é uma construção psíquica rica que desempenha um papel extremamente importante na nossa sexualidade. Desde os primórdios da psicanálise, Freud destacou sua relevância como uma forma de satisfação dos desejos que não podem ser realizados na prática. Ela permite ao indivíduo experimentar prazeres que, de outra forma, seriam impossíveis devido às restrições sociais e morais. Através da sua articulação criamos cenários que adaptados psiquicamente se desenrolam sem o medo do julgamento ou da rejeição. Isso é especialmente importante em um mundo onde as normas sociais limitam a expressão sexual. Por exemplo, pensemos em como podem servir como um refúgio seguro para aqueles que se sentem constrangidos por suas preferências ou orientações sexuais consideradas tabus, ou inaceitáveis pela sociedade. Uma dualidade tanto libertadora quanto aterrorizante, afinal, ao confrontar nossa lascívia também peitamos o medo de sermos mal interpretados ou rejeitados. A psicanálise contemporânea amplia essa discussão ao considerar não apenas a função da fantasia como uma forma de escapismo, em um contexto terapêutico, podemos começar a entender as dinâmicas subjacentes que moldam nossa sexualidade. O que elas revelam sobre nós? Quais são os desejos ocultos que estão sendo expressos? Um aspecto fascinante da imaginação sexual é sua capacidade de espelhar esses enfoques individuais, mas também as influências culturais e sociais que nos cercam. Arranjados sempre em narrativas sociais por meio das quais aprendemos o que é considerado desejável ou inaceitável. Em sua utilidade podem se colocar a serviço como uma ponte entre o inconsciente e o consciente, pois aquilo que reprimimos em nosso cotidiano pode emergir no seu mecanismo. ''Ao transformar desejos inconscientes em narrativas, a fantasia atua como uma bússola para o desconhecido de nós mesmos.'' - Dan Mena. Assim acessamos conteúdos refreados que transparecem aspectos de nossa psique que precisam ser integrados. É importante ressaltar que não deve ser vista como uma solução para a insatisfação sexual; fato que podem ter consequências complicadas. Em alguns casos, a dependência excessiva delas pode levar à desconexão da realidade, dificultando a formação de relacionamentos saudáveis e autênticos. Portanto, é ponderado sempre encontrar o ponto de equilíbrio entre o exercício e a vivência efetiva. Sua existência vai além de simples enunciados, possui relevante participação na construção da identidade sexual, o que leva consequentemente à aceitação de aspectos de nós mesmos que antes eram negados ou ocultos. Assim, vão surgindo os questionamentos: Como as nossas fantasias configuram as relações interpessoais? Quais são os limites entre fantasia e realidade na experiência sexual? E como podemos utilizar essa compreensão para promover uma sexualidade satisfatória? É muito frequente acharmos que nossos pensamentos estejam na direção de objetivos povoados por uma série delas sobre as coisas que gostaríamos de realizar, ou mesmo, aquelas que não alcançamos. No entanto, quando levadas ao extremo encontramos uma extensão, uma característica comum, a ''personalidade narcísica'' . Por outro ângulo, pesquisadores entendem que possuem elementos positivos, ao proporcionar retornos compensadores emocionalmente. Barrett, se refere assim; ''que as pessoas diferem radicalmente na sua intensidade quanto na frequência que dão mão dela''. Aqueles que têm uma vida de excitamentos mais elaborados, são reiteradamente as(os) que fazem uso mais produtivamente. Dita realização conjunta com a imaginação, onde mutos aplicam sua energia para ser utilizada em tarefas como a produção literária, artística, cinema, teatro, esportes, sendo atividades muito criativas. Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis, definem a fantasia como; ''um percurso imaginário no qual o sujeito está presente e representa, mais ou menos deformado por processos defensivos, a realização de um desejo e, em última análise, de um desejo inconsciente'' . "A arte de fantasiar não é uma fuga da realidade, mas um retorno criativo a ela, transformando o ordinário em extraordinário."- Dan Mena. O conceito é regularmente utilizado na clínica psicanalítica, sua compreensão se dá pela amplitude do espectro que ela engloba, nos permitindo uma abordagem muito atual. Por ser um tema tão importante, é amplamente estudado, existem várias interpretações, considerando que seus sentidos foram sendo modificados pelas contribuições de diferentes estudiosos e autores. Quando Freud ainda estudava sobre ''histeria'' com Breuer, presumia ela ser uma atividade mental muito presente em dito sintoma, tanto no estado de vigília quanto na condição hipnótica. "A fantasia é a linguagem do desejo disfarçado, mas sua verdade é tão real quanto os alicerces da existência material." - Dan Mena. Após essas aquisições concluídas, sua designação ganhou força e se tornou ampla, sendo necessária sua definição para o trabalho clínico. Na sua intervenção inicial com neuróticos, Freud verifica que a maioria delas (pacientes), relatam ter sofrido agressões sexuais na infância. Passado o tempo, descobre e conclui, que tais relatos e cenas libidinosas de sedução e agressão que eram narradas, não se baseavam em fatos e acontecimentos verdadeiros, mas, na composição de alegorias que escondiam manifestações espontâneas sob a forma de um mascaramento de atribuições sexuais infantis. Então diz; ' 'já não me apareciam como derivações diretas de memórias reprimidas, de experiências sexuais infantis, pois entre elas e as impressões se sobrepõem às fantasias, que, por um lado, pareciam ser construídas com base e com os materiais das memórias infantis e — por outro — se tornavam sintomas'' . ''Ao transformar desejos inconscientes em narrativas, a fantasia atua como uma bússola para o desconhecido de nós mesmos.'' - Dan Mena. As influências de acidentes sexuais deram lugar ao conceito de repressão, o que é reprimido é a sexualidade, como infantil e traumática, cujas características ele destaca: ''uma primeira vez em que a sexualidade irrompe ''muito cedo'' no sujeito ''inocente'' . Uma manifestação sexual ocorre, num momento em que a sua elaboração simbólica é impossível, e permanecerá, portanto, não processada, devido à imaturidade sexual do sujeito, até um segundo tempo, após a puberdade, onde o(a) mesmo(a) sexualmente maduro(a), irá acrescentar uma nova estrutura de significação. Nesta nova fase e suas primeiras experiências, haverá de reinterpretar o tempo e espaço dessa conexão associativa, dando a reformulação de novas representações. Até aqui, a fantasia se articula segundo a sua própria lógica inconsciente sob um ciclo, tempo e espaço , onde a mesma seleciona e elabora uma história de vida para o próprio sujeito. O que diz Freud sobre a fantasia? Ele pensava naqueles anos que era uma expressão disfarçada, uma satisfação parcial de um desejo inconsciente. Ou seja; embora elas existam no sistema inconsciente, a unidade básica do sistema psíquico não é a fantasia, mas o desejo ou a pulsão, segundo (Spillius, 2015). Já, se Freud pensava tal como uma certa estratégia para alcançar um prazer possível com um objeto ''impossível'' , vem Winnicott, que acrescenta uma perspectiva tópica envolvendo o ''self'' : ''uma estratégia para conduzir um contato sempre impossível com um objeto possível'' . O self é descrito como instância psíquica fundamental que contém os elementos que compõem a personalidade, mas não carrega o núcleo da existência genuína do indivíduo. Assim, o protagonista da existência é o ''ser interior'', e o ''self'' que atua como coadjuvante principal na formação da personalidade. Fantasia e realidade na origem e razão da neurose, enquanto argumenta a respeito que; ''elas possuem realidade mental, em oposição a uma conjuntura material, e aprenderemos gradualmente a compreender, que no mundo da neurose a realidade psíquica é decisiva'' . (Freud, 1917). "A fantasia é a linguagem do desejo disfarçado, mas sua verdade é tão real quanto os alicerces da existência material." - Dan Mena. "A arquitetura do instinto seria o lugar onde cada desejo encontra um espaço idealizado para ser ensaiado sem ser realizado." - Dan Mena. ''A imaginação criativa ocupa um lugar imprescindível, não como fuga, mas como uma energia que nos permite recalcular insatisfações, realizando desejos através da imaginação e a ficção''. - Dan Mena. Em ''Construções em Análise'' , Freud (1937), argumenta que os sintomas e inibições apresentados pelos clientes são o efeito da repressão. Por isso, entendo que o objetivo do trabalho analítico é reconduzir as repressões no seu andamento e desdobramento, para serem convertidas em ações que correspondam a um estado de maturidade psíquica para serem realinhadas. Para isso, é necessário que certas experiências do sujeito sejam lembradas e rememoradas, bem como aqueles afetos que estavam conectados por conta do recalque, as quais são (naturalmente) esquecidos. "A inventividade não é um escape da realidade, mas uma trama psíquica onde o desejo e a defesa costuram a existência." - Dan Mena. Pela técnica, se faz necessário levar o paciente a lembrar de algo vivido, embora reprimido por si. Ele tem de deduzir os vestígios que ficaram para trás, tem de reconstruir, reciclar. Onde Freud (1937), argumenta que “nas exposições da técnica analítica se ouve tão pouco sobre construções, a razão para isso é que, em vez de tal, se escuta quanto interpretações e do seu efeito” . Por isso, ele considera que ''elaboração'' , é a designação mais adequada, pois o termo ''interpretação'' incita ao que é empreendido, enquanto construção, implica a articulação desses entendimentos. Nem sempre é possível ao cliente viajar até a lembrança perfeita do recalcado, embora seja possível uma aproximação adequada da veracidade dessa lembrança, o que em termos terapêuticos produz também uma recuperação positiva e utilizável para a análise. "A arquitetura do instinto seria o lugar onde cada desejo encontra um espaço idealizado para ser ensaiado sem ser realizado." - Dan Mena. Destarte se faz necessário investigar detalhadamente a mecânica dessa produção, e nas posições tanto do analista quanto do analisado. Será então, por estas linhas e amplas pontuações que não plenamente esclarecidas, tanto da teoria quanto da clínica que se abrem novas linhas de pesquisa e esquadrinhamento. Quem ampliou consideravelmente o conceito freudiano de fantasias inconscientes foi Melanie Klein, que diz; ''que as mesmas estão sempre manifestas e ativas em cada indivíduo'' . Sua presença não é um sinal de doença ou da falta de sentido da realidade, nem que elas vão determinar o estado psíquico do sujeito, nem a natureza delas e a relação com a realidade exterior. A ficção inconsciente, é a expressão mental dos instintos, por conseguinte, existem desde o início da vida. Instintos e intuições, procuram objetos, que estão correlacionados e associados à metáfora de um, ou vários desejos, que lhe sejam adequados. Assim, atribuímos para cada impulso instintivo uma inventividade que lhe corresponde psiquicamente. Exemplo: ao desejo de limpeza, corresponde a fantasia de um banho , o que daria supostamente satisfação a esse querer, mesmo que provisoriamente. "A fantasia se revela uma ponte entre o estudo e suas pulsões primordiais, o conduzindo à construção de um equilíbrio psíquico." - Dan Mena. A Viagem do Ego A elaboração da sua travessia pelos instintos através do ego implica mais organização dele, para o qual se vê interpretado incisivamente desde o nascimento. O ego, consegue criar o laço, e ser guiado até a ansiedade e suas ''relações objetais primitivas'' , tanto da fantasia quanto da realidade. Desde que surgimos, nos defrontamos e digladiamos com o entorno real, num confronto de forças conectadas a inúmeras experiências de recompensas, retribuições, naufrágios emocionais, desilusões, insatisfação e frustração dos desejos primários. Ditas vivências, são arremessadas para a ficção inconsciente, que por sua vez as sugestiona e manipula. Não atuam mentalmente como uma válvula de escape da realidade, senão que interagem com nossas competências verdadeiras de forma assíncrona. Klein afirma, que; ''é uma atividade mental básica presente desde o nascimento, de forma rudimentar, essencial para o crescimento mental, embora possa ser usada defensivamente'' . Portanto, se entendermos que tal quimera inconsciente influencia a percepção e interpretação da realidade, o inverso também é verdadeiro; a realidade submete a fantasia inconsciente, enquanto a incorpora simultaneamente. Não podemos eliminar absolutamente seu caráter de defesa, por estar claro que sua meta insiste em satisfazer nossas pulsões primitivas e originais. Sua gratificação, pode ser vista como uma salvaguarda contra a realidade externa, no sentido da privação daquilo que pode ser ''impossível'' de executar, e mesmo, usada como ''amparo e auxílio'' contra outras quimeras, aquelas às quais eu mesmo não me permito imaginar. "Desvendar a fantasia é abrir uma janela para o inconsciente, permitindo que o sujeito veja além de suas ilusões protetoras." - Dan Mena. "A gratificação ficcional é a válvula que alivia a pressão do impossível, permitindo ao sujeito persistir diante das privações reais." - Dan Mena. Narcísica ou Relacional? Concebida como uma encenação ou um romance criado especificamente por um indivíduo, Freud as classificou as dividindo em duas; 1 - Fantasia narcísica 2 - Fantasia relacional Em ambos os casos, uma pessoa assume o papel central, no entanto, além das conscientes, existem aquelas que operam de maneira inconsciente. Podemos pensá-las como um sistema que influencia nosso comportamento. Imagine um recém-nascido submetido a uma cirurgia em que são implantadas lentes coloridas em seus olhos. Crescendo com essa percepção alterada, ele aprenderia a nomear os núcleos de acordo com sua visão, sem perceber que sua experiência difere da dos outros. Da mesma forma, elas esculpem nossa percepção da realidade sem que tenhamos plena consciência disso. No senso comum, sua aplicação poderia funcionar assim: ''o tímido sonha com conquistas amorosas incríveis'', ''o marginalizado pode se imaginar desfilando em carros caros e famosos'' . Outro cruzamento interessante da vida com o imaginário e o cinema que desempenha um rol ''concretizador de desejos'' que a realidade não lhe permite. Filmes do gênero ''fantasia'' ilustram bem essa ideia, vejamos alguns; 1. A Forma da Água (2017) – Guillermo del Toro O filme acompanha Elisa, uma mulher muda que trabalha em um laboratório secreto do governo nos anos 1960. Ela descobre uma criatura aquática com a qual desenvolve um vínculo como metáfora para o amor. 2. O Labirinto do Fauno (2006) – Guillermo del Toro Ambientado na Espanha franquista de 1944, o filme acompanha a jovem Ofélia, que encontra um labirinto mágico e um fauno que se envolve em um conto de fadas sombrias. A fantasia serve como um refúgio da crueldade da realidade, abordando temas como escapismo, resistência e os horrores da guerra. 3. A Origem (2010) – Christopher Nolan Este thriller psicológico mistura ficção científica e fantasia ao explorar os sonhos como uma realidade manipulável. O protagonista, Dom Cobb, invade o subconsciente das pessoas para plantar ideias. A fantasia se entrelaça com a mente humana, questionando a percepção da realidade e a influência das memórias e emoções. 4. Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo (2022) – Daniel Kwant Misturando multiversos, ação e comédia, o filme acompanha Evelyn, uma mulher comum que descobre diferentes versões de si mesma. A fantasia aqui reflete as possibilidades infinitas da vida, explorando temas como identidade, escolhas e busca por significado no caos da existência. 5. O Senhor dos Anéis (2001-2003) – Peter Jackson Baseado nos livros de JRR Tolkien, transporta o espectador para a Terra Média, onde coexistem hobbits, elfos, magos e criaturas mágicas. Apesar do ambiente fantástico, a saga trata de questões humanas como coragem, amizade, destino e o poder corruptor do desejo. A jornada de Frodo simboliza o peso da responsabilidade e a luta contra as trevas. Esses filmes mostram como a fantasia não é somente uma fuga, mas um meio poderoso de explorar nossa experiência de vida. Embora a psicanálise dialogue com essa visão popular, seu significado na teoria freudiana é mais embaixo. Na psicanálise entendemos que ela não somente se contrapõe à realidade, mas participa ativamente da construção do que chamamos de '' realidade''. Neste entendimento, os objetos da concretude estão investidos de alegorias, a maioria delas inconscientes. Dessa forma, realidade e fantasia não são conceitos opostos , mas elementos que se ''entrelaçam'' . Fantasiar é tecer ilusões que, paradoxalmente, revelam verdades íntimas sobre nossos desejos e medos. - Dan Mena. Freud estabelece um marco importante ao diferenciar a ''realidade exterior'' da "realidade psíquica" , que se refere a um intricado conjunto de devaneios e representações que moldam a experiência individual. Essa visão introduz a ideia de que nossos pensamentos e sonhos, embora possam parecer distantes da realidade objetiva, desempenham um papel vital na formação da nossa identidade e das nossas interações. Os ''lacanianos'' , em uma expansão dessa abordagem, introduzem a noção de "O Real" , um conceito que transcende tanto a realidade exterior quanto a psíquica, representando uma dimensão da experiência, muitas vezes inarticulada e elusiva. Essa tríade de realidades não apenas enriquece o entendimento psicanalítico, mas também provoca reflexões sobre como percebemos o mundo e a nós mesmos, revelando a estrutura das relações entre o que é tangível e os labirintos da mente. "O fantasma, é o eco do desejo que nunca foi saciado, um laço entre o corpo pulsional e a falta no ''Outro." - Dan Mena. A fantasia na obra de Freud é anterior ao conceito dele em Lacan O prisma de Lacan sobre a fantasia assume importância como mecanismo de defesa para barrar a contingência de uma memória traumática, estando associada ao que ele chamou de ''parada da imagem'' - Roudinesco, 1998. Para ele, não se restringe ao imaginário. Lacan utilizou o termo ''lógica da fantasia'' , após a razão do desejo. Desde quando um indivíduo teria criado uma noção de objeto em função do ''desejo de outro'' , como a mãe, onde agrega uma falta, lugar singular de cada sujeito com suas concupiscências diversas. Haveria logo uma lógica fundamental, a ''fantasia fundamental'' . Abordar isso significaria alterar as defesas, modificar a relação entre fantasia e gozo, prazer e desprazer. Conceito de ''fantasma'' de Lacan O ''fantasma'' é o mecanismo de captura do corpo pulsional (objeto perdido) no laço com o ''Outro'' , portador de uma falta. No seu segundo ensino, Lacan formaliza o papel do ''Outro'' na constituição psíquica através das operações de alienação e separação. Prosseguindo para Susan Isaacs, que em 1948 retoma as noções dos autores citados, acrescenta; ''que todo indivíduo tem um fluxo contínuo de fantasias inconscientes, que a normalidade ou anormalidade não dependem da presença, ou ausência destas, mas da forma como são expressas, modificadas e relacionadas com a realidade externa'' . Estas ideias são muito valiosas, ao acrescentarem ao debate, de uma forma mais específica, a possibilidade de pensar a relação entre o mundo interno e o real. A fantasia será uma espécie de caleidoscópio, com os quais enxergamos com maior ou menor clareza dependendo da posição, o que se passa no exterior, a partir do que intercorre em nosso interior. "Desvendar a fantasia é abrir uma janela para o inconsciente, permitindo que o sujeito veja além de suas ilusões protetoras." - Dan Mena. Abordadas diversas teorizações para a compreensão do tema, poderíamos pensar nela como uma capacidade da mente, por ser precisamente ela que permitirá a mobilidade ou estagnação interna das movimentações, com a respectiva manifestação exterior, via comportamentos, ações, sintomas, emoções, criações e reações diversas e personalizadas. Juntamente com as formações de compromisso e responsabilidade são palavras da linguagem da vida psíquica. Seria a expressão mental do que se passa via nosso inconsciente, dos impulsos libidinais e agressivos, e dos mecanismos de defesa postos em atividade quando se trata da hostilização. É justamente esse campo de visibilidade, aquele que construímos e geramos para nos protegermos do real. Dita concepção não seria um problema se a sua aplicação fosse consciente, visto que fingimos que ela não existe, e assim, somos dominados por suas forças. "O fantasma, é o eco do desejo que nunca foi saciado, um laço entre o corpo pulsional e a falta no ''Outro." - Dan Mena. O querer renasce sempre, deseja-se a si, é o ''desejo de desejo'', se fosse possível sua consumação completa, seria a sua morte, ou seja, o fim da vida. Nossa concepção do desejo vai sempre além da psicologia popular. Normalmente podemos dizer que pensamos o desejo como possível de ser satisfeito, quando ele possui e consome o seu objeto. Este é, no entanto, o modelo da necessidade animal que está diretamente conectado com objetos de fato. Para o ser humano não, porque somos sujeitos simbólicos, vivemos pela intermediação da linguagem, logo, temos uma relação mediada com o mundo. Portanto, o nosso desejo não encontra nunca o seu objeto, sendo todas as satisfações e encontros parciais e provisórias. O querer renasce sempre, deseja-se a si, é o ''desejo de desejo'', se fosse possível sua consumação completa, seria a sua morte, ou seja, o fim da vida. Como terapeutas, não introduzimos gambiarras na psique do paciente, senão o(a) guiamos a realizar essa cruzada particular. Nosso trabalho, é fazer que o(a) mesmo(a) se responsabilize(m) de fato pelos seus desejos, se retirando do lugar de objeto, assumindo sua posição de sujeito compositor(a) da sua realidade, implicando, sim, a criatividade bem-vinda da sua fantasia , sem que se tornem reféns) dela(s). Tomo aqui, portanto, as palavras de Freud na sua conferência ''Dissecção da Personalidade Psíquica'' , que nos esclarece; ''que o objetivo da psicanálise, é que nos tornemos o que já éramos'' . Palavras Chaves; #FantasiaSexual #Psicanálise #Freud #Inconsciente #Desejo #Imaginação #Psicologia #Sexualidade #Neurose #RealidadePsíquica #Winnicott #MelanieKlein #Narcisismo #Lacan #IdentidadeSexual #Escapismo #Terapia #Pulsões #ConflitosInconscientes #Devaneios Até breve, Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 — CNP 1199. Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 — CBP 2022130. Dr. Honoris Causa em Psicanálise pela Christian Education University — Florida Departament of Education — USA. Enrollment H715 — Register H0192.